Há
poucos dias fiz aniversário.
Embora costume brincar sobre o tema da
minha idade dizendo que tenho 79 anos, mas "de banho tomado fico como
novo", o fato é que algumas coisas mudaram na percepção que tenho da
minha realidade existencial. Assim: quando eu era jovem, o futuro ficava
num horizonte móvel. Ele se ampliava e se distanciava a cada passo
dado. Agora, eu o percebo fixo.
A distância entre mim e ele encurta a
cada velinha soprada.
Um dos
fascínios da vida, aqui de onde eu a vejo, é a possibilidade de ouvir o
que os jovens falam e o que alguns dizem aos jovens.
Nessa tarefa
instigante de ouvir, comparar e meditar, volta e meia me deparo com a
afirmação de que os anos 60 e 70 produziram uma geração de jovens
alienados.
Milhões de brasileiros teriam sido ideologicamente castrados
em virtude das restrições impostas pelos governos militares que regeram o
Brasil naquele período. Opa, senhores! Estão falando da minha geração.
Esse período eu vivi e as coisas não se passaram deste modo.
Bem ao
contrário. Mesmo num contexto pouco propício, nós, os jovens daquelas
duas décadas, éramos politizados dos sapatos às abundantes melenas.
Ou
se defendia o comunismo ou se era contra o comunismo. Os muitos centros
de representação de alunos eram disputados palmo a palmo. Alienados,
nós? A alienação sequer era tolerada na minha geração!
Havia passeata
por qualquer coisa, em protesto por tudo e por nada.
Certa ocasião
participei de um protesto contra o preço de feijão e durante alguns dias
usei um grão desse cereal preso à lapela.
Surgiu,
inclusive, uma figura estapafúrdia - a greve de apoio, a greve a favor.
É, sim senhor.
Os estudantes brasileiros dos anos 70 entravam em greve
por motivos que iam da Guerra do Vietnã à solidariedade às
reivindicações de trabalhadores.
Havia movimentos políticos organizados e
eles polarizavam as disputas pelo comando da representação estudantil.
O Colégio
Júlio de Castilhos foi uma usina onde se forjaram importantes lideranças
do Rio Grande do Sul.
As assembleias estudantis e os concursos de
declamação e de retórica preparavam a moçada para as artes e manhas do
debate político.
Na universidade, posteriormente, ampliava-se o vigor
das atuações.
O que hoje seria impensável - uma corrida de jovens às
bancas para comprar jornal -, era o que acontecia a cada edição semanal
de O Pasquim, jornal de oposição ao regime, que passava de mão em mão
até ficar imprestável.
Agora, vamos
falar de alienação. Compare o que descrevi acima com o que observa na
atenção dos jovens de hoje às muitas pautas da política, da economia e
da sociedade.
Hum? E olhe que não estou falando de participação. Estou
falando apenas de atenção, tentativa de compreensão.
Nada! As disputas
pelo comando dos diretórios e centros acadêmicos, numa demonstração de
absoluto desinteresse, mobilizam parcela ínfima dos alunos.
Claro que há
exceções nesse cenário de robotização. Mas o contraste que proporcionam
permite ver o quanto é extensa a alienação política da nossa juventude
num período em que as franquias democráticas vão ficando indisponíveis à
dimensão cívica dos indivíduos.
Em meio às
intoleráveis dificuldades impostas à liberdade de expressão nos anos 60 e
70, a juventude daquela época viveu um engajamento que hoje não se
observa em quaisquer faixas etárias.
Nada representa melhor a apatia
política da juventude brasileira na Era Lula do que os fones de ouvido.
Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org),
colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas
contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A
Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia
Rio-Grandense de Letras.