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sábado, 18 de maio de 2019

Quando as crises se encontram

Economia brasileira está sendo atingida por uma onda de aversão ao risco, que é agravada pelos erros e brigas inúteis do governo

Houve nos últimos dias um agravamento da crise brasileira e a isso se juntou um novo episódio da guerra comercial entre Estados Unidos e China. Nossas fraquezas, e as brigas deles, nos fazem ser atingidos pela onda de aversão ao risco. O ceticismo com o governo Bolsonaro aumentou muito no mercado financeiro e isso bateu no dólar. Quando o ambiente está assim, qualquer notícia pode detonar esse movimento no câmbio e nas bolsas, mas o mais perigoso está acontecendo dentro da economia.
Quem vê a economia brasileira por dentro acha que muitas empresas podem quebrar. Perdeu-se o momento, aquela hora do impulso, que leva a mais investimento. O mercado financeiro criou uma expectativa, com a eleição de Bolsonaro, que as coisas iriam melhorar. Os erros sucessivos do governo fizeram o país perder essa hora. Muitas empresas estão entrando em desespero, porque vivem uma crise financeira e estão se dando conta de que a melhora ainda vai demorar. Elas talvez não aguentem continuar esperando Godot — avalia um economista que assessora várias companhias.

Um diplomata que acompanha de perto as negociações entre Estados Unidos e China está convencido de que é tudo muito mais complexo do que parece. — De um lado os chineses acham que os Estados Unidos estão sendo draconianos e exigindo nada menos que a rendição. De outro lado, os Estados Unidos não conseguem entender a cultura chinesa e interpretam de maneira equivocada os sinais dados na mesa de negociação. Os americanos não entendem mesmo o código chinês. Quando eles ficam em silêncio, acham que é aquiescência e depois quando vem a negativa entendem como recuo. Não têm paciência com a progressividade do processo negociador chinês — explicou o diplomata.

Cresce na economia brasileira a convicção de que este ano está perdido. Ouvi dentro do governo a previsão de que o país pode ter um crescimento abaixo de 1% este ano. No mercado financeiro afirma-se que nem a reforma da Previdência resolverá o problema. O diagnóstico é de que o governo tem criado distrações que afastam o país da agenda e produzem uma deterioração rápida da conjuntura. Essa piora da expectativa bate diretamente nas empresas. Os bancos emprestam cada vez menos para as companhias por causa do aumento do risco corporativo.

No mundo, a economia americana está crescendo, mas a chinesa está em maior vulnerabilidade, e a guerra comercial eleva a incerteza sobre o PIB chinês. O crescimento dos Estados Unidos é forte, 3%, com taxa de desemprego abaixo de 4%. Essa força reflete os “esteroides” dados por Trump, com a redução dos impostos. Alguns economistas acham que ainda este ano pode haver uma desaceleração da economia americana. Quem acompanha as negociações acha que Trump pode recuar, fingindo não estar fazendo isso, e aproveitar qualquer acordo para cantar vitória. Mas de qualquer maneira o clima azedou muito na mesa de negociação a partir do momento em que Trump escalou a agressividade através da mídia social.

No Brasil, há economistas no mercado financeiro defendendo que se reduza os juros para estimular a economia, diante dos dados de que ela está esfriando ainda mais. No governo o entendimento é outro: de que o Banco Central controla a Selic, mas ela é apenas parte de todo o conjunto das taxas de juros. O problema brasileiro é fiscal, por isso a queda dos juros pode provocar o efeito contrário, ou seja, a elevação das taxas cobradas das empresas e das pessoas.

A crise política contaminou a economia. O presidente Jair Bolsonaro cria problemas diários. Ontem divulgou um texto anônimo, com uma interpretação equivocada da realidade brasileira, e se dizendo vítima de conspiração. Lembra, obviamente, Jânio Quadros e suas “forças ocultas”. Sandices desse tipo consumiram o otimismo que havia sido gerado pela eleição. — O mercado e as empresas “compraram” a agenda liberal de Paulo Guedes. Agora, o temor é de que a crise política torne inviável essa agenda — explica um integrante do próprio governo.

Essa deterioração acontece de forma muito prematura. Bolsonaro chega ao quinto mês enfrentando manifestações que lembram o fim do governo Dilma. Para piorar, as duas maiores potências ameaçam a economia global.