Quando o governo
chileno de Salvador Allende mais precisava de tranquilidade, um movimento que queria radicalizá-lo, o MIR, comandado por um sobrinho
do presidente, ajudou a dificultar o diálogo com a oposição. No Brasil,
cabos e sargentos favoráveis ao presidente João Goulart, liderados pelo cabo
Anselmo, mais tarde identificado como agente duplo, rebelaram-se e dinamitaram as pontes entre governo e Forças Armadas
(na ocasião, Luiz Carlos Prestes, aliado
de Goulart e dirigente maior do Partido Comunista, proclamava: “já estamos no poder, só nos falta tomar o governo”).
A história se repete com outro governo de esquerda: no momento em que Lula e Dilma procuram
conciliar, seus aliados petroleiros entram em greve. Não é questão de saber o
que é que pretendem; mas o que conseguem é enfraquecer, por questões outras, o governo que apoiam.
Agora, somemos: à
greve dos petroleiros segue-se a greve dos caminhoneiros ─ e, sejam quais forem
suas reivindicações, geram instabilidade no país. Há a manifestação Fora Dilma já marcada para o dia 15. A primavera
promete ser quente. E hoje começa para valer o processo contra Eduardo Cunha na Comissão
de Ética.
Há três possibilidades: a abertura do processo é
rejeitada, ou é aceita e derrubada no voto, ou é aceita e aprovada. Nas duas primeiras hipóteses, a opinião pública sentirá
o inequívoco cheiro de acordo mútuo, Cunha
salva Dilma, Dilma salva Cunha; na terceira, Eduardo Cunha se sentirá
impelido a revidar, encaminhando o impeachment, com greves na rua e
manifestações.
Prepare-se.
Bola de cristal
Há chances de
Cunha ficar na Presidência da Câmara. Mas são escassas.
Guerra à pobreza
Lula, o
ex-ministro Antônio Palocci, a
ex-ministra Erenice Guerra e o
governador mineiro Fernando Pimentel,
também ex-ministro, não nasceram em berço de ouro. Mas não podem se queixar: de acordo com dados do
Coaf, Conselho de Controle de Atividades Financeiras, do Ministério da Fazenda,
os quatro movimentaram perto de R$ 300 milhões em suas contas
bancárias, nos últimos anos. As informações oficiais foram enviadas à CPI do BNDES. Lula, diz o Coaf, movimentou R$ 52,3 milhões em quatro anos, de abril
de 2011 a maio de 2015, entre contas pessoais e de sua empresa de palestras, a LILS. Palocci movimentou muito mais: R$ 216 milhões entre 2008 e 2015, boa parte por sua empresa, a Projeto
Consultoria. Fernando Pimentel foi bem mais modesto: R$ 3,1 milhões entre
2009 e 2014. E Erenice atingiu R$ 26,3 milhões de
2008 a 2015.
Ao chegar ao poder, o PT declarou guerra
à pobreza. Foi bem sucedido.
Os bons amigos
Da ótima
coluna de Aziz Ahmed, de O Povo, do Rio: Pedro Bifano, irmão do
deputado João Bifano Magalhães (PMDB-MG), foi designado
diretor da Cemig Overseas ─ estranha subsidiária da
empresa mineira de eletricidade, com sede em Barcelona.
Salário: 35 mil euros, ou seja, R$
147 mil. Mais de cinco vezes o
salário de Dilma. Bifano foi diretor dos
Correios,
demitido por Lula quando presidente. A
Cemig está na área de influência do governador Fernando Pimentel.
Os bons partidos
Corte de despesas? É preciso cortar na carne? Sim ─ mas o corte é na carne, não
na despesa pública com os partidos políticos. Neste ano, foram R$ 608 milhões gastos com o Fundo Partidário
(distribuído entre todos os partidos, tenham ou não votos). No ano que vem, a quantia
chegará pertinho do bilhão.
Com esse dinheiro,
os partidos se dispensam de buscar apoio entre os eleitores: despesas de aluguel,
telefone, aviões, jantares, recepções e pessoal são pagas pelo fundo ─ quer dizer, por
nós. E o dinheiro é farto: em
2014, quando o volume de dinheiro não chegava a um terço disso, o deputado Levy
Fidelix, do PRTB, lamentava-se de ter de manter o partido com R$ 100 mil mensais, que chamava de “merreca”.
Economizar, jamais
Corte de despesas? É preciso cortar na
carne? Mas isso, naturalmente, não vale para todos. Neste ano, até
setembro, a
Câmara dos Deputados gastou R$ 3,6 bilhões ─ ou, fazendo o cálculo individual, sete
milhões de reais por parlamentar. Cada
Excelência gastou por mês algo como R$ 710 mil, para amenizar seus
sacrifícios pessoais ao servir à população que o elegeu. Os cálculos são do
ótimo portal Contas Abertas, que busca a transparência nas contas
públicas. Economia?
Em 2014, neste mesmo período, as
despesas tinham sido de R$ 3,25 bilhões. O aumento foi de pouco mais de 10%. Mas que é um bilhão para quem
tem tantos?
Bons companheiros
Dois adversários de longa data, o bispo Edir Macedo, da Igreja Universal do Reino de
Deus, e o apóstolo Valdemiro Santiago, da Igreja Mundial do Poder
de Deus, fizeram as pazes, ao menos por algum tempo. Ambos
concordam em apoiar o retorno da CPMF, proposta pelo governo, desde que as
igrejas fiquem isentas da cobrança.
A aproximação entre Macedo e Santiago está documentada: há a foto do encontro da
presidente Dilma com o senador Marcelo Crivella, sobrinho do bispo Edir Macedo e dirigente do
PRB, partido ligado à Universal, e o deputado Francisco Floriano, muito ligado ao apóstolo Valdemiro
Santiago.
Publicado
na Coluna de Carlos Brickmann
CARLOS BRICKMANN -
http://www.brickmann.com.br/