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quinta-feira, 25 de maio de 2023

Licença para gastar - Rodrigo Constantino

Gazeta do Povo

Um blog de um liberal sem medo de polêmica ou da patrulha da esquerda “politicamente correta”.

Se o agente James Bond, o 007 do MI6, possui uma licença para matar, o que o PT conseguiu nesta terça na Câmara foi uma licença para gastar. Para a esquerda, todo problema tem uma única solução: mais gasto público. Para quem só tem um martelo, tudo se parece com prego. Lula queria furar o teto de gastos, e conseguiu - com a preciosa ajuda do presidente da Câmara, Arthur Lira. Mas não só ele, claro.

A Câmara dos Deputados aprovou, na noite desta terça-feira (23), o novo arcabouço fiscal. Foram 372 votos favoráveis, 108 contrários e 1 abstenção. Os parlamentares aprovaram o substitutivo apresentado pelo relator da proposta, o deputado Cláudio Cajado (PP-BA). O texto segue agora para análise do Senado. Por ser um projeto de lei complementar, a nova regra fiscal precisava de pelo menos 257 votos para ser aprovada.

Após a aprovação do texto, os deputados passaram analisar as emendas à medida. Apenas uma delas chegou a ser votada na noite de terça-feira. Por 429 votos a 20, os deputados rejeitaram um destaque apresentado pelo Psol para retirar os gatilhos e sanções ao governo colocados pelo relator no texto da regra fiscal. Ufa! Menos mal...

A melhor definição do texto que passou na Câmara foi a que encontrei num grupo de liberais, explicando para leigos em economia: "em 2030 vou entrar em forma; para isso, em 2029 eu vou parar de beber, em 2028 eu começo a ir para a ginástica, em 2027 eu corto o açúcar. Vai dar certo, mas hoje e amanhã me passa a feijoada"

Conhecendo o perfil perdulário do governo Brasileiro, e a mentalidade da esquerda no poder, claro que isso não vai funcionar. Na prática, vai representar uma licença para a gastança, como se não houvesse amanhã. A cigarra ganhou na loteria e já está de olho em todas as tentações pela frente. Tantos problemas que justificam mais e mais gastos, ou melhor, "investimentos"...

Leandro Ruschel, especialista em mercado financeiro, comentou: "Passou o 'calabouço' fiscal. Deve passar no Senado. O que ele significa: aumento de gastos do governo, aumento de impostos, aumento da dívida pública, menor crescimento econômico. Nos últimos meses, a única coisa a comemorar sobre qualquer assunto é que 'poderia ser pior'."

O deputado Mario Frias lamentou: "Hoje é mais um dia triste para o Brasil, a Câmara dos Deputados autorizou (com meu voto contrário): - Aumento de despesa independente de crescimento econômico, - Afrouxamento da Lei de Responsabilidade Fiscal (a que possibilitou o impeachment da Dilma), - Manutenção dos 37 Ministérios do Lula, contra os pouco mais de 20 do Gov Bolsonaro, - Aumento de impostos para manutenção de privilégios, viagens nababescas e intermináveis, pagamentos de emendas sem fim para ter votos no Congresso, - E muito mais mazelas, são mais de 500 bilhões autorizados para gastança nos próximos 3 anos... Engraçado que discutimos mês de cor 'x', inclusão de nomes em livros de heróis, dia nacional de sei lá o que, tudo com muita discussão e debate, agora para um tema tão sério como esse que trata do futuro do Brasil e das contas públicas, pouco mais de 3 horas de um não debate, mas imposição de vontades nefastas mediante cargos em Ministérios, pagamento de emendas e por aí vai".

O deputado Luiz Phillippe de Orleans e Bragança também antecipou problemas à frente: "A maioria da Câmara decidiu por aprovar o calabouço fiscal (372 x 108). Eu votei CONTRA esse absurdo. Deixo claro, mais uma vez, que a medida prejudica E MUITO o país. Mais impostos estão por vir para bancar a farra dos gastos descontrolados do governo."

Não é preciso ter bola de cristal ou ser um doutor em economia para prever que as novas medidas levarão a uma maior irresponsabilidade fiscal. E o ministro Fernando Haddad já comemora a aprovação de olho na reforma tributária, ou seja, quer aproveitar a adesão do centrão fisiológico para passar a boiada e conseguir aumentar a carga tributária. Não há o menor risco de o Brasil dar certo com essa turma no poder...

Rodrigo Constantino, colunista - Gazeta do Povo - VOZES


domingo, 15 de setembro de 2019

Big brother? - Eliane Cantanhêde

 O Estado de S.Paulo

Controle de dados pode servir, além da defesa de aliados, para ataque de adversários?

O mais novo temor em Brasília é que a Lava Jato original possa ser trocada por uma Lava Jato particular, em que os dados não seriam mais compartilhados por uma força-tarefa de juízes, procuradores, auditores e delegados para o combate à corrupção, mas, sim, centralizados num único gabinete: o do presidente da República.

Quando se questiona essa investida simultânea na PF, no antigo Coaf e na Receita, suspeita-se que tudo isso é para a proteção de filhos, parentes, amigos e poderosos dos três Poderes. Que tal olhar para o outro lado da moeda? E se, em vez de ser exclusivamente de defesa, uma intervenção nas instituições de investigação servir também para o ataque? Em tese, já imaginaram o que pode representar a PF nas mãos de um filho do presidente, eventualmente escrivão de polícia; um secretário da Receita Federal disposto a mudar tudo e a centralizar os dados e investigações para dividi-las com o poder; um chefão do Coaf que admita compartilhar informações sobre movimentações financeiras com o Planalto? [por sorte, o questionamento proposto é em tese e certamente nenhum dos candidatos a se tornar dono de instituições, tem tal interesse.
Oportuno registrar: a PF é subordinada diretamente ao ministro da Justiça que está subordinado diretamente ao Presidente da República - que  até 2022, com as bençãos de DEUS e reeleição, é JAIR BOLSONARO.
A mesma posição de segundo escalão se aplica ao Coaf - atual UIT - e à Receita federal, mudando apenas o ministério.]

Significa que, sempre em tese, uma única pessoa, o presidente da República – atual ou futuro – teria a sua disposição um mapeamento detalhado da vida pessoal, da folha policial e dos dados fiscais e bancários de todos os seus desafetos de qualquer área. Além de defender o amigo X, ele poderia facilmente atacar o adversário Y. Mesmo antes de centralizar as escolhas do novo procurador-geral da República e o comando da PF, Receita e Coaf, [aqui um registro óbvio, mas, evita que passe despercebido a eventuais desavisados, a forma de escolha do chefe da PGR e a subordinação dos ministros de Estado vigora desde a CF 88 - da qual Bolsonaro sequer foi membro da Constituinte - e mesmo das anteriores.] o presidente Jair Bolsonaro já usou publicamente, e com seu próprio viés, informações conhecidas contra, por exemplo, Luciano Huck, João Dória, jornalistas. E se tiver acesso a dados de ministros de tribunais, deputados, senadores, governadores, funcionários, cidadãos e cidadãs? Além de divulgar, ficaria tentado a usar esse arsenal para amedrontar quem ousar confrontá-lo ou meramente questioná-lo?

É interessante a aproximação de Bolsonaro, seus filhos, seu chanceler e outros ministros com o autoproclamado guru da direita internacional, Steve Bannon, que foi estrategista da campanha presidencial de Donald Trump e depois demitido por ele da Casa Branca. Entre outras coisas, Bannon é especialista em coleta, análise e uso político de dados de cidadãos. Aliás, quem gosta de ficção vai ficar fascinado pelo documentário “The Great Hack” (“Nada é Privado: o escândalo da Cambridge Analytica”), que confirma o quanto a realidade anda superando a imaginação e as construções mais mirabolantes dos ficcionistas. O 007 é pré-histórico, quer dizer, pré-internet.

Em resumo, para não dar “spoiler”, ali é contada como foi construída a vitória de Trump, ou melhor, a derrota de Hillary Clinton nos EUA, e como o Reino Unido conseguiu cair na armadilha do Brexit. Primeiros ministros vêm e vão, sem recuos e sem avanços – sem saída. E como se chegou a isso? Com o uso dos dados e mentes das pessoas, identificando e focando nas menos convictas – logo, mais suscetíveis a propagandas maciças e às demoníacas fakenews. Por trás de tudo, a onda mundial da extrema direita. Detalhe: Bolsonaro aparece ligeiramente no filme.

Na era PT, ficamos roucos de denunciar o aparelhamento de órgãos e estatais em favor de um partido, um grupo político e, finalmente, um esquema sistêmico de corrupção. Neste primeiro ano de Bolsonaro, surgem dúvidas sobre o aparelhamento, se não é mais por um partido, mas por um projeto de poder com conexões internacionais e centralizado num presidente que, vira e mexe, dá uma cutucada na democracia. Com instituições e dados centralizados, sob o risco de uso na defesa de aliados e no ataque de adversários, ou de meros críticos, pode-se criar a mais destrutiva arma política: o medo. É só suposição, mas não é pura ficção.
 
Eliane Cantanhêde - O Estado de S. Paulo