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quarta-feira, 5 de outubro de 2022

Um tribunal que joga contra Bolsonaro - Revista Oeste

Cristyan Costa

Durante as eleições, o TSE censurou peças de campanha do presidente e permitiu que adversários atacassem a reputação do chefe do Executivo

Apesar de todo o empenho dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a ofensiva contra a candidatura à reeleição do presidente Jair Bolsonaro, por ora, não surtiu efeito. Nesta segunda-feira, 3, ao contrário do que apontavam as pesquisas, as urnas mostraram que haverá um segundo turno entre o chefe do Executivo e Lula.

Lula, na posse do Alexandre de Moraes no TSE, com Gilmar Mendes e em clima amistoso com o ministro do TSE Benedito Gonçalves | Foto: Montagem Revista Oeste/STF/SCO/Reprodução

 Lula, na posse do Alexandre de Moraes no TSE, com Gilmar Mendes e em clima amistoso com o ministro do TSE Benedito Gonçalves -  Foto: Montagem Revista Oeste/STF/SCO/Reprodução

Censura
Desde o início da campanha eleitoral, o TSE proferiu 19 decisões que, de alguma forma, tentaram atrapalhar a campanha de Bolsonaro, contra oito com potencial de prejudicar Lula. A mais recente ocorreu há cinco dias das eleições. Na semana passada, a Corte proibiu o presidente de fazer lives nas residências oficiais. O plenário referendou uma decisão do ministro relator da causa, Benedito Gonçalves, a pedido do PDT.

Apesar dos argumentos do voto divergente do ministro Raul Araújo, que trucidaram a tese segundo a qual fazer lives nos palácios do Planalto e da Alvorada configura “abuso de poder político”, os ministros Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia e Alexandre de Moraes seguiram o relator. Araújo recordou que o TSE não barrou condutas semelhantes a outros ex-presidentes, como Lula e Dilma.

O plenário fechou com a ministra Cármen Lúcia e negou um recurso da campanha do presidente para tirar do ar vídeos em que Lula chama Bolsonaro de “fascista”, “negacionista”, “miliciano” e “mentiroso”

“Parece-me que há a tentativa de impedir o presidente de fazer uso de um veículo de comunicação importante com os eleitores, de baixo custo, e que democratiza a campanha eleitoral”, acrescentou Carlos Horbach. O ministro ponderou que a decisão significaria um “custo considerável” à campanha de Bolsonaro, em virtude dos deslocamentos que serão necessários para as lives.

Na sequência, a ministra Maria Cláudia Bucchianeri lembrou que, em 2014, a candidata à reeleição do PT, Dilma Rousseff, concedeu entrevista ao Jornal Nacional, da Rede Globo, no interior do Alvorada. Além disso, durante a pandemia de covid-19, políticos recorreram a lives, muitas delas em residências oficiais, observou a juíza. “Qual é a diferença entre uma live feita pelo candidato A com um fundo branco de dentro da residência oficial e outra por candidato B feita em um fundo branco em um hotel?”, comparou a juíza.

Ainda na sessão, o presidente do TSE, Alexandre de Moraes, não conseguiu esconder o desprezo pela divergência dos colegas, ao fazer um gesto de “degola”, depois de o ministro Araújo discordar do relator. Após o episódio, Moraes explicou que estava dirigindo-se a um de seus assessores, que não passara informações importantes referentes ao julgamento, em tempo hábil para o ministro.

Alexandre de Moraes faz sinal de degola durante
 julgamento no TSE Imagem: Reprodução/TSE

Um dia antes desse revés, o TSE proibiu Bolsonaro de usar na campanha imagens de um discurso na ONU. A liminar havia sido concedida pelo ministro Gonçalves na semana anterior, novamente atendendo ao PDT. A sigla alegou que Bolsonaro “feriu a isonomia” e, com as fotos e vídeos, poderia valer-se de uma suposta vantagem (a condição de presidente), que os outros candidatos não têm.

O mesmo ministro também é o responsável por impedir Bolsonaro de fazer uso de um discurso que proferiu a apoiadores em Londres, antes de comparecer ao velório da rainha Elizabeth II. Do alto da varanda da residência oficial do embaixador do Brasil no país, o presidente defendeu a liberdade e ressaltou a importância do conservadorismo. A decisão de Gonçalves, que acolheu uma ação da senadora Soraya Thronicke (União Brasil-MS), foi referendada pelo plenário, dias depois.

Tampouco as imagens do 7 de Setembro puderam ser usadas por Bolsonaro. A decisão do ministro Gonçalves proibiu o governo de valer-se de fotos e vídeos, durante a campanha. Ao acatar um processo movido pelo PT, o juiz do TSE argumentou que Bolsonaro poderia praticar “abuso de poder político” contra adversários. “A medida do TSE violou a liberdade de manifestação do presidente”, constatou o jurista Dircêo Torrecillas Ramos, membro da Academia Paulista de Letras Jurídicas. “Todos podem reunir-se pacificamente em locais abertos ao público. Bolsonaro soube dividir os atos em dois: o desfile do Dia da Independência e, depois, sem a faixa presidencial, discursou para apoiadores. Não precisaria proibir o presidente.”

povo na rua - Sete de Setembro
Vista aérea da Avenida Paulista, em São Paulo, 
no 7 de Setembro de 2022 | Foto: ChoiceImages/Revista Oeste

O jurista Adilson Dallari acrescentou que, como justificativa, alegou-se que as festividades foram custeadas com recursos públicos. “Recursos públicos custearam as despesas da cerimônia oficial de Brasília, onde o presidente compareceu usando a faixa”. observou. “Nas outras manifestações, custeadas por particulares e por fundos de campanha, o candidato compareceu nessa qualidade. No fundo, o ministro Benedito Gonçalves atendeu a um pedido de Lula, a quem deve sua designação para o STJ.

Michelle Bolsonaro também tornou-se alvo do TSE. No mês passado, uma campanha pró-governo com a primeira-dama foi censurada pela Corte. Isso porque Michelle apareceu no vídeo por tempo superior ao limite de 25%, previsto em lei, para apoiadores que participam da campanha. “Normas do TSE limitam o tempo de manifestação de apoiadores”, disse Dallari. “No caso, a alegação é que o tempo máximo teria sido ultrapassado. Obviamente, o correto seria cortar o excesso, e não proibir a propaganda inteira.”

A mesma regra que o TSE usou para enquadrar a primeira-dama não valeu para Lula. Advogados do presidente Jair Bolsonaro foram ao TSE contra o uso de imagens de uma superlive entre o petista e artistas. O ministro Gonçalves manteve a peça no ar e pediu ao PT que apenas retirasse determinados trechos da propaganda em que os famosos cantam o jingle do ex-presidente.

Se a primeira-dama entrou na mira do tribunal, os eleitores do presidente não poderiam ficar de fora. Com uma canetada, a ministra Cármen Lúcia mandou remover outdoors com mensagens de apoio a  Bolsonaro nas ruas de Brasília. A juíza deu 24 horas para a empresa responsável tirar os painéis, caso contrário, teria de pagar multa diária de R$ 1 mil, acatando um pedido do PDT.

Assassinato de reputação
O TSE legitimou ainda uma série de ofensas e acusações da esquerda dirigidas a Bolsonaro. O plenário fechou com a ministra Cármen Lúcia e negou um recurso da campanha do presidente para tirar do ar vídeos em que Lula chama Bolsonaro de “fascista”, “negacionista”, “miliciano” e “mentiroso”. O argumento da relatora, seguido pela maioria dos magistrados: liberdade de expressão. “Como antes decidido por este tribunal, não é qualquer crítica contundente a candidato ou ofensa à honra que caracteriza propaganda eleitoral negativa antecipada, sob pena de violação à liberdade de expressão”, argumentou Cármen.

Bolsonaro também não pôde defender-se de uma reportagem do UOL, veiculada por alguns candidatos, que informa que o presidente e sua família compraram imóveis em “dinheiro vivo”. Conforme demonstrou reportagem da Revista Oeste, o termo “moeda corrente” usado pela notícia não tem relação com pagamentos feitos em espécie. A expressão significa dinheiro utilizado em um território. O TSE, contudo, não autorizou o presidente a rebater os ataques.

Além disso, a Corte Eleitoral manteve no ar o site de fake news “Mulheres com Bolsonaro?. Entre outros posts, o blog acusa o presidente de agredir mulheres, violar direitos de empregadas domésticas e defender o assassinato de uma deputada. O site não apresenta conteúdo eleitoral, pois em nenhum lugar faz menção ao pleito vindouro, mas tão somente colaciona matérias jornalísticas, já divulgadas em diversos veículos de imprensa”, sustentou a juíza do TSE Maria Cláudia Bucchianeri.

Parcialidade
Para Ivan Sartori, ex-presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, o TSE tem agido com parcialidade. “O TSE vem exercendo um papel bem restritivo sobre a campanha de Bolsonaro”, observou Sartori. “O presidente tem sido muito constrangido. Recentemente, durante a sessão que o proibiu de fazer lives nas residências oficiais, houve até um gesto de degola por parte do presidente do TSE. As sessões exigem respeito à liturgia do cargo.”

“O jornal New York Times comparou as Supremas Cortes dos EUA e do Brasil, dizendo que aquela era exclusividade jurídica e esta atuando politicamente, constatou o jurista Ives Gandra da Silva Martins. “Concordo com o jornal, como também na atuação política do STF, com uma tendência a atingir mais os conservadores do que os militantes da esquerda.”

Leia também “Alexandria, 2026”

Cristyan Costa, colunista - Revista Oeste


sábado, 16 de março de 2019

Para atirador da Nova Zelândia, diversidade é sinal de fraqueza do Brasil

O australiano Brenton Tarrant abriu fogo contra fiéis de duas mesquitas e matou 49 pessoas; governo promete rever lei sobre posse de armas

Em seu manifesto “A Grande Substituição”, de 74 páginas, o australiano Brenton Tarrant mencionou o Brasil como exemplo da fraqueza de nações diversas, assim como os Estados Unidos e a África do Sul. Na manhã desta sexta-feira, 15, Tarrant atirou contra fieis muçulmanos nas mesquitas Al Noor e Linwood, na cidade de Christchurch, na Nova Zelândia. Matou 49 pessoas.

O atentado é considerado o mais devastador da história da Nova Zelândia. Segundo a primeira-ministra neozelandesa, Jacinda Ardern, tratou-se de um “ato de violência sem precedentes”, que a levará a propor mudanças na lei sobre posse e porte de armas de fogo.“O Brasil, com toda a sua diversidade, é completamente fraturado, como Nação, onde as pessoas não podem se dar bem, se separar, e se segregar sempre que possível”, escreveu o autodeclarado “supremacista branco”.

Os americanos, para o terrorista, estão a ponto de se “quebrarem em pedaços entre si” por causa da diversidade racial. A África do Sul, mencionou, está se tornando um lado ensanguentado, com à medida que a diversidade aumenta.  “A diversidade não é uma força. Unidade, propósito, confiança, tradição, nacionalismo e nacionalismo racial é o que resulta é força. Todo o resto é apenas frase de efeito.”

Nesse capítulo sobre a diversidade de seu manifesto, Tarrant queixa-se das atuais convicções expressas pela imprensa, políticos, educadores e celebridades de que a variação étnica é a grande força das sociedades. “Enquanto isso, as nações ‘diversas’ do mundo são palcos de conflitos sociais, políticos, religiosos e étnicos sem fim”, argumentou.

 

O manifesto foi publicado em uma plataforma virtual da chamada “dark web”, onde circulam informações e negócios ilegais, e em um perfil no Twitter.  

Tarrant, um personal trainner de 28 anos, se diz  “fascista etnonacionalista” e “homem branco comum”, afirma que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, é “um símbolo da identidade branca renovada” e alega ter recebido a “bênção” do terrorista de extrema direita Anders Breivik, que matou 77 pessoas na Noruega há oito anos.



Revista VEJA



sábado, 13 de outubro de 2018

Os números elegem Bolsonaro

Bastam-lhe os votos dados a João Amoedo, Cabo Daciolo e Henrique Meirelles, que guardam perfil claramente antipetista.


O espírito plebiscitário manifestou-se já no primeiro turno, visível na escassez de votos a candidatos outrora competitivos, de grandes partidos, como PSDB, PMDB e PDT.
O eleitor percebeu, desde o início, que havia – e há – apenas dois lados em disputa, projetos antagônicos. E antecipou sua escolha. A diferença expressiva de votos pró-Bolsonaro não se reverterá. É impensável que alguém que abraçou o seu ideário venha a fazer opção oposta, já que o voto, de ambos os lados, teve o sentido de legítima defesa. Foi – e é – uma eleição binária.

Resta saber de onde os dois finalistas poderão buscar votos suplementares. E aí a vantagem também é de Bolsonaro. [o sistema de só importar os votos válidos dispensa a busca pelos finalistas de votos suplementares.
Vejamos: suponhamos hipótese não tão improvável, que com as alterações que a equipe de campanha do poste petista Haddad fez no design da campanha do laranja, desfigurando símbolos tradiocionais do ex-partido dos trabalhadores,  ofenda alguns militontos, que, em protesto optem pelo voto nulo e branco e com isso Haddad obtenha menos votos no segundo turno que no primeiro - já ocorreu com o Alckmin e pode ocorrer com Haddad (ninguém imaginava que ele perderia a eleição na qual pretendia ser reeleito prefeito de São Paulo, no primeiro turno e para o novato João Doria.
Na mesma linha de raciocínio suponhamos que Bolsonaro receba mais alguns milhões de votos.
Com isso Bolsonaro passa a ter percentual superior a 50% dos votos válidos, vencendo a eleição.
O importante para ele ser o vencedor é que alcance mais da metade do total de votos válidos.]
O fiasco dos partidos de esquerda, aqueles cujos votos podem reverter em massa para HaddadPsol, Rede e PDT –, indica que essa transferência já ocorreu no primeiro turno.
A votação somada desses partidos não muda o destino eleitoral de Haddad, que precisa crescer mais de 20 pontos percentuais para que sua votação em primeiro turno atinja a maioria absoluta. Já Bolsonaro, considerando-se os números do primeiro turno, está a 4,5 pontos percentuais da vitória.  Bastam-lhe os votos dados a João Amoedo, Cabo Daciolo e Henrique Meirelles, que guardam perfil claramente antipetista.

Há ainda os votos do PSDB, que devem se dividir, dado o perfil centrista do partido. FHC quer apoio ao PT; Dória, que disputará em segundo turno o governo de São Paulo, e Anastasia, que disputará o de Minas, já declararam apoio a Bolsonaro. Idem a candidata a vice de Alckmin, senadora Ana Amélia. O Centrão, que se aliou aos tucanos, já avisou que não apoiará o PT (seu companheiro de viagem ao longo dos governos Lula e Dilma).

O PDT, de Ciro Gomes, embora aparentado ideologicamente ao PT, fez exigências tais a Haddad que sugerem que não quer se comprometer. Pediu apenas, para começar, a Casa Civil, o Ministério do Planejamento e o Banco do Nordeste.  São cofres que o PT seguramente não dispensará. Ciro, magoado com Lula, por não tê-lo escolhido, optou por sair de cena.  A tentativa desesperada do PT de obter votos fora de sua seara, buscando atrair os eleitores que se abstiveram – e que somam 29 milhões -, fez com que, no espaço de três dias após o primeiro turno, adotasse uma estratégia patética, que beira o ridículo e rompe com todo o seu passado: “renunciou” a seus símbolos e programa.

Mudou as cores do partido, trocando o vermelho pelo verde-amarelo, tirou Lula da campanha e dos panfletos e adotou parte do discurso de Bolsonaro, passando a defender o porte de armas, o cristianismo e a família tradicional.  Nesse ritmo, acaba por perder seus próprios eleitores.  O que essas eleições estão mostrando é que os meios tradicionais de persuasão, via marqueteiros e grande mídia, perderam a relevância do passado. O candidato favorito não tinha sequer comitê de campanha; não tinha um CEP. Valeu-se das redes sociais, que o blindaram da hostilidade dos veículos tradicionais e das fake news e deram-lhe o protagonismo de que desfruta.

A brusca mudança de personalidade do PT esbarra na memória da internet. Lá estão, ainda frescas, declarações de Haddad em sentido diametralmente oposto ao que diz agora.
Entre outras, a de que subiria a rampa com “o presidente Lula” e que promoveria o desencarceramento em massa.  Em relação a Bolsonaro, não há novidade: “fascista, homofóbico, racista, misógino etc.”. [misógino Bolsonaro não é;  homofóbico, todas as pessoas de bem tem o dever ser.]  Ele continua onde sempre esteve e, a menos que uma situação inteiramente nova se apresente, e que o mostre diferente do que é (algo já tentado sem êxito), está eleito.
Uma questão meramente matemática.

Ruy Fabiano,   jornalista - Blog do Noblat - Veja