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domingo, 28 de outubro de 2018

O triângulo da propina que envolve Haddad

O candidato do PT poderia ter renegociado a dívida de São Paulo com Dilma Rousseff, mas, segundo o Ministério Público, ele preferiu participar de uma negociata envolvendo Eduardo Cunha e Leo Pinheiro, da OAS

O ano era 2013. O município de São Paulo, na época comandado pelo hoje candidato à Presidência pelo PT, Fernando Haddad, tinha uma dívida junto ao governo federal de R$ 53,2 bilhões – 13% de sua receita líquida ia para pagar dívidas com a União, que, na época, era também comandada pelo PT, da então presidente Dilma Rousseff. A solução óbvia era renegociar a dívida com seu principal credor, o governo federal. 


Entretanto, o caminho utilizado por Fernando Haddad foi uma parceria com o então deputado federal Eduardo Cunha (MDB-RJ), hoje detido em Curitiba, e o empreiteiro Leo Pinheiro, ex-presidente da OAS, também preso. É o que indicam investigações da Polícia Federal (PF) e do Ministério Público Federal (MPF) obtidas pela reportagem de ISTOÉ. Para o MPF, a triangulação revelaria a confluência de interesses entre o então prefeito petista, o então deputado corrupto e o empreiteiro corruPTor, sempre girando em torno do pagamento de propinas.

Àquela altura, Haddad estava pressionado com os diversos protestos populares fruto dos aumentos nas passagens de ônibus. Precisando de uma solução que lhe garantisse mais recursos, o petista atuou ao lado de Cunha para a aprovação da matéria. Ao mesmo tempo, de acordo com a investigação, integrantes do seu governo tiveram encontros com membros da OAS durante a tramitação do Projeto de Lei. Emails em poder da PF, demonstram constante troca de mensagens entre Cunha, Leo Pinheiro e Haddad sobre o andamento do projeto. O Ministério Público Federal acredita que Cunha recebeu propina da OAS para favorecer Haddad.


As informações que ligam Haddad, Pinheiro e Cunha constam do inquérito da Operação Manus, que investigou superfaturamento na construção do estádio Arena das Dunas, em Natal (RN), caso que levou à prisão o ex-deputado Henrique Eduardo Alves (RN). Além do caso específico do estádio potiguar, o inquérito concentrou outros indícios da relação de Cunha com a OAS. As peças juntadas no inquérito ligam os interesses dos três envolvidos na triangulação. Em 2012, durante a campanha eleitoral, Haddad recebeu doações da ordem de R$ 850 mil da empresa de Léo Pinheiro. À época, a OAS mantinha seis contratos com a prefeitura paulistana, e as dificuldades de recursos da administração municipal, na avaliação do MP, certamente refletiriam na possibilidade de tais contratos serem honrados. Somados, os contratos tinham valor global de R$ 1,4 bilhão. No relatório da Operação Manus, o MPF é explícito: Cunha “atuou em favor dos interesses da OAS relacionados à rolagem da dívida pública do Município de São Paulo, na gestão do prefeito Haddad”. Pela denúncia, Cunha trocou mensagens entre junho e outubro de 2013 com “Léo Pinheiro” justamente falando sobre essa matéria.

“Cunha atuou em favor dos interesses da OAS relacionados à
rolagem da dívida de São Paulo na gestão de Haddad”, diz PF






O governo federal apresentou o Projeto de Lei Complementar 238/2013, que teve como relator o então líder do MDB na Câmara, Eduardo Cunha, no início de 2013. A matéria tratava basicamente da rolagem da dívida da prefeitura de São Paulo e de outras aproximadamente 200 cidades brasileiras. O PLC também mudava os critérios de indexação dos contratos de refinanciamento das dívidas de estados e municípios com a União. Um detalhe que chamou a atenção nas investigações do MPF sobre o tema é que, nas trocas de mensagens deste período, existem indícios de que o ex-secretário municipal de Negócios Jurídicos Luis Fernando Massonetto alertou que um dos entraves para a não aprovação da matéria seria justamente Cunha. “Donato falou que o Sec. De Assuntos Juridicos tinha ligado no Juridico da Casa Cívil (o Manssoneto foi o Juridico de Haddad no Ministério da Educação). Disseram que o Problema era EC (Eduardo Cunha)”, descreve uma das mensagens no celular de Leo Pinheiro. Segundo consta em pesquisa da agenda da Secretaria de Justiça da Prefeitura de São Paulo, Massonetto teve uma reunião com membros da OAS, em 28 de maio de 2013. Justamente antes dessa mensagem disparada por Leo Pinheiro.

Outro trecho da investigação indica que Cunha, além de Leo Pinheiro, também trocava informações com Haddad sobre o projeto. “O próprio Eduardo Cunha conversou com Fernando Haddad antes das alterações”, diz o inquérito. Ou seja, para a PF, Haddad tinha exata noção do que estava sendo discutido na Câmara. Em outra operação, a Catilinárias, os investigadores apreenderam um computador em posse de Cunha no qual havia um e-mail encaminhado para o endereço: claudia.510mederiso@gmail.com com a seguinte mensagem: “depois de conversar com Hadda(d) fiz essas alterações, passe a ele, abs”. No arquivo anexo ao e-mail, havia a minuta do substitutivo apresentado por Eduardo Cunha à Câmara, que depois veio a ser aprovado. Segundo relatório da PF, um detalhe que corrobora a tese é uma outra troca de mensagens entre Leo Pinheiro e Cunha no qual o executivo da OAS questiona: “Ainda hoje te mando o texto que combinamos. A minuta do Fernando vc me manda”. Cunha, então pergunta. “Qual Fernando”. A resposta é precisa: “Haddad”.

O interesse extremo e a participação de Haddad no processo levanta dúvidas da PF e MPF. O problema, no caso, parece ser o caminho que cruza Haddad, Léo Pinheiro e Eduardo Cunha. Ainda mais diante da informação do MPF de que Cunha, ao lado de Henrique Eduardo Alves, teriam recebido pelo menos R$ 4,6 milhões por meio de doações eleitorais como propina pela sua atuação no Congresso, na qual se inclui a aprovação do PLC 238/2013. E de que a OAS recebeu R$ 173 milhões da Prefeitura de São Paulo na gestão Haddad. Destes, R$ 89 milhões em 2014, ano subsequente à aprovação do PLC. Como dizia Tom Jobim: o Brasil não é para amadores.

Leo Pinheiro pagou propina a Eduardo Cunha para agilizar
renegociação da dívida de São Paulo que favorecia Haddad

IstoÉ

 

terça-feira, 13 de junho de 2017

Na cadeia, Henrique Alves encomenda comida de restaurante, afirma MPF

O Ministério Público Federal (MPF) no Rio Grande do Norte emitiu, nesta segunda-feira, 12, um parecer favorável à transferência do ex-presidente da Câmara Federal Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN/governos Dilma e Temer) para Brasília, conforme solicitado pelo juiz da 10ª Vara Federal do Distrito Federal, Vallisney de Oliveira. Os procuradores Rodrigo Telles de Souza e Fernando Rocha de Andrade apontam “regalias”, como o acesso a “mídias proibidas”, refeições encomendadas de restaurantes de Natal e “falta de controle rigoroso sobre visitas”. Eles sustentam que o sistema penitenciário de Brasília está em melhores condições para receber o peemedebista.

O desembargador Ney Belo, do Tribunal Regional da 1ª Região, concedeu, na última sexta-feira, 9, liminar que barrou a transferência do ex-ministro Henrique Eduardo Alves para um presídio em Brasília. Ele está preso preventivamente no Rio Grande do Norte, alvo das Operação Manus, desdobramento da Lava Jato, e de investigação da Procuradoria da República no Distrito Federal.  A Operação Manus investiga fraudes de R$ 77 milhões na construção da Arena das Dunas para a Copa 14. Henrique Alves está sob suspeita de receber propinas das empreiteiras OAS e Odebrecht na campanha eleitoral daquele ano, quando concorreu ao governo do Estado. A ação, executada em parceria entre a Polícia Federal e a Procuradoria da República no Distrito Federal, também apura irregularidades que teriam sido cometidas pelo grupo liderado pelo ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha nas vice-presidências de Fundos e Loterias e Pessoas Jurídicas da Caixa Econômica Federal (CEF).

Em parecer, o Ministério Público Federal relata que o ex-ministro está em uma sala com ar-condicionado, acesso a mídias proibidas e visitas permanentes, “além de outras regalias incompatíveis com o regime de prisão cautelar”.  “Ora, se a ideia da prisão preventiva, em casos que tais, é evitar que o enclausurado mantenha contato externo por conta da garantia da ordem pública, da aplicação penal e da própria higidez da instrução criminal, a forma como o enclausurado é tratado pode tornar ineficiente tal medida drástica”, afirmam os procuradores.

Os procuradores destacam que manifestações anteriores do Comando da Polícia Militar do RN já deram conta de que os quartéis não apresentam as condições adequadas à custódia de presos civis. Na Academia da PM não há sequer fornecimento de alimentação a custodiados.  “Ele, então, pelo menos pelo que se noticia, tem solicitado refeições em restaurantes de Natal, o que configura regalia inconcebível para uma pessoa submetida à prisão preventiva”, reforça o parecer. [Henrique Eduardo Alves, preso preventivamente - no Brasil a prisão preventiva está se transformando em uma sentença sem julgamento e sem data para terminar - tem direito a prisão especial e por isso se encontra recolhido a sala na Academia da PM;
se o local onde está preso não oferece comida e ainda não existe no Brasil a pena de morte por inanição (aliás, existe de forma oficiosa, já que muitos brasileiros, pessoas de BEM, morrem diariamente por falta de alimentação.) acabe ao Estado providenciar alimentação para o preso ou liberar para que o internado adquira as refeições por sua própria conta.
Deixar o preso morrer por inanição é inaceitável e criminoso.] 
 
O MPF também questiona a ausência de um controle rigoroso sobre visitas e contatos, “fato que destoa da própria finalidade da custódia cautelar, que é o de cortar vínculos do preso com o meio político e empresarial criminoso em que vivia”. Nessas circunstâncias, avalia que é “plenamente razoável” a transferência para Brasília, onde há um sistema penitenciário melhor preparado para recebê-lo.  “De resto, lá já tramita ação penal contra ele, com a realização de audiências às quais inclusive ele ressaltou, em audiência de custódia, que fez questão de comparecer pessoalmente”, acrescentam os representantes do MPF.

O MPF cita diversas jurisprudências ressaltando que o direito do preso de permanecer próximo à sua família não se trata de algo absoluto, podendo ceder diante de necessidades da administração penitenciária, como no caso de Henrique Alves. “Quanto à alegação de que a transferência traria custos ao Estado, trata-se de argumento curioso, em especial quando parte de quem é investigado – e até mesmo já acusado – exatamente por desviar recursos e receber milhões de reais em propina.”

O parecer lembra ainda que o próprio Henrique Alves, em meados de 2013, “não viu prejuízo algum ao erário na utilização de avião da Força Aérea Brasileira para transportar ele e sua família para um jogo da Seleção Brasileira no Rio de Janeiro” e conclui que a atual situação é “ilustrativa do prejuízo concreto que anos de descaso com o sistema prisional do próprio Estado de origem, por parte de políticos, podem causar em desfavor deles próprios, em algum dia futuro”.

Os pedidos de prisão preventiva de Henrique Alves e Eduardo Cunha (que já se encontrava preso no Paraná) foram cumpridos pela Polícia Federal no último dia 6 de junho, dentro da Operação Manus. Os dois foram acusados de receber propina em troca do favorecimento de empreiteiras. Na mesma data, foram expedidos mandados de prisão preventiva contra os mesmos envolvidos, pela 10ª Vara Federal do Distrito Federal, dentro das operações Cui Bono e Sepsis.

O MPF relata que, no dia da prisão, na audiência de custódia, Henrique Alves “apresentou certidão da OAB/RN segundo a qual ostentaria a condição de advogado. O órgão ministerial estranhou o fato, pois consulta realizada ao Cadastro Nacional de Advogados – CNA da OAB não apontava nenhum registro de Henrique Eduardo Lyra Alves”.

A OAB/RN esclareceu que Henrique Alves é, de fato, advogado, mas se encontrava em atraso quanto ao pagamento da anuidade, somente vindo a quitar a dívida no último dia 7, já após se encontrar preso. “O pagamento em atraso objetivou apenas assegurar-lhe a condição meramente formal de advogado – já que Henrique Eduardo Lyra Alves na realidade nunca advogou – e o direito à prisão especial prevista no art. 6º, inciso V, da Lei n. 8.906/1994”, observa o parecer.

No mesmo dia 7 de junho, o Ministério Público Federal expediu ofício à Secretaria de Justiça e Cidadania do RN requisitando, com urgência, informações sobre a existência de celas capazes de receber advogados presos no sistema penitenciário potiguar. Porém, de acordo com o MPF, até a elaboração do parecer não havia sido enviada qualquer resposta.
Entretanto, o MPF relata que um pedido formulado por outro investigado preso na operação, Carlos Frederico Queiroz, obteve como resposta a informação de que, em razão da situação caótica do sistema prisional do Rio Grande do Norte, com vários episódios de rebelião e destruição, “não existem unidades com celas para presos com formação de nível superior”.

Diante da falta de estrutura apontada pelos procuradores, no Rio Grande do Norte os presos com diploma de curso superior e advogados estão sendo custodiados em quartéis da Polícia Militar. “No entanto, essa solução deve ser adotada apenas como última opção, somente se for estritamente necessária, não havendo outra alternativa. Isso porque tais unidades não foram concebidas para abrigar presos”, indica o MPF.

Fonte: IstoÉ