Sem propostas objetivas para resolver a crise na Saúde, candidatos se expõem às consequências de um ‘estelionato’ eleitoral. O ronco das ruas de 2013 ainda ecoa alto e claro
Faltam
apenas 20 semanas para as eleições gerais. E os 146 milhões de eleitores
continuam na absoluta escuridão, sem ideia de qual é o Brasil imaginado por
candidatos e partidos. Tem-se 18
nomes listados nas últimas sondagens de intenção de voto para a Presidência da
República, mas, até agora, nenhum deles sequer demonstrou preocupação em
submeter ao eleitorado uma proposta alternativa para a crise do Sistema Único
de Saúde (SUS), do qual dependem diretamente 150 milhões de pessoas. [Segurança Pública é importante, essencial mesmo e Bolsonaro tem a solução - bandido não pode encontrar moleza; mas a Saúde Pública é até mesmo mais necessária (apesar de ser inaceitável que pessoas sejam assaltadas na fila enquanto aguardam atendimento médico).
Portanto, senhores candidatos - o que inclui, sem limitar, Bolsonaro, o futuro presidente do Brasil - comecem a apresentar planos para resolver o problema de milhares de pessoas padecendo, morrendo mesmo, nas portas de hospítais;
nada de apenas promessas nem ideias tipo milagre (prometer milagre tem que antes fazer acordo com Deus)
Lembrem-se que também vocês precisam ter planos que sejam exequíveis e eficientes para à Educação e resolver o problema do desemprego (ou pelo menos colocar em níveis civilizados).
Não se assustem que é dificil mesmo; fosse fácil eu também seria candidato.]
Mantêm
silêncio, da mesma forma, sobre suas ideias para acabar com a irracionalidade
dominante nas relações entre os 50 milhões de brasileiros que não dependem do
SUS, porque têm acesso a planos de saúde, e as mais de 800 empresas operadoras
médico-hospitalares. Na crise da Saúde, não há rota de fuga disponível a
candidatos e partidos. Eles sabem que a situação do sistema é insustentável e,
por isso, precisam dizer logo aos eleitores como pretendem resgatá-lo ou
liquidá-lo — nesse caso, explicando o que planejam pôr no lugar.
O SUS é
uma obra de arte política. Nasceu há exatos 30 anos, em circunstâncias de rara
unanimidade parlamentar, em torno da ideia de saúde gratuita para todos. Os
resultados estão visíveis no acesso irrestrito à rede pública de hospitais, no
aumento da expectativa de vida, na redução da mortalidade infantil, na prevenção
(vacinações), nos transplantes de órgãos e no tratamento de infecções pelo HIV. Suas
deficiências são indicadas como principal problema nacional desde junho de
2013, quando centenas de milhares de pessoas saíram às ruas, em todo o país, em
protesto contra a inépcia nos serviços públicos básicos. Detalhe relevante
nessas pesquisas é a boa avaliação do SUS pela massa que dele depende, quando
consegue atendimento.
Na origem
da crise da Saúde está a apropriação privada de fatias do Orçamento público.
União, estados e municípios investem R$ 230 bilhões por ano, o equivalente a
3,7% do Produto Interno Bruto, metade da média dos gastos registrados em
sociedades ricas. Seria irracional propor tão somente um aumento de despesas
numa etapa de virtual falência governamental. Mas a saída, certamente, começa
pela higienização do poder político sobre os contratos. A degradação acelerada
nos serviços é consequência do predomínio de interesses particulares, da
regulação até a fila de pagamentos às empresas.
Os
governos Lula, Dilma e Temer usaram a saúde coletiva como moeda no Congresso.
Permitiram a expansão do loteamento partidário em áreas-chave do Ministério da
Saúde, da Funasa e da agência setorial ANS. Os principais beneficiários (PT,
PMDB e PP) estenderam sua influência aos estados e municípios. É
eloquente que um partido como o PP do senador Ciro Nogueira — recordista em
investigados na Operação Lava-Jato (41% da atual bancada) —, comande o
ministério e a ANS. Ou ainda, que o líder do governo, deputado Aguinaldo
Ribeiro (PP-PB), tenha recebido de presente a nomeação da mãe no comando da
Funasa na Paraíba, 24 horas depois de ter sido denunciado ao Supremo por
corrupção.
Sem
propostas objetivas para resolver a crise na Saúde, candidatos e partidos se
expõem às consequências de um “estelionato” eleitoral. O ronco das ruas de 2013
ecoa alto e claro, cinco anos depois.
José Casado, O Globo