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sexta-feira, 20 de agosto de 2021

O fiasco de Joe Biden - Revista Oeste

Ana Paula Henkel

Talibãs no aeroporto de Kabul ontem, dia 19 | Foto: Shutterstock
Talibãs no aeroporto de Kabul ontem, dia 19 | Foto: Shutterstock

O que isso tem a ver com o tema central desse artigo, o Afeganistão? Tudo. Em 1980, os Estados Unidos lideraram o boicote aos Jogos Olímpicos em Moscou para protestar exatamente contra a invasão soviética do Afeganistão no fim de 1979. No total, 65 nações se recusaram a participar dos Jogos, enquanto 80 países mandaram atletas para competir.

Quando a União Soviética invadiu o Afeganistão, em 27 de dezembro de 1979, a comunidade internacional condenou a ação. Os conselheiros do líder soviético Leonid Brejnev afirmaram que a intervenção seria rápida e incontestável e sugeriram que o presidente dos EUA, Jimmy Carter, estava muito envolvido na crise de reféns em curso no Irã para responder à situação em Cabul (vale a pena assistir ao filme Argo, de 2012). Na realidade, a intervenção soviética no Afeganistão levou a um conflito prolongado na Ásia Central, e Carter reagiu com uma série de medidas destinadas a pressionar os soviéticos a se retirarem. Essas medidas incluíram a ameaça de um embargo aos grãos, a retirada do acordo Salt II e um possível boicote aos Jogos Olímpicos de Verão de 1980, programados para ter sede em Moscou.

Os governos ocidentais consideraram pela primeira vez a ideia de boicotar as Olimpíadas de Moscou em resposta à situação no Afeganistão na reunião de representantes da Otan de 20 de dezembro de 1979 — embora naquela época muitos governos não estivessem interessados ​​na proposta. A ideia ganhou popularidade quando o dissidente russo Andrei Sakharov pediu um boicote no início de 1980. Em 14 de janeiro, a administração Carter juntou-se a Sakharov estabelecendo um prazo no qual a União Soviética deveria se retirar do Afeganistão ou enfrentaria consequências, incluindo um boicote internacional aos Jogos. Quando o prazo expirou, um mês depois, Carter pressionou os aliados dos EUA a retirarem suas equipes olímpicas. Não adiantou. A guerra soviético-afegã continuou até 1989.

Ao longo de sua história, os afegãos passaram por várias invasões estrangeiras, guerra civil, insurgência e um período anterior de opressão do Talibã. Há muitas vertentes para serem exploradas desde o golpe comunista em 1978 até os dias de hoje. Quando o assunto é o Afeganistão, seria impossível falar de todo o contexto geopolítico que envolve o país e a região em apenas um artigo. O que vimos nesta semana, a retirada das tropas norte-americanas do país junto com o colapso do governo afegão e a retomada do poder pelo Talibã, apenas inclui mais um capítulo em décadas de instabilidade e conflitos.

Desde a eleição presidencial nos EUA, em novembro de 2020, muitos analistas e historiadores apontavam para onde a América poderia ir com a eleição de Joe Biden. Não foi diferente aqui em Oeste. Biden na Casa Branca seria um desastre anunciado, como previram diversos artigos aqui publicados. O que seria difícil imaginar é a rapidez com a qual o presidente democrata marcou a maior potência do mundo com um dos maiores fiascos da história. [tem mais: se a vice assumir, seja qual for o motivo,  será a tragédia das tragédias = piorar o 'impiorável']

O presidente que não deu as caras durante a corrida presidencial mais importante do Ocidente, que venceu uma eleição ainda envolta em mistérios, perguntas sem respostas e uma quantidade inacreditável de indícios de fraude, que vem assinando ordens executivas draconianas como nenhuma outra caneta no Salão Oval, que vem encampando uma toada de medidas tirânicas dentro da pandemia que sufocam o bem mais precioso para o americano: a liberdade. Esse homem agora mostra toda a sua incompetência no cenário internacional. O Afeganistão apenas expõe, da maneira mais explícita possível, todas as fraquezas de um presidente.

Meu pai, figura sempre presente na minha vida e agora também em meus artigos, sempre dizia: “Filha, não é apenas o que você fala, mas como você entrega. Não perca um excelente argumento entregando-o de maneira porca”. Poderia ser simplista demais de minha parte trazer um velho conselho para retratar uma questão geopolítica que envolve militares e a maior potência do mundo, mas é exatamente isso. É fato que a grande maioria dos cidadãos americanos não quer mais saber de guerras, há problemas demais para serem resolvidos domesticamente, e a própria administração de Donald Trump já havia anunciado a retirada — de maneira progressiva — das tropas americanas do Afeganistão. O plano, minuciosamente desenhado pelos generais da administração anterior que teve um dos melhores secretários de Defesa dos últimos tempos, Mike Pompeo —, era trazer os soldados para casa e acabar como uma ocupação de 20 anos, iniciada logo após os ataques às Torres Gêmeas, em 11 de setembro de 2001.

A aprovação de Biden derrete diante das terríveis imagens que não param de chegar de Cabul

Como diria o professor Monteiro, não foi o que foi feito, mas como tudo foi feito. Joe Biden, que caminhava a passos largos nas políticas domésticas para se tornar a versão atual de Jimmy Carter, solidificou a teoria nesta semana. Para Biden e sua equipe, as analogias com o presidente Carter e a crise dos reféns iranianos podem ser ainda mais perturbadoras do que os paralelos óbvios com a queda de Saigon, em 1975, na Guerra do Vietnã, que seus assessores estão se esforçando tanto para negar. A história se repete diante de nossos olhos. Biden agora tem a letra escarlate da fraqueza estampada em seu peito. Donald Trump queria sair e negociou um acordo com o Talibã. Fato. Mas Biden é o atual presidente, e o problema não é simplesmente a retirada, mas a maneira incrivelmente ingênua com que a executou. Biden perdeu uma oportunidade política que jamais voltará: usar o 20º aniversário do 11 de setembro para ser retratado como o homem que pôs fim à guerra mais longa da América.

E, como diria Ronald Reagan, fraqueza gera fraqueza. A fraqueza de Jimmy Carter não se limitou aos iranianos que invadiram a embaixada em Teerã e mantiveram reféns americanos presos por mais de 400 dias. Pouco menos de dois meses depois desse episódio, a União Soviética o surpreendeu com a invasão do Afeganistão.

A grande diferença entre Biden e Carter é que o segundo estava no final do mandato e já havia construído sua reputação — a de não ter uma espinha dorsal moldada na coragem. Antes da queda de Cabul, a aprovação de Biden oscilava entre 50% e 54%. Quando ele começou a trilhar o caminho da retirada, apostou que o povo americano, cansado de 20 anos de guerra, não se importaria muito com o que aconteceria depois. E, contrariando um plano bem desenhado e todos os conselhos da Inteligência norte-americana, Biden decidiu sair de “bate-pronto”, cometendo sucessivos erros, como o de retirar tropas antes dos civis. O governo não sabe quantificar quantos americanos ainda estão em solo afegão, mas esse número pode chegar a 30 mil. A aprovação de Biden derrete diante disso e das terríveis imagens que não param de chegar de Cabul. Os americanos não gostam de parecer patéticos diante do mundo, e qualquer repetição das barbaridades que atingiu o povo na última vez em que o Talibã ocupou o poder será usada contra ele.

“Isso claramente não é Saigon”, insistiu o fraco secretário de Estado, Antony Blinken. As palavras dele, que já havia demonstrado fraqueza diante dos chineses, não batem com as de seu chefe. Em 8 de julho, Biden negou qualquer paralelo com o Vietnã e declarou: “Não haverá nenhuma circunstância em que você veja pessoas sendo levantadas do telhado de uma embaixada”. Há relatos de assessores da Casa Branca dizendo que a única ordem inequívoca em meio ao caos desta semana foi direcionar os pilotos de helicóptero dos Estados Unidos que evacuaram a embaixada americana em Cabul para pousar em qualquer lugar, exceto no telhado.

As imagens que continuam chegando do Afeganistão não mostram apenas pessoas desesperadas diante do terrível regime das trevas que as espera. Elas escancaram a incompetência que deixou os americanos — de democratas a republicanos, de Fox News a MSNBC e CNN — estupefatos com tamanha incapacidade de governar. A reação mais comum a esse desastre é semelhante à de Ryan Crocker, embaixador de Barack Obama no Afeganistão: “Fiquei com algumas questões graves em minha mente sobre a capacidade de Joe Biden de liderar nossa nação como comandante-chefe”, afirmou. “Ter entendido tudo isso de maneira tão errada — ou, pior ainda, ter entendido o que provavelmente aconteceria e não se importar.”

A marca do “segundo Saigon” ficará nos livros de história e impregnará o legado de Joe Biden, não há dúvidas quanto a isso. Mas a ideia de que temos outro Jimmy Carter no comando do país pode ser ainda mais assustadora. Especialmente se essa ideia for interpretada por Teerã, Moscou ou Pequim. Há meses temos escrito que Biden representa sangue na água. E os tubarões sabem disso.

Leia também “A fraqueza explícita diante dos adversários”

 Ana Paula Henkel, colunista - Revista Oeste

 

segunda-feira, 15 de maio de 2017

O jardim das aflições



Patrulha de cineastas de esquerda boicota filme “de direita” em festival, em guerra de patotas 

Na primeira noite eles se aproximam e roubam uma flor do nosso jardim. Boicotam um filme no Festival de Cinema de Pernambuco. E não dizemos nada. Na segunda noite, já não se escondem: pisam o cineasta maldito, matam o contraditório, e não dizemos nada. Até que um dia, o mais frágil deles entra sozinho na sala escura, rouba o projetor e, conhecendo nosso medo, arranca-nos a voz da garganta. E já não podemos dizer nada.

É uma paródia do poema “No caminho com Maiakóvski” (1968), de Eduardo Alves da Costa. Ajuda a ilustrar a pataquada de diretores de sete filmes que retiraram seus curtas do festival. Começaria no dia 23 de maio para celebrar 21 anos de vida. O motivo maior do boicote foi um documentário de 81 minutos, O jardim das aflições, sobre o filósofo de direita Olavo de Carvalho. Os revoltados afirmaram, em nota, que a escolha “favorece um discurso partidário alinhado a grupos que compactuaram e financiaram o golpe ao Estado democrático de direito ocorrido no Brasil em 2016”. O festival foi adiado por causa da debandada. A seleção era de nove filmes. Não seria isso o que se chama diversidade?

“Não é possível ter debate, só entre esquerdistas”, me disse o diretor Josias Teófilo. Ele revelou que sua vida ficou “insustentável” em Brasília depois de resolver filmar Olavo de Carvalho. “Grandes festivais disseram que eu não era bem-vindo e que nunca mais eu conseguiria dirigir nada. Esse documentário foi feito com crowdfunding porque seria impossível tentar a Lei Rouanet. Vivemos a tirania da coletividade sobre o indivíduo. Quem está fora desse establishment de esquerda só encontra má vontade no campo do cinema.”

A patrulha, de esquerda ou de direita, não é só burra, primária e insuportável. É perigosa. Favorece o obscurantismo, a ignorância. Na chamada esquerda brasileira, há grupos numerosos, especialmente no PT, que fazem distinção entre “a censura do bem” e a “censura do mal”. “As ditaduras do bem”, como Cuba e Venezuela, e “as do mal”, de direita. É de uma insensatez frenética e fanática a forma como tantos intelectuais relativizam prisões, torturas, arbitrariedades, corrupção, censura, preconceito sexual, força do Estado... desde que o regime seja de esquerda.

Esses cineastas que boicotaram o Festival de Pernambuco conseguem ser piores que Mao e Hitler, que assistiam aos filmes antes de censurar. Leonid Brejnev proibiu um filme de Tarkovski, mas assistiu antes. Esse grupo aí não viu e não gostou”, disse o diretor Josias Teófilo. “O jardim das aflições é muito mais metafísico que político. Fala de Aristóteles e Platão. O documentário traz uma mensagem a favor da individualidade. Discorre sobre a morte. Não tem motivo esse desespero todo. Mandei mensagens simpáticas aos colegas revoltados, agradecendo pela divulgação. Eu não podia pagar assessoria de imprensa.”

Olavo de Carvalho tem 70 anos, vive hoje em Petersburg, uma cidade americana de 30 mil habitantes com 80% deles negros. Dá curso on-line de filosofia para 3 mil alunos. É apontado como um dos mentores do conservador Movimento Brasil Livre (MBL), embora recuse esse título e critique “a direita emergente”. É fervoroso opositor do PT e de Dilma. E crítico do governo Temer, que considera ilegítimo. “Como vice, Temer não tem rabo preso, ele é um rabo preso”, disse ao repórter João Fellet, da BBC Brasil, em sua casa.

Militou no Partido Comunista durante a ditadura, foi amigo de José Dirceu, escondeu armas. Já se envolveu com esoterismo e astrologia. Mas se aproximou da Igreja Católica. Hoje, reza antes de dormir. Mantém uma espingarda sobre a cama para defesa pessoal e tem 30 rifles de caça. Olavo de Carvalho é um provocador, um polemista, a favor da “democracia plebiscitária”.

Uma das diretoras que se retiraram da mostra em Pernambuco, Gabi Saegesser, do curta Iluminadas, disse que “O jardim das aflições vai contra qualquer possibilidade de diálogo”, ao falar sobre “um dos maiores representantes do conservadorismo de direita”. Para a cineasta, a presença do título na programação “é como se o festival desrespeitasse a visão política e social de outros filmes”. Não é só Olavo o alvo do boicote. Há outro filme, o longa de Rodrigo Bittencourt sobre as origens do Plano Real. Entre os diretores rebelados, estão Savio Leite, Cíntia Domit Bittar, Eva Randolph, Leo Tabosa.

Na arte, como na política e na vida, o Brasil passa por um momento delicado de torcidas e patotas que urram a favor e contra, distorcem a realidade e tentam calar o outro com discurso de ódio ou de vitimização. Tapar os ouvidos e os olhos a quem discorda de você é um atestado de fraqueza e autoritarismo. Você pode ou não acreditar que Lula não tem nenhuma influência sobre o PT. A cabeça é sua ainda. A aflição também.

 Fonte: Ruth de Aquino - Revista Época