É próprio de governos com espírito autoritário querer uma ligação
direta com a população, prescindindo, ou pelo menos relegando a segundo
plano, os canais comuns nos regimes democráticos: partidos políticos,
imprensa livre. Na sua forma mais radical, a democracia direta se
utiliza de plebiscitos, que podem ser manipulados, para consultar o povo
sobre decisões importantes.
Quando esse sistema é usado localmente, como nos Estados Unidos e em
alguns países da Europa, para decidir questões que atingem o dia a dia
de uma comunidade, o plebiscito é um instrumento democrático eficiente.
Mas, quando se quer informar à população só o que interessa ao governo, a
comunicação direta se transforma em mera ação de propaganda.
Foi por isso que nasceu a “Voz do Brasil”, propaganda política do
governo Getúlio Vargas coordenada pelo tristemente famoso Departamento
de Imprensa e Propaganda (DIP) da ditadura da ocasião. [importante ter em conta que quando a VOZ DO BRASIL foi criada, a comunicação no Brasil, até a via rádio, era ineficiente, o que tornou aquele recurso um importando meio de comunicação, noticiando FATOS e não narrativas.
Felizmente a TV do apedeuta sempre teve índice de audiência inferior a 0,1%.
Curioso é que o ilustre articulista inicia deixando a impressão de que vai criticar o atual presidente, mas como já virou rotina na mídia militante o alvo é o ex-presidente Bolsonaro = o inesquecível.] Com os modernos
meios de comunicação, primeiro a televisão, depois especialmente os
digitais, a tentação de atingir milhões de cidadãos cresceu, e no
primeiro governo Lula foi criada a Empresa Brasileira de Comunicação
(EBC). Teoricamente, seria uma rede de comunicação pública, com
emissoras de televisão, rádio e programação de internet.
Transformou-se, na prática, em instrumento de propaganda política, que
teve no governo Bolsonaro seu ápice oficialista, transmitindo todas as
ações do presidente da República, discursos em formaturas de militares
especialmente, já indicando o caminho de politização das Forças Armadas
que forjava desde o início do mandato. Só não foi mais efetivo pela
audiência praticamente nula. Um exemplo de como a ideia de empresa
pública se diferencia da máquina de propaganda governamental é a decisão
da nova direção da EBC de adotar a tese petista de que o impeachment da
presidente Dilma foi um golpe parlamentar.
(...)
Agora, anuncia-se que o
presidente Lula pretende adaptar a seu estilo a comunicação
governamental, usando podcasts para se dirigir diretamente ao
eleitorado.. O presidente Lula teve bons porta-vozes nos
dois primeiros mandatos, mas agora parece disposto a ser ele mesmo seu
porta-voz, falando quando quiser e sobre o que quiser. [haja paciência para escutar o festival de besteiras que o referido cidadão vai expelir - besteiras, mentiras e coisas do tipo = será uma versão piorada do falecido COMA andante Castro.]
(...)
O podcast a ser criado é uma consequência dessa decisão de não ter
intermediários na comunicação com o povo. Uma das principais armas do
político Lula é a oratória, por isso o tratamento de sua doença teve de
ser adaptado para ele não correr o risco de perder a voz. Nos podcasts
poderá desenvolver essa aptidão e também aparecer com imagens no YouTube
durante a gravação. No final das contas, o formato é outro, mas o
conceito é o mesmo: falar o que quiser, na hora que quiser, sem
contestação.
Merval Pereira, colunista - O Globo
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