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sexta-feira, 23 de setembro de 2022

A decisiva diferença das rejeições - Alon Feuerwerker

Análise Política

As pessoas gostam mais de algumas pesquisas e menos de outras, mas infelizmente não há outro jeito de saber como anda a eleição. E quase todas elas apontam a liderança de Luiz Inácio Lula da Silva, com possibilidade de liquidar a fatura no primeiro turno, e Jair Bolsonaro folgado logo atrás, sem ser ameaçado por nenhum dos nomes remanescentes da terceira via. Assim entra a última semana antes do 2 de outubro.

Há, porém, um detalhe nas pesquisas menos explorado, mas que se tem mostrado decisivo nos rumos da corrida: o gradiente entre as taxas de rejeição, aliás muito altas, entre os dois ponteiros. Quando a rejeição é medida da maneira mais adequada, perguntando ao entrevistado se ele vota com certeza, pode votar ou não vota de jeito nenhum em determinado nome, a oposição radical a Bolsonaro gira sempre em torno de 55%, dez pontos acima da de Lula.
[depende a quem as pesquisas perguntam? o descondenado não vai às ruas para não ser vaiado, ovado, apedrejado; e os devotos que comparecem aos seus "comícios" - realizados em locais fechados, entrada restrita aos devotos, são roubados até em celulares. Quando o criminoso petista aparece em um local 'público' as imagens sempre são close deles e de alguns cúmplices que o rodeiam.]
Esse número 10 aparece nas mais diversas medições da corrida. Em ordem de grandeza, baliza a diferença entre os dois no primeiro turno, com alguma ampliação no segundo. Também parametriza as distâncias entre o ótimo+bom+regular positivo e o péssimo+ruim+regular negativo. Bem como a distância entre aprovação e desaprovação, medição binária essencial para conhecer com mais precisão a imagem de governos e governantes.[falando em rejeição - CONFIRA]


Bolsonaro encontra dificuldade para reduzir significativamente a distância entre ele e Lula, mesmo com a melhora notada na percepção sobre a situação da economia. Por quê? Porque não consegue reduzir o hiato nas rejeições, que parece ter origem mais na resistência à pessoa do presidente do que a seu governo. Esta eleição não está sendo tanto um plebiscito sobre o governo Bolsonaro, mas sobre o Jair.

Uma das principais razões para o PT e aliados lutarem com todas as forças para liquidar a fatura na primeira rodada é o risco de a polarização "depurada" de um segundo turno, com alguma paridade de condições, acabar equalizando as rejeições e tornando o desfecho menos previsível. Até agora não aconteceu, apesar das campanhas negativas. Talvez por cada um dos boxeadores estar enfatizando fraquezas do adversário bem cristalizados no eleitorado.

Fragilidades já bem precificadas.

Neste momento, na comparação com 2018, Bolsonaro e Lula parecem reproduzir os desempenhos dos então candidatos do PSL e do PT em todo o país, com exceção do Sudeste. Na maior concentração populacional e eleitoral do Brasil, o atual presidente deu um banho quatro anos atrás e hoje luta para equilibrar o jogo. Decorrem principalmente daí as distâncias abertas pelo ex nas pesquisas nacionais.

Bolsonaro enfrenta um forte antibolsonarismo na classe média (definida pelos generosos critérios brasileiros) do Sudeste, cultivado nas atitudes do presidente durante a pandemia e pelas suas arriscadas relações, ao menos verbais, com a institucionalidade.
[será? em 2 out 2022 Bolsonaro será reeleito com mais de 95.000.000 de votos - pesquisas fake serão mais uma vez desmoralizadas. É pagar para ver. O que as pesquisas mostram não é visto no Brasil real.] Como vai resolver isso será tarefa para seus profissionais de comunicação, se houver segundo turno. Quatro semanas a mais de oportunidades nunca são demais. 

Alon Feuerwerker, jornalista e analista político

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Publicado na revista Veja de 28 de setembro de 2022, edição nº 2.804

 

segunda-feira, 18 de maio de 2020

UM REINO DIVIDIDO CONTRA SI MESMO - Percival Puggina

 A sociedade brasileira conviveu, por várias décadas, com uma letargia que permitiu serem dizimadas suas convicções, sua cultura, seus valores. Sob pressão do politicamente correto, por falta de qualquer contraditório minimamente eficiente, permitiu que se instalassem os divisionismos sobre os quais muito se tem escrito. Em nome da diversidade, ressaltaram-se as diferenças e se instalaram antagonismos onde diferenças houvesse: relações familiares, etárias, laborais, sociais, de cor da pele, de sexo, sempre criando muralhas intransponíveis, conflitos e uma diversidade bizarra. Das entranhas da estupidez humana surgiam, então, as modernas formas da luta de classes numa sociedade que consentia em dividir-se e em dar curso a esse fenômeno.
 Ao longo dos anos, observando o unilateral uso político dessa patifaria sociológica se converter em pautas dos poderes de Estado, cuidei de denunciar a causa e sublinhar seus efeitos.  Aquela maioria dormente rugiu seu despertar nas ruas e no subterrâneo das redes em que os “coxinhas” clamavam contra os males feitos ao país. A hegemonia estabelecida nesses dois espaços de expressão suscitou muita malquerença. Era inaceitável que surgisse “do nada” uma força política vitoriosa exatamente nos dois nichos de opinião habitados por conservadores e liberais sempre inoperantes, passivos, letárgicos. Os dois adjetivos ocupavam lugar de destaque nos xingamentos da esquerda. Como entender que saíssem do armário em que eram contidos para, no momento seguinte, se tornarem vitoriosos nas urnas? 
Você tem ideia, leitor, de quanto poder ali foi perdido?

Infelizmente, o sucesso eleitoral esbarrou com a resistência dos outros poderes. E surgiu no Brasil uma nova divisão, um novo antagonismo, muito mais severo. Verdadeiro seccionamento da sociedade. De um lado o governo e seus eleitores cientes do risco de uma derrota no curso do mandato; 
de outro o Congresso e o STF, e a militância da esquerda, na mídia, na Universidade, no ambiente cultural. Para criar novas divisões, há eleitores do presidente que cobram dele que faça o que não deve e adversários que o acusam de já haver feito o que não deve. Há as provocações de Celso de Mello, as demandas ridículas de Lewandowsky, as intromissões de Alexandre de Moraes. Desaforos em cascata e a sociedade que se dane. 

Se o povo na rua ainda afasta os golpistas, a mídia militante se empenha em desdenhá-lo, descredenciá-lo. No reino dividido, tudo está politizado e, pior do que isso, judicializado: da hidroxicloroquina ao atestado médico, da indicação de um novo diretor-geral da PF às formas de isolamento.
Como não vir à mente as palavras de Jesus no evangelho de Mateus (12:25): “Todo o reino dividido contra si mesmo é devastado; e toda a cidade, ou casa, dividida contra si mesma não subsistirá.”
Está faltando juízo a muita gente que, graças à posição que ocupa, se lixa para o padecimento do Brasil real.

Percival Puggina (75), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.
  
  

sexta-feira, 25 de março de 2016

Vermelho é a cor mais quente

Quase todos estão no vermelho no Brasil real. Nossa convulsão mais sangrenta não é política, é econômica 

Quase todos estão no vermelho no Brasil real. E isso explica a ampla rejeição ao governo Dilma. Explica também o apoio da maioria dos brasileiros à saída da presidente da República – seja pelo impeachment, seja pela cassação de sua chapa com novas eleições, seja por sua renúncia. A voz das ruas, das pessoas mais simples – as que não têm tempo, estudo ou dom para discussões eternas, técnicas ou ideológicas, sobre esquerda, direita, legalidade de grampos, obstrução da Justiça e condução coercitiva –, é a seguinte: “O Brasil precisa voltar a andar”.

Mesmo na crise, os gastos do governo Dilma continuam a aumentar, e isso inclui as despesas com funcionários públicos. Não é pedindo ao Congresso aval para um rombo de R$ 96,65 bilhões em 2016 que Dilma vai recuperar o apoio popular perdido. Números podem ser chatos de ler, mas não dão margem a interpretações mirabolantes de juízes, ministros, parlamentares, petralhas ou coxinhas. A meta do governo era um superavit de R$ 24 bilhões. Só que o azul virou vermelho. É a cor mais quente, a que demonstra o maior crime de responsabilidade contra o país. É a cor do Planalto e das contas dos brasileiros.

O governo está no vermelho profundo, como lava fumegante de vulcão. Mas o nome de Dilma endividada não irá para a lista negra do SPC – somente os nomes dos brasileiros comuns e sem foro privilegiado, que não podem apelar ao Supremo Tribunal Federal. Esse deficit do governo federal está subestimado, porque não leva em conta os R$ 6 bilhões da renegociação da dívida com os Estados. Além disso, todos os planejamentos do ministro Nelson Barbosa contam com a injeção, no caixa, de uns R$ 10 bilhões da CPMF. 

Companheiros e companheiras, o rombo do governo Dilma este ano deve superar os R$ 100 bilhões. É o descrédito na capacidade desse governo de recuperar ou estabilizar a economia que acentua a insatisfação geral e as olheiras de Dilma. Não é só o nojo com a corrupção. O golpe que pode derrubar Dilma é o que freou a mobilidade social dos pobres e da classe média. Ao depositar o voto na urna, acreditavam que subiriam na vida e que seus filhos e netos poderiam estudar em boas escolas e ser alguém. Poderiam ser bem tratados em hospitais. O golpe da gestão incompetente de Dilma rasgou as bandeiras sociais do próprio PT. Desde 1992, o Brasil registrou pela primeira vez, em 2015, a combinação de queda de renda e aumento da desigualdade.

O desemprego recorde em sete anos, de 8,2% no mês de fevereiro, atinge quase 10 milhões de brasileiros. É muita gente que acreditou no Partido dos Trabalhadores. Eles estão na busca frenética de trabalho e dormem nas filas do seguro-desemprego, que torturam quem está ali ao exigir documentos de décadas atrás para conceder o benefício. Ouvir depoimentos de quem busca seu direito legítimo ao seguro-desemprego é uma aula para entender a impopularidade de Dilma. Só em janeiro e fevereiro, 428 mil vagas de trabalho foram destruídas, 40% delas no comércio.

A desculpa do governo para descumprir a meta, jogar pelos ares o ajuste fiscal e assumir gastos irresponsáveis é um primor: “Achamos que neste momento o governo tem de atuar para estabilizar a economia”, disse Nelson Barbosa. Quem, em sã consciência, acredita que pode estabilizar alguma coisa contraindo dívidas e mais dívidas? Se a Odebrecht tem uma central de propinas para caranguejo, avião, nervosinho, drácula, lindinho, passivo, proximus, atleta, grego, múmia, viagra, feira, há, no Palácio do Planalto e em seu Ministério da Fazenda, uma central para imprimir dinheiro e disseminar mentiras.

A convulsão mais sangrenta no Brasil não é política, mas econômica. A Petrobras fechou 2015 com prejuízo de quase R$ 35 bilhões e uma dívida de quase R$ 500 bilhões. A recessão levou 277 indústrias a fechar as portas. Trabalhadores ocupam instalações de empresas que decretaram falência. O protesto não é pela esquerda nem pela direita. Eles não empunham bandeiras do Brasil nem muito menos vermelhas. Querem sua dignidade de volta. Não querem só comida, mas até o alimento anda escasso.

O menino que deixou um saco de paçoquinhas no meu espelho retrovisor lateral por R$ 2,00 me comoveu, embora seja ilegal e arriscado o magrelo correr em meio aos carros na avenida. Não gosto de paçoca, mas as palavras na etiqueta eram: “Quem dorme sonha. Quem trabalha conquista”. Abri a janela do carro e comprei o doce de amendoim, torcendo para ele não ser atropelado e voltar para casa. Seria bom se sonho e trabalho fossem garantidos a ele. Era hora de aula. Deveria estar na escola, não é mesmo, Dilma?

Fonte:  Ruth de Aquino - Época