J. R. Guzzo
Ministro participou de evento patrocinado por grupo condenado pela Justiça; e se o caso bater no STF?
Houve um incidente no aeroporto de Roma e até agora não está claro o que realmente aconteceu. Pelo que deu para entender, a Polícia Federal e a mídia dizem que o ministro Alexandre de Moraes, a mulher e o filho foram insultados, e até agredidos, por um casal de brasileiros – um senhor de 70 anos e sua esposa.
O acusado nega tudo;
há alegações, inclusive, de que a agredida foi a sua mulher e que o
agressor foi o filho do ministro. Os “especialistas” dizem que pode ter
ocorrido um “ataque ao estado de direito”.
Lula disse que os acusados são “animais selvagens” e precisam ser “extirpados”. Seu ministro da Justiça, também antes da apuração começar, já assinou a sentença de condenação dos suspeitos.
Moraes, ele próprio, até agora não disse nada.
O
ministro, pelo seu comportamento público, não é um homem do silêncio,
da moderação e da harmonia. Em seu inquérito perpétuo (quatro anos, já),
para investigar “fake news” e “atos antidemocráticos, mandou prender,
multar, censurar, bloquear contas, quebrar sigilos legais, indiciar – e
disse, tempos atrás, que “ainda falta muita gente pra prender, muita
gente pra multar”.
Se sofreu um atentado como o que foi descrito, contra
a sua própria pessoa física, o normal é que estivesse tratando o
episódio como um crime de lesa-pátria.
Mas até agora não houve nenhum
terremoto – e, mais que tudo, não apareceram as imagens das câmeras
instaladas no aeroporto de Roma.
O
que se sabe, no mundo das realidades, é a existência de outro tipo de
problema. Segundo noticiou o jornalista Eduardo Oinegue, na Band, o
ministro Moraes foi à Itália para participar de um evento em Siena.
Mas
não era ninguém de Siena, nem da Itália, quem promovia o evento. Era uma
faculdade particular de Direito de Goiânia – uma UniAlfa, que já havia
montado a primeira fase do evento em Valladolid, na Espanha. Dos 31
palestrantes da lista que foi divulgada, 20 eram do Brasil mesmo, e 11
deles da própria UniAlfa.
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É
uma história ruim, mas a parte menos edificante é a própria UniAlfa.
Ela pertence a um grupo empresarial de Goiás que se dedica à múltiplas
atividades – vende refrigerantes, aluga carros, lida com imóveis e,
entre várias outras coisas, tem um laboratório farmacêutico, a
Vitamedic.
É aí que está a dificuldade.
Essa Vitamedic fabrica
ivermectina, uma das drogas que o ex-presidente Jair Bolsonaro
recomendava contra a covid – e que foi amaldiçoada para todo o sempre
pela imprensa, os defensores da democracia e a CPI do “genocídio”.
Poucos dias antes dos colóquios de Siena, a Vitamedic foi condenada pela
justiça do Rio Grande do Sul a pagar uma multa de R$ 55 milhões, por
“danos coletivos à saúde”; a empresa, que faturou R$ 500 milhões com a
venda de ivermectina durante a pandemia, deu apoio ao “kit covid”, um
delito de “fake news” que o STF considera absolutamente hediondo.
Está
certo um ministro do STF aceitar convites como o que recebeu do grupo
que controla a UniAlfa?
Ele, a mulher e o filho?
E se a condenação da
justiça gaúcha acabar batendo um dia no Supremo?
O presidente da
empresa, José Alves, já teve coisas a tratar ali – durante a CPI, na
qual teve de depor, obteve um mandado de segurança contra a quebra do
seu sigilo bancário e telefônico.
O STF atravessa o pior momento de toda
sua história.
Não precisa, positivamente, de histórias como essa.
J. R. Guzzo, colunista - O Estado de S. Paulo