J.R. Guzzo
Não tem preço
Por que será? É provável que Bolsonaro nunca tenha criado uma calamidade tão maligna quanto essa – nem tão duradoura, visto que o seu preferido vai ficar decidindo o que é certo e o que é errado para o Brasil pelos próximos 27 anos. Mas o que houve, de Lula e da extrema esquerda até a bancada “da bala” e a extrema direita, foi um dos mais intensos movimentos que já se viu neste país em matéria de olhar para o outro lado e fazer de conta que não aconteceu nada demais. [inclusive aqueles partidecos sem votos e sem programa, que a qualquer pretexto judicializam tudo que o presidente tenta emplacar, silenciaram - esquecendo o que se tornou a máxima deles: 'não temos votos, nem programa de governo, mas governamos através do Supremo';
E, notem que a primeira ação poderia ter como fundamento qualquer detalhe e com o estouro curricular, poderiam questionar até a reputação ilibada do indicado.
Nada fizeram, afinal perceberam a possibilidade da gangue esquerdista ainda enrolada com a Justiça ser absolvida.] Nem a constatação de que o novo ministro copiou e colou na sua “tese” trechos inteiros escritos por um advogado amigo – incluindo os erros de português – sem dar um pio sobre o nome do verdadeiro autor, provocou maiores objeções. Para um presidente que é diariamente acusado de genocídio para baixo, fora o pouco-caso com os quilombolas, os incêndios no Pantanal e a sua participação em milícias do crime organizado, trata-se de uma vitória e tanto.
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A passividade com que os inimigos de Bolsonaro receberam a indicação do dr. Kássio para o STF, para não ficar enrolando a questão com considerações superiores de ciência política, tem uma explicação bem simples: ninguém falou nada porque todo mundo gostou – ou, se não gostou, engoliu com casca e tudo. O novo ministro, quando se pensa um pouco, é o homem dos sonhos do mundo político brasileiro de hoje – agrada ao PT, ao “Centrão”, à OAB, ao ministro Gilmar Mendes, aos presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, às empreiteiras de obras públicas, aos refugiados da Lava Jato, aos escritórios “top de linha” da advocacia criminal, aos defensores das “instituições democráticas”, à classe intelectual, ao presidente Bolsonaro, à família do presidente Bolsonaro e por aí vamos. O leitor se lembrou de alguém mais? Pode colocar na lista. [com certeza não agradou, não agrada e nem agradará aos bolsonaristas de raiz - esperamos que o presidente Bolsonaro ou as falhas curriculares do indicado revertam a indicação, ou será que só contamos na hora do voto?]
O fato é que ninguém que viaja nesse bonde pode admitir, de jeito nenhum, que o STF melhore, por pouco que seja. Pode tudo – mas melhorar, não. Eis aí o maior risco que todos eles podem correr hoje em dia. Um Supremo menos ruim que esse é uma ameaça direta ao seu bem-estar; é ali que os “garantistas” garantem que os acusados de corrupção sejam deixados em paz, e a garantia dessa impunidade não tem preço para os proprietários da vida pública do Brasil. Uma Justiça mais decente obrigaria a classe política e o resto da massa que hoje vive à custas da máquina do Estado a se comportarem melhor do que se comportam. E quem está querendo se comportar melhor nesse povo? Bolsonaro teve a sua primeira grande chance de piorar o Supremo. Não perdeu a viagem.
É a “governabilidade” – todo o mundo se ajeita, a “resistência” continua fazendo discurso, mas deixa Bolsonaro em paz nas coisas que de fato importam, e o público pagante fica no papel de otário.
J.R. Guzzo, Jornalista - O Estado de S. Paulo