[importante ter presente que o combate ao PT e a toda a esquerda tem que estar sempre presente, visto que o partido perda total e a esquerda representam o mal que tem que ser combatido sempre, sempre.]
O discurso do presidente Jair Bolsonaro em sua posse foi coerente com
suas posturas de candidato. Retomou suas teses centrais, formuladas no
calor da disputa eleitoral, como se, agora, pudessem simplesmente servir
como orientações de governo. Uma coisa é a campanha, com suas
necessidades retóricas, voltadas para o convencimento do cidadão, outra,
muito diferente, reside nas ideias concretas de governar.
O candidato conseguiu articular em torno de si tanto sentimentos difusos
e setoriais da sociedade quanto posturas focadas em dizer não ao
petismo e ao politicamente correto, identificado com concepções de
esquerda. O combate ao PT foi a sua grande bandeira, fazendo ver à
opinião pública a sua responsabilidade pelo descalabro fiscal, pelo
desemprego, pela ideologização da educação, pela criminalidade
desenfreada e pela corrupção generalizada. Foi, nesse sentido, imensamente favorecido pela escolha eleitoral
petista, que preferiu, ao arrepio da verdade, tornar Lula um perseguido
político, quando não passa de um criminoso já julgado e condenado em
várias instâncias. Em vez de reconhecer a corrupção em seus governos,
optou por se esconder, não assumindo a própria culpa. Poderia ter-se
aberto um novo caminho!
Tampouco foi de valia permanecer no discurso inverossímil do “golpe”,
quando a Constituição foi fielmente obedecida, até mesmo com o
beneplácito de ministros do Supremo que haviam sido escolhidos pelos
ex-presidentes Lula e Dilma. A corroborar sua ausência de visão, deu-se
ao luxo de não comparecer à posse do novo presidente, numa atitude de
não reconhecimento do resultado das eleições e das regras mesmas do jogo
democrático. Pode-se dizer que o PT facilitou a vida do candidato
Bolsonaro. Este, certamente, agradece!
Acontece que o antipetismo, ao aglutinar diferentes formas de oposição e
de descontentamento, terminou por agrupar interesses os mais diversos,
alguns abertamente contraditórios entre si. De modo geral, pode-se falar
de conservadores e liberais, defensores da ordem e da segurança,
partidários da livre-iniciativa e de uma economia concorrencial de
mercado, e assim por diante. Conservadores nos costumes e na educação,
por exemplo, sinalizam para os valores da família, da religião e da
pátria, podendo ou não ser favoráveis a uma economia de livre mercado.
Liberais na economia podem ser radicalmente avessos aos conservadores,
advogando por uma liberdade generalizada.
A base eleitoral do agora presidente Bolsonaro conseguiu reunir essas
diferentes posições, o que fez seu discurso de posse procurar dar
satisfação a todas. Em certo sentido, pode-se dizer que o caráter
abstrato e genérico de suas formulações foi consoante com os diferentes
interesses que abriga em seu seio. Ao procurar atender todos, pouco foi
dito sobre o modo concreto desse atendimento, o que certamente agradará a
alguns e desagradará a outros. A sociedade brasileira reconhece-se em seu novo governante, cuja vitória
não deixa margem nenhuma a dúvidas. Cansou-se do palavreado político em
geral, sobretudo quando constata, em seu cotidiano, uma criminalidade
galopante. Pessoas querem simplesmente caminhar tranquilas pelas ruas,
sem ser assaltadas ou assassinadas. Para elas, bandidos devem estar na
prisão e as leis devem ser implacavelmente aplicadas.
O reconhecimento
nacional da Lava Jato é uma prova disso.
Não tolera o desemprego, fruto
de uma economia emperrada e atravessada por interesses corporativistas,
embora a reversão da curva já tenha sido empreendida pelo governo Temer.
O povo quer um Estado que funcione, atendendo os mais carentes e a
classe média em geral com serviços de saúde e educação consoantes com os
impostos arrecadados. Muito se paga ao Estado e pouco se recebe dele em
retribuição. Em troca, assiste ao deplorável espetáculo de estamentos
estatais usufruindo privilégios e advogando em causa própria por
aumentos salariais, quando outros, na base, nada recebem. Pode-se dizer
que a sociedade se cansou dos privilégios usufruídos por uma minoria que
desconhece o interesse geral.
Bolsonaro soube muito bem capitalizar para si esse sentimento generalizado. Contudo a fase da expressão política popular dá agora lugar à de governar, fazer opções, desagradar e realizar a necessária transformação do País. Governar não é agir numa reunião aleatória de interesses divergentes, mas ver além deles em benefício de um todo mais abrangente, o Brasil. O atendimento de diferentes interesses particulares não significa resolver os problemas prementes do País. As virtudes de um candidato não coincidem necessariamente com as virtudes de um governante ou de um estadista.
Bolsonaro soube muito bem capitalizar para si esse sentimento generalizado. Contudo a fase da expressão política popular dá agora lugar à de governar, fazer opções, desagradar e realizar a necessária transformação do País. Governar não é agir numa reunião aleatória de interesses divergentes, mas ver além deles em benefício de um todo mais abrangente, o Brasil. O atendimento de diferentes interesses particulares não significa resolver os problemas prementes do País. As virtudes de um candidato não coincidem necessariamente com as virtudes de um governante ou de um estadista.
As últimas décadas foram, sobretudo, marcadas por um forte viés
distributivista, como se a função do Estado fosse simplesmente
redistribuir a riqueza segundo os anseios particulares dos governantes
de plantão. A questão da produção de riquezas foi, em boa medida,
relegada, salvo, nestes últimos anos, na política de responsabilidade
fiscal do governo Temer. O novo presidente, por sua vez, deverá contrapor-se a essa tendência
distributivista da sociedade brasileira, o que certamente terminará por
acarretar o descontentamento dos que se sentirem prejudicados. Deverá
ver o Brasil do amanhã, e não somente o das urgências do dia presente.
Dele será exigida a coragem de decidir, de mudar o Brasil.
Para tanto não poderá ficar preso a seus discursos de campanha. Valores
religiosos não são de valia para a condução da economia, por mais que
tenham validade em outras esferas da vida humana. O País exige o que o
próprio presidente chamou de “reformas estruturantes”, dentre as quais a
mais importante é a reforma da Previdência. Sem ela o Brasil soçobrará.
Com ela a Bandeira Nacional não voltará a ser vermelha!
Denis Lerrer Rosenfield - Professor de filosofia na UFRGS