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quarta-feira, 8 de fevereiro de 2023

O navio fantasma - Percival Puggina

Passei quatro anos apontando a coesão da velha imprensa na oposição ao governo Bolsonaro
Durante todo o período, de modo ininterrupto, essa mídia, o STF e o TSE protagonizaram a oposição. 
Sempre vi nisso um descomunal favorecimento a quem chegasse contra o governo na eleição presidencial. 
Em 15 de abril de 2021, por 8 votos a 3, o Supremo proporcionou a zebra e – surpresa! – em outubro, deu Lula.
 
Transcorrido apenas um mês de governo, o que assistimos é um cavalo-de-pau e a volta ao passado.  
Quem falar pelo governo – seja Lula, qualquer de seus ministros ou parlamentar, personagens do segundo escalão ou dirigentes do partido gasta mais tempo atacando o governo que saiu do que promovendo o governo que entrou. 
No petismo isso é genético. Por definição, seu adversário não presta, tem que ser permanentemente atacado e ter sua reputação assassinada a sangue frio. Contudo, sublinhe-se a bem da inverdade: o PT é contra discurso de ódio e seus sucessos são vitórias do amor... Lula, Lula! De algum lugar Deus está te vendo.
 
Quando falam sobre temas de gestão, trabalhos de casa, tarefas a cumprir, daquilo, enfim, para o que são pagos, a situação fica ainda pior. As manifestações soam como estertores do passado: controle social da mídia, desarmamento, favorecimento do aborto, revogação da Lei do Teto de Gastos e ruptura com princípios básicos da estabilidade monetária, volta dos lesivos e escandalosos empréstimos internacionais pelo BNDES. Chegou? Não, tem mais.  
Fim da autonomia do Banco Central, guerra às privatizações, revogação dos preceitos da Lei das Estatais que impedem seu aproveitamento para fins políticos e partidários (o que barrou a corrupção e representou o retorno à lucratividade dessas instituições). 
E por aí vai o navio fantasma que, como um zumbi, emergiu de funduras abissais e estacionou, tenebroso, na Praça dos Três Poderes.
 
A mídia, mesmo a ativista, não está tão comprometida com a sandice como para passar recibo a esse futuro totalmente comprometido com o pretérito.  Pudera! 
Mesmo quem viaja nas cabines de luxo sabe que vai beber água salgada se o navio bater num iceberg ou nos rochedos de um arquipélago tropical. Então, em meio à intensa replicação das narrativas, começam as críticas feitas como se quem critica não tivesse qualquer responsabilidade com a escolha do comandante Lula para jogar o Brasil contra os rochedos, como o comandante Schettino fez com o navio de cruzeiro Costa Concórdia.

Percival Puggina (78), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.


sexta-feira, 15 de julho de 2022

Se eleito, Lula vai censurar a imprensa e desde já mostra como - Gazeta do Povo

J.R. Guzzo

De tudo o que Lula promete que vai fazer de ruim para o Brasil e para os brasileiros, caso seja eleito para a presidência da República na próxima eleição, nada está tão claro, desde hoje, como a censura à imprensa.  
Lula faz questão de dizer isso em público; na verdade, garante que a guerra oficial contra a liberdade de expressão será uma das “prioridades” do seu governo. Ele e o PT não dizem que querem a censura, é claro falam em “controle social da mídia”, mas é exatamente a mesma coisa, em termos práticos. Trata-se aí, unicamente, de impedir a circulação de notícias, de opiniões ou de qualquer coisa que o governo não queira que se publique. Fazer isso é censurar


                          Foto: EFE/Joédson Alves

Na verdade, a esquerda organizada em torno do ex-presidente já está dando uma prévia de como seu governo vai agir nessa área. Um grupo que se apresenta como “movimento dos sem-teto”, em São Paulo, fez um comício de protesto nas portas da rádio Jovem Pan; 
não admitem que a emissora, onde Lula é abertamente criticado, diga as coisas que está dizendo. 
Inventaram que estavam protestando contra o “machismo” do noticiário da Jovem Pan - por conta da cobertura sobre um episódio de estupro. Conversa. O que eles, a esquerda em geral e o PT não toleram na Jovem Pan é a sua postura de independência
Ao contrário do que faz quase toda a mídia brasileira, Lula é tratado ali não como o santo que vai “salvar o Brasil”, mas como quem ele realmente é: um condenado na justiça pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro, em três instâncias e por nove juízes diferentes.

Ele e o PT não dizem que querem a censura, é claro – falam em “controle social da mídia”, mas é exatamente a mesma coisa, em termos práticos

Lula quer proibir que se diga isso; quer proibir, na verdade, que se diga um monte de coisas, do passado e do presente. 
Hoje ele manda militantes profissionais às portas dos veículos de comunicação, tentando calar a voz de quem discorda do PT e dele mesmo. Amanhã, vai usar o “controle social da mídia” e a força do governo para fazer isso
 
Vai ter o apoio do Supremo Tribunal Federal, das elites e da maioria dos próprios jornalistas e donos dos órgãos de imprensa – que no Brasil, por razões ideológicas e de outras naturezas, são contra a liberdade de expressão, em vez de serem a favor. Vão receber de Lula, com certeza, a censura que estão pedindo.
 
J. R. Guzzo, colunista - Gazeta do Povo - VOZES
 
 

sábado, 9 de julho de 2022

A imprensa é contra a liberdade - Revista Oeste

J. R. Guzzo

O governo de Jair Bolsonaro gastou R$ 258 milhões com publicidade. Lula, em seus oito anos na Presidência, gastou R$ 7,7 bilhões 

Quem é contra a liberdade de expressão no Brasil? O primeiro nome que vem à cabeça é: “O Supremo”. O segundo é: “Lula”. 
Vai se amontoando, aí, uma porção de gente. A esquerda nacional, é claro, vem na frente do bloco, acompanhada dos professores universitários, dos políticos ladrões e dos empresários inclusivos. 
Podem ser acrescentados os artistas de novela, a Ordem dos Advogados e mais ou menos tudo o que se tem em matéria de “entidades da sociedade civil” associações em favor dos direitos humanos, por exemplo, bispos católicos, “estudantes”, sindicatos, ONGs de todos os propósitos, e por aí afora. 
O que não se diz, nunca, é que entre os maiores inimigos da expressão livre neste país, hoje em dia, estão os jornalistas e os donos dos veículos de comunicação. Parece esquisito, e é esquisito mesmo. Também é a verdade.

Foto: Montagem Revista Oeste | Shutterstock
Foto: Montagem Revista Oeste | Shutterstock 
 
Naturalmente, com exceção de Lula, todos os citados acima acreditam, ou dizem, que não são contra a liberdade de imprensa, de jeito nenhum. 
O STF, para começar, acha que não é, embora censure as redes sociais, congele no banco o dinheiro dos comunicadores de direita e exija a extradição, depois de sua prisão pela Interpol, de um jornalista que teve de exilar-se nos Estados Unidos para não ser enfiado na cadeia. 
Boa parte dos demais ficaria igualmente horrorizada se alguém lhes dissesse que são a favor da repressão ao direito de palavra — apesar de estarem fechados com Lula, e de Lula dizer que o “controle social da mídia”, incluindo a televisão, é uma das “prioridades” do seu governo. 
Do ponto de vista da lógica, não dá para fazer as duas coisas ao mesmo tempo: votar em Lula e ser a favor da imprensa livre.  
Mas todo mundo nesse bonde está convencido de que a prioridade absoluta do país é “acabar com o fascismo”, a “ditadura” e o negacionismo; por conta disso, acham natural, ou até uma boa ideia, colocar na Presidência da República um político condenado por corrupção e lavagem de dinheiro, em três instâncias e por nove juízes diferentes. Mais complicado é o caso dos jornalistas e dos seus patrões.
 
Como um cidadão que exerce o ofício de comunicador, no qual a liberdade de expressão é essencial para as coisas terem um mínimo de cabimento, pode ficar contra os seus próprios direitos?  
E os proprietários das empresas, então? 
Também para eles a palavra livre é indispensável — ou pelo menos era, até não muito tempo atrás. Mas as coisas mudaram. 
Hoje o que está em jogo, mais que qualquer princípio, é algo muito simples, e vital para veículos e jornalistas: o dinheiro. É isso o que estão querendo — liberdade de expressão, para a maior parte deles, não resolve nada, e não enche a barriga de ninguém.  
Na verdade, hoje em dia, só atrapalha. Tornou-se sinônimo de “internet” e “redes sociais”, onde de uns anos para cá todos ganharam o direito de se manifestar, como quiserem e quando quiserem — e, com isso, levaram a imprensa em geral para a pior crise de sua história moderna.  
 
Os veículos perderam público, publicidade e receitas. Os jornalistas perderam empregos, salários e segurança.  
A saída, para ambos, não é recuperar leitores, ouvintes e telespectadores. É receber dinheiro do governo, em forma de propaganda paga. 
Não há isso hoje. Para haver de novo, é preciso que o atual governo vá embora; quanto mais tempo ele dura, menos dinheiro entra. 
Para o seu lugar, tem de vir gente que volte a gastar dinheiro do Tesouro Nacional com publicidade. E se essa gente quer acabar com a livre manifestação, paciência.

Chega a ser cômico, até — como na extravagante indignação dos jornalistas contra o recente projeto de ajuda financeira aos motoristas de caminhão

Os números a respeito são muito claros e muito incômodos. O governo de Jair Bolsonaro gastou, ao longo de seus três anos e meio, R$ 258 milhões com publicidade. Parece muito dinheiro; com certeza não é pouco. Mas espere três segundos até ver como eram as coisas nessa área antes da administração atual. Lula, em seus oito anos na Presidência, gastou R$ 7,7 bilhões, em dinheiro do pagador de impostos, para a imprensa publicar propaganda oficial.  
Isso é, simplesmente, 30 vezes mais do que a despesa de Bolsonaro. Dilma, em quatro anos, gastou R$ 9 bilhões — e aí já são 35 vezes mais. (As informações são de O Estado de S. Paulo e de UOL Notícias. Foram reapresentadas há pouco pela jornalista Carla Cecato, da JovemPan News.) Talvez seja útil pensar um pouco nesses números. 
 
No seu caso concreto, por exemplo: se você ganha R$ 15.000 por mês, como salário ou fruto da sua atividade, as 30 vezes a mais de Lula seriam R$ 450.000 mensais no bolso. As 35 vezes de Dilma dariam R$ 525.000, entra mês, sai mês. Que tal? Nem todos ficariam indiferentes a esse tipo de dinheiro. Conclusão lógica: é preciso acreditar num desprendimento de São Francisco de Assis, por parte dos proprietários de veículos, para achar que eles não perceberam a diferença, ou que não se importam com ela. Onde foram parar os quase R$ 17 bilhões que Lula e Dilma deram para a mídia? Não estão, com certeza, na conta-corrente dos órgãos de imprensa — e nem serviram para pagar salário de jornalista.

OESTE nunca tem problemas em falar livremente dessas coisas porque nunca aceitou, e continua não aceitando, um único real em publicidade de governo — governo federal, empresas estatais, governos de Estado, prefeituras, como propaganda ou como divulgações de “interesse público”.  
Faz isso porque sabe perfeitamente bem que, quando um órgão de imprensa aceita dinheiro oficial, dali a cinco minutos o governo vem se sentar à sua mesa. É a vida; não há como ser diferente
E a seca de verbas oficiais, a maior jamais registrada na história da imprensa brasileira: seria a prova de que a mídia acumulou esse oceano de ódio ao governo Bolsonaro porque parou de ver dinheiro do Erário público? Não, prova não é — prova, aí, só com confissão por escrito, como os empreiteiros de obras faziam nos tempos da Lava Jato. 
 
Não vai rolar, não é mesmo? Mas, com as coisas que publica diariamente em seu noticiário, a mídia brasileira parece fazer o máximo possível de esforço para dar a impressão de que é disso, precisamente, que se trata. Chega a ser cômico, até — como na extravagante indignação dos jornalistas contra o recente projeto de ajuda financeira aos motoristas de caminhão, como compensação parcial pela alta dos combustíveis. 
E então: dinheiro para caminhoneiro não pode, por ser “antidemocrático” e aumentar as despesas do governo, mas verba de publicidade para a imprensa pode? Essa preocupação extremada com a democracia e o equilíbrio nas contas públicas estava ausente dos veículos quando Dilma dizia, sem ouvir nenhuma objeção, que iria “fazer o diabo” para se reeleger. É isso, a mídia brasileira de hoje. Fica tudo muito na cara.

Os veículos de comunicação deixaram de ser um sistema independente de informação ao público

A liquidação da liberdade de expressão, por parte dos jornalistas, tem uma agravante, que vai além das questões financeiras: eles são contra essa liberdade, para efeitos práticos e por convicção ideológica. A grande maioria dos comunicadores brasileiros é de esquerda, ou acha que é — e um dos princípios mais rigorosos, e mais duradouros, de qualquer regime político socialista é a intolerância absoluta ao direito à liberdade de manifestação e de pensamento.  

Não é muito complicado: simplesmente não há, e nunca houve na história humana, da Rússia comunista a Cuba, Venezuela e similares, dez minutos de liberdade de imprensa num governo esquerdista. 
É contra a natureza do “socialismo”, assim como é contra o “socialismo” a ideia de democracia em si mesma — e os jornalistas deste país têm fé no “socialismo”, e não no direito de livre expressão. 
É por esse motivo, justamente, que são a favor do plano de “controle social” da mídia ou de censura, quando se vai à realidade dos fatos — que Lula e o PT querem impor ao Brasil. Esse “controle” acaba com a liberdade de imprensa na vida real — mas os jornalistas querem mesmo que ela acabe. 
Estão convencidos, cada vez mais, que a livre manifestação é um pecado mortal, que favorece a “direita”, o “autoritarismo” e os propósitos “antidemocráticos”. Para isso, estão numa guerra diária, intransigente e sem trégua contra os fatos. Não há volta nessa viagem.

Além do dinheiro do governo que não está vindo mais, nada poderia mostrar tão bem a aliança de jornalistas e donos de veículos contra a liberdade de expressão, ou o seu reduzido apreço por ela, quanto esse “consórcio” que formaram com tanto entusiasmo — um instrumento para darem todos a mesma notícia, ou o mesmo tom ao noticiário de todos os dias. 

O “consórcio” é uma negação grosseira da necessidade de haver concorrência entre os veículos, e conteúdos diferentes em cada um, para haver imprensa livre — não há liberdade verdadeira, na prática, se não for assim. 

Imprensa com um veículo só, como o Pravda da Rússia ou o Granma de Cuba, é imprensa de ditadura. O “consórcio de veículos” é o maior esforço já feito até hoje pelos órgãos de comunicação brasileiros para se conseguir uma situação desta natureza.  
Eles deixaram de ser um sistema independente de informação ao público. São hoje, pela ação das redações e pela falta de princípios, de talento e de energia por parte dos donos, mais um partido político.

Leia também “Eles não querem cumprir a lei”

J. R. Guzzo, colunista - Revista Oeste


sexta-feira, 3 de setembro de 2021

Lula e a censura anunciada - Revista Oeste

J. R. Guzzo

Não vai haver golpe militar nenhum. Vai haver um regime totalitário se Lula voltar ao governo. O resto é fumaça para esconder a verdade

Está sendo executada neste momento no Brasil a manobra mais velha e possivelmente mais sórdida que existe na história da bandidagem política mundial acusar o inimigo de estar fazendo exatamente aquilo que você vai fazer de pior, assim que tiver a oportunidade de mandar no governo. 
 
O truque de hoje é a operação que anuncia todos os dias na mídia, na discussão política e na máquina pública, para não falar nos representantes da “sociedade civil”, ameaças terminais à democracia por parte “do governo”, “dos militares”, “do Bolsonaro” e por aí afora. É mentira em estado puro. A ameaça real e objetiva, que existe no mundo dos fatos e não na gritaria, é o ex-presidente Lula, agora candidato de novo à Presidência da República. É a vigarice de sempre: enquanto se fala do perigo falso, vai se montando peça por peça o perigo de verdade. Não vai haver golpe militar nenhum. Vai haver um regime totalitário se Lula voltar ao governo. O resto é fumaça para esconder a verdade.
 
Não se trata, aí, de um ponto de vista. É a simples exposição de fatos que estão ocorrendo aos olhos de todos: Lula é a única ameaça que existe no momento contra a democracia brasileira porque ele mesmo, Lula, e o seu entorno mais ativo anunciam abertamente projetos de destruir essa democracia se ele for eleito em 2022.  
O maior desses projetos, pelo que estão dizendo agora Lula e o PT, é liquidar a liberdade de imprensa no Brasil. Não falam assim, é óbvio; ninguém fala assim, nem na Coreia do Norte. Embrulham o seu propósito numa trapaça: a de que querem “melhorar” a qualidade da imprensa, ou torná-la mais “verdadeira”, mais “justa”, mais isso, mais aquilo, com novas regras para o seu funcionamento. Sai a liberdade de pensamento assegurada no Artigo 5 da Constituição do Brasil. 
Entra em seu lugar o “controle social da mídia”, como diz Lula. 
É um pacote de regras que tem um objetivo claro e um efeito inevitável: 
colocar a imprensa brasileira, na vida real, debaixo do comando do governo e dos “movimentos sociais” controlados por ele.

Controle social é isso: censura. Não é outra coisa, e nem pode ser, porque não existe na história humana, desde que Gutenberg inventou a máquina de imprimir 500 e tantos anos atrás, nenhum episódio nenhum mesmo em que um governo tenha feito leis sobre a imprensa sem reduzir, prejudicar ou acabar com a liberdade da imprensa. Não há como ser de outro jeito. Se o Estado dá a si próprio o direito de decidir o que o público pode ou não pode ler, ver e ouvir, vai acabar havendo censura. 

Como seria possível não haver? A partir do minuto em que uma comissão qualquer, criada pelo governo, ganha o poder de vetar esta ou aquela palavra em nome do “bem comum” — palavra, frase, assunto —, esse governo passa, queira ou não queira, a praticar censura. Os mecanismos de “controle social da mídia” propostos por Lula irão, em algum momento da sua existência, ampliar o que a imprensa pode dizer sobre isso ou aquilo? É claro que não. Só vão reduzir, é óbvio — cortar, diminuir, proibir. Com Lula, a publicação de conteúdo editorial no Brasil vai depender de licença. Quem dá a licença manda. Quem pede a licença obedece. Fim de conversa. A vida é isso, sempre.

Tudo o que o comissariado da comunicação social não aprovar será considerado “notícia falsa”.

A volta de Lula à Presidência não é apenas a volta das empreiteiras de obras públicas ao governo. 
Não é só o reinício dos assaltos aos fundos de pensão, nem o retorno triunfal dos ladrões da Petrobras, da Eletrobras, da Nuclebras e de todas as “bras” que são a paixão do ex-presidente. 
Não é só o regresso dos banqueiros tão estressados com a abstinência de poder que foram capazes, imaginem só uma coisa dessas, de pensar em aderir a um manifesto com críticas à política econômica do governo. (Depois recuaram, é claro.)  
Não é só a volta de Sérgio Cabral, condenado a 390 anos de cadeia por corrupção (Lula disse que votar em Cabral era um “dever político e moral”), dos que roubaram tanto que se ofereceram para devolver parte do que roubaram e dos vendedores de sondas para a extração de petróleo.  
Não é apenas a retomada das atividades dos “Ronaldinhos do mundo de negócios”, como Lula chama a um dos seus filhos. É tudo isso, sim — mas é principalmente a pior ameaça às liberdades públicas e privadas que o Brasil já conheceu depois de 1964.
A primeira delas é a liberdade de expressão. Lula, em suas declarações mais recentes, tem dito que o erro mais grave dos governos do PT, o seu e o de Dilma, foi não ter conseguido criar o “controle social dos meios de comunicação” no Brasil. Afirmou, a propósito, que se tivesse de fazer uma “autocrítica”, seria esse o seu arrependimento: deixou a imprensa livre. (É ele mesmo, Lula, quem está dizendo isso. Não é nenhum adversário político.) Liberdade de expressão, para o ex-presidente, é uma coisa errada. Seu mundo mental predileto é o da censura. 
 
E o que pode ser, na prática, a censura de Lula? É o tal “controle social” dos meios de comunicação — um sistema no qual, simplesmente, é proibido publicar o que o governo não quer que seja publicado. Ou o governo, diretamente, através dos seus Ministérios das Comunicações, secretarias de imprensa, comissariados e outros bichos, ou um “conselho” qualquer com “representantes da sociedade”uma aglomeração de OAB, CNBB, MST, CUT, UNE, procuradores, professores, mulheres”, “negros”, “índios” e o que mais você possa imaginar.

“Controle social da mídia” é isso — os membros de um organismo que está fora dos meios de comunicação passam a aprovar ou vetar qualquer coisa que a imprensa queira divulgar para o público. É simples. O que eles aprovam sai publicado. O que eles vetam não sai. Mais: esses órgãos de “controle” podem punir, com cassação de licenças, multas para veículos, penas para jornalistas e outras aberrações, quem não se enquadrar nas regras impostas pelo governo. Sua ferramenta de repressão preferida, pelo que tem sido dito até agora, será o “discurso do ódio”, uma criação multiuso da esquerda mundial. No caso, quando o governo estiver sendo criticado e não goste da crítica, os órgãos de controle dirão que ele está sendo vítima de “discurso do ódio”. Pronto: fica proibido publicar o que o governo não gosta
Outro pé de cabra da censura serão as utilíssimas fake news, ou “notícias falsas”. Tudo o que o comissariado da comunicação social não aprovar será considerado “notícia falsa”. Pronto: a notícia não sai. Se é falsa não pode sair, não é mesmo?

Numa e na outra circunstância, o governo dirá que está servindo ao bem comum, que precisa ficar acima da liberdade individual — com isso, vai salvar o povo brasileiro de ouvir palavras de ódio ou notícias falsas. Hoje as “agências de verificação” decidem o que é e o que não é fake news. No novo sistema, o órgão de “controle social” tomará a decisão — ou, então, as tais “agências” poderão ser terceirizadas para executar esse serviço (desde que declarem “notícia falsa” o que o governo quer que seja notícia falsa.) Está na cara o mundo de possibilidades de censura que esses truques irão permitir a quem manda na máquina do Estado. 

Imagine-se, por meio minuto, o que o atual governo poderia fazer se estivesse em vigor o sistema que Lula quer impor ao Brasil se for eleito. 
Nenhum governo brasileiro desde 1500 levou tanta pancada da imprensa quanto o de Jair Bolsonaro. 
Foi chamado de desordeiro, de psicopata e de genocida; não foi chamado de ladrão, mas no resto foi excomungado em tudo. 
Chegaram, inclusive, a desejar que o presidente morresse quando ficou doente, em letra de fôrma e impressa no papel. 
Se isso não é manifestação de ódio, o que seria? 
Os órgãos de imprensa ou jornalistas não sofreram absolutamente nenhuma punição por isso, nem foram incomodados de qualquer modo que fosse. Pelo sistema que Lula quer criar, nem um centésimo de nada disso poderia ser publicado.

O que Lula quer é isso: uma imprensa venezuelana no Brasil.

Lula, nas suas últimas aulas sobre como deve ser o Brasil daqui para a frente, achou que deveria falar da imprensa em Cuba ou na China para explicar o que pretende fazer com a imprensa do seu próprio país. Avisou, a respeito, que não vai fazer no Brasil a “regulamentação” que existe na China e em Cuba — ele chama assim, de “regulamentação”, duas das mais ferozes máquinas de censura hoje em operação no mundo. Que sorte a nossa, não é mesmo? 
Lula diz que não quer submeter o Brasil a uma situação de liberdade zero, como na China e em Cuba. O que quer, então? 
Ele veio, no começo, com uma história de fazer aqui como se faz na imprensa “inglesa” ou na imprensa “alemã”. Que diabo quer dizer uma coisa ou outra?  Desde quando Lula entende disso? 
Ele nunca leu um jornal alemão na vida, nem inglês; não sabe, simplesmente, o que está falando. Sua intenção real ficou clara, logo em seguida, quando dissertou sobre a situação da mídia na Venezuela — aí si, coisa que ele conhece e da qual gosta. 
O que Lula quer é isso: uma imprensa venezuelana no Brasil. Pode não ser a China ou Cuba, mas dá quase na mesma.

Na Venezuela, não há liberdade de imprensa praticamente nenhuma — os veículos de comunicação livres foram liquidados pelo governo durante as ditaduras dos presidentes Hugo Chávez, primeiro, e Nicolás Maduro, agora. (Sobra um jornal, El Nacional, no momento sob investigação por “questionar as autoridades”.) Foi uma necessidade, segundo Lula, pois a mídia queria acabar com o governo. “Eu vi como a mídia destruía o Chávez”, disse Lula. É o exato contrário da verdade, como é comum acontecer em tantas coisas que o ex-presidente diz em público. Por força, uma depois da outra, da Ley Organica, da Ley de Responsabilidad e da Ley del Odio y por la Tolerancia impostas aos meios de comunicação, e depois estendidas às redes sociais, quem foi destruída na Venezuela foi a imprensa livre. Ao longo dos anos, esses mecanismos de “controle social” dos meios de comunicação obrigaram os veículos a publicar notícias enviadas pelo governo, fecharam empresas de mídia por “questionar a autoridade legitimamente constituída” e cassaram licenças de funcionamento de emissoras de rádio e televisão. 

O resultado concreto disso tudo é que ao longo desses anos de ditadura, de 2004 para cá, o governo mandou encerrar as atividades dos seis maiores canais de televisão da Venezuela, três quartos dos jornais foram fechados e 40 emissoras de rádio tiveram suas licenças cassadas por “irregularidades”. A Ley del Odio, particularmente, prevê punições de até 20 anos de cadeiacabendo ao governo, é claro, o poder e definir quem pratica o “ódio”. Em geral, “odiar” é falar mal dos governantes, sobretudo nas redes sociais.

Os planos de Lula para a imprensa são apoiados com entusiasmo pela maioria dos jornalistas brasileiros e tratados com timidez, reverência ou silêncio pelos proprietários dos veículos de comunicação. Faz sentido. Os jornalistas são a favor do “controle social” da mídia, até porque quase nada do que dizem hoje desagradaria aos futuros censores; além do mais, acham que o “bem comum”, ou a “sociedade”, precisa de uma imprensa submetida ao controle do governo. Na sua opinião, é melhor que seja assim. Acreditam que a liberdade de expressão não pode ser “absoluta” — o Artigo 5 da Constituição deve ficar abaixo do “interesse maior” que é, no seu entender, “a democracia”. 
 
A liberdade de expressão está longe de ser absoluta no Brasil; 
todo cidadão ou veículo de comunicação são 100% responsáveis pelo que afirmam, e estão devidamente sujeitos a processos penais ou ações cíveis por tudo o que escrevem, dizem ou mostram. 
Mas realidades como essa foram suprimidas do debate. 
Num país em que um deputado federal em pleno exercício de seu mandato está preso por delito de opinião, contra o que estabelece de maneira indiscutível a Constituição, a liberdade de imprensa passou a ser artigo barato.

Não poderia haver estímulo melhor para Lula e para as suas ideias do que deve ser a comunicação social neste país.

Leia também “Manual prático do golpe”

J. R. Guzzo, colunista -  Revista Oeste

 

quinta-feira, 20 de maio de 2021

A polícia da informação - Revista Oeste

Augusto Nunes e Branca Nunes

 Filha da censura e irmã do controle social da mídia, a agência de checagem tenta impor o pensamento único

Sepultada em 1976 pela revogação do Ato Institucional nº 5, a velha censura tentou sair da tumba com um nome espertamente rejuvenescido: controle social da mídia. Desmoralizada pela suspeita de que as redações seriam comandadas por bandos de franklinsmartins, e infestadas por jornalistas que odeiam a liberdade de expressão dos outros, foi enterrada como indigente. Em 2015, começou a escapar da cova rasa com um codinome que soa inofensivo: agência de checagem. Desta vez, os disfarces são menos mambembes, a metodologia é mais sutil. Mas rugas inconfundíveis escancaram a alma liberticida. Podem chamá-la de censura que ela atende.

Entre 1968 e 1976, a teimosa inimiga da liberdade de informação não ocultava a identidade e agia em forma de gente. Instalados nas redações de jornais e revistas, os censores liam todos os textos prontos para publicação armados de um lápis de cor. O X em vermelho berrante interditava páginas datilografadas que lhes parecessem desfavoráveis ao governo, e também trechos que aquele leitor onipotente considerasse misterioso demais. Na dúvida, invertiam o antiquíssimo preceito jurídico — e decidiam contra o réu. Algumas publicações trocavam o texto, outras preenchiam o espaço desocupado com versos dos Lusíadas ou receitas de bolo. Com o tempo, alguns censores agiam com o desembaraço de quem se sente em casa.

O responsável pela coleção de XXXXXXX que desfigurou centenas de páginas da revista Veja ficou tão à vontade que solicitou a inclusão da sala que ocupava nas escalas feitas pelo moço do cafezinho. A reivindicação foi encaminhada ao destinatário errado. Depois de ouvi-la, o diretor responsável Edgard de Sylvio Faria, homem de poucas palavras, raríssimos sorrisos e nenhuma paciência com intrusos, chamou o garçom da Editora Abril para transmitir-lhe a orientação curta e grossa: “Se esse senhor pedir a você alguma coisa, recuse. Se quiser cafezinho, sirva frio”. Bem mais calorosas foram as relações entre os jornalistas do Pasquim e a censora do semanário, dona Solange. Durante algumas semanas, parte dos redatores e a encarregada de vigiá-los preferiram entender-se na cama. Acabaram denunciados pela crescente redução de textos proibidos. E a tolerante Solange foi substituída por um homem.

Os critérios que orientavam o trabalho dos censores caberiam numa frase: “É proibido publicar qualquer artigo, reportagem, editorial, vogal, consoante, ponto de exclamação, vírgula, ponto de interrogação, reticências ou quaisquer outras coisas que possam desagradar aos integrantes da cúpula do governo federal”. Os executores da missão de vetar textos sabiam que isso era pouco para os governantes nativos, cujo sonho foi explicitado pelo general-presidente Costa e Silva em meados de 1968. Convidado para um almoço pela Condessa Pereira Carneiro, o visitante queixou-se à dona do Jornal do Brasil do tom pouco amistoso das páginas da editoria de Política. “Nossas críticas são sempre construtivas”, ponderou a Condessa. “Mas eu não quero saber de críticas, nem destrutivas nem construtivas”, abriu a alma o chefe do governo militar. “O que eu quero mesmo é elogio.”

Tal sonho pareceria possível se tivesse vingado o parto do controle social da mídia. Concebida por jornalistas convencidos de que a liberdade de imprensa era incompatível com a democracia, como Franklin Martins e Rui Falcão, a invencionice pretendia assumir o comando do noticiário jornalístico em todo o Brasil por meio de “conselhos” formados por profissionais a serviço do PT. Como as redes sociais ainda eram irrelevantes, entraram na mira dos pais da novidade telejornais, radiojornais, jornais impressos, revistas e outros veículos convencionais. Esses só divulgariam informações filtradas pelos conselheiros incumbidos de fazer chegar ao povo apenas o que o povo precisa saber. Gente para a composição dos conselhos não faltaria: desde a fundação do PT, sobram jornalistas devotos da seita que tem em Lula seu único deus. Foi a escassez de inteligência que matou o plano — antes que os genuínos jornalistas morressem de rir.

Quem seria incumbido de selecionar as manchetes que abrem o Jornal Nacional?, perguntavam-se nas redações e nos botequins os providos de pelo menos 15 neurônios. Quer dizer que os conselheiros cuidariam de escrever a reportagem de capa da Veja, editar o caderno especial do Estadão, eleger a foto principal do Globo? E quem vai comprar publicações produzidas por um bando de incapazes capazes de tudo? Onde encontrar leitores, ouvintes e telespectadores interessados no que pensam, dizem e escrevem militantes que engolem sem engasgos ordens emanadas de um analfabeto funcional? O monstrengo morreu por ausência de respostas a tais interrogações elementares. Retornaria anos depois rebatizado de agência de checagem, o mais recente filhote da censura ortodoxa. O caçula encontrou um habitat perfeito no país cindido por um Fla-Flu que a pandemia de coronavírus tornaria ainda mais maniqueísta. No restante do mundo, a covid-19 é uma usina de dúvidas. Aqui, gerou um gigantesco conglomerado de poços de certezas. Nas agências de checagem se aglomeram — com máscara, lavando as mãos a cada 15 minutos, desfraldando a bandeira do eterno lockdown e respeitando até medidas de distanciamento social com fervor religioso — anônimas sumidades que se julgam capazes de distinguir o que é certo e o que é errado, o que é verdade e o que é mentira. Melhor: fake news, expressão aplicada a desinformações que determinam o resultado de toda eleição.

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A mão invisível das agências de checagem desceu sobre Oeste pela primeira vez em 31 de julho de 2020. Sob o título “É falso que imagem da Nasa prova que Amazônia não está ‘em chamas’”, a Aos Fatos determinou que a imagem do satélite da agência espacial que ilustrava o texto publicado 11 dias antes não correspondia à realidade. Motivo: uma das três manchetes destacadas no início da reportagem citava o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).

Numa extensa resposta à agência — e em outras matérias publicadas sobre o caso —, Oeste explicou que jamais usara fotos da Nasa para contestar dados do Inpe. A imagem do satélite apenas provava que a Floresta Amazônica, diferentemente do que vinha divulgando a imprensa tradicional, não estava em chamas. Oeste acrescentou que, “mesmo analisando os dados do Inpe (e não foi essa a intenção da reportagem), era possível constatar que, no bioma amazônico, havia 2.248 focos de queimadas registrados pelos satélites em junho de 2020”. O número era inferior à média para o mês, de 2.724 — e bem abaixo do máximo, registrado em 2004 (9.179 focos).

Em consequência da parceria entre Aos Fatos e Facebook, a reportagem de Oeste, sempre que compartilhada na rede social, era coberta por uma tarja com o aviso: “Informação falsa — Checada por verificadores de fatos independentes”.

Em 17 de março deste ano, Aos Fatos atacou novamente: “É falso que São Lourenço zerou mortes e internações por covid-19 devido a ‘tratamento precoce’”. A reportagem publicada por Oeste na antevéspera informava corretamente que, de acordo com o boletim emitido pela prefeitura de São Lourenço, naquele dia não havia um só paciente internado na UTI devido à covid-19. O texto incluía um relato do prefeito Walter Lessa (PTB) sobre a adoção do tratamento precoce em casos de suspeita da doença. Como sempre, a agência contestou a utilidade do tratamento precoce.

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Em vez de excluir os textos, como determinou a Justiça, Aos Fatos colocou uma tarja preta sobre o logotipo de Oeste e manteve as postagens. A insolência foi tão longe que a agência se considerou censurada pela decisão do juiz que a proibiu de censurar os textos censurados. O Facebook ainda não liberou os posts patrocinados da revista.

A má-fé das agências de checagem não se limita a Aos Fatos. Em 8 de abril, a Verifica, subordinada ao jornal O Estado de S. Paulo, contestou trechos da reportagem com o título “Covid-19: após um mês de lockdown, aumenta o número de pacientes internados em leitos de UTI em Araraquara”. As afirmações da Verifica foram rebatidas uma a uma no texto intitulado “Oeste novamente é vítima de fake news de agência de checagem”. Eram oito. Na primeira delas, a agência alegava que Araraquara não tivera um mês de lockdown. Segue-se a resposta de Oeste:

Um texto publicado pela revista de divulgação científica Scientific American afirma que as distorções e mentiras produzidas por políticos e analistas se tornaram tão comuns que os principais meios de comunicação passaram a designar jornalistas e verificadores de fatos para checar suas afirmações. “A motivação para descobrir falsidades e declarações enganosas tiradas do contexto é louvável”, diz o artigo. “Os verificadores de fatos visam a chegar mais perto da verdade, mas seus preconceitos podem ocultar a própria verdade que procuram.” Se também no Brasil as intenções são boas, os resultados até aqui se mostram desastrosos. Balizados pela arrogância e por uma perigosa autoconfiança, os checadores agem como infalíveis policiais da informação. Se efetivamente soubessem identificar todas as mentiras e todas as verdades, estariam perdendo a chance de enriquecer rapidamente. Bastaria que as agências lançassem publicações próprias. O mundo finalmente seria apresentado ao jornalismo sem erros.


Leia também “Checadores de ideias”

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Augusto Nunes e Branca Nunes, colunistas - Revista Oeste

 

quinta-feira, 11 de outubro de 2018

A força da democracia

Haddad e Bolsonaro não vão perder eleitorado e militância, mesmo que se aproximem do centro e da moderação

Calma, pessoal: nem o Brasil vai virar uma Venezuela, nem voltar à ditadura militar. Enquanto petistas denunciam o militarismo de Bolsonaro e os bolsonaristas atacam o bolivarianismo de Haddad [que acabou com a Venezuela] disputa dominante nas redes sociais – os dois candidatos caminham na direção do centro e da moderação.  Nenhum deles, ainda, escreveu carta ao povo brasileiro, mas fizeram clara manifestação na entrevista ao JN. Ambos descartaram a proposta de tentar uma nova constituição – que seria o passo inicial de mudança de regime. Bolsonaro desautorizou seu vice, o general Mourão, que falara na viabilidade de um “autogolpe”. Haddad desclassificou a fala de José Dirceu, para quem o objetivo do PT é tomar o poder, não apenas ganhar a eleição.

Pode-se suspeitar que essas manifestações foram da boca para fora. E de fato, no campo petista, há muita conversa bolivariana. Por exemplo: os ataques à imprensa, que levam às propostas de “controle social da mídia”, uma censura mal disfarçada;
. a defesa de líderes que promoveram o petrolão, um assalto ao Estado para comprar a política, a maior ofensa à democracia praticada desde o fim do regime militar;
. a defesa de ditaduras esquerdistas;
. e, claro, a Globo é a culpada pela disseminação da extrema-direita.

No campo bolsonarista, então, encontram-se ideias e condutas autoritárias para qualquer lado que se olhe. Por exemplo: o problema da segurança se resolve com a matança do maior número possível de bandidos, para o que é preciso armar os cidadãos – quando se sabe que as melhores polícias do mundo são também as que menos matam; [proposta que conta com o9 apoio maciço das pessoas de bem.]
. minorias de todos os tipos, na política e nos costumes, devem ficar caladas e seguir as regras ditadas pela maioria – uma violação ao mais simples princípio democrático, que preza o respeito e garante a voz das minorias; [as minorias precisam entender que quando pretendem impor seus costumes, suas práticas - na maioria das vezes verdadeiras aberrações - as ditas minorias querem impor a ditadura das minorias, o que é inaceitável.]
. a desumanidade do imperdoável elogio a torturadores; [chamam de tortura, interrogatórios enérgicos que muitas vezes eram realizados durante o regime militar, exatamente para que as ações de combate ao terrorismo não fossem prejudicadas.]
. e, claro, a Globo é a culpada pela disseminação do esquerdismo.

Há mais barbaridades e mentiras nas redes, mas fiquemos com estas amostras.
A questão é outra. Por que Haddad precisou dizer explicitamente que o PT não quer conquistar o poder? Porque se continuar com esse viés ideológico, não ganha nem a eleição.  E lá se vai ele para o centro, para tentar ganhar a eleição – objetivo, aliás, difícil, dada a enorme diferença de votos do primeiro turno. Reparem: gostando ou não, contrariando ou não os seus radicais sinceros, Haddad nem ganharia a eleição, nem conseguiria governar se ficasse só com sua turma.  Resumindo: o PT foi de Lula para garantir a posse de sua base; agora vai de Haddad para buscar alguma coisa no centro e no anti-establishment dominantes. A chance é remota, mas é a única.

Já Bolsonaro está mais confortável. É favorito, sobretudo pela clara ascensão no final do primeiro turno. Ele precisa de poucos votos para confirmar a vitória e deve contar com parte do eleitorado que escolheu candidatos de direita e centro.  Está tão confortável que nem parece preocupado em obter apoios, por exemplo, dos candidatos a governador que foram ao segundo turno. Tem ocorrido um movimento contrário: candidatos estaduais declarando voto em Bolsonaro, sem qualquer negociação prévia, tentando pegar a onda conservadora.

O risco para Bolsonaro está do lado dele mesmo: uma declaração muito errada, algo de extremo radicalismo, antidemocrático, o abandono das propostas liberais em política econômica, ações violentas de seus seguidores.  Assim como Haddad não vai perder seu eleitorado e a militância mais à esquerda, mesmo que se aproxime do centro, também Bolsonaro não vai perder sua base mais radical no caso de um mesmo movimento.

Mas pode perder os líderes e eleitores que têm visão liberal e democrática, não apreciam a extrema direita, acham que Bolsonaro é um candidato fraco, mas menos ruim que a opção petista. Esse pessoal pode ir, por exemplo, para o voto nulo.  Foi a força da democracia, manifestada na votação de domingo, que levou os candidatos a jurar pela Constituição. Seria bom que não ficassem só nas declarações, mas tratassem de segurar seus radicais.

Carlos Alberto Sardenberg, jornalista - O Globo

 

quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

O povo não é bobo

Os que estão no governo querem mesmo é censura prévia ou, como se diz por aí, controle social da mídia

“Sim, eu sei o que fazem os editores, eles separam o joio do trigo e publicam o joio". A frase clássica de Adlai Stevenson, político americano do Pós-Guerra, pode ser utilizada com variadas intenções. Trata-se, claro, de uma divertida crítica à qualidade da imprensa. Por aí, as verdadeiras notícias estariam na lata de lixo das redações e, lógico, a sociedade ficaria sempre mal informada.

Mesmo quando não admitem, políticos de todas as tendências concordam com Stevenson. Os que estão no governo, então, acham que a frase é perfeita e justifica medidas corretivas. Não é censura, dizem, apenas encontrar meios para melhorar a qualidade da imprensa. Conversa. O que querem mesmo é censura prévia ou, como se diz por aí, controle social da mídia.

Jornalistas estão o tempo todo decidindo, primeiro, o que se vai apurar, segundo, o que se vai publicar e, terceiro, como se vai apresentar a notícia. Tudo considerado, caímos na mais antiga questão da profissão: o que é notícia? Há várias respostas clássicas produzidas por jornalistas: — Se o cachorro morde o homem, não é notícia, se o homem morde o cachorro, é;
— Notícia é tudo aquilo que alguém não quer ver publicado, o resto é propaganda;
— Jornalismo é oposição, o resto é armazém de secos e molhados (Millôr Fernandes);

Examinamos essas teses em coluna aqui publicada em 22/12/2011, com o título “O povo não é bobo". Também pode ser encontrada no arquivo de www.sardenberg.com.br.  A questão hoje é anterior: quem decide o que é notícia? Os patrões, os donos dos jornais, rádios, TVs e sites — diz o pessoal que quer introduzir a censura prévia, perdão, o controle social.

Sim, há veículos nos quais as redações são instruídas a publicar apenas o que os patrões consideram a notícia correta. Exemplo? Todos os veículos cujo patrão é o governo — a conhecida imprensa chapa-branca.

Somos contra a censura prévia e/ou “controle social" — o leitor já terá notado — mas se a regra for introduzida, a aplicação tem que começar pelos veículos do governo. Estes publicam um enorme joio, as versões oficiais: ninguém rouba nada, não há mensalões nem petrolão, tudo funciona e, se não funciona, é por causa da seca, do azar, do mundo, da oposição ou da imprensa do contra.

Ainda tem aí uma baita farsa. O verdadeiro patrão é o povo, que paga os impostos e assim financia a chapa-branca. Mas os políticos, governantes de plantão, usurpam o papel de patrões e controlam essa mídia no interesse dos respectivos partidos. Sim, foram eleitos, e por isso representam a população. Mas, numa democracia, não podem esquecer que tiveram o voto de parte dos eleitores, havendo, pois, uma outra parte que merece respeito — e informação não partidária.

A saída — segundo uma velha tese — é colocar os veículos do governo sob controle de um comitê com representantes dos diversos partidos, em número proporcional aos votos por eles conseguidos. Esqueçam. Não funciona. Um veículo público assim dirigido vai noticiar não uma, mas várias versões oficiais, o joio do governo e o da oposição. Duplo desperdício de dinheiro do povo.

Há quem recomende a proibição legal: governos, federal, estaduais ou municipais, não poderiam editar veículos de informação geral — de suposta informação geral, no caso. A TV pública, por exemplo, divulgaria apenas programas educativos, cursos e informação efetivamente pública, como campanhas para combater a dengue, chamada para vacinação, previsão do tempo, instruções para agricultores e assim por diante.  Seria mais barata e mais útil.

Outros sugerem que os veículos do governo sejam, afinal, dirigidos como os da imprensa privada de qualidade — aquela cujos jornalistas são guiados por um código formal ou informal, com o objetivo de apurar e publicar o que é notícia ou opinião relevante.
Na prática, é difícil conseguir tal isenção no setor público. Além disso, se a TV pública vai fazer a mesma coisa que a TV privada faz, por que gastar dinheiro do contribuinte com a primeira?

O que retorna a questão: como garantir que os jornalistas escolham o trigo? Ou como a lei pode garantir a qualidade da imprensa? Não pode. A lei tem que garantir a liberdade da imprensa e, sim, dos jornalistas. A qualidade — ou, a notícia de interesse, publicada de forma correta, isenta e independente —, isso depende do público, do leitor, ouvinte, telespectador e internauta.

O povo não é bobo, sabe onde buscar a informação. Olhem as audiências. É eloquente a audiência zero dos noticiários das TVs públicas. É evidente a baixa credibilidade dos veículos que só divulgam a voz do dono, seja o governo ou a empresa privada.  O tema seguinte é: como distinguir e quem pode distinguir entre ofensa e crítica? Na próxima.

Fonte: Carlos Alberto Sardenberg,  jornalista - O Globo