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quinta-feira, 9 de fevereiro de 2017

Estão patrulhando André Lara

O economista não está apanhando pelo que escreveu, mas porque escreveu sobre taxa de juros, tema interditado

No início de janeiro, o economista André Lara Resende publicou no jornal “Valor” o artigo “Juros e conservadorismo intelectual”. Longo e incompreensível para quem tropeça em coisas como “velocidade de circulação da moeda”, o texto trazia uma pergunta: “Como é possível que, depois de dois anos seguidos de queda do PIB, de aumento do desemprego, que já passa de 12% da força de trabalho, a taxa de juro no Brasil continue tão alta, enquanto no mundo desenvolvido os juros estão excepcionalmente baixos?” 

Resende não apresentava a resposta, mas informava que está sendo discutida a eficácia do remédio dos juros altos contra a inflação. É possível que essa receita seja tóxica, e esse é um debate corrente na academia internacional.  André Lara Resende foi presidente do BNDES durante o governo de Fernando Henrique Cardoso e integrou a ekipekonômica que criou e administrou o Plano Real, restabelecendo o valor da moeda nacional.

O artigo recebeu mais ataques que o texto de Carlos Marighella “Algumas questões sobre as guerrilhas no Brasil”, publicado pelo “Jornal do Brasil” em setembro de 1968. Na maioria dos casos, Lara Resende foi contestado sem ser citado, como se fosse um ectoplasma. Assim fez o professor Samuel Pessoa, reclamando porque “propagandeiam-se heterodoxias que vendem ilusões”.  Numa entrevista curta, e por isso mesmo pouco articulada, o economista Arminio Fraga informou que “o André foi provocativo”, reconheceu que esse é “um debate muito especializado” e atirou na testa. Disse que Lara Resende “implicitamente sugeriu que (...) sendo mais agressivo com cortes de juros no Brasil, talvez levasse a uma queda da inflação, o problema é que essa sugestão encontrou terreno fértil no Brasil, que adora um atalho.” 

Quando a repórter Érica Fraga perguntou-lhe “por que o Brasil adora atalhos”, Arminio desconversou. Falar mal do “Brasil” é um dos tiques nervosos da demofobia. Erminio Fraga, Samuel Pessoa e o artigo de Lara Resende são mais inteligentes do que esse tipo de debate. O professor Delfim Netto registrou que “a tribo dos economistas está inquieta”, nem tanto pelo que André disse, mas porque mexeu em coisa que deve ficar fora da agenda: a taxa de juros. Vale reiterar, Lara Resende não defendeu juros baixos, mas, como disse Arminio Fraga, “implicitamente sugeriu”. E isso não se deve fazer, nem mesmo em artigos incompreensíveis para a patuleia.

Os piores atalhos são os que flertam com o silêncio. É quase certo que Fraga e Pessoa conheçam essa história, mas vale recontá-la: Em 1973, a Editora Agir deveria publicar uma nova edição do clássico “Introdução à analise econômica”, de Paul Samuelson. Lá ele condenava as ditaduras dizendo que, mesmo quando produzem milagres econômicos, eles são transitórios. Entre elas, mencionou a ditadura brasileira. A editora não queria publicar a referência, e pressionou Samuelson com a ajuda de dois corifeus do liberalismo econômico nacional, os doutores Eugênio Gudin e Roberto Campos. O atalho do silêncio funcionou, pois Samuelson concordou com a supressão do parágrafo.

Resultado: os jovens americanos que estudaram pela edição americana aprenderam que o Brasil podia quebrar. Os brasileiros só viram a quebra em 1982, quando ela aconteceu.


Fonte: O Globo - Elio Gaspari, jornalista

domingo, 6 de setembro de 2015

Guerrilha controla o norte do Paraguai

Conheça a perigosa guerrilha que controla o norte do Paraguai

O Exército do Povo Paraguaio (EPP) já matou mais de 20 pessoas nos últimos dois anos e alguns se perguntam se o governo de Assunção está realmente tentando combatê-lo

No coração da América do Sul, um grupo terrorista relativamente novo no universo das lutas armadas está tomando o espaço das autoridades locais e provocando rumores de que o próprio governo age como cúmplice do grupo. O Exército do Povo Paraguaio (EPP) foi formalmente fundado em 2008, mas o movimento rebelde por trás da guerrilha marca presença no norte do Paraguai por quase 20 anos.
Guerrilha Exército do Povo Paraguaio(Reprodução/Twitter)

Habilidosos com explosivos e equipados com armas automáticas, os rebeldes do EPP são regularmente ligados a grupos armados estrangeiros, como por exemplo, as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc). Sua ideologia é uma mistura das doutrinas marxista, leninista e guevarista, com uma característica local muito particular: o grupo reverencia o ditador que controlou o país após sua independência, José Gaspar Rodríguez de Francia. O político selou as fronteiras do Paraguai ao comércio exterior para impulsionar o desenvolvimento interno e executou e encarcerou centenas de seus oponentes.

O EPP se financia por meio da cobrança das chamadas "taxas revolucionárias" de donos de propriedades agrícolas locais, contou um fazendeiro da cidade de Horqueta - um dos locais de mais força do grupo - ao jornal britânico The Guardian. "Eles afirmam ser como Robin Hood, roubando dos ricos para dar aos pobres, mas nós somos pessoas que trabalham duro também", contou o homem que pediu para ser mantido em anonimato após ter sido advertido pelas guerrilhas para não falar com a imprensa.

Mesmo com o envio de milhares de soldados e tendo declarado estado de emergência na região, o governo paraguaio parece não conseguir conter o grupo, que opera em algumas centenas de quilômetros quadrados de extensas florestas e propriedades agrícolas que só crescem. Ao todo, o EPP e seus fundadores já mataram mais de 50 pessoas - 25 só nos últimos dois anos - das quais 30 eram civis e 21 policiais ou militares. Em março, assassinaram três fazendeiros paraguaios desarmados, e espalharam panfletos proibindo o cultivo de "soja, milho, ou qualquer outro produto que exija pesticidas" pela propriedade.

Governo omisso - Contudo, a manutenção da força do grupo tem provocado dúvidas sobre o real interesse do estado em combater o EPP, e sobre os benefícios em não acabar com a organização. A ideia de que a guerrilha é um inimigo conveniente e controlável do governo é defendida por Cristóbal Olazar, antigo secretário geral do Movimento Pátria Livre, cujo braço armado se dividiu para formar o EPP, e que agora é informante da polícia. "A corrupção é muito forte entre as organizações de segurança, e não é vantajoso para eles acabar com este grupo, porque isso também acabaria com o seu apoio econômico", afirmou ao Guardian.

Ele alega também que a polícia e a Força-Tarefa Conjunta (FTC) - a força organizada pelo presidente Horacio Cartes para combater os terroristas - são cúmplices no esquema de tráfico de drogas que acredita ser organizado pelo EPP. No final de junho, a Câmera dos Deputados criou uma comissão para investigar as acusações de corrupção na FTC. O clientelismo, cultivado por décadas de regime de partido único e que resultou em funcionários corruptos, que desviam grandes quantidades de dinheiro público, também desmotiva a população a denunciar as ações do grupo terroristas - que fica cada vez mais perigoso.

Fonte: Revista VEJA