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sexta-feira, 3 de julho de 2020

O sofisma do Poder Moderador - Almir Pazzianotto Pinto

O Estado de S.Paulo

Conferir seu exercício às Forças Armadas significa abrir largas portas ao arbítrio

Na ausência de motivos para levarem a efeito a ideia do golpe, as hostes bolsonaristas recorrem à figura do Poder Moderador. Invocam a aplicação forçada e torta do artigo 42 [142] da Constituição de 1988. Poder Moderador existiu, mas na Carta Imperial de 1824, outorgada por Sua Majestade o imperador dom Pedro I. Dizia o artigo 98: “O Poder Moderador é a chave de toda organização política e é delegado privativamente ao Imperador, como Chefe Supremo da Nação e seu primeiro representante, para que, incessantemente, vele sobre a manutenção da independência, equilíbrio e harmonia dos poderes políticos”.

Para a regime monárquico era aceitável que ao imperador coubesse a prerrogativa de velar, ou seja, de fiscalizar a preservação do equilíbrio e da harmonia entre os Poderes Legislativo e Judiciário. Afinal, a ele pertencia a chave da organização política. Registre-se, ademais, que Sua Majestade era pessoa inviolável e sagrada, não se encontrando sujeita “a responsabilidade alguma”, conforme prescrevia o artigo 99. 
Proclamada a República, as coisas deixaram de ser assim. O presidente da República, chefe do Poder Executivo, não é inviolável ou sagrado. Responderá, se for o caso, pela prática de crimes de responsabilidade e comuns, conforme determinam os artigos 85 e 86 da Lei Fundamental.

[os que estão imbuídos do viés antibolsonarista, que temem  medidas mais enérgicas, possíveis de adoção dentro da Constituição Federal vigente, buscam por todos os meios desqualificar as interpretações do artigo 142 'caput' e seu parágrafo primeiro, da Carta Magna, tentando denominar  as Forças Armadas - instituição encarregada de executar as ações autorizadas naquele artigo - de Poder Moderador.

Com isso buscam desqualificar qualquer pretensão das Forças Armadas serem consideradas um quarto poder, que seria o Poder Moderador.
Tal busca não tem como prosperar,ser exitosa,  exceto se o STF optar pele recurso da interpretação criativa - mais uma, que se prosperar não será a última. 
O tão comentado artigo 142 é bem claro quando atribui as Forças Armadas o exercício de atribuições que podem ser consideradas - especialmente no caso de conflito entre Poderes - específicas de um Poder Moderar, atribuições que estão embutidas  naquele comando constitucional.
É cristalina a redação do mesmo dispositivo quando atribui ao Presidente da República o Comando Supremo das Forças Armadas.
A Lei complementar nº 97, especialmente o seu artigo 15, é claríssima quando estabelece que a requisição proveniente dos Chefes do Poder Judiciário e/ou dos Poder Legislativo,  para emprego das Forças Armadas deve ser dirigida ao Presidente da República.
A Lei Complementar 97, foi editada em cumprimento ao determinado na Constituição Federal, artigo 142, parágrafo primeiro. Tal lei está em vigor há mais de 30 anos e tem competência outorgada pela própria CF para disciplinar, complementar aquele artigo.

Chamar de Poder Moderador as FF AA por exercerem uma função constitucional nada importa. A turma do mecanismo, seus simpatizantes e incautos, busca ao insistir nessa denominação,  desclassificar um inexistente Poder Moderador ou tentativa de criá-lo.

O exercício das funções moderadoras é, constitucionalmente, das Forças Armadas. Chamar as forças singulares, no exercício de função moderadora, de Poder Moderador, Poder Regulador, é uma mera opção. 

Caso a Constituição esteja errada, equívoco só agora percebido - tudo indica, consequência de ser o presidente Bolsonaro o Comandante Supremo das Forças Armadas, que não tem a simpatia da turma citada e nem dos que com ela simpatizam, apoiam.  
Então emendem a Constituição. 
Sendo retirada da Constituição - resultado de alteração efetuada  na forma estabelecida no artigo 60 da Lei Maior, não existe nenhuma instituição com funções de Poder Moderador.

Não ocorrendo emenda e permanecendo a redação atual, , executar atribuições típicas de um Poder Moderador -  dentro do 'estado democrático de direito' no qual o Brasil se encontra - será missão das Forças Armadas do Brasil.] 

Há algum tempo registrei que a Constituição de 1988 é a única, entre oito, que não resultou de golpe militar. Sucedeu à Constituição de 17/10/1969, conhecida como Emenda n.º 1, editada pelos ministros Augusto Hamann Rademaker Grünewald, da Marinha, 
Aurélio de Lira Tavares, do Exército, 
e Márcio de Souza Melo, da Aeronáutica. 
Haviam assumido a chefia do governo com a doença do presidente Costa e Silva. Para fazê-lo afastarem o vice-presidente Pedro Aleixo, seu sucessor natural de conformidade com o artigo 79 da Constituição de 1967. A História aí está para não nos esquecermos.

O dr. foi eleito em 5/1/1985, pela pressão popular. O colégio eleitoral apenas ratificou a vontade do povo, cansado de duas décadas de autoritarismo. Unida em torno dos partidos de oposição, a Nação reivindicava, em grandes manifestações públicas e pacíficas, o restabelecimento das eleições diretas e a restauração do Estado Democrático de Direito.

A doença que vitimou o dr. Tancredo quase pôs tudo a perder. Na noite de 14 de março, ao ser divulgada a notícia da internação no Hospital de Base começaram a circular em Brasília boatos de intervenção militar para impedir a posse de José Sarney. A rápida interferência do general Leônidas Pires Gonçalves, futuro ministro do Exército, teria assegurado ao vice-presidente o exercício interino da Presidência até a morte de Tancredo, em 21 de abril. A Constituição de 1988 não é produto de crise ou de golpe militar. Resultou de Assembleia Nacional Constituinte, convocada e eleita como compromisso da campanha pela redemocratização. Tem defeitos. O maior, talvez, decorrente de irrefreável prolixidade.

Contém, entretanto, os instrumentos necessários à defesa do regime democrático. Às Forças Armadas – constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na disciplina e na hierarquia, sob a autoridade suprema do presidente da República – incumbe a defesa da Pátria, a garantia dos Poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, a defesa da lei e da ordem. A Constituição não as investe do Poder Moderador. Não são elas “a chave de toda a organização política”. Tampouco lhes compete velar pela manutenção da independência, do equilíbrio e da harmonia dos demais Poderes políticos, prerrogativa dos imperadores.

Para preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem pública ou a paz social, ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional, ou atingidas por calamidades de grandes proporções da natureza, o presidente da República pode se valer da decretação do estado de defesa. 
Nos casos de comoção nacional ou de fatos que comprovem a ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa, ou de declaração de estado de guerra ou resposta a agressão armada estrangeira, tem ao seu dispor o estado de sítio. No primeiro caso, o decreto deverá ser submetido de imediato ao Congresso Nacional, para validá-lo ou não. No segundo, o Congresso deverá ser consultado antes (artigos 136/141 da Constituição).

Em ambas as situações, para preservação do Estado Democrático de Direito o Congresso Nacional permanecerá em atividade, sendo assegurada a divulgação dos pronunciamentos dos parlamentares nas correspondentes Casas Legislativas, desde que liberados pelas respectivas Mesas Diretoras. Pelas mesmas razões, o estado de defesa e o estado de sítio não impedirão o acesso à tutela do Poder Judiciário.
Conferir às Forças Armadas o exercício de Poder Moderador, instituto estranho ao arcabouço constitucional, significa abrir largas portas ao arbítrio.

Almir Pazzianotto PintoAdvogado, ex-ministro do Trabalho