O Globo
O economista Abhijit Banerjee é indiano-americano, cresceu em Calcutá. Esther Duflo é franco-americana. Eles fundaram o Laboratório de Ação contra a Pobreza no MIT onde trabalham. Os dois são casados e têm diversos trabalhos juntos em economia do desenvolvimento e combate à pobreza. Michael Kremer é professor de economia do desenvolvimento e economia da saúde em Harvard e é pesquisador associado a um centro de inovação para a ação das nações sobre a pobreza. Os três se complementam, fizeram trabalhos juntos, tanto acadêmicos quanto de avaliação direta de políticas públicas. Duflos e Kremer estudaram, por exemplo, o impacto da oferta de escola secundária gratuita em Gana. Ela estudou o efeito do saneamento básico. A ideia principalmente do casal Banerjee-Duflo é usar o modelo de experimentos focalizados para estudar o combate à pobreza de forma ampla. Kremer fez inicialmente estudos no Kenya em meados dos anos 1990. Banerjee e Duflo fizeram pesquisas em Mumbai e Vadodara na Índia. Em outra análise, o casal verificou o impacto do acesso à infraestrutura no desenvolvimento da China. Esses trabalhos se transformaram no método padrão em economia do desenvolvimento.
A teoria de Kremer sustenta que as tarefas de produção executadas conjuntamente — em um ambiente em que várias pessoas com aptidões diferentes e complementares cooperam — elevam a produtividade. Essa complementariedade de aptidões seria, segundo ele, a chave da produtividade. O comitê disse que eles juntos reestruturaram totalmente a economia do desenvolvimento e têm tido um claro impacto no combate à miséria no mundo. Principalmente “porque usam métodos de pesquisa experimental para identificar as políticas de intervenção mais efetivas para combater a pobreza”, segundo escreveu o jornal “Financial Times”.
Esther Duflo em entrevista ontem disse que o objetivo deles “é garantir que a luta contra a pobreza esteja baseada em evidências científicas”. Um dos estudos do trio mostra que apenas disponibilizar material escolar e os livros às crianças pode não ser suficiente para um bom aprendizado, que ocorre de forma mais eficiente com um ensino mais individualizado, mais feito sob medida. Houve um tempo em que políticas de combate à pobreza não eram consideradas temas centrais na economia.
Hoje, a economia se volta cada vez mais para a redução da pobreza e da desigualdade como forma não apenas de corrigir as distorções criadas pelo capitalismo, mas como única maneira de garantir aumento da produtividade e desenvolvimento. A escolha do Nobel de 2019 faz parte da tendência de instalar cada vez mais esse tema no centro do debate. Além disso, o comitê do prêmio ressaltou a forma com que os três sempre abordaram a questão: com métodos científicos de desenvolvimento de políticas, e com testes de avaliação da eficiência da política adotada.
O que impressiona nos três laureados ontem é a dispersão das áreas para as quais eles levaram seus estudos, que pode ser desde educação e saúde, segurança no trânsito, ação policial, saneamento, garantia de água potável, papel dos influenciadores e combate a determinados dogmas do ultraliberalismo. Em uma aula magna, chamada “aulas Tanner”, Duflo contesta a ideia de que o assistencialismo reduza a liberdade das pessoas. Duflo é a segunda mulher a ganhar o Nobel de economia e a pessoa mais jovem laureada com o prêmio na área. Tem 46 anos. Banerjee, com 58, e Kremer com 54 anos, são também relativamente jovens para o Nobel.
Combate à pobreza é dever moral das sociedades civilizadas, mas o que os três laureados de ontem estimulam com seus trabalhos é a busca da forma mais eficiente, e cientificamente testada, de alcançar esse objetivo. E isso não por benemerência, mas sim porque essa é a questão central do desenvolvimento.
Blog da Míriam Leitão, jornalista - Com Alvaro Gribel, São Paulo - O Globo