Economia brasileira está sendo atingida por uma onda de aversão ao risco, que é agravada pelos erros e brigas inúteis do governo
Houve nos últimos dias um agravamento da crise brasileira e a isso se
juntou um novo episódio da guerra comercial entre Estados Unidos e
China. Nossas fraquezas, e as brigas deles, nos fazem ser atingidos pela
onda de aversão ao risco. O ceticismo com o governo Bolsonaro aumentou
muito no mercado financeiro e isso bateu no dólar. Quando o ambiente
está assim, qualquer notícia pode detonar esse movimento no câmbio e nas
bolsas, mas o mais perigoso está acontecendo dentro da economia.
Quem vê a economia brasileira por dentro acha que muitas empresas podem quebrar.— Perdeu-se o momento, aquela hora do impulso, que leva a mais
investimento. O mercado financeiro criou uma expectativa, com a eleição
de Bolsonaro, que as coisas iriam melhorar. Os erros sucessivos do
governo fizeram o país perder essa hora. Muitas empresas estão entrando
em desespero, porque vivem uma crise financeira e estão se dando conta
de que a melhora ainda vai demorar. Elas talvez não aguentem continuar
esperando Godot — avalia um economista que assessora várias companhias.
Um diplomata que acompanha de perto as negociações entre Estados Unidos e
China está convencido de que é tudo muito mais complexo do que parece. — De um lado os chineses acham que os Estados Unidos estão sendo
draconianos e exigindo nada menos que a rendição. De outro lado, os
Estados Unidos não conseguem entender a cultura chinesa e interpretam de
maneira equivocada os sinais dados na mesa de negociação. Os americanos
não entendem mesmo o código chinês. Quando eles ficam em silêncio,
acham que é aquiescência e depois quando vem a negativa entendem como
recuo. Não têm paciência com a progressividade do processo negociador
chinês — explicou o diplomata.
Cresce na economia brasileira a convicção de que este ano está perdido.
Ouvi dentro do governo a previsão de que o país pode ter um crescimento
abaixo de 1% este ano. No mercado financeiro afirma-se que nem a reforma
da Previdência resolverá o problema. O diagnóstico é de que o governo
tem criado distrações que afastam o país da agenda e produzem uma
deterioração rápida da conjuntura. Essa piora da expectativa bate
diretamente nas empresas. Os bancos emprestam cada vez menos para as
companhias por causa do aumento do risco corporativo.
No mundo, a economia americana está crescendo, mas a chinesa está em
maior vulnerabilidade, e a guerra comercial eleva a incerteza sobre o
PIB chinês. O crescimento dos Estados Unidos é forte, 3%, com taxa de
desemprego abaixo de 4%. Essa força reflete os “esteroides” dados por
Trump, com a redução dos impostos. Alguns economistas acham que ainda
este ano pode haver uma desaceleração da economia americana. Quem
acompanha as negociações acha que Trump pode recuar, fingindo não estar
fazendo isso, e aproveitar qualquer acordo para cantar vitória. Mas de
qualquer maneira o clima azedou muito na mesa de negociação a partir do
momento em que Trump escalou a agressividade através da mídia social.
No Brasil, há economistas no mercado financeiro defendendo que se reduza
os juros para estimular a economia, diante dos dados de que ela está
esfriando ainda mais. No governo o entendimento é outro: de que o Banco
Central controla a Selic, mas ela é apenas parte de todo o conjunto das
taxas de juros. O problema brasileiro é fiscal, por isso a queda dos
juros pode provocar o efeito contrário, ou seja, a elevação das taxas
cobradas das empresas e das pessoas.
A crise política contaminou a economia. O presidente Jair Bolsonaro cria
problemas diários. Ontem divulgou um texto anônimo, com uma
interpretação equivocada da realidade brasileira, e se dizendo vítima de
conspiração. Lembra, obviamente, Jânio Quadros e suas “forças ocultas”.
Sandices desse tipo consumiram o otimismo que havia sido gerado pela
eleição. — O mercado e as empresas “compraram” a agenda liberal de Paulo Guedes.
Agora, o temor é de que a crise política torne inviável essa agenda —
explica um integrante do próprio governo.
Essa deterioração acontece de forma muito prematura. Bolsonaro chega ao
quinto mês enfrentando manifestações que lembram o fim do governo Dilma.
Para piorar, as duas maiores potências ameaçam a economia global.
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