Blog Matheus Leitão
Magistrado tem combatido com eficácia as fake news que influenciam milhares de pessoas. Inquérito é ainda mais necessário à medida em que 2022 se aproxima.
Há uma constante pressão sobre o ministro Alexandre de Moraes, do
Supremo Tribunal Federal (STF), com o andamento do inquérito das fake
news. Não deveria ser assim. O magistrado tem avançado contra uma
das principais doenças do nosso tempo: a desinformação em massa, responsável
por manchar reputações, criar narrativas políticas mentirosas e até definir
eleições presidenciais em democracias consolidadas – o que dirá nas jovens como
a brasileira.
A mais recente decisão do ministro gerou uma série de críticas e contestações. Ele determinou a retirada do ar de alguns perfis de de bolsonaristas em redes sociais, pessoas que estão sob investigação por espalhar fake news e fazerem ameaças às instituições democráticas. Vários reabriram seus perfis com IP do exterior e ele mandou que as plataformas também retirassem do ar. O Facebook, no entanto, afirmou que não cumpriria a decisão de bloquear as contas internacionais e que recorreria ao plenário da corte.
[Com todo o respeito à VEJA - da qual somos assinantes desde o
governo Geisel = mais de 2.000 exemplares, conservados, apesar de quase sempre
empoeirados - vamos tecer alguns
comentários que expressam nossa surpresa sobre a forma que a presente matéria
tenta defender o ministro presidente do 'inquérito do fim do mundo'.
O
fator principal para a denominação é que uma única autoridade exerce na peça
investigatória as funções de policial, promotor, defensor, juiz singular e de a
mais alta instância recursal.
Muito provavelmente o artigo em questão
não será exitoso, mas o empenho com que tenta
defender nos parece que não seria alcançado em documento que viesse a ser
elaborado pelo ministro Moraes, em conjunto
com o decano do STF.
Vamos às considerações:
- Os Estados Unidos sempre tiveram
uma propensão a atuarem como 'polícia
universal' (já foram mais ativos) e, no
seu exercício tiveram muitos dissabores.
- Agora, em evidente risco para o Brasil, o ministro Alexandre de Moraes, se arvora de 'juiz universal' e tenta impor suas decisões além das fronteiras do território do Brasil.
Nos assusta que a necessidade do
cumprimento de suas decisões no âmbito de uma inexistente "jurisdição universal" imponha
ao Brasil, especialmente as suas Forças Armadas - tão abandonadas, desde os tempos
do governo do sociólogo tucano - o pesado ônus de fazer cumprir os éditos do ministro fora das
fronteiras brasileira, inclusive fazendo valer o recurso da 'condução debaixo de vara'.
- Quanto ao fecho da matéria, é mais uma
vez reforçada a impressão que muitos brasileiros tem de que a democracia
brasileira é de uma fragilidade imensa.
Ou será que é a democracia vigente sob o
peculiar 'estado democrático de direito', nos moldes brasileiro, que tem tantos
defeitos que se torna frágil?]
A
plataforma tinha a preocupação legítima de combater um precedente delicado:
- a de um ministro brasileiro determinando algo para ser cumprido em
outros países, fora portanto do alcance de sua jurisdição.
Mesmo assim é preciso manter o foco no problema maior, o mal das fake
news. Recentemente escrevi aqui na coluna que o Facebook havia
saído na frente do Twitter ao excluir contas ligadas a assessores
do presidente Jair Bolsonaro e dos seus filhos, encontrando terreno seguro no
caminho estreito entre limpar a rede sem virar censor de conteúdo. A plataforma
disse que era “conteúdo inautêntico”. Num caso específico, um
assessor do Palácio do Planalto que escondia a sua identidade em páginas que
controlava.
O inquérito das fake news já cometeu erros ao censurar órgãos de
imprensa como a Crusoé e O Antagonista, mas se transformou em
um dos mais importantes em andamento na corte. Ele não combate somente as
notícias falsas, mas o extremismo crescente no país. E tenta
responsabilizar aqueles que, encorajados pela impunidade de crimes cometidos
nas redes, fizeram ameaças de bomba contra o STF. A gravidade desses ilícitos é
tão grande que, em determinado momento, viu-se, além da propagação do ódio, a
defesa de teses contrárias à saúde pública em meio à maior pandemia dos
últimos cem anos. Para os críticos do inquérito, o problema é a
possibilidade de, na
tentativa de controle das fake news, se ferir a liberdade de expressão. Como se o remédio
fosse matar o paciente. É preciso
todo o cuidado na garantia da liberdade de expressão, mas manifestar
opinião é diferente de alimentar o ambiente de ódio, montar uma máquina para
reproduzir mentiras e atacar pessoas que não têm o mesmo arsenal
para se defender. Ou mesmo para propagar ideias que aumentam a força de uma
pandemia que já matou mais de 97 mil pessoas no Brasil.
Não há risco de se ferir a liberdade de houvesse, existem entidades,
como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), atentas em buscar evitar retrocessos. O
próprio STF tem mecanismos de controle internos que podem corrigir eventuais
excessos o ou erros. Há divergências internas na corte e interlocutores de
ministros afirmam que, quando as investigações perderem o sigilo, tudo ficará
esclarecido para a sociedade.
A verdade é que o STF, e e o próprio Alexandre de Moraes, têm acertado
muito mais que errado neste e em outros casos em tramitação. A corte tornou-se
um bastião de defesa da democracia brasileira. Não há risco de o relator do do
inquérito das fake news matar o paciente. O magistrado tem é combatido com
eficácia um mal deste século que tem influenciado a vida de milhares de
pessoas. A investigação é ainda mais necessário à medida em que 2022 se
aproxima, sem que a polarização diminua. O risco de nada fazer é ver o país
engatar de vez a marcha ré.
A chance aberta pelo inquérito é conhecer melhor os mecanismos digitais
montados pelo bolsonarismo nas eleições de 2018. Essa mesma engrenagem tem sido
acionada para simular movimentos de opinião pública em favor dos grupos mais
extremos do atual governo. O país não pode cometer o erro de estar despreparado
para neutralizar manipulações que capturem a vontade do eleitor.
A democracia precisa ser
protegida.