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quarta-feira, 15 de maio de 2019

Saudades do Meirelles

“Em quatro meses de blá-blá-bá, muita falta de foco e crises fabricadas pelo próprio presidente Bolsonaro, seus filhos e aliados ideológicos, o governo ainda patina na economia”


Se dissermos que já tem gente sentindo saudades do ex-presidente Michel Temer, que foi preso pela segunda vez pela Operação Lava-Jato na sexta passada e foi solto, novamente, ontem, pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), estaríamos fazendo uma provocação; mas, com certeza, o ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles, já começa a dar saudades. Meirelles pegou a economia em profunda recessão, com inflação acima do teto, a maior bagunça nas estatais e os gastos públicos numa espiral ascendente; durante o período do mandato de Temer, conseguiu domar a economia e dar uma arrumada na casa, baixou a inflação e os juros; entregou o país em certo nível de atividade econômica e expectativa de crescimento para este ano acima de 2,5%.

Em quatro meses de blá-blá-bá, muita falta de foco no que é realmente importante e crises fabricadas pelo próprio presidente Bolsonaro, seus filhos e aliados ideológicos, o governo ainda patina na economia, embora tenha avançado alguma coisa na área de infraestrutura. Uma herança do governo Temer, em especial do ex-ministro Moreira Franco, responsável pelo programa de parcerias público-privadas e concessões, que o ministro da Infraestrutura, Tarcísio Freitas, que havia participado de sua equipe, agora está tocando de forma acelerada e com reconhecida competência.

A ata da reunião da semana passada do Conselho de Política Monetária (Copom), só divulgada ontem, foi um banho de água fria no otimismo do mercado. O Banco Central (BC) decidiu, pela nona vez seguida, manter a taxa básica de juros da economia, a Selic, em 6,5% ao ano. Segundo o Copom, existe “probabilidade relevante” de que o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro tenha registrado um “ligeiro” recuo no primeiro trimestre de 2019. Pesou na avaliação a situação da economia mundial, que sofre os efeitos da guerra comercial entre os Estados Unidos e a China, as duas maiores potências econômicas do mundo atual. “Os riscos associados a uma desaceleração da economia global permanecem e que incertezas sobre políticas econômicas e de natureza geopolítica podem contribuir para um crescimento global ainda menor”, afirma o Copom.

O ministro da Economia, Paulo Guedes, assustou ainda mais os agentes econômicos com as declarações que deu na Comissão Mista do Orçamento da União, à qual compareceu ontem, na Câmara. Disse que a previsão de crescimento do PIB neste ano caiu para 1,5%. Para Guedes, a economia brasileira está “no fundo do poço”. O Orçamento de 2019 aprovado pelo Congresso, durante o governo Temer, previa um crescimento de 2,5% do PIB. Como isso não vai ocorrer, o país entrou no que Guedes chama de “abismo fiscal”, que vai exigir cortes na Esplanada dos Ministérios e, talvez, uma revisão do limite do deficit fiscal.

Quanto pior, pior
Guedes dramatiza a situação também para pressionar o Congresso a aprovar a reforma da Previdência, vista como tábua de salvação do governo, mas não se pode dizer que isso é uma chantagem. A situação é realmente grave, e o governo não conseguiu, até agora, empolgar os agentes econômicos como se esperava logo após as eleições. O problema não é apenas a situação fiscal. De parte dos analistas do mercado financeiro, a convicção é de que a reforma da Previdência será aprovada pelo Congresso, ainda que mitigada, o que abrirá caminho para outras medidas favoráveis de natureza econômica e tributária. Essa aposta, porém, tem sua credibilidade arranhada pela sucessão de crises criadas pelo próprio governo.


A crise mais séria, para o mercado, é a disputa entre os militares e os filhos do presidente da República, que são porta-vozes do chamado “grupo olavista”. Há que se destacar que as propostas ultraliberais de Guedes para a economia não têm nenhuma contradição com a retórica do chamado “grupo olavista”, que defende soluções ultraconservadoras nas políticas públicas e nos costumes, além de apostar na radicalização política, verbalizada pelo guru político do presidente Bolsonaro, Olavo de Carvalho.

Acontece que o “modus operandi” do clã Bolsonaro é muito truculento, desconectado da realidade dos problemas sociais e econômicos e focado na ocupação de mais espaços no governo por aliados políticos do grupo. Além disso, o presidente Bolsonaro comporta-se de forma errática, sem prioridade clara em relação à agenda do governo, que é sobressaltada por medidas de impacto que miram muito mais a sua base eleitoral mais radical do que o conjunto da sociedade. De certa forma, os indicadores econômicos estão mostrando ao presidente Bolsonaro que a rapadura é doce, mas é dura, como se diz no jargão popular. O próprio ministro Paulo Guedes, com razão, joga a culpa da situação no passado, porém, precisa cair na real: o problema agora é do atual governo, que deixou a economia piorar.

Nas Entrelimhas - Luiz Carlos Azedo - CB


 

sexta-feira, 8 de dezembro de 2017

Não há garantia de os juros continuarem baixos


Com mais um corte feito pelo BC, a taxa básica chega a seu ponto mais baixo, porém a situação ficará insustentável se o Congresso não iniciar a reforma da Previdência 


O Banco Central, pelo seu Conselho de Política Monetária, cortou os juros básicos, a Selic, em mais 0,5 ponto, para 7%, e, com isso, a taxa atingiu a marca mais baixa em décadas ou, com alguma precisão, desde 1999, quando surgiu a política de metas de inflação. 

Merece as devidas comemorações, até pela forma com que a Selic tem caído. Recorde-se que, em 2012, a taxa chegou a 7,25%, mas apenas porque assim desejou a então presidente Dilma Rousseff, e, mesmo com a inflação fora das rédeas, o BC de Alexandre Tombini obedientemente fez o que o Planalto desejava. Como alertado, a inflação ganhou mais fôlego, e a Selic teve de voltar a subir, até chegar ao pico de 14,25%, em julho de 2015.

A queda foi rápida, mas, desta vez, porque a inflação permitiu, ao contrário do que aconteceu nos tempos de intervencionismo e do “novo marco econômico” de Dilma Rousseff e do lulopetismo. Ficou evidente que não basta vontade política para administrar uma economia. É preciso acionar os mecanismos certos.  Contribuíram para o atual quadro — em que a inflação está abaixo de 3%, quando a meta é de 4,5% —, o efeito de uma grande safra agrícola e mesmo a recessão. A economia emite sinais de recuperação, que, lenta, mantém a calmaria nos preços, também ajudada, até agora, pelo câmbio. Por isso, o relatório do BC sobre a decisão de quarta-feira admite mais um corte, menor, na próxima reunião do Copom.

Outro fato inédito é que a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), dos créditos a projetos de investimento, ficou igual à Selic, uma das prioridades do BC. Para isso a TJLP está em processo de extinção, a ser substituída por outra taxa, menos dependente do poder discricionário dos governos.  O aspecto positivo do nivelamento é que deixa de haver subsídios nesses financiamentos, uma conta pouco clara para a sociedade e fator de desequilíbrio fiscal. A queda da Selic também ajuda nas contas públicas, porque ela incide sobre a dívida interna.

Porém, não é possível prever quanto tempo mais haverá calmaria na inflação e nos juros. O imponderável é a reforma da Previdência, se o Congresso se disporá ou não a iniciá-la ainda este ano, o que é o ideal.  No lado da economia, há ingredientes necessários para que o PIB continue a se recuperar. Com inflação baixa e o mercado de trabalho em reativação, a renda da população volta a crescer, o consumo se eleva, e o setor produtivo, com grande capacidade ociosa, pode atender à demanda em alta sem maiores esforços de investimento.

Mas não há a certeza de que o Tesouro sairá da rota da insolvência. O que só acontecerá se e quando a reforma da Previdência for aprovada. Ou houver confiança de que isto acontecerá, sem a necessidade da eleição de um novo governo.  A sensação de conforto com a conjuntura benigna da economia pode ser efêmera. Tudo está nas mãos do Congresso.


Editorial - O Globo