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terça-feira, 4 de junho de 2019

O custo da reputação

O custo da reputação de uma grande empresa

Manipulação de até dois dólares por barril nos contratos produzia fortunas

Brasil, Estados Unidos e Suíça avançam numa investigação conjunta de corrupção que tende a resultar numa reforma das práticas do comércio mundial de petróleo, alimentos, minerais e metais. No alvo estão as transnacionais Glencore, Vitol, Trafigura, Mercuria e Gunvor. Juntas, controlam quase 25% dos contratos no comércio global de commodities. Nos EUA, o Departamento de Justiça, a Comissão de Valores Mobiliários (SEC, na sigla em inglês) e a Comissão de Negociação de Futuros de Commodities (CFTC) se uniram às Procuradorias do Brasil e da Suíça na apuração de pelo menos 17 casos.

É a mais ampla investigação no setor desde os anos 80, quando o então promotor de Nova York Rudolph Giuliani saiu à caça de Marc Rich, fundador da Glencore. Rich acabou condenado a três séculos de prisão, o dobro da pena do ex-governador do Rio Sérgio Cabral. Fugiu, perdeu metade da fortuna, mas morreu ainda bilionário em 2013. Não voltou aos EUA, mesmo perdoado pelo presidente Bill Clinton. A etapa brasileira da investigação avança com delações de executivos relatando subornos em troca de vantagens em contratos da Petrobras.

Escritórios da estatal em Houston, Londres e Nova York negociavam em média 400 mil barris de combustíveis por dia, a preços variáveis. Em apuração sobre contratos com Glencore, Trafigura e Vitol, a Petrobras afirmou à Justiça que não possui registros em papel ou eletrônico sobre os negócios, feitos durante 15 anos seguidos de maneira informal, sem qualquer controle. A manipulação de até dois dólares por barril nos contratos produzia fortunas, rateadas entre funcionários e políticos (PT, MDB, Progressistas, antigo PP, PL , ex-PR, e PSDB).

Glencore, Vitol e Trafigura são três vezes maiores que a Petrobras. Os prejuízos potenciais às suas reputações são imensuráveis —por causa de Rich, a Glencore já foi obrigada a se dividir. Somente para juntar a papelada exigida pelos EUA, a Glencore gastou em média R$ 620 mil por dia no segundo semestre do ano passado, informa no balanço anual.
 


terça-feira, 11 de dezembro de 2018

A irmandade do suborno

Petrobras não consegue dimensionar suas perdas 


Todo dia a Petrobras compra e vende petróleo e derivados no mercado mundial. Durante a última década e meia, negociou em média 400 mil barris a cada jornada de 24 horas, a preços variáveis.  Agora descobriu-se que parte dessas transações não teve qualquer registro e deu prejuízos à empresa estatal, mediante subornos pagos a funcionários, intermediários, políticos do PT e outros partidos políticos.

Eles receberam propinas entre dez centavos e US$ 2 por barril de petróleo e derivados nas negociações diárias, com pagamento à vista, e em contratos de longo prazo — mostram os novos processos abertos na Operação Lava-Jato.  O grupo fazia a Petrobras comprar a preços acima de mercado e a vender a preços mais baratos. Numa negociação de 300 mil barris, por exemplo, acertavam com o cliente estrangeiro “comissão” de US$ 1 por barril e embolsavam US$ 300 mil. Chegaram a “sumir” com 17,5 mil toneladas métricas de combustível da estatal embarcadas em três navios. Em 2012, celebraram o recorde de US$ 2 de propina sobre uma carga levada a Fortaleza.
A Petrobras não consegue dimensionar suas perdas na área, onde obtém dois terços do seu faturamento. Contou ao Ministério Público, em abril: 

“Não é possível localizar todas as aprovações (dos gestores), visto que algumas ocorreram em despachos presenciais ou por telefone, principalmente para os casos mais antigos.” São 15 anos de contratos informais, diários, sem controle de auditores e de órgãos como CVM e TCU. Entre os principais beneficiários se destacam três trading companies, irmãs na hegemonia sobre o mercado mundial de petróleo e derivados. Vitol, Trafigura e Glencore somam receitas de quase US$ 500 bilhões por ano, seis vezes mais que a estatal brasileira, equivalente ao PIB de Minas. 

Os processos deixam claro que “a alta cúpula dessas empresas tinha total consciência do que estava ocorrendo”. Devem ir a julgamento no Brasil, nos Estados Unidos e na Suíça.


José Casado, jornalista - O Globo