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quarta-feira, 8 de março de 2017

Não vá para a rua sem óculos

Se as manifestações de março partirem para o “fora todo mundo”, vão se desmanchar na história como em 2013

Dizem que março será o mês da volta das manifestações, do novo grito das ruas. Aparentemente, serão manifestações em defesa da Lava Jato. Essa é uma causa irretocável. Mas o sismógrafo da opinião pública brasileira – essa entidade exótica – parece registrar também uma tendência ao reaparecimento do “fora todo mundo”. É o famoso saco de gatos cívico, aquele “basta” genérico que o Brasil tanto ama. Nesse caso, por incrível que pareça, as ruas podem não fazer bem à Lava Jato.

Um instituto de pesquisa apurou que, para a maioria dos brasileiros, Eduardo Cunha é um vilão mais nocivo que José Dirceu. Cada vez mais se observa que as pesquisas de opinião ensejam desconfiança – infelizmente, e sem nenhuma teoria conspiratória. Há muitas formas de induzir o resultado – tipo de pergunta, momento da sondagem etc. – e vários institutos andaram levando surra da realidade por causa disso. É natural que Cunha seja mais citado que Dirceu, já que sua saga esteve em cartaz mais recentemente. A pesquisa sublinha a síndrome da memória curta – o que não deixa de ser um fato real. [com certeza o bônus de mais onze anos de cadeia que o reeducando Zé Dirceu, 'guerrilheiro de festim'
, ganhou de Sérgio Moro, fará com que todos se convençam de que Dirceu é muitas vezes mais venenoso que Cunha.]
 
Em outras palavras: pode não ser o mais honesto você pesquisar com um corintiano na saída do estádio, após uma derrota do Corinthians, o nível de satisfação dele com qualquer coisa no planeta Terra; mas também é verdade que boa parte das manifestações públicas brasileiras tem a profundidade de uma ressaca futebolística. Os famosos protestos de junho de 2013 continuam sendo descritos por narradores diversos – o que não falta por aqui é narrador – como um divisor de águas na política nacional. É uma espécie de alquimia historiográfica. Basta dizer que aquele mar de gente nas ruas não fez cócegas nos principais responsáveis pela insatisfação geral.

A causa inicial contra o aumento das passagens de ônibus, que depois se ampliou com o slogan “Não é só por 20 centavos”, denotava a perda de poder aquisitivo e a deterioração das condições de vida em geral – primeiros sinais da recessão profunda que se instalou no país. Como se sabe hoje (e já era fácil enxergar na época), a derrocada econômica foi obra exclusiva da quadrilha que governava o Brasil – com direito à façanha de jogar a maior empresa nacional na lona. Você pode deixar o narrador sonhar que ali o PT começou a cair, mas você sabe que é mentira.

Dilma, Mercadante, Rossetto, Ananias e todo aquele estado-maior de picadeiro fizeram a festa:
pronunciamentos, coletivas, anúncios de reforma política, promessas de plebiscito e doces reminiscências dos seus tempos de militância de rua, o que os igualava aos manifestantes de 2013. Os delinquentes federais saíram sem nenhum arranhão da Primavera Burra – e ainda contrataram para a campanha eleitoral do ano seguinte os bravos ativistas de mídia e de quebra-quebra que estavam nas ruas por um mundo melhor (para os seus cofrinhos particulares).

O problema deste março de 2017, com Cunha desbancando Dirceu entre os vilões da Lava Jato, é parte da multidão tirar do foco as obras completas do PT (já faz tanto tempo...) e partir para o “fora todo mundo” – inclusive quem está consertando (e bem, segundo todos os indicadores) o desastre. Vamos ser didáticos: todos os pilantras do PMDB merecem cadeia, e a força-tarefa da Lava Jato jamais deu qualquer sinal de que pretenda aliviar os partidários do presidente, ou mesmo o próprio; mas o gigantesco esquema do petrolão, articulado ao mensalão, que sequestrou o coração do estado brasileiro e permitiu o maior assalto da República, não foi liderado e regido por nenhum desses coadjuvantes. A Lava Jato só terá sido bem-sucedida se condenar e prender a cúpula populista que virou dona do Brasil por 13 anos. Se a opinião pública aceitar qualquer coisa diferente disso, estará desautorizada a reclamar da corrupção.

Se as manifestações de março de 2017 partirem para o “fora todo mundo”, provavelmente vão se desmanchar na história como as de 2013. Se servirem para atrapalhar a equipe econômica de Temer, que é reconhecida tecnicamente no mundo todo e está arrumando a casa, o tiro sairá pela culatra. Os parasitas que estão de boca aberta para herdar, em 2018, a lenda coitada do PT saberão reabrir devidamente todas as boquinhas e bocarras que a Lava Jato conseguiu fechar.

Fonte: Guilherme Fiuza - Revista Época
 
 

segunda-feira, 16 de março de 2015

Na tentativa de explicar, ministros ampliam confusão



O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, adota tom institucional e reconhece força dos protestos, mas Miguel Rossetto, da Secretaria Geral da Presidência, fala como manifestante inflamado

O governo escalou os ministros José Eduardo Cardozo (Justiça) e Miguel Rossetto (Secretaria Geral da Presidência) para responder às manifestações contra a presidente Dilma Rousseff e o PT deste domingo (15), mas não conseguiu evidenciar qual a estratégia do Planalto para lidar com a crise. Enquanto Cardozo fez uma fala institucional e buscou o equilíbrio entre os interesses do Planalto e a insatisfação dos milhares de brasileiros que foram às ruas, Rossetto adotou a postura de um militante petista indignado com os eventos.

Cardozo foi o primeiro a falar, antes de começar a entrevista coletiva. Ele reconheceu a legitimidade dos protestos, não minimizou nem ridicularizou os manifestantes, não insistiu no famoso "nós contra eles" do PT, e disse que Dilma quer o diálogo. "Estamos abertos a ouvir propostas". O ministro da Justiça também reforçou o combate à corrupção como bandeira do Planalto e a necessidade de uma reforma política. “O governo está aberto a ouvir as vozes daqueles que protestam e daqueles que aplaudem”, disse.

O discurso de Cardozo marcou uma inflexão importante na postura adotada pelo PT e pelo governo na semana passada, após o “panelaço” em protesto ao pronunciamento de Dilma no domingo (8) pelo Dia Internacional da Mulher. Na ocasião, os dirigentes petistas chegaram a acusar a oposição de ter “financiado” o panelaço.

Protestos escancaram desgaste do PT
Imediatamente após a fala de Cardozo, no entanto,  Rossetto subiu o tom e atacou o que chamou de “golpismo” e de “intolerância”. Segundo ele, os protestos deste domingo (15) reuniram apenas manifestantes que não votaram em Dilma no ano passado. Ele também insistiu na tecla de que o Planalto está empenhado no combate à corrupção e que não vê necessidade de grandes mudanças. Por fim, pregou a necessidade da reforma política como solução para todos os males que hoje afligem o governo.

No jargão do marketing político, Cardozo “falou para fora”, para os “não convertidos”, e Rossetto falou “para dentro”, para a militância que precisa de combustível para continuar defendendo Dilma. O resultado final foi ruim.  Conforme apurou ÉPOCA, no saldo final, o Planalto considerou que a iniciativa de colocar os dois ministros, lado a lado, para dar respostas aos protestos fracassou porque gerou mais ruído num momento em que o país espera uma mensagem clara do que pretende a presidente Dilma e seu governo.

Fonte: Época OnLine