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quinta-feira, 28 de fevereiro de 2019

Câmara impõe condições para votar pacote de Moro

Deputados do Centrão usam crise da Receita Federal para condicionar a tramitação de propostas anticrime à votação de projeto de lei contra abuso de autoridade


Líderes de partidos do Centrão querem condicionar a aprovação do pacote anticrime apresentado pelo ministro da Justiça, Sérgio Moro, à votação do projeto de lei que endurece a lei de abuso de autoridade. O texto foi aprovado no Senado em abril de 2017, mas não avançou na Câmara porque ganhou a pecha de anti-Lava Jato, por prever punição a juízes e integrantes do Ministério Público. 

Agora, deputados vão usar a crise na Receita Federal como pretexto para votar o projeto de abuso de autoridade. A articulação é estimulada por ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Integrantes das duas Cortes ou até mesmo seus parentes estão entre os 134 contribuintes alvo de pente-fino da Receita. O vazamento dessas informações provocou reação do Judiciário. Já o Tribunal de Contas da União (TCU) mandou abrir uma inspeção.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou a interlocutores que o pacote de Moro andará no mesmo ritmo do projeto de abuso de autoridade. Procurado para falar sobre esse ponto, Maia não se manifestou. Já o líder do DEM, deputado Elmar Nascimento (BA), afirmou ao Estado que a investigação da Receita foi uma surpresa. 
 “Se fizeram isso com um ministro do Supremo e com a mulher do presidente da Corte, o que se pode fazer com qualquer cidadão? 
Aí é que se pressiona pela votação do projeto de abuso de autoridade”, afirmou o deputado, em referência a Gilmar Mendes e a Roberta Rangel, mulher do ministro Dias Toffoli.

A ministra do STJ Isabel Gallotti também entrou na mira da Receita Federal.   

[da mesma forma que o abuso de autoridade precisa ser contido, é dificil de entender a impunidade dos vazamentos - o Coaf, exercendo suas atribuições legais e de grande importância detectou movimentações atípicas na conta de um ex-assessor de um dos filhos do presidente Bolsonaro;

tais movimentações deviam e devem ser investigadas e tudo esclarecido, mas, por envolver, ainda que indiretamente, um dos filhos do presidente da República, o assunto vazou, vazamentos diários, e até hoje tais vazamentos (criminosos) não foram apurados.

Receita Federal, MP, PF, Coaf e qualquer órgão do Governo Federal tem o DEVER e o DIREITO de investigar o que for da sua competência institucional, encontrando irregularidades aprofundar as investigações, envolver outros órgãos, com competência legal, nas investigações, denunciar, processar e punir.

O inaceitável é que o assunto vaze, especialmente para prejudicar determinadas pessoas em função do cargo que exercem. ]

Em nota, a Receita afirmou que “os indícios originalmente apontados não se confirmaram, razão pela qual os procedimentos de fiscalização não foram instaurados”. O secretário especial da Receita, Marcos Cintra, chegou a pedir desculpas aos contribuintes que tiveram seus dados expostos. Gilmar, por sua vez, reforçou o coro sobre a necessidade de o Congresso votar o projeto de abuso de autoridade. “Está evidente que (o vazamento) virou um festival, um pandemônio”, argumentou ele. 

O líder do PP, Arthur Lira (AL), definiu como “esculhambação” não apenas o vazamento de dados da Receita, como de investigações da Justiça e do Ministério Público. “Sempre defendi o projeto de abuso de autoridade.” No PT, o deputado Paulo Pimenta (RS), líder da bancada, também disse ser favorável a dar prioridade ao projeto que pune desvios de conduta de agentes públicos. “Somos a favor porque todos os setores da sociedade devem ter regras. Sejam deputados ou juízes”, declarou Pimenta. Até mesmo integrantes do partido do presidente, o PSL, admitem votar as duas propostas “casadas”. A deputada Bia Kicis (DF) ressalvou, porém, que a alternativa “não pode prejudicar o pacote de Moro”.  

Penas
O projeto sobre abuso de autoridade prevê mais de 30 ações que podem ser assim classificadas, com penas que variam de seis meses a quatro anos de prisão. Para a força-tarefa da Lava Jato, essas medidas, se aprovadas, acabarão por restringir as investigações. Na prática, a votação conjunta das duas proposições também é uma resposta do Congresso a trechos do pacote de Moro, como o que criminaliza o caixa 2 nas campanhas eleitorais. A medida foi apartada do projeto principal justamente para evitar danos à parte do pacote que trata da segurança pública e do combate ao crime organizado. Na tentativa de obter apoio dos congressistas, o próprio Moro tem adotado discurso mais brando sobre o caixa 2.

Maia ainda avalia se irá ou não instaurar uma comissão especial para analisar o pacote anticrime. Nesse caso, o conjunto de propostas teria de tramitar em diversas comissões temáticas, o que poderia prolongar por anos a análise final. “Ainda não decidi. Vamos analisar isso com calma”, disse Maia ao Estado. A preocupação é evitar que esse debate contamine a votação da reforma da Previdência. A pauta econômica é prioridade não só do governo como do presidente da Câmara. Outro “entrave” ao projeto de Moro é o ministro do Supremo Alexandre de Moraes. Ex-ministro da Justiça, ele integrou uma comissão de juristas que preparou projeto semelhante ao de Moro. Na noite de ontem, os dois se reuniram para tentar uma aproximação.

O Estado de S. Paulo