Um presidente em fim de mandato não deve jogar uma bomba no orçamento de um sucessor que defende o veto
Depois que o Senado aprovou o aumento de salários dos ministros do
Supremo Tribunal Federal, o presidente eleito Jair Bolsonaro disse o
seguinte: “Complica para a gente, quando fala em fazer reforma da Previdência,
tirar dos mais pobres e aceitar um reajuste como esse. Está nas mãos do
Temer. Não sou o Temer, se fosse, você sabe qual seria minha posição.
(...) Não tem outro caminho no meu entender, até pela questão de dar
exemplo.”
Faltam 48 dias para Temer passar a faixa a Bolsonaro. Será no mínimo um
péssimo exemplo jogar uma bomba que poderá chegar a R$ 4 bilhões anuais
no Orçamento de um governo que nem começou. Mas isso não é tudo. O Senado aprovou o mimo ao apagar das luzes da legislatura por 41 votos a
favor, 16 contra, 20 ausências e uma abstenção. A sessão foi presidida
pelo senador Eunício Oliveira, que disputou a reeleição e foi mandado
para casa. Metade da bancada que votou a favor do aumento perdeu a
cadeira, como Romero Jucá, ou desistiu do Senado, como Aécio Neves. Por
ordem alfabética, o primeiro senador solidário com o reajuste dos
ministros foi Acir Gurgacz, que cumpre pena de quatro anos e seis meses
na penitenciária da Papuda.
A votação foi uma clássica xepa de feira. O aumento tramitava no Senado
desde 2016, mas Eunício Oliveira levou-o ao plenário em regime de
urgência. O relator do projeto na Comissão de Assuntos Econômicos,
senador Ricardo Ferraço, deu parecer contrário e votou contra o
reajuste. Na sua conta, elevando-se o salário dos ministros de R$ 33.763 para R$
39.293 provoca-se um efeito cascata que, com o tempo, vai se espalhar
por toda a administração. Na mesma sessão, os senadores votaram também o
aumento do salário da procuradora-geral da República. Por mais razão
que tenham os ministros com seus salários, nenhum deles passará
necessidades com um salário de R$ 33.763 e outros pequenos confortos. Na
maioria, são pessoas patrimonialmente seguras por fortuna familiar,
acumulação, sucesso profissional e mesmo por empreendedorismo.
O senador Eunício e muita gente boa garantem que o aumento irá só para
os 11 ministros ou, quem sabe, só para os juízes dos tribunais
superiores. Quem já viu uma comissão de frente entrar na Marquês de
Sapucaí sem que houvesse atrás uma escola de samba pode acreditar nisso. Juízes e desembargadores admitem a possibilidade de trocar alguns de
seus penduricalhos depois que houver a propagação do aumento, mas não há
quem garanta o sucesso dessa manobra. Muitos juízes, como Sergio Moro,
recebem o auxílio-moradia e veem nele um complemento salarial. Seu
derivativo carioca, o doutor Marcelo Bretas, acumula o mimo com o da
mulher, que a ele tem direito pelos seus próprios méritos. (O fato de
morarem no mesmo apartamento seria irrelevante.) [acrescentamos o fato de que o doutor Bretas e esposa dividem a mesma cama.
O troca-troca de mimos por penduricalhos não justifica, visto que o aumento das excelências é praticamente o dobre do valor do auxílio-moradia = quem banca o troca-troca, o contribuinte, tem o prejuízo aumentado;
há também o risco de que seja criado o 'adicional por tempo de serviço', um balão de ensaio já foi lançado, o que aumentará o prejuízo da 'viúva' = contribuinte.
E, tem mais, a norma que proíbe a concessão de aumento a menos de 180 dias da troca do presidente da República está sendo ignorada; sugestão: os insatisfeitos com o aqui chamado 'mimo do STF' recorram ao Supremo Tribunal Federal - nos parece que dois partidos e um deputado contestaram o 'mimo' no STF, que decidirá após a Reforma da Previdência ser aprovada.]
O troca-troca de mimos por penduricalhos nunca foi explicado direito. Se
há aí um toma lá dá cá, alguém precisa mostrar a planilha com a conta,
porque até agora a Viúva só dá, nunca toma. Os salários da Justiça estão defasados, mas não se desembaralha o novelo
com mimos para ministros acompanhados de inexequíveis promessas de
contenções. Tudo ficaria melhor se, em vez de uma xepa de feira, Temer
vetasse o aumento aprovado para os ministros, e Jair Bolsonaro chamasse
sua turma para fazer a conta direito, mostrando-a aos contribuintes. Um veto de Temer lustrará seu fim de governo e permitirá que a questão
seja zerada, para ser discutida numericamente por um governo livre de
ganchos processuais.