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domingo, 29 de março de 2020

Classe média alta - Quem tem a vida ganha descobriu só agora que o SUS existe - J.R. Guzzo

Gazeta do Povo

Saúde pública, no Brasil, não faz parte do mundo da classe média alta, mesmo a que não é tão alta assim, e muito menos, é claro, a que está ainda acima, nos galhos mais altos da árvore social. Saúde pública é coisa de pobre. SUS? Esperas dez horas na fila do atendimento?Exames clínicos que não podem ser feitos na semana que vem, nem na outra – daqui a três ou quatro meses, talvez? 
Cirurgias sem data marcada, do tipo “tente mais tarde”? É assim que a saúde de milhões de brasileiros é tratada, há 30 anos, todos os dias. Ninguém governos, mídia, “sociedade civil” — dá a mínima para isso. Por que daria? Não é com eles. O povo, como diria um dos famosos personagens de Chico Anísio, que se exploda.

Entra em cena o coronavírus – ah, agora sim, a saúde publica passa a ser prioridade absoluta. O vírus pega geral. Pega, pode pegar, ou vai pegar as classes apresentadas acima. Tudo muda dramaticamente de figura, então. Fecha tudo. Isola tudo. Confina tudo. Proíbe tudo. Para tudo. Dane-se a necessidade de produzir. Dane-se o pobre que precisa de trabalho para comer e sustentar sua família – não dá, para ele, recorrer às reservas de seus investimentos na bolsa ou em CDIs; ou pega no batente todos os dias ou não ganha um tostão, e sem dinheiro ninguém lhe dá nada. Danem-se os empregos, mesmo porque a maioria das classes médias para cima não precisa de emprego para viver, ou pode substituir o seu se perder.

Toda essa gente, hoje, se escandaliza. “Não se pode colocar a economia acima da vida”, dizem, como se uma coisa impedisse a outra. De um minuto para outro, passaram a se preocupar com a “sobrecarga” nos hospitais, problema que jamais lhes tinha passado pela cabeça na vida.  O brasileiro do SUS escuta, pensa e não entende nada. “Sobrecarga”? Mas a gente vive em sobrecarga, o tempo inteiro. Esqueça a falta de leitos. Não há nem cadeiras para o infeliz sentar. Fica jogado no corredor, até aparecer um lugarzinho. Mas o Brasil que está bem de vida, ou remediado, jamais pensa nessas coisas, porque elas não lhe dizem respeito. Poderiam estar acontecendo em Marte.

Agora, com o coronavírus roncando na porta, entraram em pânico. O que não era problema passou a ser. E, como sempre acontece nessas horas, surgiu a necessidade desesperada de achar um culpado. O judas que encontraram, no momento, é o presidente Bolsonaro. O chefe da nação, como se sabe, é um homem que não sabe utilizar direito a palavra. Em 15 meses de Presidência, não aprendeu nada a respeito, ou aprendeu muito pouco.

Resultado: ao falar sobre a epidemia, dizendo até umas coisas perfeitamente razoáveis, não escondeu o que deveria ter escondido, provocou, criticou, falou mal de A, B e C — e com isso abriu a porta para os seus inimigos caírem matando. "Inimigo da saúde pública". "Irresponsável". "Criminoso". "Genocida". “Renúncia imediata”.
Vai ser acusado, já, de deixar o vírus à solta no Brasil, de propósito. 
 [Tem um colunista que chegou ao ponto de propor que o Presidente Bolsonaro, seja denunciado ao Tribunal Penal Internacional, por crimes contra a humanidade.
O mais interessante é que acompanho o trabalho daquele profissional há bastante tempo - tirando essa escorregada, feia mesmo, é um excelente jornalista - e nunca ouvi ele escrever uma palavra condenando a matança da Síria.Nem uma vírgula, contra o tirano Assad.]
Depois, de ter destruído a economia, eliminado 50 milhões de empregos e sabe lá o que mais. As classes médias ficarão aliviadas por terem encontrado um demônio. E a "pobrezada" do SUS vai continuar se explodindo.

J. R. Guzzo, jornalista -  Vozes - Gazeta do Povo


quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

CRIMINALIDADE - "O terror durou uma hora", diz jovem estuprada por seis no Ibirapuera



Moradora de Moema, bairro de classe média alta da capital, e filha de pais advogados, a jovem de 18 anos que sofreu estupro coletivo no Parque do Ibirapuera no último domingo (17) tem dores por todo o corpo, mas o pior de tudo, diz ela, é lembrar das cenas de terror que viveu por cerca de uma hora. “Está difícil até sair de casa. Só quero que tudo isso passe logo. Quero esquecer o que vivi”, afirmou, em entrevista exclusiva a VEJA SÃO PAULO.

Na tarde de quarta (20), a reportagem encontrou a garota e sua mãe no Shopping Ibirapuera. Três dias após o ataque brutal que sofreu no principal parque da cidade, a jovem se mostrou bastante abatida e chorou durante a entrevista. Também apresentava sinais de mal-estar provocados pela medicação pesada que vem tomando para prevenir doenças sexualmente transmissíveis. O tratamento, ministrado pelo Hospital Pérola Byington, referência no atendimento a mulheres vítimas de violência sexual, dura 28 dias.
 Parque do Ibirapuera à noite (Foto: Veja São Paulo)

A estudante, que espera o resultado do vestibular de direito em uma renomada instituição paulistana, contou detalhes do ataque e lamentou o tratamento que recebeu na delegacia ao denunciar o crime. “Eu me senti em um ambiente muito machista. Eles usavam um tom inquisidor: ‘Ah, então você fez isso”; “Você foi até lá?”; “Você estava com ele’. Sempre com olhar de reprovação”, diz a garota. “Não sou essa promíscua que estão dizendo.”

A jovem afirmou ainda que bebeu demais naquele dia e que o rapaz de 19 anos com quem estava antes de ser atacada se aproveitou de seu estado de embriaguez. “Fui ao parque para uma comemoração com um grupo de amigas, acabei bebendo demais e ele se aproveitou de mim, da minha fragilidade, ainda que sem violência”, contou. Ela foi estuprada nas proximidades do Portão 7, que dá acesso à Avenida República do Líbano. O rapaz com que estava fugiu no momento em que os abusadores chegaram. Ele levou o celular da vítima. Na segunda pela manhãfoi detido junto a outros três rapazes. Ouvido pela polícia, foi liberado ainda naquele dia.

Confira abaixo o depoimento da jovem a VEJA SÃO PAULO:
Cheguei ao parque por volta das 16h. Fui até a marquise me encontrar com um grupo de amigas para uma comemoração. Tomei um susto quando vi aquela quantidade de pessoas [ela afirma que só no dia seguinte soube que se tratava de um rolezinho organizado pelas redes sociais]. Por causa daquela ‘muvuca’, decidimos fazer nosso piquenique mais afastado. Sentamos no gramado próximo ao MAM [Museu de Arte Moderna] e por ali ficamos. O pessoal trouxe bastante bebida. Cerveja e vinho, principalmente. Bebemos e não vimos o tempo passar. Até que em um momento, um rapaz se aproximou puxando papo. Era bem simpático. Usava alargadores nas orelhas. Era branco, magro e alto.

Conversamos sobre vários assuntos, de política à educação. E continuamos bebendo. O pessoal com quem eu estava foi se dispersando e, no fim, ficamos só ele e eu. O parque, naquele momento, continuava bem cheio. Era por volta das 19h30, estava escurecendo e eu queria ir embora. Até porque já estava bem mal por causa da bebida. Ele levantou a mão, abriu e mostrou um punhado de droga. Perguntei o que era e ele disse que se tratava de cocaína. Contou que havia acabado de comprar ali no parque mesmo. Lembro de ter ficada assustada e de não ter usado. No meu depoimento à polícia, perguntaram se havia ocorrido consumo de drogas. Eu disse que sim. Mas eles entenderam que eu havia usado, o que eu não lembro ter acontecido. Estamos aguardando o laudo dos exames que vai mostrar isso [o resultado deve sair em 30 dias].

Falei para ele que precisava ir embora e fomos caminhando juntos, de mãos dadas, até o Portão 6. Ele começou a ir para uma área mais escura e com muitas árvores, próximo do local chamado de ‘bananal’, um lugar que eu só conhecia de nome. Sabe quando tem pavor de um lugar? (o local fica próximo ao Viveiro Manequinho Lopes, onde jovens, tanto héteros quanto homossexuais, fazem sexo).
Continuei dizendo que precisa ir embora. Estava muito mal e zonza. Ele foi me forçando. Foi aí que tudo aconteceu. Ele se aproveitou de mim, da minha fragilidade, ainda que sem violência. Eu me vi no chão quando, de repente, num lapso de tempo, eu já não o via mais ali ao lado. Imediatamente, chegaram três homens na minha frente e acredito que mais outros três atrás de mim. Eles me xingavam de p.., de vadia e vieram para cima. 

Eles me colocaram abraçada contra uma árvore, de costas para eles, seguraram meus braços e me estupraram. Foi uma hora de terror. Eu gritei, pedi ajuda, mas chegou um momento de tanto pavor que a voz nem saia de dentro de mim. Eu só queria que aquilo terminasse logo. Quando eles me soltaram dei por falta das minhas coisas. Os estupradores disseram que o rapaz com quem eu estava antes afirmou que era namorado e levou tudo.

Eu saí correndo, chorando, até encontrar um funcionário do parque, que me ajudou a chegar até em casa. Liguei desesperadamente para minha mãe, que estava num jantar, mas não consegui contar o que aconteceu por telefone. Só pedi para ela chegar logo. Entrei em estado de choque sem abrir a boca. Aos poucos, de forma monossilábica, contei o que aconteceu. Eu me senti envergonhada e culpada. Chegamos ao 27º DP [Campo Belo] por volta das 23h para registrar o boletim de ocorrência. Eu me senti num ambiente muito machista. Eles usavam um tom inquisidor: “Ah, então você fez isso”; “Você foi até lá?”; “Você estava com ele”. Sempre um com um olhar de reprovação. Acho que é por isso que as mulheres vítimas de violência não prestam queixa. 

Estou em choque com tudo isso. Não sou essa menina promíscua que as pessoas estão falando. O meu relato à polícia foi deturpado. Se eu estivesse em sã consciência, jamais teria acontecido isso. Ainda mais porque eu que sempre fui àquela pessoa que tem noção do perigo, sempre me previno muito.
Sou grudada com a minha mãe, mando whatsapp de onde estou, que horas vou chegar [a mãe mostra as conversas num smartphone]. Jamais teria chegado perto desse garoto se tivesse o ar de uma pessoa ruim.
Estou com dores na clavícula, nos braços, e meu joelho está todo dolorido. Fui encaminhada ao Hospital Pérola Byington para exames e tomei uma série de medicações e vacinas preventivas contra doenças sexualmente transmissíveis. O tratamento vai durar por 28 dias. Quero que tudo isso passe logo quero esquecer o que vivi. Está até difícil de sair de casa. 


Resumo: Na madrugada desta segunda (18), uma mulher de 18 anos denunciou um estupro coletivo ocorrido dentro do Parque Ibirapuera. Natural de Jundiaí, a vítima afirma ter sido abordada por seis homens no momento em que se relacionava sexualmente com outro rapaz. Ela diz que foi forçada a fazer sexo com todos do grupo. Enquanto isso, seu acompanhante fugiu levando seus pertences. 

O local do crime relatado na ocorrência do 27º Departamento de Polícia foi o portão 6 do parque, que fica na altura do número 950 da Avenida Quarto Centenário. Segundo o boletim, a vítima foi violentada por cerca de uma hora e trinta minutos. A jovem disse ter feito uso de bebida alcoólica e cocaína e foi enviada ao Projeto Bem Me Quer para procedimentos médicos e psicológicos.

Fonte: VEJA São Paulo