Em entrevista à
repórter Eliane Cantanhêde, veiculada no Estadão, o ex-ministro e
ex-deputado federal Delfim Netto, 87, emitiu opiniões corrosivas sobre
Dilma Rousseff. Admitiu ter votado nela. Mas disse que não repetiria o
gesto. Considera a presidente “absolutamente honesta''. Mas fulmina o
mito da gerentona: “…Ela é simplesmente uma trapalhona.”
Delfim referiu-se à decisão do governo de enviar ao Congresso um
orçamento deficitário para 2016 como “a maior barbeiragem política e
econômica da história recente do Brasil”. Vão abaixo algumas das
declarações do economista:
— Dilma X Ex-Dilma: […]
As pessoas sabem que a presidente é uma mulher com espírito muito
forte, com vontades muito duras, e ela nunca explicou porque ela deu
aquela conversão na estrada de Damasco. Ela deveria ter ido à televisão,
já no primeiro momento, e dizer: “Errei. Achei que o modelo que nós
tínhamos ia dar certo e não deu”. Mas, não. Ela mudou sem avisar e sem
explicar nada para ninguém. Como confiar?
— Direção do vento: Ela
mudou um programa econômico extremamente defeituoso, que foi usado para
se reeleger. Em 2011, a Dilma fez um ajuste importante, aprovou a
previdência do funcionalismo público, o PIB cresceu praticamente no
nível do Lula. Mas o vento que era de cauda e que ajudou muito o Lula
tinha mudado e virado um vento de frente. […] Então, ela foi confrontada
em 2012 com essa mudança e com a expectativa de que a inflação ia
aumentar e o crescimento ia diminuir e ela alterou tudo. Passou para uma
política voluntarista, intervencionista, foi pondo a mão numa coisa,
noutra, noutra, noutra… Aquilo tudo foi minando a confiança do mundo
empresarial e, de 2012 a 2014, o crescimento vai diminuindo, murchando.
— Efeito urna:
A tragédia, na verdade, foi 2014, porque ela [Dilma] usou um axioma da
política, que diz que ‘o primeiro dever do poder é continuar poder’. No
momento em que ela assumiu isso, ela passou a insistir nos seus
equívocos. Aliás, contra o seu ministro da Fazenda, o Guido Mantega, que
tinha preparado a mudança, tanto que as primeiras medidas anunciadas
pelo Joaquim Levy já estavam prontas, tinham sido feitas pelo Guido. […]
O Guido não tem culpa nenhuma. E, para falar a verdade, nenhum ministro
da Fazenda da Dilma tem culpa nenhuma, porque o ministro da Fazenda é a
Dilma, é ela. E o custo da eleição é o grande desequilíbrio de 2014.
— Déficit de credibilidade: Como
a credibilidade do governo é muito baixa, o ajuste que ele [Joaquim
Levy] fez encontrou muitas dificuldades, não teve sucesso porque não foi
possível dizer que o ajuste era simplesmente uma ponte.
— Barbeiragem histórica:
O primeiro equívoco mortal foi encaminhar para o Congresso uma proposta
de Orçamento com déficit. Foi a maior barbeiragem política e econômica
da história recente do Brasil. A interpretação do mercado foi a
seguinte: o governo jogou a toalha, abriu mão de sua responsabilidade, é
impotente, então, seja o que Deus quiser, o Congresso que se vire aí.
— Governo Frankenstein:
A briga interna ocorre em qualquer governo, mas o presidente tem de ter
uma coisa muito clara: ele opta por um e manda o outro embora. Um
governo não pode ter dentro de si essas contradições, senão vira um
Frankenstein. […] Quem tem de sair [Levy, Nelson Barbosa ou Aloizio
Mercadante?] é problema da Dilma, mas quem assessorou isso do Orçamento
com déficit levou o governo a uma decisão extremamente perigosa e
desmoralizadora. E isso produziu um efeito devastador.
— Corte na carne dos outros:
O aumento da Cide seria infinitamente melhor. CPMF é um imposto
cumulativo, regressivo, inflacionário, tem efeito negativo sobre o
crescimento e quem paga é o pobre mesmo. Ele está sendo usado porque o
programa do governo é uma fraude, um truque, uma decepção – não tem
corte nenhum, só substituição de uma despesa por outra e o que parece
corte é verba cortada do outro. Dizem que vão usar a verba do sistema S.
Ora, meu Deus do céu! R$ 1 do sistema S produz infinitamente mais do
que R$ 1 na mão do governo. Alguém duvida de que o governo é
ineficiente?
— Cobra mordendo o rabo: Eles
vão ter de negociar [o pacote fiscal] com a CUT e com o PT, que é o
verdadeiro sindicato do funcionalismo público. Então, é quase
inconcebível e vai ter uma greve geral que vai reduzir ainda mais a
receita. É uma cobra que mordeu o rabo. O aumento de imposto é 55% do
programa; o corte, se você acreditar que há corte, é de 19%; e a
substituição interna representa 26%. Ou seja, para cada real que o
governo finge que vai economizar com salários, ele quer receber R$ 3 com
as transferências e o aumento de imposto. No fundo, o esforço é nulo.
— Em quem votou? Na
Dilma. Mas acho que o Aécio era perfeitamente ‘servível’. Teria as
mesmas dificuldades que a Dilma enfrenta, porque consertar esse negócio
que está aí não é uma coisa simples para ninguém, mas ele entraria com
uma outra concepção de mundo, faria um ajuste com muito menos custo e a
recuperação do crescimento teria sido muito mais rápida.
— Votaria de novo? Não,
primeiro porque ela não pode ser candidata. É preciso dizer que eu acho
a Dilma absolutamente honesta, com absoluta honestidade de propósito, e
que ela é simplesmente uma trapalhona.
— Michel Temer seguraria o rojão? Acho
que sim. Nós somos muito amigos. O Temer tem qualidades, é uma pessoa
extraordinária, um gentleman e um sujeito ponderado, tem tudo, mas eu
refugo essa hipótese enquanto não houver provas [contra Dilma], e vou te
dizer: ele também.
Fonte: Blog do Josias - http://josiasdesouza.blogosfera.uol.com.br/2015/09/20/delfim-a-dilma-e-simplesmente-uma-trapalhona/