Bernardo Mello Franco
O pronto-socorro do doutor Dias Toffoli voltou a fazer milagres no
recesso. Ontem o presidente do Supremo impediu uma operação que mirava o
senador José Serra. A Polícia Federal tentou recolher documentos no
gabinete do tucano, mas foi barrada na portaria. Toffoli atendeu a uma reclamação do presidente do Senado, Davi
Alcolumbre. Eleito com a promessa de renovar a Casa, ele se empenhou na
blindagem do colega. Antes de recorrer ao Supremo, ligou para um
delegado da PF e pediu que o mandado de busca e apreensão não fosse
cumprido. A carteirada funcionou.
Alcolumbre não falou francês, mas seu telefonema lembra a atitude do
desembargador que se recusava a usar máscara em Santos. Irritado com a
multa, o magistrado ofendeu os guardas que faziam seu trabalho. O
presidente do Senado não precisou humilhar ninguém. Apenas usou o poder
para evitar o cumprimento de uma ordem da Justiça Eleitoral. Pouco depois, Toffoli suspendeu de vez a operação. O ministro afirmou
que o mandado de busca padeceria de “extrema amplitude”. Por isso,
haveria “risco potencial” de a PF apreender documentos ligados à
atividade parlamentar do senador.
Na linguagem do futebol, o juiz Toffoli apitou “perigo de gol”. Sua
decisão sugere que os agentes poderiam encontrar provas de crimes
cometidos por Serra no exercício do mandato. Nesta hipótese, o senador
estaria protegido pelo foro privilegiado. É uma linha de raciocínio curiosa. No ano passado, o Supremo enviou o
caso do tucano para a primeira instância. Argumentou-se que as suspeitas
de caixa dois não tinham relação com o mandato de senador. Agora o
presidente da Corte diz que o juiz eleitoral não poderia ordenar a busca
no gabinete. O foro privilegiado não valia, mas voltou a valer.
Como o tribunal está em recesso, o Ministério Público não tem a quem
recorrer. Responsável pelo plantão judiciário, Toffoli decidirá tudo
sozinho até o início de agosto. Quando a folga suprema acabar, a
operação de busca terá deixado de fazer sentido. Se havia algo a ser
encontrado no gabinete de Serra, não haverá mais.
Bernardo M. Franco, colunista - O Globo