Senado deve recorrer ao Supremo e não
confrontá-lo
Não existe alternativa possível a não ser cumprir a
determinação judicial. Caso haja discordância, o único
caminho a seguir é o do recurso à Corte
A coexistência entre os três poderes da República é
básica para a estabilidade do regime, e para isso há
leis e ritos. Quando
este equilíbrio é rompido, instalam-se crises institucionais, que têm de ser
debeladas a partir destas mesmas leis e ritos, porque não se podem admitir
soluções que não estejam baseadas na Constituição.
Não há, no estado democrático de direito, o mais forte que se impõe
sobre o mais fraco. Tampouco, portanto, saídas unilaterais.
A decisão da Primeira Turma da Corte, por três votos
(Luís
Roberto Barroso, Rosa Weber e Luiz Fux) a dois (Marco Aurélio Mello e Alexandre de Moraes), de afastar o senador tucano
mineiro Aécio Neves do mandato e mantê-lo em regimento de “recolhimento
noturno”, evoluiu ontem para a aprovação do regime
de urgência, a fim de que o plenário da Casa decida, na terça, o que
fazer.
Ao menos ganhou-se tempo, porque o pior que pode
acontecer é o Senado recusar-se a cumprir uma decisão do STF, algo
inimaginável e inaceitável. [frise-se bem: uma
decisão de uma turma do STF, decisão tomada por maioria apertada - 3 a 2
- e que por invadir a competência constitucional de outro Poder, ferindo sua
autonomia, deveria no mínimo ser referendada pelo Plenário da Suprema Corte, em
uma decisão respaldada no voto favorável à decisão da Turma de pelo menos dois
terços dos ministros.
O Senado está sendo afrontado por uma
decisão de apenas três ministros do STF, em uma turma de cinco ministros.]
Sequer entre senadores há consenso. O próprio Aécio
Neves já anunciou que recorrerá — o caminho indicado. Randolfe Rodrigues
(Rede-AP) é um dos senadores que defendem, com razão, que cabe ao Senado fazer
lei, e não interpretar leis, tarefa exclusiva do Judiciário. Vai na mesma
direção o senador Álvaro Dias (Podemos-PR), defensor da solução por meio de
recursos ao STF. [ os dois defensores de que o
Senado aceite ser subjugado pela vontade de três ministros do STF, em uma turma
de cinco, sendo que os dois votos restantes foram contra a decisão que pisoteia
o Senado Federal, são: o senador Randolfe Rodrigues, salvo engano nunca teve um
projeto de lei sequer levado ao Plenário do Senado para análise e votação,
limitando o exercício do mandato a contestar o que considera errado mesmo que
sua posição só traga tumulto e o senador Álvaro Dias que segue também a linha
do 'sou contra tudo', apesar de ser mais moderado e sensato que o seu colega
aqui citado.]
A decisão da Segunda Turma gera polêmica. Que está nela
própria, porque houve dois votos divergentes da maioria, o de Alexandre de Moraes e o de
Marco Aurélio Mello, relator do caso. Há, é certo, um debate jurídico. O ministro Luís Roberto
Barroso, voto divergente e vitorioso, garante, ao contrário do que entendem
senadores, que o recolhimento noturno não é prisão, e que, portanto, não contraria
o artigo 53 da Constituição, segundo o qual só é possível parlamentar ser
detido em flagrante de crime inafiançável ou continuado.
Fux, por sua vez, diz que o recolhimento
noturno está previsto como medida cautelar pelo Código de Processo Penal. Não falta combustível para esta
polêmica. Mas só resta ao Senado e ao senador, como a qualquer cidadão,
cumprirem uma determinação judicial, enquanto recorrem. O ideal seria que o
assunto fosse para o plenário da Corte, e nesta instância os onze ministros
defendessem seu entendimento.
Deve-se, ainda, creditar ao reboliço que tomou
conta de parte da Casa o fato de que há parlamentares e partidos em posição
desconfortável na Lava-Jato e em outras ações anticorrupção que aproveitam o
momento para se precaver diante do que poderá acontecer com eles mais à
frente. Entende-se, assim, o vigor da defesa de petistas da
intocabilidade do senador mineiro, também apoiado pelo PMDB, em que transitam “quadrilhões”,
termo usado pela Procuradoria-Geral da República. Esta crise institucional
não faz sentido.
Fonte: O Globo - Editorial
[chega a ser preocupante a entrevista concedida ontem ao Jornal Nacional pelo ex-ministro, ex-presidente do STF, Ayres Britto, que declara com um sorriso irônico que quem não estiver satisfeito com uma decisão do Supremo que recorra ao próprio Supremo ou cumpra.
Se percebe que o ex-ministro (notem bem, se trata de um ex, imagine um atual) exibe um sorriso irônico, um certo deboche quando expressa sua opinião de que as decisões do Supremo são indiscutíveis e tem que ser cumpridas, exceto se o próprio Supremo as revogue.
Esquece o nobre ex-ministro que a decisão questionada foi tomada por apenas 3 ministros da Suprema Corte - menos de um terço da sua composição plena - e impor a outro Poder o seu cumprimento é desrespeitar o principio de independência dos Poderes, procedimento este, que não combina com o tão decantado "estado democrático de direito".
Não nos surpreende que o ex-ministro pense assim, já que seu estilo arbitrário, prepotente, é notório, afinal foi ele que quando presidia o Supremo convalidou ato da ex-presidente Dilma que modificava mediante Decreto um artigo da Lei de Acesso Informação e é sabido que uma LEI não pode ser modificada por um Decreto.
Se espera que o bom sendo prevaleça e que o Plenário do STF decida sobre o assunto, especialmente considerando que em uma Corte composta por onze ministros, apenas três decidiram afrontar um dos Poderes da República - tivesse sido a esdrúxula decisão aprovada pelo Plenário do STF e por unanimidade, ainda tinha alguma lógica.
Mas foi tomada por menos de 1/3 dos ministros do Supremo - não houve unanimidade nem na Turma que proferiu o ato de supremo arbítrio.
Vamos imaginar que o Supremo não revogue o ato arbitrário e o Senado além de não cumprir ainda revoga na próxima terça.
Queira o senador Randolfe ou o Dias estará aberto o espaço para que uma outra Instituição decida que o ato deve ser revogado - e o revogue - ou deve ser cumprido e imponha, pela força, o seu cumprimento.]
Para saber mais sobre esta ilegalidade, clique aqui.]