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sábado, 15 de fevereiro de 2020

A militarização do Planalto – Editorial - O Estado de S. Paulo

Decisão de Jair Bolsonaro é compreensível. O problema é que ele parece disposto a fechar definitivamente as portas aos políticos, aquartelando-se no Planalto

O presidente Jair Bolsonaro anunciou o general Walter Braga Netto, chefe do Estado-Maior do Exército, como o novo ministro da Casa Civil. Quando a nomeação for efetivada, todos os Ministérios com gabinete no Palácio do Planalto estarão ocupados por militares.

É compreensível que Bolsonaro queira ter, como seus ministros mais próximos, pessoas com quem tenha maior afinidade. O presidente, como capitão reformado do Exército, decerto sente-se mais à vontade e confiante com assessores que foram seus companheiros de farda ou são egressos do mesmo ambiente em que se formou como militar. O problema é que, assim, Bolsonaro parece disposto a fechar definitivamente as portas aos políticos, aquartelando-se no Palácio do Planalto.

Nada disso pode ser considerado definitivo, em especial para um presidente que troca ministros e assessores com enorme facilidade, muitas vezes como consequência de rompantes inesperados e por motivos obscuros – em geral relacionados às idiossincrasias dos filhos. Poucos são os ministros de Bolsonaro que podem se dizer seguros no cargo, mesmo os que supostamente se ligam ao presidente pelo espírito de camaradagem dos quartéis – que o diga o general Carlos Alberto dos Santos Cruz, demitido da Secretaria de Governo em junho do ano passado por interferência direta do vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ), um dos filhos do presidente. Esse caso, como vários outros, mostra que o único compromisso firme de Bolsonaro não é com a estabilidade da administração do País, mas sim com relações de parentesco. Nem mesmo um amigo de longa data do presidente, como o general Santos Cruz, resistiu à força dos laços familiares.

Enquanto durar, contudo, o “gabinete fardado” do Palácio do Planalto é um indicativo claro de que o presidente Bolsonaro resolveu retirar o gerenciamento de seu governo da órbita dos políticos. “Ficou completamente militarizado o meu terceiro andar”, brincou o presidente, em referência ao andar do Palácio do Planalto onde ficam o gabinete da Presidência da República e os de alguns de seus principais auxiliares. Agora, ministros militares ocupam toda a chamada “cozinha do Planalto” – a Casa Civil, a Secretaria de Governo, o Gabinete de Segurança Institucional e a Secretaria-Geral.

Uma das principais tarefas da Casa Civil é justamente coordenar os Ministérios, o que dá a seu titular o enorme poder de ser a voz do presidente no relacionamento com todo o primeiro escalão. Ao que parece, o presidente Bolsonaro acredita que um militar terá melhores condições de realizar esse trabalho. “Nada contra os civis”, apressou-se a dizer Bolsonaro, mas, segundo deu a entender, o futuro ministro, por ser general, conseguirá “coordenar os ministros, buscar soluções e antecipar os problemas que podem acontecer”. E o que não tem faltado neste governo, desde o primeiro dia, são problemas.

Ao se acercar somente de militares e colocar em função-chave na organização do governo um general com o perfil de Braga Netto ao chefiar a intervenção federal na Segurança Pública do Rio de Janeiro, em 2018, ele demonstrou elogiável discrição e foco na disciplina –, Bolsonaro sinaliza rédea mais curta em relação a seus ministros, em especial os que podem nutrir pretensões eleitorais, e uma interlocução ainda menor com os políticos e com o Congresso.

Sabe-se, desde sempre, que Bolsonaro desconfia até da própria sombra, imaginando-se cercado de “traíras” – a expressão é dele, para designar os que, em sua visão, se aproveitam da onda bolsonarista para auferir lucros eleitorais. Recentemente, disse que daria “cartão vermelho” a ministro que esteja “usando Ministério” como trampolim eleitoral. Coincidência ou não, pouco depois o ministro Onyx Lorenzoni, que ultimamente passou mais tempo cuidando de seu projeto de se tornar governador do Rio Grande do Sul do que das tarefas da Casa Civil, perdeu o cargo.

De seus ministros, Bolsonaro espera lealdade absoluta, bem de acordo com o espírito da caserna.
É o único critério que, para ele, realmente importa.
 
 Editorial - O Estado de S. Paulo 
 
 

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2020

A militarização do Planalto - Nas entrelinhas

“Os militares no governo têm revelado mais bom senso diante das crises e conflitos do que a ala ideológica e religiosa que cerca o presidente Jair Bolsonaro


A queda do ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, era pedra cantada. A surpresa é a sua substituição por mais um oficial de quatro estrelas da ativa, o que significará a completa militarização do Palácio do Planalto. O presidente Jair Bolsonaro convidou para o cargo o general Braga Neto, chefe do Estado-Maior do Exército e ex-interventor na segurança do Rio de Janeiro, função que exerceu com discrição e habilidade política. Caso não aceite o convite, o nome mais cotado para o cargo é o do almirante de esquadra Flávio Rocha, atual comandante do 1º Distrito Naval, recém-promovido a quatro estrelas, que já havia sido convidado para uma assessoria especial da Presidência.

Aliado de primeira hora na campanha presidencial, Onyx deverá ser deslocado para o Ministério da Cidadania, no lugar do emedebista Osmar Terra. A troca de guarda na Casa Civil era esperada, mas não ocorreu ainda por causa da relação de amizade entre ambos. A pasta foi completamente esvaziada, principalmente depois da perda do Programa de Privatizações e Investimentos (PPI). A gota d’água foi o desempenho de Onyx na negociação com o Congresso, na qual o governo acabou cedendo R$ 30 bilhões em emendas impositivas do relator e das comissões, que foram vetadas por Bolsonaro —o Palácio do Planalto teve que negociar um acordo com os partidos da sua própria base para recuperar R$ 11 bilhões, por causa da derrubada dos vetos.

A substituição de Onyx pelo general Braga Neto pode melhorar o funcionamento interno do governo. Essa será a sua missão principal. A doutrina de organização vigente no Exército se baseia na cooperação e coordenação entre suas unidades, mas nunca superou completamente as tendências autárquicas de suas grandes unidades, e da própria Força em relação à Marinha e à Aeronáutica. O outro lado da moeda é a “militarização” dos processos decisórios, confinados a círculos restritos e de cima para baixo, o que vem se traduzindo na exclusão da sociedade civil e dos demais níveis de governo dos fóruns de discussão e deliberação sobre políticas públicas, mesmo em questões nas quais esse tipo de concepção induzem ao erro. [a discussão, às vezes, é necessária e útil - mas, discutir demais, ouvir muito pitaco, atrapalha mais do que ajuda.]

O Estado brasileiro precisa ser enxugado, é verdade, mas seu caráter democrático está consagrado pela Constituição de 1988.  
[alguma coisa ser 'consagrada' na Carta Magna não implica ser viável ou a melhor solução.
Especialmente quando temos a 'constitução cidadã', especializada em conceder direitos sem a contrapartida dos deveres e gerar despesas sem produzir riquezas.]  É um “Estado ampliado”, em razão da autonomia de muitos de seus órgãos e da participação colegiada da alta burocracia e de representantes da sociedade nas decisões. Nos governos do PSDB e do PT, pela própria natureza social-democrata desses partidos, esses fóruns e organismos foram, num primeiro momento, normatizados e consolidados. Num segundo, porém, foram instrumentos de aparelhamento partidário, cooptação de lideranças e abdução de interesses que, a rigor, deveriam ser negociados no âmbito do Congresso, e não nos gabinetes da Esplanada.

Burocracia
Agora, há um movimento inverso, cujo desfecho não está suficientemente claro. Mas caminha numa direção de completo apartamento do processo decisório do governo de instâncias de participação da sociedade e representação subnacional — como governos estaduais e municipais —, ainda que alguns desses fórum subnacionais sejam poderosíssimos, como é o caso do conselho de secretários de Fazenda. O outro lado da moeda será a reorganização autônoma da sociedade civil e o fortalecimento do poder de negociação do Congresso, para onde convergirão todas as demandas e reivindicações dos governadores e prefeitos — além de entidades da sociedade civil. Resta saber como o governo lidará com isso.


A presença de militares no governo por si só não significa a “militarização” das políticas públicas, o que não teria a menor chance de dar certo. Mas essa tendência existe, sobretudo quando as concepções dos militares sobre certos assuntos, como a Amazônia, por exemplo, convergem com grandes interesses econômicos (como no caso da mineração) ou de natureza ideológica e religiosa (caso da política indigenista). Entretanto, é inegável que os militares no governo têm revelado mais bom senso diante das crises e conflitos do que a ala ideológica e religiosa que cerca o presidente Jair Bolsonaro.

Uma outra questão é a relação dos militares com os servidores civis, que têm cultura completamente distinta e mais experiência na gestão da máquina pública. A cooperação entre ambos pode dar mais eficiência à máquina do governo, mas os conflitos e tensões serão inevitáveis em razão dessas diferenças. Todos os estudos sobre a burocracia mostram que a sua eficiência depende da confiança e da observação das normas. E que o “espírito de corpo” dos servidores, sobretudo em funções essenciais do Estado, reage às mudanças de rotina quando impostas sem discussão e negociação.

Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo - Correio Braziliense