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domingo, 22 de outubro de 2017

BolsoLula

Tetraneto do patriarca da Independência, o político mineiro Zezinho Bonifácio costumava dizer pelos corredores do poder que só o fato novo e o fato consumado eram capazes de justificar as grandes reviravoltas políticas do País. A ascensão de Jair Bolsonaro é, sem medo de errar, o fato novo da corrida presidencial de 2018. Agora, ele trabalha para se tornar um fato consumado. Mesmo que, para isso, tenha de camuflar sua essência. Senão vejamos. Na última semana, em tour pelos EUA, o pré-candidato ao Planalto cancelou um debate na George Washington University faltando apenas 24 horas para o evento. No rastro de uma saraivada de críticas, emergiu a justificativa: a recusa guardou relação com o que chamou de “cilada” armada contra ele pelo organizador do colóquio, o americano Mark Langevin, um ex-integrante da CUT. Sem entrar na questão da armadilha em si, convenhamos, o Bolsonaro “velho de guerra” jamais fugiria do embate. 

Pelo contrário. A refrega era um prato cheio para o pré-candidato. Dono de estilo eloqüente, soltaria os cachorros para cima do “professor-militante” em meio ao deleite de seu séquito. O debate geraria barulho nas redes sociais. Seus seguidores vibrariam a cada intervenção. Bolsonaro consolidaria votos. Mas por que, então, claudicar? A verdade é que o deputado, aos poucos, se molda às conveniências eleitorais.

Bolsonaro não é chuva de verão. Pela primeira vez, sabe que reúne chances de chegar ao Planalto. Mas ele também está ciente de que, para alcançar a Presidência, precisa transcender seu eleitorado cativo. Necessita ganhar a preferência de dois dos mais numerosos grupos de eleitores brasileiros: mulheres e moradores dos grotões do País. Não é tarefa trivial. Seduzir essa fatia do eleitorado lhe exige ser menos Bolsonaro “tiro, porrada e bomba” e mais “Bolsonaro paz e amor”.

Mudanças de comportamento motivadas por interesses puramente eleitorais não constituem uma novidade. Em 2002, Lula moderou o discurso radical e repaginou o visual para se tornar palatável ao mercado, às elites e à classe média. Deu certo. Bolsonaro segue trilha semelhante. No próprio périplo pelos EUA, suavizou o linguajar para soar menos casca-grossa aos investidores. Convencido de que precisa passar por um processo de “desradicalização”, jamais, por exemplo, repetirá a entrevista de 1999 em que sugeria o fuzilamento de FHC. Como Lula jamais repisou a famosa entrevista para a Playboy, em 1979, quando afirmou que usava o sindicato para “papar” mulheres de companheiros mortos.

As semelhanças param por aí. Mas, gostem ou não, é melhor aliados e adversários de Bolsonaro já irem se acostumando. O candidato, embora ainda não seja fato consumado, pode sim ser eleito presidente, caso se confirme o cenário pulverizado que se descortina no horizonte. E quanto maior for a possibilidade dele chegar lá, menos Bolsonaro ele será. Por mais irônico que possa parecer, Bolsonaro 2018 estará mais próximo de Lula 2002 do que de Trump 2016.

Fonte: Sérgio Pardellas - Isto É




quinta-feira, 28 de abril de 2016

Uma carta sobre Marcela, bela, etc, etc



Tudo isso serve a um mesmo objetivo - fragilizar os valores cristãos, apagar a sã filosofia, criar um novo Direito para um projeto social e político revolucionário que, sem exceção, fracassou em todas as suas experiências históricas.
(Transcrevo resposta a uma mensagem que recebi de leitora (1) com críticas ao meu anterior artigo sobre reações feministas à matéria em que a revista Veja ocupou-se da esposa do vice-presidente da República.)

Prezada senhora. Agradeço sua mensagem. Devo dizer que o artigo que escrevi sobre o assunto foi curtido por quase 500 pessoas. Quarenta e oito por cento, mulheres. Portanto, a leitura que a senhora faz dos fatos não é mais do que uma opinião em torno da qual há divergências substanciais. Detalho um pouco mais, aqui, meu entendimento. A matéria da Veja é irrelevante, de interesse apenas para quem tem curiosidade sobre a vida das celebridades. Não me parece que, ao finalizar dizendo que Temer é um homem de sorte, a revista ou a jornalista Juliana Linhares estejam sinalizando o estilo de vida que dona Marcela escolheu como algo a ser afirmado como padrão. Até porque, sendo a autora jornalista da Veja, estaria, ela mesma, se excluindo do suposto padrão que a senhora e outros quiseram encontrar nas entrelinhas de seu texto.

Quanto ao mais, o estilo de vida que dona Marcela escolheu para si é algo que diz respeito a ela e à família dela. Fazê-la objeto de uma saraivada de críticas como percebi, consultando posts aqui e ali (e foram ignoradas no seu comentário), é uma coisa sem sentido que me parece não encontrar de parte dela conduta correspondente. Muitas feministas querem o direito de viver como bem entendem e se escandalizam com a vida que Marcela escolheu... Paradoxo! E esse paradoxo foi um dos pontos que sublinhei em meu artigo.

Por outro lado, quando feministas criam movimentos e promovem ações públicas, sujeitam-se ao crivo da opinião alheia. Ações externas, manifestações de rua, conteúdos publicados nas redes sociais, perdem o caráter privado e íntimo que impediria outras pessoas de expressar suas próprias compreensões sobre tais pautas. Foi no uso desse direito que escrevi o artigo que a desagradou. E seu desagrado é tão legítimo quanto a discordância que expressei. Sem pretender uma erudição que não tenho, cito a conhecida frase de Terêncio: "Nada humano me é estranho". Um dos equívocos do feminismo é esse que a senhora comete quando pretende que apenas as mulheres possam opinar sobre questões femininas.

O mal-estar causado pela matéria da Veja só pode ter três motivos: 1) má interpretação do sentido geral texto, algo que uma releitura talvez retifique; 2) rejeição política à revista e ao marido da senhora em questão; e 3) teimosa recusa à obviedade expressa na frase final da matéria: "Temer é um homem de sorte". Ora, negar isso é negar uma evidência. Temer é um homem de sorte, sim senhora. Quem dirá que não, sem avançar em devaneios despidos de comprovação sobre a vida íntima do casal?

Quem escreve se vale do que aprendeu e eu aprendi, vendo e lendo, que há um projeto em curso no Ocidente, atacando, por todos os flancos, os valores da civilização. O projeto revolucionário ganhou multiplicidade de formas e se concentrou em atacar a resistência cultural que o Cristianismo lhe opunha. Entre incontáveis manifestações desse fenômeno sociológico e político contemporâneo, sublinho: os ataques frontais ao cristianismo e à instituição familiar, a vulgarização da sexualidade, o tipo de ensino ideologizado que é levado aos jovens, a manipulação da história, as políticas de gênero e excessos da agenda gay, a supressão dos símbolos religiosos em espaços públicos, aberrações como a promovida para afrontar a Jornada Mundial da Juventude e a levada a efeito por alunas do ICH da UFPel em outubro passado, a vulgarização do uso de drogas, o desrespeito à propriedade privada, as rupturas da ordem e o emprego da violência em atos públicos, a tolerância para com a criminalidade, e, claro, os excessos do feminismo que, de um salto, vai da justa defesa da igualdade para o total desvario das condutas.

Tudo isso serve a um mesmo objetivo - fragilizar os valores cristãos, apagar a sã filosofia, criar um novo Direito para um projeto social e político revolucionário que, sem exceção, fracassou em todas as suas experiências históricas. Não estou vendo fantasmas. Simplesmente estou vendo.

Assim, se a senhora encontra nos seus círculos de relações dissensos em relação às posições que defendo, nada há de surpreendente: essas pautas são, mesmo, controversas. No entanto, como afirmei acima, eu sei que há, entre todas, um traço comum. Há o ataque e há a defesa de valores que muito prezo, para o bem de meus filhos, sobrinhos e netos. Como a senhora bem diz, é perfeitamente possível ser isso e não ser aquilo. A provocação que fiz na parte final do meu artigo, mencionando o impeachment, teve um objetivo para mim importante: eu quis lembrar o conjunto da obra a ser protegida. Muitas vezes, as pessoas não se dão conta de que ao perderem de vista o conjunto servem muito bem a quem tem péssimas intenções sobre o todo, vale dizer, a quem tem intenções totalitárias. E o mal que apontei nesta carta infiltra-se e se serve de todas essas pautas.

Cordialmente

Percival Puggina -
http://www.puggina.org

(1) Bom dia! lamento muito que sua visão de mundo seja ou isso ou aquilo. Informo que tem muitos aquilos e muitos issos. Escrevo sobre sua coluna a respeito da bela, recatada e do lar.... São tantas as mulheres, tantas as trabalhadoras, tantas as provedoras. Qual o interesse da Veja em retratar essa senhora com esses adjetivos? Provavelmente essa senhora tem inúmeras outras qualidades também.... Por que reforçar esses? Você fala na condição de homem. Deixe falar quem sabe do que está falando. Deixe as mulheres falarem. Se feminista ou não, é a nossa opção. Politicamente, temos direito de nos posicionar. Se sim ou não ao impeachment, se sim ou não a considerá-lo golpe. Não empacote as pessoas, nem as mulheres. As pessoas não pensam por blocos. Há muitas nuances. A moça tem o direito de ser como quiser... assim como todas as mulheres.... o problema está em empacotar, rotular, enaltecer algumas qualidades..... qual o interesse.... Se você se ofende com a reação da mulheres, é porque é homem. Só uma mulher sabe o que vive, o que sofre e o que precisa enfrentar diariamente.