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terça-feira, 4 de junho de 2019

Jogo de empurra

Governadores e bancadas estaduais querem reforma imposta pelo governo federal. Teriam álibi de terem sido obrigados

O verdadeiro jogo de empurra entre a Câmara Federal e as Assembleias Legislativas para a implantação da reforma da Previdência revela a baixa política em plena vigência. Todos falam em aprovar a melhor reforma possível, mas o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, está claramente sendo empurrado para uma disputa de espaço político com o Executivo que, no momento e a médio prazo não será superada, pois o estilo de Bolsonaro é de enfrentamento, e não de acordos.

Maia nega que esteja disputando espaço. Diz que apenas está atrás da agenda perdida. "Previdência reduz o crescimento da dívida. Sem uma agenda não vamos tirar o Brasil do buraco”. O Congresso está sendo pressionado pelas ruas e não gosta disso; se sente obrigado a aprovar alguns projetos com medo da reação popular, o que não agrada a seus líderes.  Acredito que o Congresso aprovará uma boa reforma da Previdência, pois entendeu que o momento é grave e não é hora de negociações políticas banais em torno de um projeto que é para o país, e não para o governo Bolsonaro.

Mas, com a disputa de espaços políticos regionais, há reações à extensão compulsória da reforma aos Estados e municípios. Os atuais deputados estaduais e vereadores são potenciais candidatos a deputado federal, e por isso os atuais deputados federais querem que os estaduais sejam obrigados a fazer suas reformas regionais para assumirem a responsabilidade da aprovação de medidas impopulares.   Já os governadores e as bancadas estaduais querem que a reforma seja imposta pelo Governo Federal. Assim terão o álibi de terem sido obrigados. Terão também os eventuais benefícios da reforma, sem o desgaste que ela certamente acarretará.

A proposta do governo abarca servidores estaduais e municipais, e obriga os governos regionais a criarem contribuição extraordinária para acabar com os déficits dos seus sistemas previdenciários.  A PEC da reforma autoriza, porém, que estados e municípios decidam suas fórmulas de contribuição no período de seis meses depois de promulgada. Um ponto da reforma é semelhante à do ex-presidente Michel Temer: enquanto não forem aprovados os sistemas estaduais e municipais, eles estarão enquadrados na mesma alíquota da União.
Essa alíquota, de 14%, só poderá ser reduzida pelos estados e municípios não deficitários nos seus sistemas previdenciários. A proposta de Temer dava o mesmo prazo de seis meses para governadores e prefeitos aprovarem reformas nas suas assembléias e, caso isso não acontecesse, automaticamente valeriam as regras de aposentadoria dos servidores da União.  Embora essa decisão não implique em prejuízo para a meta de economizar R$ 1,2 trilhão, se ela não for igual para todos os entes da Federação o esforço para equilibrar as contas públicas perderá boa parte de sua força. O déficit desses entes é de R$ 96 bilhões, o que em 10 anos corresponde à economia total da reforma da Previdência nesse período.

Se a questão dos Estados e municípios não for resolvida, essa pendência quase certamente resultará na necessidade de o governo federal auxiliá-los mais cedo ou mais tarde.  Segundo a Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão de assessoramento do Senado, com a aprovação da reforma, déficits previdenciários do Pará, do Distrito Federal e do Mato Grosso seriam zerados em 10 anos. O mesmo estudo mostra que a redução do déficit continuaria insatisfatória em cinco estados: Minas Gerais, Rio Grande do Sul, São Paulo, Rio de Janeiro e Santa Catarina.

Para a IFI, a aprovação da reforma da Previdência vai estabilizar o gasto previdenciário em um prazo de dez anos. As despesas do Regime Geral de Previdência Social (RGPS) representam 8,6% do Produto Interno Bruto (PIB), e estão crescendo. Com a aprovação da reforma do jeito que foi enviada pelo Governo, subiriam para 8,9% até 2029.  O IFI diz que sem mudanças no sistema, a relação RGPS-PIB poderia chegar a 10,6% num prazo de dez anos. A fragilidade das contas das previdências estaduais, com tendência de alta se nada for feito, indica, para o IFI, que a reforma apresentada pelo governo “é possivelmente o único modo de equilibrar ou ao menos reduzir os desequilíbrios nos estados, em prazo razoável de tempo”.





sábado, 3 de fevereiro de 2018

Lula é apenas o primeiro

No País reinou a calma. Era esperado. E o mesmo vai ocorrer quando da prisão do chefe do petrolão. O Brasil mudou, ainda bem

A condenação de Luiz Inácio Lula da Silva a 12 anos e 1 mês de reclusão – além da pena pecuniária – é um marco político-jurídico. Nunca na história do Brasil houve algum fato que sequer tenha se aproximado ao acontecido no já célebre 24 de janeiro de 2018. Poucos acreditavam que a Justiça fosse igual para todos. O caput do artigo 5º da Constituição era considerado perfumaria, algo para ser lido até com desdém. Isso porque havia brasileiros mais iguais que outros. Porém, juízes identificados com a plenitude do Direito, que julgam independentemente da capa do processo, demonstraram que temos sim Justiça – muito diferente daquela dos tribunais superiores de Brasília.

O sinal dado por Porto Alegre é claro: ninguém está acima da lei. É um recado não somente para Lula mas para toda elite política. Se até ele pode ser condenado (e vai ser preso) por que outros não serão? E são centenas envolvidos nas investigações, alguns já processados e muitos condenados em primeira instância. A fila é longa e deve andar esse ano com novas condenações atingindo políticos de diversos partidos políticos. O País tende, portanto, para um caminho muito distinto do italiano. Lá a Operação Mãos Limpas foi logo controlada pelo poder tradicional. Aqui o processo é distinto e está criando as condições para a efetiva construção da República sob bases democráticas stritu sensu.

O PT tentou desqualificar o processo contra Lula. Perdeu. Depois atacou Sergio Moro. Perdeu também. Aí mirou suas baterias contra os desembargadores do TRF da 4ª Região. Novamente foi derrotado. Lula, como de hábito, usou o partido para seu interesse pessoal. Sabe que sem ele o PT não sobrevive. E dessa vez arrastou toda esquerda. O que foi bom para ele, foi péssimo para o futuro de outras organizações que poderiam – no campo da esquerda – produzir um discurso ético, dissociando-se do PT. Assim, caso se mantenham no apoio a Lula e na desqualificação da decisão judicial, caminham juntamente com o PT para o suicídio político. Muitos temiam a reação popular à condenação de Lula. Os militantes profissionais que acompanharam in loco o julgamento foram embora sem qualquer problema. No resto do País reinou a calma. Era esperado. E o mesmo vai ocorrer quando da prisão do chefe do petrolão. O Brasil mudou, ainda bem.


Marco Antonio Villa - IstoÉ