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sábado, 11 de fevereiro de 2017

Temer dá o tom

Ele não é uma unanimidade nacional. Ao contrário. Chegou ao posto cercado por desconfianças e críticas, não só da oposição como do público em geral que temia o risco de viver sob a tutela de mais um aventureiro (como tantos que por ali passaram!), sendo, no caso, alguém que sequer tinha sido escolhido diretamente pelo voto popular. Michel Temer assumiu há poucos meses como 37º presidente da República, debaixo de ralos índices de popularidade, sofrendo a pecha de representar um partido ideologicamente fisiológico e estruturalmente esfacelado – que mais se aparenta com uma federação de caciques regionais do que com o modelo almejado por eleitores de uma agremiação coerente e coesa. 

Devagar, ao seu estilo, usando do traquejo político e da facilidade para a negociação – atributos que lhe são reconhecidamente peculiares – foi impondo uma nova agenda ao Planalto e, por consequência, ao País. Independente das preferências partidárias e das queixas de cada um contra seus métodos, o fato é que o presidente está colhendo robustos resultados e mostrando consistência na gestão. Como um jogador de pôquer que coloca sobre a mesa a mão imbatível de um “Royal Flush”, ele apresentou, nesses primeiros tempos, cartas fortes como a da volta do controle aos gastos públicos, através de um teto constitucional aprovado em Congresso, a queda dos juros, o crescimento da receita com a arrecadação (sem aumento de impostos) e o encaminhamento de reformas essenciais, tais como a da Previdência e a da legislação trabalhista, esta última flexibilizando relações entre patrões e empregados. Sem contar, de quebra, a rearrumação administrativa e de caixa de estatais como a Petrobras e a Eletrobras, que andavam à míngua. 

O Banco Central e o BNDES deixaram de ser usados, respectivamente, como mero emissor para tapar gastos do Tesouro e garantidor de créditos subsidiados. Estão em nova forma, focados em seus objetivos fins de política monetária, desenvolvimentista e fiscal. Decorre daí talvez a mais eloquente vitória da administração Temer, assinalada na semana passada, com efeitos positivos e consequências duradouras sobre a vida de todos os brasileiros: a queda da inflação a patamares mundialmente tidos como civilizados. Em janeiro a taxa ficou em comportados 0,38%, o menor nível para o mês em mais de 30 anos, três vezes menor que o de janeiro do ano passado. É um índice nunca antes experimentado desde o início da era da estabilização da moeda, em 94. 

O que isso representa? Certamente o desempenho não é fruto tão somente de um cenário recessivo que inibe o recrudescimento dos preços. Afinal, a recessão já é moléstia em vigor por aqui desde 2014, pelo menos. A acomodação inflacionária é decorrente, principalmente, de uma volta à normalidade das condições macroeconômicas. A impressão de que tudo melhora, e numa velocidade maior que a esperada, vem endossada por vários indicadores e avalizada por muitos daqueles que estão acostumados a interpretar os humores do mercado.

 Armínio Fraga (que já pilotou o BC) diz, por exemplo, que a sensação de trem desgovernado, a caminho do precipício, passou. O professor Afonso Celso Pastore, ex-ministro da Fazenda, entende que o voluntarismo predominante no campo fiscal e dos juros nos tempos de Dilma (e que fez tudo desandar) virou coisa do passado. Mesmo empresários concordam com o otimismo e avaliam que “a economia parou de doer”. De um jeito ou de outro, Michel Temer vai empreendendo seu ritmo de virada. 

Ele se mostra genuinamente comprometido com o objetivo – encarado como missão – de colocar o País no rumo, pacificando ânimos. Sem pretensões à reeleição, segundo diz. Fará, nesse caso, história. Por enquanto, no plano político, amealha outros importantes trunfos e vitórias expressivas. Fez valer a sua influência para colocar na direção da Câmara e do Senado aliados do governo. Aproximou ainda mais de seu núcleo de poder a estratégica esquadra tucana, concedendo-lhes espaço na Justiça, no campo dos direitos humanos e em cargos-chave do Planalto. Ao todo, o presidente passou a somar quase 400 votos no Parlamento. Uma maioria tão absoluta que ele pode vir a aprovar qualquer texto de emenda constitucional sem muito esforço. E para deixar completo o seu ciclo de influência, encaminhou um nome da cota pessoal, com as qualificações exigidas de “notório saber” e “reputação ilibada”, para ocupar a cadeira vaga no Supremo. Com habilidade política e na economia, Temer está desanuviando o horizonte de problemas.

Fonte: Editorial - Carlos José Marques,  diretor editorial da Editora Três


 

terça-feira, 31 de maio de 2016

As mal-ajambradas explicações de Dilma

Em entrevista, Dilma repete a visão delirante do ‘golpe’ e ainda defende a ideia risível de que em 2014 era muito difícil perceber que o Brasil estava em crise. Não lia jornais

Antes de ser afastada da Presidência, no início da manhã de 12 de abril, Dilma Rousseff, entrincheirada no Planalto, cumpriu uma intensa agenda de comícios indoor, em que, inflamada, repetiu a tese ilusória de que estava sendo vítima de um “golpe”.
 
Não adiantou. O Senado acolheu o pedido de impeachment por crimes de responsabilidade, devido a infrações graves contra o princípio da responsabilidade fiscal e a lei orçamentária, passando a correr o prazo de até 180 dias para seu efetivo julgamento pela Casa, sob a presidência do ministro responsável pelo STF, Ricardo Lewandowski.

A presidente afastada guardou algum silêncio até este domingo, com a publicação de uma entrevista à “Folha de S.Paulo”, em que aproveitou para desdobrar a tese esperta do “golpe” comprada internamente por militantes, e, no exterior, por aliados, simpatizantes e desavisados —, colocando-se, mais uma vez, como vítima do deputado, também afastado, Eduardo Cunha. Convém apresentar-se como alvo de uma unanimidade nacional — negativa.

Dilma bate na tecla, também nada verossímil, de que o impeachment visa a desmontar a Lava-Jato, como se ela, Lula e o PT não houvessem tramado contra a Operação. O mais lógico, e menos custoso, seria eles reforçarem a aliança com certas parcelas do PMDB em torno deste objetivo comum. Outro falseamento da realidade — já explorado por Dilma — é culpar a oposição por criar obstáculos a tentativas de o governo enviar reformas ao Congresso. Ora, os governos do PT se notabilizaram por evitar e sabotar reformas. Com a exceção de mudanças no sistema previdenciário do servidor público, iniciadas no primeiro mandato de Lula e completadas apenas em fins de 2015, já no segundo mandato de Dilma. Demorou muito.


Mais dessintonizada ainda da realidade foi a resposta da presidente afastada quando questionada sobre o fato de ter defendido um programa de governo na campanha à reeleição e aplicado outro, um caso irretocável de estelionato eleitoral.  Na visão edulcorada de Dilma, o governo e nem ninguém perceberam que o Brasil havia entrado em crise. Ora, ora. 

No ano da campanha, 2014, o PIB já desacelerava, o emprego rateava. Numa interpretação benévola com Dilma, ela deixou de ler a imprensa profissional a partir de 2012/13, desde quando veículos como O GLOBO começaram a alertar para os erros de política econômica e os consequentes sinais, cada vez mais fortes, de que viria uma explosão fiscal. Se a presidente no aguardo do impeachment, assessores e seguidores esperavam melhorar de situação, com a entrevista, frustraram-se. Dilma continua a viver em um mundo próprio, em que a vida real se subordina à vontade política. Engano fatal, por certo.

Fonte: Opinião - O Globo