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terça-feira, 14 de março de 2023

Não falta comida porque alguns comem demais - Revista Oeste

Gabriel Cesar de Andrade
 

A teoria desastrosa de Lula não é novidade. Ela foi exportada para o restante do mundo a partir dos EUA há mais de meio século

 Flávio Dino e Lula | Foto: Montagem Revista Oeste/Ricardo Stuckert/PR

Flávio Dino e Lula | Foto: Montagem Revista Oeste/Ricardo Stuckert/PR
 
 Há alguns dias, ao instituir o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, Lula disse que: “Se tem gente com fome, significa que alguém está comendo mais do que deveria”. A fala foi tratada como piada nas redes sociais: 

Se por um lado o humor ajuda o brasileiro a superar momentos de desesperança política, não há como ignorar a gravidade da fala vinda do chefe do Executivo e todas as consequências econômicas que ela sugere para a política social, a agricultura e a economia.

Lula não é o inventor da tese segundo a qual se alguns comem mais, outros precisam passar fome. A teoria desastrosa foi exportada para o restante do mundo a partir dos Estados Unidos há mais de meio século. Em 1968, o livro The Population Bomb foi lançado, por dois respeitados professores de Stanford, e previa uma catástrofe global pelo crescimento populacional desenfreado e a fome generalizada.

Um dos autores, o ambientalista radical Paul Ehrlich, previu dois anos depois do lançamento de seu best-seller que, “em algum momento nos próximos 15 anos, o fim chegaria”.  
Segundo Ehrlich, 65 milhões de norte-americanos e 4 bilhões de pessoas em outras partes do mundo morreriam de fome até o fim da década de 1980.
Livro The Population Bomb | Foto: Divulgação

Desnecessário dizer que tais previsões se mostraram totalmente infundadas, apenas servindo como combustível para um movimento mundial de violação de direitos humanos no México, na Bolívia, no Peru, na Indonésia, em Bangladesh e na Índia, onde mais de 6 milhões de homens foram esterilizados num único ano.

Hoje, a população global é o dobro da que existia na época dessas previsões catastróficas, e a porcentagem dos que vivem em situação de miséria caiu de 25% para 10%, na média global. E não são os países ricos que estão liderando essa “cura da fome” mundial, mas, sim, os países em desenvolvimento, onde 20% da população passou a ter o que comer desde 1970.

Fonte: FAO

Com esses números, já é possível saber que a tese do ambientalista radical Paul Ehrlich estava errada, afinal a população continuou crescendo e a taxa de famintos reduziu drasticamente. Mas e quanto à tese de Lula, de que se alguém passa fome é porque alguém está comendo demais?

Processos agrícolas modernos, com aumento da produtividade das sementes, controle de pragas e uso inteligente do solo, permitiram à humanidade se alimentar muito mais do que jamais havia feito antes

Se Lula estiver correto, na série histórica em que a malnutrição do mundo desenvolvido reduziu, os mais ricos teriam deixado de comer para que os pobres tivessem acesso a alimentos. O problema é que isto também não aconteceu.

Fonte: FAO

Observando os dados, é possível verificar que, apesar das discrepâncias regionais, o mundo todo passou a consumir uma quantidade cada vez maior de calorias por dia ao longo do tempo. O que explica essa situação não é nem a tese ambientalista de Ehrlich, nem a tese socialista enferrujada de Lula. Mas, sim, a tese da globalização e do livre-comércio.

Em meio século, enquanto a área agricultável global cresceu somente 10% e a população mundial dobrou, a produção de alimentos triplicou.

Fonte: OCDE
Processos agrícolas modernos, com aumento da produtividade das sementes, controle de pragas, uso inteligente do solo, automatização e segurança jurídica para a cadeia de produção, permitiram à humanidade se alimentar muito mais do que jamais havia feito antes. 
Em meados do século 19, colher 1 tonelada de grãos levava um dia inteiro e exigia o trabalho de 25 homens. 
Hoje, uma pessoa operando uma colheitadeira consegue fazer isso em seis minutos.
 
O erro que o ambientalista norte-americano Ehrlich cometeu em sua análise apocalíptica é o mesmo que Lula comete agora: acreditar que, para alguém passar fome, existe alguém “gastando” comida demais. 
Para Ehrlich, a culpa era dos recém-nascidos e do crescimento populacional. 
Para Lula, a culpa é “dos ricos”, ou de quem come mais do que precisa. A economia mostra que ambos estão errados.

É o avanço do capital privado, em contraponto à política divisiva do nós-contra-eles, que resolve os problemas da humanidade, como a fome e a destruição em massa. O discurso enferrujado de Lula, que ignora o desenvolvimento privado e aposta num discurso sem amparo em dados, deve ser combatido com fatos.

O fato relevante para este caso é que, diferente do mercado, em que a especialização, a inovação e a troca multiplicam a produção, na relação entre Estado e cidadão, podemos falar de um “jogo de soma zero”. 
Para o Estado receber, alguém (no caso, o cidadão) tem de perder. 
E como isto se relaciona com o caso da fome?
 
Desde o início do governo Lula até a data de hoje, o Estado brasileiro arrecadou mais de R$ 550 bilhões em impostos.  
Se os mais pobres fossem realmente prioridade, como ele sempre diz, com cerca de 10% do valor arrecadado, seria possível fornecer um salário mínimo para cada beneficiário do Bolsa Família. 
Uma família de três membros receberia R$ 3,6 mil por mês — contra R$ 600 do benefício atual, seis vezes mais.
 
Se há brasileiros passando fome porque alguém está comendo demais, este alguém que come demais é o próprio governo, chefiado por Lula.  
Foi ele que escolheu o inchaço da máquina pública, com a criação de mais 14 ministérios, mais cargos e negociatas, além de se recusar a cortar despesas para escolher prioridades. 
O que se vê é o triste começo de um governo que entrou prometendo picanha e agora reclama de brasileiros que comem demais. 

 Leia também “Acredite, o mundo está melhorando” 

Gabriel Cesar de Andrade é graduado em Direito (UFSC), com foco em economia (Mises Institute)

Gabriel Cesar de Andrade, colunista - Revista Oeste