Coluna publicada em O Globo / Economia / Política
Há diversas maneiras de solapar a democracia. A mais tosca é o
golpe militar. Um exército liderado por generais, mas também por
políticos civis, simplesmente fecha as instituições.
Isso está fora de moda. Mesmo em 64, aqui, o regime tornou-se militar, mas sempre buscando ares de legalidade.
O primeiro presidente general, quer dizer, marechal,
Castello Branco, foi eleito no Congresso Nacional, inclusive com o voto
de muitos parlamentares que viriam a ser cassados. Juscelino Kubitschek,
por exemplo.
Os demais presidentes também foram eleitos no Congresso,
depois que os generais escolhiam um colega. A oposição permitida, o MDB,
até apresentava candidatos, como a anti-candidatura de Ulysses
Guimarães ou a candidatura de fato do general Euler Bentes.
Quando a oposição parecia crescer, era simples: o regime
fechava o Congresso por um período, cassava parlamentares e juízes,
censurava a imprensa e, pronto, logo voltava à rotina controlada. [Comentário: todas as punições aplicadas eram por violações aos ditames da legislação vigente - ninguém era punido sem o ato punitivo elencar as razões, incluindo as violações às leis.]
Hoje em dia, há modelo mais sofisticado. O exemplo perfeito
está na Rússia de Vladimir Putin. Olha-se pelo alto e parece [se percebe que as normas democráticas são seguidas, respeitadas.] uma
democracia: o presidente é eleito pelo voto direto da população, tem
mandato fixo, o parlamento aprova as leis, os tribunais julgam, jornais
circulam, rádios e tevês estão no ar.
Houve, é verdade, casos extremos. Adversários do regime que
aparecem mortos, mas vejam a situação do mais popular líder
oposicionista, Alexei Navalny. Ele sofreu um atentado, envenenado num
voo da Sibéria para Moscou, mas foi salvo num hospital alemão.
Voltou para a Rússia e aí foi preso, com mandato judicial e
tudo, sob duas acusações: violação da liberdade condicional e fraude.
Foi julgado num tribunal, que ouviu seu advogado, e condenado a nove
anos de prisão.
Outro exemplo, o magnata do petróleo Mikhail Khodorkovski,
que enriqueceu na era Putin, mas violou duas regras estabelecidas pelo
presidente: não abrir meio de comunicação independente; não fundar
partido político liberal.
Foi preso e condenado por fraudes contra o imposto de renda, em julgamento aberto e com direito a defesa.
Qual o truque? Controlar as instituições republicanas por dentro. Um passo
essencial é controlar os tribunais, afastando juízes independentes e
nomeando os amigos do rei. A ditadura brasileira fez isso: aumentou o
número de juízes do STF, nomeou sua turma e depois ainda cassou “os
outros”.
Repararam? Sim, o presidente Bolsonaro cogita exatamente
disso: aumentar o número de ministros da Supremo para nomear os novos e
fazer a maioria.
Só ele? Não. Em 2013, a então deputada Luiza Erundina, com apoio de
advogados ligados ao PT, apresentou proposta de emenda constitucional
que transforma o STF em Corte Constitucional e amplia o número de
ministros de 11 para 15.
Outra forma de solapar a democracia é controlar/intimidar a
imprensa. Na Venezuela, Chávez e Maduro não renovaram o direito de
transmissão de emissoras independentes. É o que deseja fazer Bolsonaro. [nos parece - pensamos que o articulista se refere à renovação da concessão da TV Globo; dia 5, ao que sabemos, venceu a concessão e a emissora pediu sua renovação. O processo está sob exame e certamente até o final deste ano o presidente Bolsonaro, tomará a decisão que lhe compete.]
O PT, no governo, propôs controle social da mídia, ideia
abandonada depois de reação da sociedade civil. Mas Lula já tentou
expulsar o jornalista Larry Rohter, do NY Times. [entre outros comentários o jornalista destacou o estado permanente de porre que o petista vivia.] Mais, como
ex-presidente, pediu publicamente a demissão de uma economista do
Santander que, em análise técnica, disse que a perspectiva de reeleição
de Dilma derrubava a economia. Prefeituras ligadas ao PT ameaçaram
fechar contas no banco.
O Santander demitiu a economista, cujas previsões se realizaram inteiramente.
Eleitores de centro dizem que Lula e o PT estão em outra e que Bolsonaro é ameaça imediata de solapar a democracia.
Verdade. A prova é a tentativa do presidente de usar a PF e o Cade para ameaçar os institutos de pesquisa. [ameaçar??? quem não deve, não teme; se os institutos foram socorridos pelo TSE - sempre decide pró Lula - o correto seria investigar e seria comprovado, nas eleições 2022, o que foi provado em 2018 = as pesquisas mentem.]
Mas incomoda a resistência de Lula em acertar contas com
aquele passado, incluindo a corrupção. Esse acerto e mais a definição de
uma política econômica responsável, acho, consolidariam a vantagem do
ex-presidente. [vantagem???baseada em pesquisas realizadas por institutos que se apavoram em terem suas pesquisas 'pesquisadas]?].
Mas preocupa Lula querer ganhar com um cheque em branco.
Carlos Alberto Sardenberg, jornalista