A
crise tirará férias oficialmente. Mas não haverá descanso. Fora de Brasília, as
articulações em torno do impeachment seguirão
Na
noite de segunda-feira, dia 21 de dezembro, a presidente Dilma Rousseff ofereceu
no Palácio da Alvorada um coquetel de final de ano para ministros, auxiliares
mais próximos e um restrito grupo de aliados no Congresso. Numa clássica blusa de renda
preta, acompanhada de colar de pérolas, Dilma circulou com o semblante
aliviado. Permitiu-se inclusive uma piada inusual com o líder do PT na Câmara, Sibá
Machado, a quem chamou de “crítico de
arte”, depois que o petista lhe presenteou com um
quadro da artista plástica mineira Gri Alves.
A crise política terá uma pausa forçada e desejada em janeiro – não por obra de algum talento ou melhora súbita na situação, mas devido à inércia da obrigação legal do recesso parlamentar e da vontade de ambos os lados, governo e oposição, de interromper a disputa. Será apenas uma parada técnica. As articulações só deixarão de ocorrer no palco central, em Brasília, e acontecerão em outros palcos – ou coxias – espalhados por todos os Estados. Em encontros longe dos refletores, com o país em “pause”, governo e oposição se armarão para o que virá em fevereiro.
Nesse cenário, Dilma abdicou da temporada na praia e fará apenas uma pequena pausa para passar as festas de fim de ano com a família, em Porto Alegre. Dilma crê que terá condições de esboçar alguma reação em janeiro para começar a tirar sua administração das cordas. [a única forma de Dilma tirar sua administração das cordas é enrolando as cordas em seu pescoço.] O entorno de Dilma não quer desperdiçar a trégua.
Sem dinheiro, sem a oposição do Congresso e sem o Judiciário para tornar operacional a Lava Jato, o Planalto espera colocar em ação em janeiro o que mais gosta de fazer: uma ofensiva midiática para tentar reverter a péssima imagem do segundo mandato de Dilma entre os brasileiros. A massa de propaganda tentará vender a mensagem de que a administração não está totalmente paralisada. O Planalto acredita que, ao falar sozinho, conseguirá reduzir um pouco seu sufoco.
Trata-se, no entanto, de uma verdade parcial. Se é unânime a avaliação de que Dilma ganhou um surpreendente respiro no fechar das cortinas de 2015, também é certo que a reviravolta do jogo pouco ou em nada se deveu a ações dela e de seu governo. Não fosse o Supremo em uma ponta da Praça dos Três Poderes e o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), em outra, o mandato de Dilma continuaria por um fio. Renan enxergou na fraqueza de Dilma um porto seguro para escorar-se depois da última etapa da Operação Lava Jato, que atingiu pessoas próximas a ele.
Frequentador dos mais privilegiados corredores do poder em Brasília desde os tempos de líder do governo Fernando Collor no Congresso, Renan foi, fora do mundo jurídico, o principal responsável pela operação que reanimou Dilma. O senador adotou um discurso de paz e mandou recados claros ao vice-presidente, Michel Temer, de que não quer mais conflitos no PMDB e nem pretende discutir impeachment com as várias alas da legenda. “Não há mais conversa”, afirma um aliado de Renan. “Agora, ele espera um gesto do Temer para unificar o partido.” Ao contrário de seu vizinho de corredor, Eduardo Cunha, igualmente na mira da Lava Jato, a ordem de Renan é pacificar, em vez de partir para o embate.
Renan passará os próximos dias entre sua casa de praia de Barra de São Miguel, perto de Maceió, e em Murici, no interior de Alagoas, seu berço político. O refúgio, no entanto, não o afastará das articulações. É comum que políticos façam uma peregrinação até Alagoas para pedir sua bênção. Com o impeachment em suspenso e com eleições à vista, neste janeiro a peregrinação será ainda mais intensa. Renan também conversará com aliados sobre o que se fará em Brasília a partir de fevereiro. Em seu caso, não se trata apenas de estratégia, mas de sobrevivência.
A regra para os líderes
e parlamentares mais graduados será a mesma: trabalhar bastante em janeiro
– mas, ao contrário de Dilma, sem estratégia de
marketing e longe dos holofotes. Se há a desvantagem de cada um estar em um
Estado diferente, há a enorme vantagem de haver tempo livre das obrigações
regimentais das sessões – além da discrição dos encontros fora de Brasília,
longe das atenções. Ninguém acredita que o presidente
da Câmara, Eduardo Cunha,
um workaholic assumido, entusiasta do impeachment e acossado pelo medo
de perder o cargo e o mandato devido a seu envolvimento no petrolão e a um
processo no Conselho de Ética, passará o mês de férias
sem articular com seus aliados.
Cunha
já planeja como procrastinar ainda mais seu processo no Conselho. Planeja também como
a Câmara colocará sob teste as novas regras prescritas pelo Supremo para o
impeachment.
Fonte: Revista Época