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sábado, 21 de outubro de 2017

Porões: Ilações sobre conversas Mendes-Aécio buscam indignar tontos e intimidar ministro

Não se conhece o conteúdo das conversas; de 46 ligações em 85 dias, só 24 se completaram; todos os contatos, por óbvio, antecederam as baixarias protagonizadas pela holding JJ&F: Janot, Joesley e Fachin [Gilmar Mendes não se intimida; ele está entre os homens que Deus poupou do sentimento do medo.]

O ministro Gilmar Mendes, do STF, também presidente do TSE, é a caricatura de vilão de história em quadrinhos predileta dos idiotas e, por que não dizer?, dos safados

Durante a ditadura, temia-se o que produzia a chamada “comunidade de informações”. Na democracia que temos, todo cuidado é pouco com as investidas dos habitantes dos porões da Polícia Federal e do Ministério Público Federal. E essa gente, com o beneplácito ou a colaboração de setores do Judiciário — nem o Supremo escapa —, torna-se especialista não em investigação, mas na arte da difamação. Querem ver? Vou produzir um lead bombástico contra Mendes. E vou mentir só contando a verdade, para lembrar propaganda genial da Folha, de 1988, da W/GGK, que reproduzo no pé do texto. A ideia era de um certo jovem publicitário chamado Nizan Guanaes. Vamos lá.

“Gilmar Mendes falou ao telefone com Aécio Neves no dia em que tomou uma decisão que o favoreceu, livrando-o de depor à Polícia Federal”. Posso piorar um pouco as coisas para mexer ainda mais com o seu fígado e deixá-lo mais desinformado. A Operação Patmos apreendeu dois celulares de Aécio. Em um, havia 38 ligações entre o senador e o ministro, no período que vai de 16 de março e 13 de maio: 56 dias
– no aparelho das 38 chamadas, Aécio ligou 25 vezes; o ministro atendeu a 12;
– Mendes ligou sete vezes; aí foi o senador que não atendeu;
– em outras seis, o ministro conseguiu falar.

Em outro aparelho, há oito ligações entre 18 de fevereiro a 4 de abril. Seis delas se realizaram. Duas foram feitas pelo ministro. Ah, claro! O cuidadoso analista observa, no relatório, que Aécio é investigado em sete inquéritos e que Gilmar Mendes é relator de quatro deles.
Já está bem indignado?
Que absurdo, né?
Comecemos, então, a desmontar essa bobajada pelos números.
1: Dados os dois aparelhos, são 46 ligações. Apenas 24 se completaram em 85 dias: uma a cada 3,5 dias. Mas esse também é um número verdadeiro que mente. Explicarei por quê.
2: Os diligentes investigadores informam que não se conhece o conteúdo das conversas. Ah, que pena!!!!!.
3: Ao leitor, ouvinte ou telespectador desatento, escapa que Aécio era presidente do PSDB e que Mendes era e ainda é presidente do TSE. Naquele período, o Congresso debatia uma reforma política e o projeto que muda a lei que pune abuso de autoridade.
4: As conversas, por óbvio, não poderiam ter nenhuma relação com a Operação Patmos, Joesley Batista e toda essa armação asquerosa porque a dita-cuja foi deflagrada no dia 18 de maio. Aquele vazamento da conversa que não houve entre Joesley e o presidente Temer é do dia 17 daquele mês.
5: Atenção! O único ministro que pegou para si um caso sem que tenha havido sorteio foi Edson Fachin. Foi Rodrigo Janot quem decidiu, ao arrepio da lei e do Regimento Interno do Supremo, que seria ele a cuidar do caso JBS. E Cármen Lúcia anuiu com a ilegalidade. Com Gilmar é diferente. Em todos os casos de que é relator, houve sorteio.
6: E a coincidência entre a ligação do dia 25 de abril e a decisão de Mendes favorável a Aécio? Falemos dela. O imaginoso analista escreve em seu relatório:
Nota-se, conforme destaque deste analista na planilha anteriormente reproduzida, que algumas dessas ligações, ou simples tentativa, ocorreram no dia 25/04/2017, mesma data em que o ministro Gilmar Mendes deferiu monocraticamente requerimento do senador Aécio Neves, relativo à suspensão de interrogatório que seria realizado nesta Policia Federal no dia seguinte, 26/04/2017 (…). Embora não sendo possível afirmar que as ligações havidas no dia 25/04/2017 tenham relação com o requerimento protocolado nesta mesma data pelo advogado do senador Aécio Neves e deferido neste mesmo dia pelo ministro Gilmar Mendes, é de se destacar a coincidência desses contatos”.
7: Perceberam? Restou a ilação no ar. O que o relatório ignora e a imprensa informa, mas esconde, é que o ministro deferiu um pedido para que Aécio não fosse obrigado a depor, em um dos inquéritos antes de conhecer, vejam que barbaridade!, o conteúdo da acusação que delatores haviam feito contra ele. A decisão de Mendes está em consonância com jurisprudência pacífica da Corte.
8: Você não acha, leitor, que é realmente um absurdo que alguém queira ao menos saber do que está sendo acusado antes de depor? Onde já se viu? Desse jeito, o Brasil ainda acaba descobrindo o direito de defesa e o devido processo legal.
9: Bem, era fatal: os idiotas já saíram por aí a disparar sua metralhadora de boçalidades e ignorância.
Eis aí, na sua inteireza, como tem funcionado a República dos Porões, em pleno regime democrático — por enquanto ao menos. Querem algo que chega até a ser jocoso? Há ligações realizadas de… dois segundos!!!! Sabe, leitor, quando você dá dois passos, e a sua conversa via WhatsApp vai para o espaço? Pois é… Até mesmo as ligações que se completam traem o número de conversas. Quantas vezes um bate-papo no WhastsApp só chega ao fim depois de três ou quatro ligações?

Mais: ainda que tivesse dado uma sentença absurda em favor de Aécio, por que Gilmar Mendes teria de falar antes com ele? Em que isso poderia alterar a sua opinião? Em que tal ligação teria beneficiado o senador?
É um despropósito que um relatório como esse seja de domínio público. Qual é o seu objetivo? Qual é a sua utilidade no inquérito? Se não se conhece o conteúdo da conversa e se a coisa não se presta senão à ilação, serve para quê?
Ao se colocar um troço como esse para circular, o único objetivo é pôr sob suspeição uma autoridade. “Ah, mas a democracia não permite?” Desde que existam motivos e que, então, a coisa tenha consequência. Não é o caso. A conversa mole serve apenas ao propósito de atingir a reputação do Supremo.

Que os respectivos comandos da Polícia Federal e do Ministério Público Federal tomem a decisão de fechar os seus porões e enquadrar os seus difamadores. Sempre que alguém me veio com a conversa de que a tortura, durante a ditadura militar, era obra de marginais do sistema, não do regime ele-mesmo, fiz pouco caso da explicação. Reconhecia nos senhores generais autoridade para pôr fim àquela bandalheira. E, quando Geisel quis, a coisa acabou.
É POSSÍVEL CONTAR UM MONTE DE MENTIRAS DIZENDO SÓ A VERDADE

Tratamos agora de coisa distinta, é verdade — embora o linchamento de reputações esteja longe de ser algo indolor ou irrelevante. Mas é de autoridade que se fala aqui. Ou a PF e o MPF põem fim a seus radicais ou serão engolidos pela desordem que estes promovem.  Para arrematar: a nova onda, agora, é tornar públicas meras avaliações feitas “por este analista” que não servirão para nada. Assim, disfarça-se o caráter autoritário e policialesco da prática e sempre se poderá dizer que o “documento” foi obtido legalmente.

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Fonte: Blog do Reinaldo Azevedo