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domingo, 4 de outubro de 2015

Governo teme ação de Cunha para viabilizar impeachment

Governo se arma para conter ação de Cunha pelo impeachment


• Dilma pede a ministros que se preparem para reagir ao presidente da Câmara

Governo teme ação de Cunha para viabilizar impeachment


• Planalto avalia que deputado pode tentar deflagrar processo, mesmo depois de ser alvejado pela Lava Jato

Natuza Nery, Valdo Cruz – Folha de S. Paulo

Horas depois de concluir a reforma de seu ministério, que abriu espaço para o PMDB no governo na esperança de barrar os pedidos de impeachment contra ela, a presidente Dilma Rousseff mandou os auxiliares se prepararem para reagir se o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), se movimentar para deflagrar o processo.

Com a reforma ministerial anunciada sexta (2), Dilma entregou ao PMDB o controle de sete ministérios, incluindo as pastas da Saúde e da Ciência e Tecnologia, que serão dirigidas por deputados do baixo clero, alinhados a Cunha.

Mesmo assim, o governo teme que o presidente da Câmara dê nas próximas semanas os passos necessários para pôr em marcha o impeachment, na tentativa de camuflar o desgaste que ele tem sofrido desde que se tornou alvo da Operação Lava Jato.

A Procuradoria-Geral da República denunciou Cunha ao Supremo Tribunal Federal por suspeita de corrupção, acusando-o de receber US$ 5 milhões em propina de fornecedores da Petrobras. O Supremo ainda não decidiu se aceitará a denúncia e abrirá processo contra o deputado. [denúncia pode ser feita por qualquer um: o que é necessário é que seja aceita e sendo aceita que seja provada.]

Na semana passada, o Ministério Público da Suíça informou que encontrou quatro contas bancárias controladas por Cunha e seus familiares, ampliando as suspeitas sobre ele. O deputado nega possuir contas no exterior. Na avaliação do Palácio do Planalto, as acusações contra Cunha tiram força do movimento pró-impeachment, mas os auxiliares de Dilma apostam que o deputado insistirá em deflagrar o processo, com o objetivo de criar uma cortina de fumaça que o ajude a se defender das denúncias.

Cabe ao presidente da Câmara decidir se um pedido de impeachment deve ou não ser analisado pelos deputados. Cunha recebeu 19 petições desde fevereiro e já engavetou 11 até a semana passada. O principal pedido, formulado pelo jurista Hélio Bicudo, que rompeu com o PT há alguns anos, e pelo ex-ministro da Justiça Miguel Reale Júnior, que trabalhou no governo Fernando Henrique Cardoso, continua em sua mesa.

É possível que Cunha também rejeite esse pedido, numa manobra combinada com a oposição, que em seguida recorreria ao plenário para que a maioria dos deputados desse a palavra final sobre o assunto. Seria possível assim abrir o processo de impeachment e afastar Dilma da Presidência sem vincular Cunha diretamente à iniciativa. Na próxima semana, o TCU (Tribunal de Contas da União) deve rejeitar as contas do governo referentes a 2014, o que pode realimentar a crise, reforçando o discurso dos que defendem o impeachment.

Apesar dos riscos, a presidente chegou ao fim da semana aliviada com o desfecho da reforma ministerial. Em almoço com governadores aliados após o anúncio da nova equipe, ela estava "feliz da vida", segundo um assessor.  Dilma disse acreditar que as mudanças no primeiro escalão e a reaproximação com o PMDB ajudam a atenuar a crise e reduzem os riscos de abertura de um processo de impeachment na Câmara.

A presidente reconheceu, porém, que será necessário trabalhar daqui para a frente para tentar reaver a estabilidade política de maneira mais consistente. A reforma ministerial foi apenas o primeiro passo neste sentido.Dilma pretende participar mais ativamente do trabalho de articulação política, como fez no processo de montagem de nova equipe. A petista assumiu as negociações e conduziu diretamente a maior parte das conversas para escolha dos novos ministros.

A presidente quer manter o grupo do vice-presidente Michel Temer (PMDB) na coordenação política. Sua intenção é que o ministro da Aviação Civil, Eliseu Padilha, aliado do vice, trabalhe com o novo chefe da Casa Civil, Jaques Wagner, e o ministro Ricardo Berzoini, da nova Secretaria de Governo, na definição de estratégias para votações no Congresso Nacional. A presidente acredita ainda que conseguiu reduzir uma de suas fragilidades no Congresso ao abrir canal direto com o líder do PMDB na Câmara, Leonardo Picciani (RJ), o que pode ajudar o Planalto a se contrapor a Cunha. [esse líder do PMDB é do baixo clero e um espirro do Cunha o coloca em órbita ao redor do sol.]

Recomeço
Auxiliares de Dilma dizem que, com o fôlego obtido na reforma ministerial, a presidente teria reunido condições para superar aos poucos a instabilidade política e enfrentar a crise econômica. Neste recomeço, Dilma fez concessões também ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, seu antecessor e padrinho político, algo que tentava evitar desde o início do segundo mandato. A partir de agora, Dilma terá três lulistas ao seu lado dentro do Palácio do Planalto: Wagner, Berzoini e o chefe da Secretaria de Comunicação Social, Edinho Silva.

Ao entregar sete ministérios ao PMDB, a presidente procurou contemplar os principais líderes do partido, distribuindo as pastas a aliados do vice Michel Temer, de Cunha e do presidente do Senado, Renan Calheiros (AL). A sétima ministra peemedebista é a senadora Kátia Abreu, na Agricultura. Recém-chegada ao PMDB, ela é amiga de Dilma e não é considerada pelos peemedebistas uma indicação partidária.

Fonte: UOL/Notícias 
 

quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

Os sem noção



Certos setores da esquerda estão convencidos de que os mais de 54 milhões de brasileiros que reelegeram a presidente Dilma Rousseff são de esquerda, e que a vitória significou uma autorização para aprofundamento de um programa socializante no país, com uma Constituinte convocada por "plebiscito popular" (como se fosse possível outro tipo de plebiscito, palavra originada do latim plebiscitu - decreto da plebe) para realizar uma reforma política, instituição de mecanismos de participação popular - já derrotado no Congresso - e a inevitável "democratização dos meios de comunicação", que nada mais é do que o controle pelo governo dos órgãos independentes de informação.

Por isso, as primeiras nomeações do segundo governo Dilma estão provocando grande decepção e divisões na esquerda, que constatam com pesar que, reeleita, a presidente leu com mais pragmatismo o resultado das urnas e foi buscar nas hostes adversárias o homem adequado para estabilizar a economia que ela conseguiu desestabilizar nos primeiros quatro anos.

A nomeação de Joaquim Levy para a Fazenda está sendo digerida com muito custo, mas as pressões maiores estão voltadas para os novos ministros da Agricultura, Katia Abreu, e para o do Desenvolvimento, Armando Monteiro, dois dirigentes de associações patronais. Politicamente mais frágeis, tornaram-se exemplares de como o ministério tem uma tendência nada revolucionária, que poderia bem ter sido escolhido pelo candidato da oposição Aécio Neves.

A análise está correta, mas a ignorância que essa esquerda demonstra das raízes profundas que ancoram as nomeações mostra que um governo que se guiasse por suas obsessões não teria muito futuro. Foi assim também no primeiro governo Lula, que nomeou Roberto Rodrigues para a Agricultura e Luiz Fernando Furlan para o Desenvolvimento, além de colocar o banqueiro internacional e deputado federal tucano Henrique Meirelles no Banco Central.

Dilma repete a dose, claramente influenciada pela experiência de seu tutor Lula, mas com diferenças contra si importantes. A começar por que quem estava no comando era Lula, a única liderança incontrastável no PT. Quem ousou confrontá-lo, como Cristovão Buarque ou Suplicy, ou saiu do partido ou ficou nele sem importância. Sem falar que os tempos econômicos no mundo são outros, muito adversos.

Na economia, Lula tinha um petista de alta estirpe no comando da equipe, Antonio Palocci, e estava portanto blindada a movimentação conservadora da nova política econômica para colocar as contas nos trilhos. Para melhorar a situação, Palocci convenceu-se mesmo de que o caminho ortodoxo era o único possível para o crescimento do país, depois de longas trocas de ideias com Arminio Fraga, ex-presidente do Banco Central que o PT demonizou na eleição presidencial passada.

Mas foi para Arminio que Joaquim Levy telefonou antes de aceitar a proposta de trabalho petista, pois ele integrou a equipe que preparava o programa econômico para um eventual governo do PSDB. Os economistas que Palocci acolheu em sua equipe foram permanentemente perseguidos por setores petistas que não se conformavam com as novas orientações. Marcos Lisboa, Murilo Portugal, o próprio Levy, só permaneceram no ministério enquanto Palocci lhes dava respaldo. Com sua saída, no segundo governo Lula, abriu-se espaço para que a dupla Dilma Rousseff no Gabinete Civil e Guido Mantega na Fazenda fosse desmontando as conquistas feitas pelos "conservadores", preparando a derrocada que seria o primeiro governo Dilma.

Nem mesmo os fatos negativos produzidos nos últimos quatro anos são suficientes para convencer esses grupos esquerdistas que sua receita de aumento de gastos sem base na arrecadação, gerando déficit primário em vez de superávit; aumento da dívida bruta com a utilização dos bancos públicos como biombos; descontrole da inflação; balança de pagamentos negativa, levou o país a uma situação de descontrole que só mesmo um salto triplo carpado como o dado por Dilma poderia mudar a perspectiva futura do país.

Eles ainda acreditam que os eleitores da classe média emergente e os pobres que recebem o Bolsa Família votaram em Dilma ideologicamente, e não entendem que o que esses eleitores fizeram foi votar a favor do conservadorismo, acreditando erradamente que estavam ajudando a manutenção do emprego e do salário. A permanecer essa disputa ideológica contra a realidade que se impõe, vai ser muito difícil Joaquim Levy levar adiante seu projeto. E o escorpião, fiel à sua natureza, vai ferrar quem poderia levá-lo a atravessar o rio a salvo da correnteza.

Fonte: Merval Pereira