Análise Política
O governo ultrapassou seu primeiro obstáculo significativo ao vencer as
eleições para a presidência da Câmara dos Deputados e do Senado Federal.
Não garantiu ali, é verdade, um alinhamento automático, visto que os
parlamentares estão amparados na solução político-jurídica alcançada
para as emendas de relator. Mesmo quem decidir passar os quatro anos na
oposição terá garantido um volume confortável de recursos para as bases
eleitorais.
Mas, com a vitória, o Palácio do Planalto evitou a criação de um foco de
turbulência e um ponto de apoio à atividade institucional da oposição.
Arquimedes já dizia que com um ponto de apoio pode-se mover o mundo. Sem
isso, a oposição continua ilhada num nicho desconfortável, marcado
pelas circunstâncias do 8 de Janeiro e sob a sombra da figura dominante
do ex-presidente, popular, mas politicamente imobilizado, ou quase.
As vitórias no Congresso, entretanto, se evitam turbulências adicionais
prematuras, não alteram o quadro estratégico. O governo eleito ano
passado precisa navegar em meio a 1) um Legislativo de maioria
conservadora; 2) um Judiciário onipresente e onipotente; e 3) Forças
Armadas ressabiadas. [oportuno lembrar que o barco que o governo dispõe se caracteriza pela desonestidade (de uns 50% dos seus membros, começando pelo 'capitão' do barco) incompetência e desorientação total.] Daí que o presidente da República não possa se dar
ao luxo de perder popularidade. E daí a importância da economia no
curto/médio prazo.
Os sinais são contraditórios. O real está ganhando terreno junto ao
dólar, o que vai ajudar a conter a inflação, oferecendo argumentos ao
Executivo na queda de braço com o Banco Central em torno da nossa
exuberante taxa real de juros. Mas, e se o avanço do real decorrer,
principalmente, do belo prêmio oferecido a quem investe em títulos do
Tesouro? Nesta hipótese, estaríamos retornando à armadilha da âncora
cambial.
Que segura a inflação, mas também o crescimento.
E como ficariam, nesse cenário, os sonhos de reindustrialização?
Complicado. Outro fator de complicação: a atividade e o emprego ensaiam
alguma perda de fôlego, até pela defensiva empresarial. Num cenário de
juros reais apetitosos e perspectiva de aumento da carga tributária
(aparentemente, o caminho que o governo escolheu para burilar a
reputação de disciplinado fiscal), é natural que as empresas cuidem
antes de tudo do caixa.
Até agora, sabe-se que o governo quer promover uma reforma tributária,
vai jogar todos os esforços nisso. Quer aproveitar o acúmulo congressual
a respeito para avançar na busca de mais justiça social, por meio de
impostos. É um compromisso de campanha. Mas falta saber que medidas o
governo adotará para estimular o investimento privado, sem o que
qualquer expectativa de crescer e criar empregos é quimera.
Parafraseando Deng Xiaoping, a discussão econômica tem girado em torno
da cor do gato, sem que se tenha muita informação sobre como ele vai
caçar os ratos.
Alon Feuerwerker, jornalista e analista político
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