Se
alguém planejasse, não armaria tantas trapalhadas para que tantas coisas dessem
errado em tão pouco tempo
A eleição
do deputado Eduardo Cunha para a presidência da Câmara foi apenas um detalhe na
trajetória de um governo que parece ter feito uma opção preferencial pela
trapalhada. Vale a pena atrasar o relógio.
A
doutora Dilma ainda estava de férias e, em seu nome, saiu do Planalto a bala perdida que acertou a testa do ministro do
Planejamento, Nelson Barbosa. Levou-o a um recuo
público desnecessário, apenas humilhante, por causa de um comentário
genérico sobre o salário-mínimo. Pouco depois, veio outra bala perdida, desta
vez na direção do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, por ter dito que os
critérios do seguro-desemprego estavam ultrapassados, coisa já anunciada pelo
seu antecessor. Isso num governo que
pretende carregar a bandeira de uma “pátria
educadora", e cortou verbas do Ministério da Educação.
Deu-se um apagão no sistema elétrico e o ministro de Minas e Energia
prontamente informou que foi um acidente.
A área técnica do governo desmentiu-o no ato.
Nenhuma dessas coisas precisava
ter acontecido. “Pátria educadora" é conversa fiada. O Planalto não precisa atirar nos
seus próprios ministros. O doutor das Minas e Energia não precisava dizer o que
disse. Finalmente, se Eduardo Cunha tinha uma “ascendência irreversível" na Casa, a
doutora deveria ter percebido que iria para frigideira com o petista Arlindo
Chinaglia.
Quem
seria preferível para presidir a Casa: um
petista, ou qualquer um? Conseguiu-se o milagre de dar conteúdo
oposicionista ao doutor Cunha. Se a desarticulação política do Planalto e do PT tornavam a
derrota inevitável, o ronco de poder emitido pelo comissariado nas
últimas semanas foi apenas uma opção preferencial pela trapalhada. Um miado de leão, rugido de gato.
Essas
foram iniciativas equivalentes à do sujeito que resolve atravessar a rua para
escorregar na casca de banana da outra calçada. Verdadeira mágica, porque do
outro lado da rua havia só a banana de Cunha. Na calçada em que anda o Planalto
há cachos. O ano de 2014 fechou com o maior déficit das
últimas décadas, desmentindo 12 meses de
sucessivas lorotas. A Petrobras
teve seu crédito rebaixado e suas
ações valem menos que dois cocos em Ipanema. Isso e mais a certeza de que a
Operação
Lava-Jato vai desentranhar as contas do PT. (A regulamentação da Lei Anticorrupção está engavetada há um ano.)
O governo resolveu inflar seus
desastres porque,
na batalha da comunicação, egocentrismo e megalomania abafam a rotina. Mesmo
assim, nem tudo são espinhos. Esse mesmo governo mandou passear o lobby das
concessionárias de energia que pretendia espetar na Viúva uma conta de R$ 2,5 bilhões. Mandou passear
também os clubes de futebol com suas dívidas de pelo menos R$ 1,5 bilhão. Muito justamente reduziu o crédito estudantil para jovens com desempenho pouco acima
do medíocre no Enem. Contrariou os barões das escolas privadas, mas conteve a
privatização de seus recursos. Essa batalha ainda não terminou, como ainda não
entrou em cena a das operadoras de saúde, começada nos dias das festas de fim
de ano.
Resta à doutora Dilma
um consolo. Na oposição, a única novidade é que Aécio
Neves deixou a barba crescer.
Por:
Elio Gaspari, jornalista