A categoria pretende pedir novos aumentos de salário com base na indicação de que integrantes das Forças Armadas teriam correção de 23% em troca de mudanças em regras previdenciárias
Servidores civis do Poder Executivo Federal se preparam para pressionar o futuro governo por novos reajustes salariais. Eles tomaram a iniciativa de generais das Forças Armadas de pedir ao presidente eleito, Jair Bolsonaro, reajuste de 23%, em troca das mudanças que o governo pretende fazer na Previdência, como parâmetro para pleitear a correção das suas próprias remunerações. “Em 2016, segundo o Boletim Estatístico de Pessoal (BEP), do Ministério do Planejamento, os militares custaram R$ 57 bilhões ao Tesouro. Estimados 23% desse valor, o impacto financeiro seria de R$ 13 bilhões. Atualizados os R$ 57 bilhões, considerados os aumentos de 2017 e de 2018, o reajuste custaria para a União cerca de R$ 15 bilhões”, estimou Rudinei Marques, presidente do Fórum Nacional das Carreiras de Estado (Fonacate).
Em 2016, a maioria das categorias do topo da pirâmide do Executivo
civil assinou acordo com a ex-presidente Dilma Rousseff, mantido pelo
sucessor, Michel Temer, para um aumento salarial de 27,9%, em quatro
parcelas, até 2019. No mesmo período, os militares receberam correções
diferenciadas, de acordo com a patente, de 24,24% a 48,91%. O soldo dos
generais, almirantes e brigadeiros saltou de R$ 11.800 para R$ 14.031 —
sem contar as gratificações, que variam com o grau de qualificação, de
12% a 150% do vencimento básico. Pelos dados do Planejamento, as
despesas com os militares (ativos, da reserva, reformados e
pensionistas) equivaliam a 22,4% de todo o gasto com salários.
Um
eventual aceno positivo do presidente eleito aos pleitos da caserna
seria imediatamente entendido, na análise de Rudinei Marques, como um
incentivo para o funcionalismo. Principalmente para o chamado carreirão,
que recebeu 10,8%%, em duas parcelas (2016 e em 2017), sem previsão de
novas correções em 2018 e 2019.
Os
23% também devem se transformar no ponto de partida das carreiras de
Estado, para a campanha salarial de 2020. “Os generais estão
certíssimos. Nós vamos também enviar ofício ao governo solicitando
reposição inflacionária, seguindo o exemplo deles e dos membros do
Judiciário, que receberam mais 16,38% nos contracheques”, afirmou Sérgio
Ronaldo da Silva, secretário-geral da Confederação Nacional dos
Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef, que representa 80% do
funcionalismo).
“É importante destacar que R$
15 bilhões são quase três vezes o impacto do tão criticado aumento do
Judiciário, de R$ 6 bilhões anuais. Ou seja, está provado que o cofre
abre se houver conveniência. Nós, da classe dos barnabés, vamos dialogar
e reivindicar os nossos direitos, dessa vez com argumentos sólidos e
sucesso usados por outras carreiras”, afirmou Silva. Para recompor as
perdas salariais, a Condsef quer reajuste de 24% em 2020. “A pressão
agora vai ser maior. Vamos observar com lupa as negociações”, reforçou.
Os
militares, segundo fontes do governo, não tiraram os 23% da cartola.
Fizeram uma troca. Aprovariam as mudanças na Previdência das Forças
Armadas desde que, no mesmo projeto, conste uma cláusula de aumento dos
ganhos mensais do generalato. Na proposta apresentada a Bolsonaro e seu
ministro da Fazenda, Paulo Guedes, admitem ampliação do prazo de
permanência (e de contribuição) dos militares na ativa, de 30 para 35
anos; idade mínima para aposentadoria de 55 anos para homens e mulheres;
e desconto previdenciário para cabos, soldados, alunos das escolas de
formação e pensionistas.
O funcionalismo
está ansioso para saber como o próximo presidente vai equacionar esse
dilema, no pouco tempo que resta até 31 de dezembro de 2018.
“Primeiramente, o presidente vai ter que agradar aos generais, sem
perder de vista a Emenda Constitucional (EC 95) que estabeleceu o teto
de despesas. O segundo passo será incluir esse possível aumento de
gastos no Orçamento de 2019, já entregue ao Congresso, e que precisa ser
aprovado até o fim do ano. E, depois, explicar como vai remanejar as
verbas, indicando a fonte de recursos para o reajuste”, alertou Rudinei
Marques.
Roberto Luis Troster, economista da
Universidade de São Paulo, previu um quadro sombrio para a economia do
país, com aumento da dívida pública e dos índices de desemprego. “Será
um tiro no pé do crescimento. Antes de qualquer reparo nas perdas
salariais, temos que repor os empregos. Tomara que isso não passe de um
gesto sem muita consequência e que o projeto seja engavetado. Do
contrário, o deficit nas contas públicos de R$ 139 bilhões vai
aumentar”, afirmou Troster. No entender de Nelson Marconi, professor de
macroeconomia e finanças públicas da Fundação Getúlio Vargas (FGV), não
há dúvida de que haverá uma enxurrada de pedidos de aumento salarial em
2019. “Essa é a lógica. As categorias de servidores, agora mais
motivadas, vão se preparar para anos sem aumento, o que parece ser a
orientação da nova equipe econômica.”