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sábado, 9 de outubro de 2021

Câncer: novos medicamentos reduzem necessidade de quimioterapia

Entre os tumores mais beneficiados com a nova abordagem estão os de mama e o de pulmão

 A chegada de medicamentos capazes de atacar apenas as células tumorais promove uma guinada no jeito de tratar o câncer e reduz a necessidade de uso da quimioterapia


 MUDANÇA - Novos ares: após químio, Fátima usa remédios menos agressivos - Egberto Nogueira/Ímãfotogaleria/VEJA

O semblante tranquilo, o sorriso no rosto, o cabelo mais longo, nada faz supor que a aposentada paulista Fátima Aparecida Guerra, de 57 anos, ex-secretária, enfrente um câncer de mama há treze anos. Mais difícil ainda seria imaginar que, desde julho de 2019, ela trate metástases desse mesmo tumor nos pulmões, nos ossos e na região próxima à traqueia. Em 2008, quando a doença foi diagnosticada e o tumor extraído por meio de cirurgia, Fátima era outra mulher. Submetida à quimioterapia, a cada sessão seguiam-se oito dias na cama de intenso desconforto. “Não tinha forças para me levantar”, ela lembra. “Além das náuseas, do cansaço, sentia dores horríveis.” Dez anos depois, quando soube que células tumorais haviam se alojado em outras partes de seu corpo, o filme voltou a sua cabeça. Que angústia pensar naquilo tudo de novo. Felizmente, a história não se repetiu. Em pouco mais de dois anos de tratamento, os tumores diminuíram e Fátima segue forte, sem tanto sofrimento quanto da primeira vez.

Fátima é o retrato feliz de uma guinada espetacular na forma de tratar o câncer, que pouco a pouco tira de cena a quimioterapia para dar lugar a medicações bem menos agressivas e muito mais eficazes. É uma revolução que acontece gradualmente, como em geral são as transformações produzidas pela ciência, e que tem beneficiado milhares de pacientes em todo o mundo. Nessa segunda rodada de tratamento, Fátima, por exemplo, não precisou de quimioterápicos porque está sendo medicada com uma droga que atua de forma seletiva sobre as células doentes, sem danificar tanto tecidos saudáveis. Por isso a redução dos tumores — o ataque é preciso — e a menor ocorrência de efeitos colaterais sobre o organismo da ex-secretária. “Eles nem se comparam ao que acontecia quando eu fazia químio”, diz. De fato, enquanto os remédios modernos têm atuação bem definida, a quimioterapia atinge o corpo todo, matando o câncer mas destruindo também células normais.

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Não surpreende, portanto, que só na semana passada tenham sido aprovados no Brasil dois medicamentos contra ambos. O primeiro é o amivantamabe, da farmacêutica Janssen, indicado contra um tipo raro de câncer de pulmão. O segundo é o trastuzumabe deruxtecan, da Daiichi Sankyo e AstraZeneca, feito contra um tipo específico de câncer de mama. Ele faz parte da classe conhecida como químio inteligente. Isso porque a droga leva até a célula tumoral uma concentração elevada de quimioterápico. Faz isso graças a um anticorpo desenhado para chegar às células desejadas, como um trem com destino certo. Os resultados do remédio foram tão expressivos que a Food and Drug Administration, a agência americana responsável pela aprovação de remédios, decidiu pela liberação depois de analisar as conclusões da primeira fase dos estudos clínicos com a droga. Isso só acontece quando os benefícios são tão espetaculares que não deixam dúvida sobre a pertinência em liberar a medicação. “A altíssima eficácia do remédio pode revolucionar o tratamento do tumor para o qual foi criado”, diz o oncologista Marcelo Cruz, do Hospital Sírio-Libanês, de São Paulo. A estratégia evoca a busca do alemão Paul Ehrlich, prêmio Nobel de Medicina em 1908, por aquilo que ele chamava de “bala mágica”: uma substância tóxica que matasse apenas tecidos doentes.

Quando drogas assim começaram a chegar, não eram consideradas a primeira escolha de tratamento. Isso também está mudando, como disse a VEJA o oncologista Robert Vonderheide, diretor do Penn Medicine’s Abramson Cancer Center, da Universidade da Pensilvânia, nos Estados Unidos, reputado centro de pesquisa e tratamento. “Para muitos pacientes com câncer de pulmão, a quimioterapia não é mais a primeira opção”, diz ele. “Preferimos ir com as terapias-alvo ou com a imunoterapia, abordagens que têm ajudado a revolucionar o cuidado com nossos pacientes nos últimos anos.” A imunoterapia é um tratamento biológico que potencializa a atuação do sistema de defesa do corpo contra os tumores. No câncer de mama, a quimioterapia também é menos usada. Um estudo da Universidade Stanford, nos Estados Unidos, retratou bem o fenômeno. Depois de analisar as respostas de 504 oncologistas e de 5 080 pacientes com determinados tipos da doença em estágios iniciais, o time de Stanford concluiu que o declínio no uso da quimioterapia entre as mulheres foi de 34%, em 2013, para 22%, em 2015. Entre os especialistas, a indicação caiu de 44% para 31% no mesmo período. Um dos desafios dos médicos é saber quando ela é cabível. O que ajuda a esclarecer dúvidas são painéis genéticos que apontam quem se beneficiará da terapia. Uma avaliação desse tipo evitou que 70% de mulheres com câncer de mama em estágio inicial recebessem quimioterapia sem necessidade no Hospital Pérola Bying­ton, em São Paulo.

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Publicado em VEJA, edição nº 2759, de 13 de outubro de 2021

Saúde - VEJA - MATÉRIA COMPLETA


sábado, 14 de dezembro de 2019

Queiroz: câncer de ex-assessor volta a se manifestar, apontam exames - VEJA

O ex-assessor de Flávio BolsonaroFabrício Queiroz, recebeu uma notícia que o deixou arrasado: o câncer que havia sido retirado de seu intestino voltou a se manifestar, dessa vez em nódulos. Ele esteve no hospital Albert Einstein, no bairro do Morumbi, em São Paulo, onde ficou sabendo, na última quinta 12, o resultado de uma colonoscopia junto com a uma bateria de exames pela qual passou recentemente.

Queiroz trata há cerca de um ano uma neoplasia com transição retossigmoide, o mais comum entre os tumores de intestino. Acomete uma a cada dezesseis pessoas até os 90 anos de idade. Ele está localizado no intestino grosso, próximo da saída do reto. Manifesta-se, em geral, por sangramentos. A gravidade é definida não tanto pelo tamanho do tumor, mas se (e quanto) ele atingiu os gânglios linfáticos — há gânglios linfáticos próximo ao reto. Nesse caso, o risco de metástase é alto.

Desaparecido desde que seu nome surgiu em um escândalo que causa preocupação no clã Bolsonaro, Queiroz teve seu paradeiro revelado por VEJA em agosto. A reportagem exclusiva mostrou que ele hoje vive no Morumbi e frequenta o hospital Albert Einstein para o tratamento. Mesmo com o ex-assessor fora dos holofotes, sua situação sempre foi tratada com prioridade na família Bolsonaro. Embora tenha se afastado dele publicamente, o presidente traçou estratégias no campo jurídico e político para as suspeitas não prejudicarem seu mandato.

Até então, a última aparição pública de Queiroz havia sido justamente no Einstein. Em 12 de janeiro, ele postou um vídeo na internet em que surgia dançando no hospital durante a recuperação de uma cirurgia — que custou 64,6 mil reais. A reportagem já informava a suspeita de que o procedimento não teria resolvido o problema do tumor. Os advogados do ex-assessor, um policial militar aposentado, afirmam que ele paga as despesas médicas com recursos próprios ou com o auxílio de seu plano de saúde.

Suspeito de ser o operador do esquema conhecido como “rachadinha”, Queiroz trabalhou no gabinete do hoje senador Flávio Bolsonaro quando ele era deputado na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj) de 2007 a 2018. Ao longo de 2016, o ex-assessor movimentou 1,2 milhão de reais em sua conta bancária, com uma série de saques e depósitos fracionados considerados atípicos pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).

Queiroz e Flávio são alvos do Ministério Público do Rio de Janeiro, cujas investigações chegaram a ser suspensas pelo ministro Dias Toffoli, presidente do Supremo Tribunal Federal, em uma decisão que atingiu todos os procedimentos baseadas no compartilhamento de dados bancários e fiscais sem autorização do Poder Judiciário. O STF reverteu esta medida e deu sinal verde para as apurações no final do mês passado. Ambos sempre negaram as irregularidades.

VEJA - Transcrito em 14 dezembro 2019


terça-feira, 8 de outubro de 2019

Podernite - a doença do poder - Gazeta do Povo

Gaudêncio Torquato


Os governantes, regra geral, padecem de grave doença: a podernite. Que afeta, sobretudo, membros do Poder Executivo, a partir do presidente da República, governadores e prefeitos, podendo, ainda, pegar protagonistas de outros poderes e os corpos da burocracia.  Como todas as ites, trata-se de uma inflamação, que, ao invés de atacar o corpo, invade a alma. Podemos designá-la como a “doença do poder”. Se alguém quiser associá-la ao egotismo, a importância que uma pessoa atribui a si mesmo, está correto, pois os conceitos são próximos.

O presidente Bolsonaro, vez ou outra, avisa que o poder é dele. Inclusive, o poder da caneta BIC, substituída pela caneta Compactor, quando tomou conhecimento que a primeira é de origem francesa. (Bolsonaro, lembremos, azucrinou o presidente Emmanuel Macron por conta da questão amazônica). [Bolsonaro apenas respondeu à altura, em várias lances e de forma contundente, o ato viperino do presidente francês  quando insinuou agredir a SOBERANIA do Brasil sobre a AMAZÔNIA LEGAL, usando o eufemismo = 'internacionalizar'.] O STF, nos últimos tempos, tem pontuado: em última instância, o poder é nosso. A decisão de conceder aos delatados a condição de serem os últimos a falar nas investigações da Lava Jato é um exemplo do poder da última palavra.

O Legislativo, assustado com a invasão de suas competências e queixoso da debilidade do governo na frente da articulação política, assume papel de protagonista principal em matéria de reformas. Nesse ciclo de grandes interrogações, cada qual quer ter mais poder. Até porque no vácuo, um poder toma o lugar de outro. O poder traz fruição, deleite, sentimento de onipotência. Governantes e até burocratas se acham donos do pedaço, tocados pela ideia de que são eles que conferem alegrias e tristezas, fecham e abrem horizontes, fazem justiça.


A podernite tem graus variados de metástase. Nos homens públicos qualificados, talhados pela razão, os tumores são de pequena monta. Nos Estados mais desenvolvidos, com culturas políticas mais evoluídas, a doença não se espalha muito porque as críticas da mídia e de grupos formadores de opinião funcionam como antivírus. Nos Estados menos aculturados, dominados por estruturas paternalistas e sistemas feudais, a doença geralmente chega a graus avançados.

O primeiro sintoma da doença é a insensibilidade. Só ouve o que quer ouvir. O grito rouco das ruas é para eles uma sinfonia distante. Da insensibilidade, deriva a arrogância. Governantes transformam-se em soberanos, querendo que cidadãos vistam o manto de súditos e achando que os programas governamentais constituem um favor e não um dever. Nessa esteira, desenvolve-se o assistencialismo, com pequenos sacos de migalhas distribuídas a esmo.



"LEIA TAMBÉM: Na República, não há poder absoluto
Em um país marcado pela impunidade política, é de se supor que o entendimento reinante no STF talvez estivesse destoando dos fins de uma ordem juridicamente justa..... "

A construção da identidade de um Governo transforma-se, assim, em culto à personalidade, sob os aplausos da plêiade de amigos e oportunistas. Alguns governantes descobriram as vantagens das redes sociais e capricham no envio de mensagens, vídeos e fotos sobre sua performance,  desprezando a sábia lição de nossos avós: “elogio em boca própria é vitupério”.

O obreirismo inconsequente também passa ser eixo das administrações, no fito de fixar marcas. E é porque faltam recursos. Vivemos momentos de quebradeira geral. Mas o “balonismo pessoal” (fenômeno de enchimento do balão do ego) é impulsionado por levas de áulicos. Ocorre que o Produto Nacional Bruto da Felicidade o PNBF não sobe. Os bolsos continuam secando. E a indignação social se expande.

Por isso, as pessoas se afastam dos governantes. Só mesmo grandes sustos – como queda de popularidade – trazem-nos à realidade. Nesse momento, percebem que o poder é uma quimera. Volta-se contra eles mesmos.  Senhores, esta é a dura realidade: a glória mítica de palanques, os palácios, os ministérios e as instâncias da Justiça são coisas passageiras. Mudam como as nuvens. (A propósito, as caravanas que pediam Lula Livre hoje se mobilizam para pedir o Lula Preso. Porque da sede da PF em Curitiba onde está, ele consegue fazer mais barulho do que em seu apartamento de São Bernardo do Campo). Eita, Brasil mutante, ou se quiserem, Brasil do chiste.

Só faltava essa: O procurador de Justiça de Minas Gerais, Leonardo Azeredo dos Santos, ganha R$ 24 mil mensais e garante que esta quantia é um “miserê”. O que dirão os milhões de brasileiros desempregados ou aqueles que põem no bolso o mísero salário mínimo?

Os pacientes de podernite agem como Vespasiano, o Imperador, que, na beira da morte, ficava gracejando numa cadeira: Ut Puto Deus Fio (Parece que Me Transformo num Deus).

Gaudêncio Torquato, jornalista - Publicado na GAZETA DO POVO