Os organizadores não foram pegos de surpresa.
Em 1992, um carro da Viradouro pegou fogo na dispersão. Em 2003, a
atriz Neusa Borges caiu de uma alegoria da Tijuca
[Carnaval não é nossa praia, mas, não podemos deixar de manifestar nosso apoio à posição defendida na matéria adiante transcrita.]
Em que pese a heroica vitória da Portela, que não conquistava um
título desde a inauguração do Sambódromo, em 1984, o carnaval de 2017
ficará marcado pelos acidentes com os carros alegóricos da escolas de
samba Paraíso do Tuiuti, na noite de sábado, e da Unidos da Tijuca, na
madrugada de terça-feira, que deixaram 35 feridos. Quase uma semana após
os desfiles, dois deles ainda permanecem internados em estado grave.
A primeira coisa que chama a atenção nos trágicos episódios é a falta
de um protocolo para casos como esses. E não dá para dizer que os
organizadores da festa foram pegos de surpresa. Basta lembrar que, em
1992, um carro alegórico da Viradouro com 22 destaques pegou fogo na
dispersão — felizmente, os sambistas conseguiram sair antes que as
chamas consumissem totalmente a alegoria, que, na época, ainda não tinha
as proporções gigantescas como hoje. Em 2003, a atriz Neusa Borges
despencou de um carro alegórico da Unidos da Tijuca, sofrendo ferimentos
graves. Sem protocolo definido, as decisões ficaram a cargo da Liga
Independente das Escolas de Samba (Liesa), que, ignorando a gravidade do
caso, optou por não interromper o espetáculo. Com o desfile em
andamento, o carro da Paraíso do Tuiuti foi removido do local da
tragédia antes que a perícia fosse feita. E, quando parte do carro da
Unidos da Tijuca desabou, os bombeiros tiveram de abrir caminho entre as
alas para socorrer as vítimas em pleno desfile.
A sucessão de erros entraria pela Quarta-Feira de Cinzas. Numa
reunião feita às pressas antes da abertura dos envelopes com as notas
dos jurados, a Liesa decidiu que nenhuma escola do Grupo Especial seria
rebaixada, concedendo habeas corpus preventivo para Paraíso do Tuiuti e
Unidos da Tijuca, diretamente responsáveis pelas tragédias que tiraram o
brilho do carnaval deste ano. [a decisão da Liesa, arbitrária e sem fundamento, premiou a irresponsabilidade.
A segurança dos participantes do desfile é responsabilidade primeira e intransferível da agremiação carnavalesca a qual pertencem.
No afã de apresentar carros alegóricos que se destaquem, os responsáveis pelas 'escolas de samba' esquecem a segurança dos membros.
É contraditório que uma escola seja penalizada se exceder o tempo regulamentar para o desfile, por um minuto que seja, e ao mesmo tempo seja premiada por levar para a passarela um carro alegórico que se desmancha - caso da Unidos da Tijuca.
Qualquer falha nos carros apresentados deve ser punida com mais rigor do que o utilizado para punir as falhas no tempo de desfile, na bateria, nas evoluções, etc.
Falhas na estrutura do espetáculo não podem ser motivo para premiar os responsáveis.]
O desfile de equívocos não parou por aí. Conhecidos os resultados,
percebe-se que a tumultuada apresentação da Unidos da Tijuca recebeu
notas melhores do que a de concorrentes que não tiveram problemas
semelhantes. O que põe em xeque a lisura deste corpo de jurados da
Liesa.
Após o acidente, autoridades se mobilizaram para aumentar a segurança
das alegorias. O Inmetro quer estabelecer normas para confecção de
carros alegóricos. E o Ministério Público estuda um Termo de Ajustamento
de Conduta (TAC) com as escolas de samba para determinar regras rígidas
de proteção. Iniciativas que são bem-vindas, mas que podem se tornar
inócuas se não houver fiscalização adequada. O desfile das escolas é patrimônio do carioca e até do brasileiro. A
Liesa, que fez um bom trabalho de organização do evento, tem de
preservar este patrimônio, e não destruí-lo por questões políticas
internas.
Fonte: Editorial - O Globo