Comissão da Verdade relatará agressões a
homossexuais na ditadura
Recomendação
será de indenizar quem foi perseguido pelos militares por ser gay
Cerca
de 20 páginas do relatório final da Comissão Nacional da Verdade (CNV), que será entregue à
presidente Dilma Rousseff no próximo dia 10, descreverá
uma série de violações aos direitos dos homossexuais cometidos pela ditadura
militar. A inclusão aconteceu na fase de conclusão do relatório, depois
de longa discussão entre os integrantes da comissão. Alguns eram contrários à
existência de um capítulo específico para tratar do assunto e advogavam por um
texto único que unisse a violação contra homossexuais, mulheres e crianças. Foi
voto vencido. [obviamente que tinham que ser voto
vencido; afinal, não tem o menor sentido juntar homossexuais com mulheres
(claro, as não homossexuais) e
crianças.]
O
trabalho, organizado pelo brasilianista americano James Green, da Universidade
Brown, e por Renan Quinalha, assessor da Comissão Estadual da Verdade de São
Paulo, mostra como a homossexualidade foi objeto de perseguição, pois era
confundida com subversão e considerada um agravante para os presos políticos.
No texto
enviado à CNV consta que “agentes do SNI
e da Polícia Federal incluíam, nos seus relatórios sobre subversão, detalhes
sobre pessoas que relacionavam diretamente o comportamento sexual ao perigo que
representavam ao Estado. Detalhavam assim essas pessoas vistas como
ameaçadoras: ‘Consta ser pederasta' ou é ‘Elemento homossexual passivo’”.
— Não houve uma política de Estado para
exterminar os gays, mas a homofobia era sim uma prática institucionalizada pelo
regime — afirmou Renan Quinalha, cujas conclusões foram recém-lançadas no livro “Ditadura e homossexualidades”.
O caso
mais ruidoso apontado pelo trabalho foi o expurgo
de homossexuais do Ministério de Relações Exteriores comandado pelo então
ministro Magalhães Pinto, em 1969. O fato foi relatado pela primeira vez pelo GLOBO há cinco anos. De acordo com
documentos sigilosos do Arquivo Nacional, Magalhães Pinto determinou um “rigoroso exame dos casos comprovados de
homossexualismo de funcionários do ministério suscetíveis de comprometer o
decoro e o bom nome da casa, tendo em vista o possível enquadramento dos
indiciados nos dispositivos do Ato Institucional nº 5”.
Nos casos
em que os investigadores tiveram dúvida sobre a orientação sexual dos
investigados, o chefe do Serviço de Assistência Médica e Social do ministério
sugeriu a realização de exames proctológicos. Por “prática de homossexualismo, incontinência
pública escandalosa”, sete
diplomatas foram afastados do Itamaraty. Outros 10 constam como suspeitos. [o servidor público tem que ter dignidade; e tal requisito, importante
para qualquer função pública, se torna mais essencial se o funcionário
representa o Brasil, exerce função diplomática, ainda que em nível subalterno.
A dignidade é inerente à função
pública – só de 2003 para cá é que a função pública passa por um processo de
aviltamento que só será encerrado com o expurgo de toda a esquerda nojenta, a
petralhada corrupta.]— Supomos que tenha acontecido
perseguição em outros ministérios, mas será preciso mais investigação — diz
Quinalha.
Entre
as recomendações da CNV está a indenização dos perseguidos pelo regime militar
por serem homossexuais. Militantes
do movimento gay elogiaram a iniciativa, embora nem todos concordem com a visão
de Quinalha de que a homofobia fosse política de Estado. — O preconceito era arraigado na sociedade. Assim
como a direita achava que ser gay era um atentado aos bons costumes, para a esquerda a homossexualidade era tida
como um vício pequeno burguês — afirmou João Silvério Trevisan,
um dos jornalistas responsáveis pelo primeiro jornal gay brasileiro, “O Lampião da Esquina”, que circulou
entre 1978 e 1981.
Fonte: O Globo