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quinta-feira, 9 de julho de 2015

Para juiz da Lava-Jato, críticas a delatores feitas por Dilma ofendem o STF



Sérgio Moro criticou comparação entre 'criminosos colaboradores' e 'traidores da pátria' após entrevista da presidente
O juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, criticou a comparação feita pela presidente Dilma Rousseff aos delatores da Operação Lava-Jato no ofício em que defendeu a prisão preventiva do empresário Marcelo Odebrecht, presidente da Odebrecht. Moro afirmou que são ofensivas ao Supremo Tribunal Federal, que homologou os acordos, comparações entre "prisão cautelar" e "tortura" ou entre "criminosos colaboradores" e "traidores da pátria".

O juiz se manifestou depois que a presidente Dilma Rousseff afirmou não gostar de delatores. No despacho, no entanto, ele não citou a presidente. “Mesmo juízo de inconsistência cabe às equiparações inapropriadas entre "prisão cautelar" e "tortura" ou entre "criminosos colaboradores" e "traidores da pátria". Não há como este Juízo ou qualquer Corte de Justiça considerar argumentos da espécie com seriedade. São eles, aliás, ofensivos ao Egrégio Supremo Tribunal Federal que homologou os principais acordos de colaboração, certificando-se previamente da validade dos pactos e da voluntariedade dos colaboradores”, escreveu Moro.

A presidente falou sobre os delatores durante viagem aos Estados Unidos, ao comentar o depoimento do dono da construtora UTC, Ricardo Pessoa. Em seu depoimento de delação, o empresário listou como beneficiários de recursos de contratos da Petrobras a campanha da presidente Dilma Rousseff em 2014 e a campanha do ex-presidente Lula em 2006. Dilma comparou os delatores a Joaquim Silvério dos Reis: "Tem uma coisa que me acompanhou ao longo da vida. Em Minas, na escola, quando você aprende sobre a Inconfidência Mineira, tem um personagem que a gente não gosta porque as professoras nos ensinam a não gostar dele. Ele se chama Joaquim Silvério dos Reis, o delator. Eu não respeito delator."  Joaquim Silvério dos Reis foi responsável por delatar à Coroa portuguesa a Inconfidência Mineira. Ele obteve perdão de suas dívidas e entregou o nome dos inconfidentes, o que levou à morte Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes.

Em seu pronunciamento, a presidente fez ainda uma comparação com os delatores da ditadura e recorreu à sua experiência durante esse período: "Até porque eu estive presa na ditadura e sei o que é. Tentaram me transformar em uma delatora; a ditadura fazia isso com as pessoas presas. E eu garanto para vocês que eu resisti bravamente, até em alguns momentos fui mal interpretada, quando eu disse que, em tortura, a gente tem de resistir, porque senão você entrega seus presos. Então, não respeito nenhum. Agora, acho que a Justiça de pegar tudo o que ele disse e investigar. Tudo, sem exceção. A Justiça, o Ministério Público e a Polícia Federal."

O juiz também considerou inconsistente as críticas sobre suposto número elevado de criminosos colaboradores. "Na Operação Lava-Jato, não se tem por objeto um crime único, isolado no tempo e espaço, mas, infelizmente, segundo as provas, em cognição sumária, já colhidas, um esquema criminoso prolongado e persistente, ilustrado por prejuízos já reconhecidos pela Petrobras de mais de seis bilhões de reais. Diante da dimensão dos fatos, o número de criminosos colaboradores é, em realidade, pouco expressivo, sendo provavelmente explicado pela crença equivocada na omertà e na impunidade", afirmou.
Ao falar sobre o presidente do Grupo Odebrecht, ele afirmou que não tem dúvidas de que "é pessoa conhecida, poderosa e com amigos poderosos" e ressalta que sua prisão cautelar não tem como objetivo "dar um exemplo" e é baseada em fundamentos legais.

Fonte: O Globo


terça-feira, 30 de junho de 2015

Uma mente confusa



 A presidente Dilma, infelizmente para nós brasileiros e para o país, não tem o dom de organizar seu pensamento. Se fosse apenas uma dificuldade de se expressar, como quando resolveu louvar a mandioca e chamou-a de “grande conquista brasileira”, já seria difícil para uma autoridade que tem obrigação de explicar seus atos a cada instante de seu governo.

Mas quando o pensamento equivocado é também embaralhado, aí já se torna um problema político-institucional. Se a presidente diz que não respeita delatores, ela está partindo do princípio de que o presidente da UTC Ricardo Pessoa, e outros executivos que fizeram suas delações premiadas, estão revelando fatos verdadeiros que deveriam ser escondidos.

Sim, por que só pessoas que estão por dentro das conspirações ou das bandidagens podem delatar seus companheiros em troca de algum benefício da Justiça. Foi, aliás, para evitar que as revelações sobre crimes fossem desqualificadas pelos interessados que o que chamamos popularmente de “delação premiada” tem o nome oficial de “colaboração premiada”.  Mas, de qualquer maneira, a presidente Dilma tratou de jogar sobre Ricardo Pessoa a pecha de traidor, comparando-o a Joaquim Silvério dos Reis, o que a deixa mal e a todos os denunciados pelo empreiteiro. E ela não percebe essa incongruência, o que faz com que prossiga em linha reta para o abismo sem que ninguém possa ajudá-la, já que, sabe-se, ela não admite contestações.  “Eu não respeito delator, até porque estive presa na ditadura militar e sei o que é. Tentaram me transformar numa delatora. A ditadura fazia isso com as pessoas presas, e garanto para vocês que resisti bravamente. Até, em alguns momentos, fui mal interpretada quando disse que, em tortura, a gente tem que resistir, porque se não você entrega seus presos.”

Nessa frase, temos de tudo: uma confusão entre seu papel como guerrilheira, e o dos petistas que se meteram no mensalão e no petrolão; uma ignorância assombrosa da diferença entre democracia e ditadura e, sobretudo, a insensatez de comparar os inconfidentes mineiros com os mensaleiros e petroleiros, que podem ser tudo, menos patriotas heróicos em luta contra uma opressão estrangeira.

Não há Tiradentes nessa história que a presidente Dilma tenta recontar, e nem ela foi uma lutadora pela democracia, como pretende hoje. A tortura de que ela e muitos outros foram vítimas é uma página terrível de nossa história, mas não pode servir de desculpa para justificar meros roubos de uma quadrilha que tomou de assalto o país nos últimos 12 anos, nem para isentar os eventuais desvios cometidos pela presidente.

Ao contrário, aliás, muitos fazem hoje a comparação da sanha arrecadatória do governo federal com os “quintos do inferno” que a colônia portuguesa tirava do Brasil. Quanto à insinuação de que os presos hoje pela Operação Lava-Jato sofrem torturas como no tempo da ditadura, só mesmo a politização da roubalheira justifica tamanho despautério.

A propósito, o jurista Fabio Medina Osório, especialista em questões de combate à corrupção e improbidade administrativa, Doutor em Direito Administrativo pela Universidade Complutense de Madri e Presidente do Instituto Internacional de Estudos de Direito do Estado (IIEDE), “olhando o direito comparado e o que ocorre hoje no mundo em termos de combate à corrupção”, discorda dos que consideram abusivas as prisões preventivas decretadas pelo juiz Sérgio Moro.

“Não apenas nos EUA, mas na Europa, as prisões cautelares têm sido utilizadas no início de processos ou quando investigações assinalam elementos robustos de provas”, ressalta, lembrando os casos do ex-premiê de Portugal, José Sócrates, e os dirigentes da FIFA, presos cautelarmente por corrupção - e alguns em avançada idade - seguem encarcerados.  “A ideia não é humilhar ninguém, mas, diante do poder econômico ou político das pessoas atingidas, estancar o curso de ações delitivas de alto impacto nos direitos humanos, tal como ocorre no combate à corrupção.

Medina Osório lembra que “nos termos da Lei Anticorrupção, as empresas deveriam ter aberto robustas investigações para punir culpados e cooperar com autoridades, talvez até mesmo afastando os executivos citados nas operações, se constatadas provas concretas ou indiciárias de suas participações em atos ilícitos”.

Ao não cooperar nem apurar os atos ilícitos noticiados, “as empresas sinalizam que estão ainda instrumentalizadas por personagens apontados pela Operação Lava Jato como os possíveis responsáveis”.

Para Medina Osório, vale indagar: o que é realmente novo aqui no Brasil? “Prisões democráticas, onde cabem ricos e pobres, convenhamos”.

Fonte: Coluna do Merval Pereira – O Globo