Folha de S. Paulo
O TJ-RJ destrambelhado e o movimento democracia já - Concessão de foro especial a Flávio Bolsonaro ignora a regra do jogo
O presidente Jair Bolsonaro descobriu a autocontenção só depois que a
Justiça decretou a prisão de Fabrício Queiroz. A propósito: a concessão,
pelo TJ-RJ, de foro especial a Flávio Bolsonaro afronta decisão do
Supremo. Tem de ser revertida por meio de recurso especial ao STJ ou de
reclamação ao próprio STF. Fui contra o fim do foro especial — e apanhei muito dos bolsonaristas por
isso —, mas o meu entendimento foi derrotado. Viva o colegiado! A menos
que a 3ª Câmara Criminal do TJ-RJ tenha encontrado no acórdão alguma
regra excetuando filhos de Bolsonaro, esse Flávio volta para as mãos do
outro, o Itabaiana. Que coisa! O apreço de certos varões de Plutarco
pela democracia depende mais da polícia do que da Constituição.
A luta é longa, e estamos só no começo. Enquanto o primeiro-amigo se
homiziava na realidade quântica de Frederick Wassef —o buliçoso advogado
que, ao mesmo tempo, abrigava e não abrigava o subtenente de
milícias--, o "capitão" nos ameaçava com a cólera das legiões, secundado
por fardas e pijamas verde-oliva pendurados nos cabides do Planalto. O Brasil anda tão doidão que debatíamos até a semana retrasada se um
golpe, ou autogolpe, era ou não possível.
Dar golpe para quê?
Para
render as Forças Armadas ao Comando de Rio das Pedras?
Para transformar o
país num grande Ministério da Saúde de Recrutas Zero, onde sobram
coturnos e faltam médicos?
[nos espanta o excesso de liberdade, próximo ao desrespeito, nas menções às Forças Armadas do Brasil que merecem todo o respeito de todos - especialmente dos brasileiros;
CONSTITUIÇÃO FEDERAL:
...
" Art. 142.....
..........
§ 3º Os membros das Forças Armadas são denominados militares,
aplicando-se-lhes, além das que vierem a ser fixadas em lei, as seguintes disposições:
....
I - as patentes, com prerrogativas, direitos e deveres a elas
inerentes, são conferidas pelo Presidente da República e asseguradas em plenitude aos
oficiais da ativa, da reserva ou reformados, sendo-lhes privativos os títulos e postos
militares e, juntamente com os demais membros, o uso dos uniformes das Forças Armadas;"
Torna-se recorrente menções despeitosas, ofensivas mesmo, a oficiais das nossas FF AA, especialmente, a oficiais da reserva, sem que a estes fiquem limitadas, - inclusive alcançando, sem limitar, oficiais-generais.
Por favor, não entendam como uma ameaça - qualquer coisa dita nos dias atuais, que não seja contra o presidente Bolsonaro pode caracterizar crime hediondo - e sim como uma lembrança de um passado não muito distante: lembrem-se do ex-deputado Márcio Moreira Alves e do seu discurso proferido em 1968.
Quanto ao alegado desrespeito por parte do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro a uma decisão do Supremo, cabe ao Ministério Público estadual provocar uma manifestação da Suprema Corte - que esperamos ocorra em decisão colegiada,]
O Brasil já está levando pito até de fundos de investimento, alertando
que o país não verá o verde do dinheiro enquanto não controlar a
Amazônia em chamas. Entidades de defesa do meio ambiente e dos direitos
humanos denunciaram à ombudsman da União Europeia os retrocessos em
curso. Eurodeputados enviaram carta ao presidente da Câmara conclamando o
Legislativo a resistir à devastação. O acordo Mercosul-UE está subindo no telhado; os investimentos externos,
já minguados, podem nos abandonar de vez; o agronegócio de ponta é hoje
prejudicado por madeireiros e grileiros de casaca mal cortada, que
ousam falar pelo setor. E lá estávamos nós a interpretar falas e
silêncios de generais. No país dos cemitérios eloquentes, fazíamos um
debate com quase 60 anos de atraso. A prisão de Queiroz evidenciou o
ridículo dentro do trágico.
Golpe? Autogolpe? Não percamos mais tempo com as ideias mortas que
oprimem o cérebro dos vivos. Participo nesta sexta à noite do que
pretende ser um grande ato virtual em defesa da democracia. Não se trata
de frente ampla de partidos nem de ensaio geral para a deposição de
Bolsonaro ou para a disputa eleitoral de 2022. A exemplo de outras iniciativas, como o manifesto Estamos Juntos,
brasileiros se articulam em defesa da garantia dos direitos fundamentais
assegurados pela Constituição, repudiando retrocessos no terreno
institucional. Mas não só. O coronavírus não é professor nem guia moral.
É um patógeno assassino. Mas também ensina.
E as milhares de vítimas da pandemia —todas sem vela e muitas sem
sepultura— escancaram a necessidade de a democracia avançar além das
garantias formais. A cor da morte na pandemia é preta. Seu lugar
privilegiado na pirâmide das iniquidades é a pobreza. Não podemos mais
tolerar um modelo que tenta harmonizar privilégios inaceitáveis com
racismo, miséria e desigualdade aviltante. O mais provável hoje é que Bolsonaro caia. E depois? Ele lidera o
desastre, mas as condições que o levaram ao poder sobreviveriam. E é
nelas que mora o problema. Há que se cobrar democracia em miúdos: em
políticas públicas, em atendimento aos vulneráveis, em fim de
privilégios. Para que ela possa existir também para os pretos e para os
pobres. E viva esta Folha, com sua campanha em defesa da democracia e com as
aulas de Oscar Pilagallo sobre a ditadura militar! É preciso pensar o
passado para instruir o futuro, em vez de ser esmagado por ele.
Bolsonaro e seus golpistas são só o que passa.
Reitere-se: o TJ-RJ não tem licença para ignorar decisão do Supremo. É a regra do jogo, coisa dessa tal democracia.
Reinaldo Azevedo - Coluna Folha de S. Paulo
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