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sexta-feira, 17 de dezembro de 2021

Barbeiragens médicas - O pesadelo de adoecer em Portugal - O Globo

Ruth de Aquino
 
Não é um caso só, não são dois nem três. Quase perdi uma amiga querida que teve uma simples apendicite em visita de férias à filha, moradora de Lisboa. Foi vítima de uma mistura de diagnósticos errados – primeiro, gastroenterite, e depois cálculo renal com cirurgia de emergência tipo açougue, UTI sucateada, alta prematura, negligência absurda no pós-operatório e infecção hospitalar com bactéria.
 
Diagnósticos errados e infecção hospitalar são grandes vilões da medicina em Portugal

Minha amiga teria provavelmente morrido de septicemia se não tivesse voltado para o Brasil. 
Seus médicos no Rio descobriram dois abscessos no abdômen e retiraram 40 mililitros de pus. 
Fez a terceira e última cirurgia agora, cinco meses depois de sentir a primeira dor forte num vilarejo na costa vicentina, no Alentejo. Desenvolveu uma hérnia por conta das barbeiragens portuguesas. Sua história é uma saga. Um alerta para brasileiros iludidos. Pensam que a medicina em Portugal funciona e, que maravilha, é de graça! 

Seriam férias de reencontro em julho com a filha numa casa alugada no meio do silêncio, praias de rio e mar, numa aldeia de mil habitantes. De repente, uma dor alucinante. “Vomitei, pensei em intoxicação alimentar. Fui a um hospital público a duas horas e meia dali, em Portimão, no Algarve”. Como a fila dava voltas na emergência por conta da Covid, a próxima parada foi um hospital particular, à 1h da madrugada. Fez tomografia computadorizada do abdômen. Injetaram um remédio para dor, deram antibiótico e a liberaram. Diagnóstico: gastroenterite. 

Como continuava a urrar de dor, com febre, voltou com a filha para Lisboa. Foi ao consultório de um médico brasileiro que atende também na rede pública. Ele diagnosticou cálculo renal. “Deu uma batida do rim. Eu pulei. 'Viu? É pedra no rim, aposto' ”. No dia seguinte, já de cadeira de rodas pela dor, foi à CUF, o sonho de todo mundo. Tipo Copa Star, Sírio Libanês. O ultrassom renal não acusou nada. “Só olharam o rim. Não investigaram. Português pensa na caixinha”. 

Sem evacuar e sem comer quase nada, barriga inchada como se estivesse grávida, começou a vomitar água. De ambulância dos bombeiros, foi para o Hospital Universitário São José, referência pública. O enfermeiro lhe deu uma pulseira verde, de casos não graves! Como gritava que ia morrer, uma residente se compadeceu e a mandou para o cirurgião. “Médicos não botam a mão em você até saber se está ou não com Covid. Fiz PCR na emergência, mas o resultado, negativo, levou seis horas! Uma sonda me tirou dois litros de suco gástrico. Mas só me operaram às 2h da manhã do dia seguinte”. 

“Não fizeram ressonância. Abriram minha barriga, dos seios à virilha, sem saber o que havia dentro. Em duas horas, me abriram, descobriram o apêndice já supurado e me grampearam, técnica em desuso no Brasil. Fiquei 12 dias na UTI”. Outro trauma. “Só 4 enfermeiros por turno para 32 leitos. Cama quebrada. Sem suporte para o soro. A comadre não era individual. Era uma enfermaria mista. Talvez por ser uma sociedade patriarcal, cada homem tinha sua arrastadeira (comadre). Mulher não, tinha que pedir e esperar”. Teve diarreia, mas não havia papel no banheiro. Teve flebite e, quando reclamava de dor pedindo para trocar a veia, ouvia um deboche. “’O que é que é, brazuca?’ ‘Gente, sou cidadã portuguesa’, eu respondia. Muito preconceito”. 

Com seis quilos a menos, teve alta antes do tempo. “Acho que precisavam do leito. Minha ferida ainda estava purgando e eu tinha febre baixa. Não me receitaram antibiótico nem recomendaram cinta. Não me deram telemóvel (celular) de nenhum médico. Era início de agosto. Auge do verão. Médicos em férias. O único disponível se negava a examinar paciente pós-cirúrgico. Com febrão de quase 39, liguei em pânico para o hospital. Me receitaram paracetamol!” 

Uma semana após a alta, em consulta marcada conforme o padrão, o cirurgião receitou antibiótico oral. “Com isso, você pode pegar um avião”. No Rio, ela volta aos poucos à vida, recuperando-se da terceira cirurgia, ainda com muitas limitações. Precisou reconstruir o umbigo, que depois de tantos cortes e intervenções estava na lateral direita do corpo. Teve de colocar uma tela porque não se conseguia unir mais os tecidos, após as infecções. Sempre foi saudável, forte, adepta de ioga, comida orgânica, meditação, bicicleta. Sempre nadou às 6h da manhã. Precisa esperar até retomar seu cotidiano.

Portugal pode, talvez, sofrer de um problema crônico de formação médica e um problema pontual de sucateamento de hospitais.  
Diagnósticos equivocados e infecção hospitalar são os maiores vilões, tanto na saúde pública quanto na particular. 
Também incomoda o raciocínio rígido, preguiçoso, linear, ingênuo e teimoso de muitos médicos de lá. Lembrei-me da piada do ascensorista, que afirmava estar “parado” e não “descendo” – com tanta certeza de que falava a verdade. 

Ah, você pode dizer, erros médicos acontecem, um caso não pode condenar a medicina de um país.
Verdade. E por isso conversei com turistas ou moradores de Portugal. Escutei histórias horripilantes. 
Médico em hospital tentando costurar sem anestesia os lábios de uma senhora que havia caído no hotel.
Enfermeiro em hospital servindo carne de porco para recém-operado de estômago.
Parafusos enferrujados em joelhos.
Médico que não conseguiu enxergar um tumor na tireoide olhando exames de imagem. 
Muita gente, especialmente com mais idade, faz o caminho de volta. Afinal, você quer viver ou morrer em Portugal?

Ruth de Aquino - O Globo


sexta-feira, 9 de agosto de 2019

O bem que Jair Bolsonaro nos faz - Ruth de Aquino

O Globo

Direita sem máscara

Muito injusta essa perseguição ao presidente. Seu jeitão de “sou assim mesmo” e suas declarações sinceras ajudam o Brasil a se confrontar consigo mesmo e com sua História. Jair faz a extrema-direita sair do armário e arreganhar os dentes, todos salivando contra o próximo, contra dados negativos sobre a pátria ou contra o mero debate de ideias. Jair obriga o isentão a se posicionar e sair do muro. Com seus arroubos, pitis e ataques, Jair estimula a imprensa a dar o maior duro, em tempo real, para esclarecer a população e desmascarar mentiras. Quem sabe, um dia, Jair personificará tanto ódio, preconceito e desumanidade que uma oposição inteligente surgirá em nosso país. [impossível - temos um arremedo de oposição, comando pelo 'primeiro-ministro' Maia e que ganha espaço na imprensa repetindo as mesmas declarações, demonstrando incompetência ou falta de fundamentação para mudar o tema, para dezenas de jornais.
E ainda age como quinta-coluna -  sempre que pode  finge ser a favor do governo do presidente JAIR BOLSONARO.]

Jovens e velhos, aproveitem as trevas e busquem a luz e a informação. Já sabiam que o pai do presidente da OAB havia sido sequestrado e assassinado sob custódia do Estado durante a ditadura militar? Ou só souberam porque Bolsonaro resolveu vociferar e inventar que os companheiros de guerrilha o tinham executado? [o assunto estava meio em banho-maria - afinal, o corpo nunca foi encontrado, assim, não há prova cabal de que houve assassinato.
O presidente Bolsonaro apenas chamou a atenção para uma possibilidade - ter o assassinato, se ocorreu, sido cometido pelos próprios companheiros do desaparecido. 
Os guerrilheiros, os terroristas costumavam com frequência assassinar, até mesmo por motivos banais, seus próprios companheiros.
Quanto ao caso do Inpe, é conveniente separar a indiscutível competência do Inpe da postura temperamental do seu presidente, chegando a ofender o Presidenta da República, postura também adotada pelo presidente da Comissão de Mortos e ... .
Ambos incorreram em grave insubordinação, desrespeito ao titular do cargo máximo da República e foram devidamente punidos.
O Inpe deve ficar fora da encrenca - sua competência é notória e respeitável - já a tal 'comissão' cabe aquela pergunta: para que serve a CEMDP?]
Sabiam que o desmatamento da Amazônia quase quadruplicou? Ou só souberam depois das provocações de Bolsonaro ao físico e presidente do Inpe, Ricardo Galvão, exonerado por “falta de clima”? Aliás, todos já conheciam o Inpe – Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais – ou só depois da guerra ambientalista de Bolsonaro? Eu não sabia que a Noruega doa tantos bilhões para o Fundo Amazônia. Confesso que estou aprendendo muito com Bolsonaro no poder. 
Sabiam que a Ancine viabiliza o cinema e o audiovisual brasileiros? Só “A Turma da Mônica” teve 2 milhões de espectadores. Por implicar com filmes “pornográficos” como Bruna Surfistinha, Jair declarou: “Vamos buscar a extinção da Ancine. Não tem nada que o poder público tenha que se meter a fazer filme.” Por causa do Jair, O Globo mostrou que, em 2018, biografias, família, relacionamentos e religião foram temas de 40% dos 185 filmes. Prostituição, 1%. Um filme religioso teve a maior bilheteria no ano passado. Eu não fazia ideia. ["A Turma da Mônica é sucesso, sem depender da Ancine - qualquer produtora tem interesse.

Quanto ao baixo nível de pornografia depende da classificação oficial e esta fica a cargo da Ancine (a raposa cuidando do galinheiro) e nos critérios da agência 'Bruna Surfistinha'  não é pornográfico e 'Lula, o filho ...' não é uma obra prima de pornografia moral. Sobre os presos, a dor das famílias do presos jamais pode ser considerada quando comparada com a dor das famílias das vítimas do assassinos - as vítimas não escolheram o destino, já os presos estavam presos por opção.

Quanto ao assunto terras indígenas apesar de todo o empenho da PF, não conseguiu descobrir nenhum indício de invasão de terras indígenas no episódio do índio assassinado.]

Sabiam que, dos 62 presos mortos em Altamira, no Pará, 26 ainda aguardavam julgamento e não tinham condenação? Talvez não chegássemos a saber se Jair tivesse reagido dignamente às bárbaras decapitações. Em vez de pensar na dor das famílias, disse: “Pergunta para as vítimas (dos presidiários decapitados) o que elas acharam”. 
Sabiam da corrida de garimpeiros em terras indígenas, ou só estão se informando depois do auê causado pelo Jair? Ele tentou transferir da Funai para a Agricultura a demarcação das terras, peitou o Congresso, feriu a Constituição e depois recuou. 
Sabiam no Sudeste o nome do governador da Paraíba, antes de Jair se referir pejorativamente aos nordestinos como “paraíbas” e deflagrar uma guerra orçamentária contra a região, acusando o Nordeste de querer “a divisão do país”? [Cabe registrar que a Funai no MJSP ou no MA, contimua subordinada à Presidência da República.]
Sabiam que 1,8 milhão de crianças trabalham ilegalmente em vez de estudar? Conheciam a dimensão do trabalho escravo, que Jair vê com condescendência?
Medidas Provisórias e decretos presidenciais têm levado o Brasil a entender mais de: porte e posse de armas; estações ecológicas; papel do Itamaraty; repressão policial. Jair está excitado com o pacote anticrime porque agora os criminosos “vão morrer na rua igual barata”(sic). [as palavras do presidente quanto ao trabalho infantil e o trabalho escravo - duas práticas odiosas e que devem ser repudiadas e punidas de forma exemplar - foram mal interpretadas.
Quanto aos  bandidos, ter como destino, morrer na rua igual a barata, foi  mais uma figura de linguagem, já que com o pacote anticrime - se deixarem que seja aprovado - a  punição dos bandidos vai ficar mais fácil.]
Um terço dos brasileiros pensa e age como o presidente. Atacam com ofensas, ameaças e palavrões qualquer um que não se alinhe com o bolsonarismo. Jair tirou a máscara da extrema-direita. E isso é bom.

Ruth de Aquino - O Globo

sábado, 25 de novembro de 2017

Obrigada e tchau, caros leitores

Se alguém disser que a primeira coluna é a mais difícil de escrever, não acredite. É a última 

Ruth, obrigado e sucesso na 'próxima esquina'.
Aqui no Blog Prontidão Total você sempre teve leitores - muitos já eram teus leitores  antes do Blog.

Gostávamos e continuamos gostando muito do que você escreve - apesar de divergirmos  em quase tudo, sempre que apresentamos matéria cuidamos de inserir na tua matéria deixando claro nossas razões.

Até qualquer hora.
abraços dos Editores do Blog Prontidão Total

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segunda-feira, 19 de setembro de 2016

Menos, menos!

Deltan pediu para ser ridicularizado, e foi. Lula se acha Jesus Cristo, mas só o inocenta quem o idolatra 

[certo que os procuradores pisaram na bola e forneceram alguma munição para aumentar a duração dos últimos estertores do Lula;
mas, o importante é que são essas acusações, hilárias ou não, que vão levar o Lula para a cadeia. Isto é o que conta. Queremos Lula preso, apodrecendo no xadrez igual está o Zé Dirceu. E o melhor é que junto com Lula, vai a esposa e dois filhos.]

Não tenho provas, mas tenho convicção de que os dois lados o procurador do Ministério Público Federal e da Lava Jato Deltan Dallagnol e o ex-presidente Lula – exageraram tanto em suas retóricas, comparações e adjetivos que acabaram por virar piada. Pior, prejudicaram um processo que se arrasta há mais de dez anos, quando Lula pediu desculpas ao Brasil pelo mensalão, jogou Zé Dirceu às feras e se disse traído pelos companheiros.

O primeiro tiro no pé foi de Dallagnol. Com seu rosto imberbe e óculos de primeiro aluno, tem 36 anos e é procurador da República desde os 22. Fez mestrado em Harvard, é especialista em crimes financeiros. Em seu currículo, constam mais de 200 horas de cursos sobre lavagem de dinheiro, corrupção, evasão de divisas, técnicas de denúncias. Nesse último item, tem muito a aprender. O show de acusações hiperbólicas a Lula, ele ilustrou com um “quebra-cabeça. Um powerpoint tão tosco quanto hilário, com erros de digitação (“proinocracia”), [uma acusação se sustenta pela exposição dos FATOS e não pela grafia de algumas palavras;  uma pessoa é assassinada a tiros de fuZil e o digitador no libelo erra e digita fuSil, não será o simples erro de digitação que absolve o assassino.] palavras hifenadas como expres-sivida-de, enri-queci-mento, corrom-pida, men-salão. Algumas bolas eram incompreensíveis, como “vértice comum” ou “reação de Lula”. No centro, LULA, flechado por todos os lados. Nem na era pré-­digital essa ilustração seria aprovada numa sala de aula. Originou memes de morrer de rir nas redes sociais. O procurador foi ridicularizado. Pediu por isso. Recebeu.

Dallagnol extrapolou do substantivo para o adjetivo. Em arroubos que deveriam ser vetados, chamou Lula de tudo o que pudesse levantar a bola para o ex-presidente. “Grande general no comando da engrenagem.” “O comandante máximo da propinocracia e da corrupção.” “O maestro da orquestra criminosa.” Menos, Dallagnol, menos.

O procurador disse coisas que já sabemos, que o petrolão não se limitava à Petrobras, mas envolvia a Eletrobras, os ministérios do Planejamento e da Saúde e a Caixa Econômica, entre outros órgãos públicos. Com a saída de Dirceu do governo, segundo Dallagnol, a continuidade do mensalão (que virou petrolão) só foi possível porque o ex-ministro não era o líder – e sim alguém acima dele, o então presidente Lula. Essa convicção é provavelmente nacional.

Talvez não seja eu apenas que não aguente mais ouvir falar das reformas no tríplex em Guarujá e no sítio em Atibaia, embora saibamos que é nos detalhes que mora o diabo. Os valores são ínfimos comparados ao que o PT deve ter roubado do país todos esses anos. Quando o presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto, diz que recorreu à empreiteira OAS para guardar os 14 contêineres com presentes ganhos por Lula no Planalto porque “não tinha outro jeito”, é claro que não passa de história da carochinha.

Mais importante é a gigantesca promiscuidade com empreiteiras, o pacto bilionário que tirou do povo o dinheiro para a educação, saúde, trabalho, saneamento, transporte, que iludiu os mais necessitados, e que deixou tantos esqueletos de obras essenciais paradas pelo país afora. O conjunto da obra, do qual Lula parece mesmo ser o chefe. Só o inocenta quem o idolatra.

Lula é um mito, por suas conquistas pessoais, por superar uma infância de miséria, por liderar greves históricas, [Lula liderava as greves e ao mesmo tempo negociava por baixo da mesa com os patrões ferrando os liderados.] por se tornar o primeiro operário a ser presidente da República e ser reeleito. Sua consagração como líder popular é legítima. Sua retirada de milhões da pobreza e da fome é uma verdade, mesmo de vida curta por erros no comando da economia. Seu carisma é irrefutável. Sua capacidade de fazer alianças espúrias e mesmo assim manter a militância a seu lado é notória. Sua malandragem é conhecida.

Lula também exagera. Ofende a inteligência dos brasileiros ao insistir que nunca soube de nada. Mente sobre um monte de números. Acusa os procuradores de farsa lulocêntrica para levá-lo à cadeia, mas promove uma farsa demagógica. “Só ganha de mim aqui no Brasil Jesus Cristo”, afirmou. Já disse que seu corpo levou “mais chibatadas” do que o corpo crucificado de Jesus. Onde estão os memes de Lula/Jesus na cruz? Menos, Lula, menos.

Sempre chora ao lembrar que não tinha “um bocado de feijão para botar no fogo” na infância ao lado de cinco irmãos, na Vila São José, região carente de São Paulo. Felizmente, dinheiro não o preocupa mais. Ao contrário do uruguaio Mujica, que não enriqueceu nada, o patrimônio de Lula cresceu 360%, em valores nominais, após o fim de seu segundo mandato, em 2010.


Enquanto os procuradores da Lava Jato levarem Lula a se fazer de vítima, ouvirão bravatas assim: “Provem uma corrupção minha que irei a pé ser preso”. E prejudicarão a acusação preparada pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Não dá para chamar esses jovens procuradores estudiosos de “força-tarefa”. Falta força (e comedimento) na tarefa.


Fonte: Ruth de Aquino - Época


segunda-feira, 12 de setembro de 2016

O ajuste moral



Os políticos brasileiros têm uma dívida moral gigantesca com o país. Precisam começar a saldá-la
A palavra de ordem no Brasil de hoje, mais que ajuste fiscal, é  “ajuste moral”. Por isso o novo slogan nas redes sociais é #ForaLadrao, apartidário e impessoal. Ele abarca a todos. Não só aos ladrões de bilhões de reais ou dólares, mas aos vândalos de sonhos, ideais e convicções. Ladrões da inclusão social, das estatais, dos direitos a um voto limpo, ladrões da paz, da educação e da saúde. Os presidentes – a destituída e o entronado –, os governadores, os prefeitos, os senadores, os deputados, os vereadores, todos têm uma dívida moral gigantesca com o país. Algumas medidas são urgentes para começar a saldar essa dívida.

A cassação do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha. É uma ironia que possa ser cassado apenas por “quebra de decoro”, mas é assim que a banda toca. Acusado de mentir à CPI da Petrobras ao negar conta na Suíça em seu nome, Cunha esperneia há dez longos meses. Precisa ser punido exemplarmente, em nome da moralidade. Que Cunha não seja apenas suspenso, como quer. O Brasil deseja que ele perca seu mandato e se torne inelegível.

O veto ao aumento indecente para o Judiciário num momento de crise econômica profunda, em que a comida desaparece da mesa do povo e o emprego some do cotidiano. A nova presidente do STF, a mineira Cármen Lúcia, que assume na segunda-feira, é uma esperança de austeridade, com sua dedicação quase monástica à vida pública. “Não gosto muito de festas. Eu gosto é de processo”, disse a ministra do Supremo, que já se expressou contra altos gastos no Poder Judiciário. [Nota do Blog Prontidão Total:  exceto se a ministra Cármen Lúcia assumir no estilo Lewandowski – já estuprando a Constituição – o aumento dos servidores do Judiciário não poderá ser vetado – a Lei concedendo reposição PARCIAL das perdas salariais dos servidores do Poder Judiciário já foi sancionada, promulgada, não podendo mais ser vetada.
O que a ministra Cármen Lúcia pode fazer é tentar impedir o aumento para os ministros do Supremo Tribunal Federal – que ainda não é lei, estando apenas sendo cogitado.
Apesar de toda sua disposição em colaborar com Temer a ilustre presidente vai ter contra ela ‘apenas’ dez SUPREMOS MINISTROS.]

O cerco implacável às doações ilegais nas próximas eleições municipais. Continua a festa das fraudes e dos laranjas, mas o Tribunal de Contas da União e o Tribunal Superior Eleitoral estão de olho. O TSE identificou mais de 21 mil pobres que transferiram ao todo R$ 168 milhões a campanhas municipais. O TCU detectou irregularidades em mais de um terço de 114 mil doações a candidatos a prefeito e vereador. Até morto aparece como doador. 

Beneficiário de Bolsa Família também. Chega de propina.  O desmascaramento dos desvios bilionários de quatro dos principais fundos de pensão do país, que atingem 1,3 milhão de trabalhadores. Rombo de mais de R$ 50 bilhões, provocado por investimentos fraudulentos, superfaturamento de contratos. Envolvendo energia, petróleo e infraestrutura. Maiores lesados são funcionários da ativa e aposentados das estatais. A operação foi batizada pela Polícia Federal com base numa modalidade de investimento. Nome chique: Greenfield. E nem Dilma Rousseff nem Michel Temer sabiam de nada. Que se abram agora as caixas-pretas do BNDES. #ForaLadrao.

A redução do patético número de partidos políticos. São 35 – e deles, 27 com representação na Câmara. Muito mais que um fatiamento de siglas, é um esquartejamento do sistema partidário, que dificulta a formação de uma consciência política. Não há coerência a princípios ou a programas. Essa pulverização desmobiliza o eleitor. Cada vez menos se vota por partido no Brasil. O PT destruiu a força da sigla com sua avalanche de erros éticos e de gestão. Os políticos trocam de filiação partidária como quem troca a gravata ou o corte de cabelo. As maiores manifestações de rua, a favor ou contra, nada têm a ver com um partido específico. Acordem para sua falta de sintonia e seu isolamento. E #ForaLadrao.

O despertar para o maior desafio e única esperança das futuras gerações: a educação universal e de qualidade, em horário integral. O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) mostrou que, em dez anos, a nota do ensino médio avançou em 0,3 ponto. Ou seja, próximo de nada. O Brasil continua a avançar nos primeiros anos do ensino fundamental. Mas o que proporcionamos a nossos adolescentes? Por ano, 700 mil alunos abandonam o ensino médio. Estamos condenando mentes jovens à mediocridade ou a coisa pior.

Um choque na gestão de Saúde e no calamitoso índice de saneamento básico. Basta de ver famílias sofrendo em filas de hospitais, morrendo por falta de remédio, de médico ou de internação. Saneamento é um tema que não rende leitura. Fede demais. Mas é preciso se indignar: metade da população brasileira ainda não tem esgoto coletado em suas casas. 

Nesse item que compromete a qualidade de vida e a saúde, o Brasil está em 11o lugar na América Latina. Medalha de incompetência e negligência. Em um mês que tanto se falou de superação e inclusão pelo esporte, em que nos emocionamos com tantos atletas que transformaram adversidades financeiras e físicas em histórias de sucesso, ouro, prata e bronze, os políticos brasileiros precisam compreender que merecem todas as vaias do mundo. Até prova em contrário, são culpados.

Fonte: Ruth de Aquino – Época


domingo, 28 de agosto de 2016

A baixaria dos juízes do Senado

Lewandowski pediu uma “forma cortês” de falar. Mas o que se viu foi uma baixaria digna dos piores BBBs 

Começou mal o julgamento do impeachment da presidente Dilma Rousseff, acusada de crimes de responsabilidade fiscal que contribuíram para jogar o Brasil no atual descalabro econômico. A baixaria explícita se instalou na Casa mais alta de nossa República. Era de esperar. Suas Excelências se acham acima do bem e do mal e transformam um julgamento histórico em briga de rua.


Os xingamentos mútuos, puxados pela porta-bandeira Gleisi Hoffmann, retrucados pelo mestre-sala do DEM Ronaldo Caiado e incendiados pelo puxador do samba do PT Lindbergh Farias, foram contidos a custo pelo ministro Ricardo Lewandowski, que parecia atônito diante da desobediência e incivilidade dos excelentíssimos senadores, que se acusaram de imorais, drogados, assaltantes e exploradores.  “Qual é a moral deste Senado para julgar a presidente da República? Qual é a moral que têm os senadores aqui, para dizer que ela é culpada, para cassar?”, gritou Gleisi ao microfone. [Gleisi fez  a indagação baseada em sua própria condição, que  é investigada pela prática de crimes e a qualquer momento pode ser denunciada. Como é possível que uma acusada de crimes, sob investigação e esposa de um assaltante possa julgar alguém?] “Não sou assaltante de aposentado”, retrucou Caiado, referindo-se ao ex-ministro Paulo Bernardo, marido de Gleisi, acusado de fraudar empréstimos consignados. “Você é [assaltante] de trabalhador escravo”, afirmou Gleisi, abandonando o tratamento de “senhor”. Lindbergh saiu em defesa de Gleisi chamando Caiado de “canalha”, apoiado por bicheiros. Caiado mandou Lindbergh fazer exame antidoping porque o Senado não era lugar para ficar cheirando”.

Foi um espetáculo vergonhoso, que só não saiu totalmente de controle devido à serenidade do ministro Lewandowski. Ficou claro que jamais o senador Renan Calheiros ou qualquer outro político teria autoridade para acalmar os ânimos. A baixaria digna dos piores BBBs aconteceu apesar dos alertas. No início da sessão, Lewandowski orientou que os senadores agissem como “verdadeiros juízes”. Pediu que adotassem uma “forma cortês” de falar, “polida, respeitosa”, sem violar “a honra” ou “o decoro”. E quis também o impossível: que os senadores-juízes abandonassem “opções ideológicas, preferências políticas e inclinações pessoais”, para se ater a aspectos técnicos. 

Pode ser que, diante da repercussão negativa, os pitbulls de um lado e de outro resolvam se comportar e engulam os gritos de guerra. É irônico que o único personagem a ser rebaixado – de testemunha de acusação a “informante” –, Júlio Marcelo, procurador do Ministério Público no Tribunal de Contas da União (TCU), tenha sido o mais sereno, o mais articulado, sem ceder em momento algum a qualquer provocação, especialmente do advogado e ex-ministro José Eduardo Cardozo.

Júlio Marcelo foi rebaixado a pedido do PT, por não ser isento, já que apoiara pelas redes sociais uma manifestação pró-impeachment. Mas foram despidas de paixão suas respostas sobre as pedaladas fiscais de Dilma, as mentiras na campanha de reeleição e o papel concreto da presidente no (des)comando das estatais e da economia. Uma aula para quem deseja realmente entender por que, hoje, o brasileiro é obrigado a cortar plano de saúde e escola particular, por que já faltam alimentos e remédios na praça, por que as pequenas empresas estão endividadas ou fechando e por que os mais pobres sofrem uma taxa de desemprego de 20,6%.

Dilma foi um terremoto. Era para ser um poste passageiro instalado por Lula, à revelia do próprio PT, era para ser uma transição num país com as contas em dia. Era para Dilma ser mãe do PACo, Programa de Aceleração do Crescimento, mas virou mãe do PAQ, Programa de Aceleração da Queda, como escrevi aqui há três anos. Foi quando começou a cair a máscara do assistencialismo sem futuro. O país foi às ruas contra os políticos que arrombavam cofres, depredavam nossa autoestima e vandalizavam nossa economia. A presidente eleita, hoje ré, pede que tenham pena dela e se compara a Getúlio Vargas.

É válido o argumento de que o então vice-presidente Michel Temer não poderia se eximir de culpa. Nem ele nem muito menos o PMDB, o maior aliado dos governos petistas. Mas alegar inocência de Dilma é coisa de militante cego. Achar que Dilma não sabia nada do aparelhamento nas estatais, da promiscuidade com empreiteiras, dos superfaturamentos milionários, das escaramuças no Orçamento com fins eleitorais é uma ofensa até a ela, que sempre fez questão de centralizar todas as decisões.

Aparentemente, o PT também já abandonou a presidente afastada. Às vésperas do julgamento do impeachment, a executiva do PT rejeitou em peso, por 14 votos a 2, a proposta de Dilma de um plebiscito para antecipar as eleições presidenciais de 2018. O Partido dos Trabalhadores quer mais tempo para que o desastre dilmês passe a entrar na conta do PMDB e Lula tente voltar em 2018, prometendo o que não fez na era petista: saúde, segurança e educação de qualidade para todos. Alguém voltará a prometer ética na política?

Fonte: Ruth de Aquino - Época

 

domingo, 31 de julho de 2016

O maior legado da Olimpíada



É pavoroso o crime de omissão de sucessivos governos no cenário natural mais belo do mundo 

Esses apartamentos inacabados na Vila Olímpica não são nada para mim. Nada, diante da grande vergonha, de dimensões planetárias, que é a catástrofe ambiental do Rio de Janeiro. É pavoroso o crime de omissão (e provável desvio de verba) de sucessivos governos estaduais no cenário natural mais belo e majestoso do mundo. Pelo menos o crime está sendo exposto para o mundo. Viva a Olimpíada!

Além de carioca, sou militante desta Cidade Maravilhosa, nasci em Copacabana quando “arrastão” nada mais era que pescadores chegando com suas redes à areia coalhada de conchas e tatuís, peixes brilhando ao sol, águas cristalinas. Quando o Rio de Janeiro foi escolhido sede dos Jogos, em 2009, concorrendo com Madri, Tóquio e Chicago, vibrei. Era o momento de investir com seriedade. A adesão do povo foi impressionante: 85% queriam muito que o Rio fosse escolhido. Ingenuidade? Otimismo? Uma pesquisa da revista Forbes com 10 mil pessoas em 20 países acabava de eleger o Rio como “a cidade mais feliz do mundo”.

Meu artigo, há sete anos, parafraseava Barack Obama no título: “Sim, nós podemos”. Escrevi que cobraríamos o cumprimento de promessas porque estávamos “cansados de testemunhar falcatruas e projetos megalomaníacos que enchem os bolsos de políticos e são inúteis para a população”. Confiava em “uma virada” se houvesse “planejamento e responsabilidade”.

Nesse balneário com vistas de tirar o fôlego e clima ameno, havia três desafios a ser confrontados com a garra de atletas que buscam o ouro no pódio: a despoluição da Baía de Guanabara, a segurança pública e a infraestrutura urbana, com transporte adequado. Sabíamos como Barcelona havia aproveitado a oportunidade para se tornar um polo internacional de turismo. Por que não o Rio?

Até o prefeito Eduardo Paes me contradiz agora. Para o jornal inglês The Guardian, ele disse que “sim, nós perdemos”. “Esta [Olimpíada] é uma oportunidade perdida para o Brasil. Não estamos nos apresentando bem. Com todas essas crises econômicas e políticas, com todos esses escândalos, não é o melhor momento para estar nos olhos do mundo”, comentou, mas também reclamou de exagero nas críticas. “Isso me deixa louco. Se você ler os meios de comunicação internacionais, parece que tudo aqui é zika e pessoas atirando umas nas outras.”

Torcemos para a Olimpíada dar certo, em paz, sem ataques terroristas, sem assaltos a delegações e turistas, sem mortes de inocentes. E que sejam contornáveis os problemas na organização. Já nem são medalhas a nossa prioridade. Um legado da Olimpíada talvez seja o reconhecimento de nosso vexame maior: as águas imundas e poluídas do Rio. 

 Especialistas em saúde deram aos nadadores e velejadores um conselho. Fiquem de boca fechada para evitar doenças com dejetos, lixo, bactérias, rotavírus. “Os atletas estrangeiros estarão literalmente nadando em m... humana e correm o risco de adoecer por conta de todos aqueles micro-organismos”, disse ao jornal The New York Times Daniel Becker, pediatra carioca.

No ano passado, almocei com o governador Pezão e mencionei o fracasso de seu compromisso de despoluir a Baía até a Olimpíada. “Ruth, isso também é exagero do pessoal. Tem uns sacos boiando, uns pneus... a gente vai conseguir limpar.” Em 2014, ele dizia que a meta era ter 80% do esgoto tratado. Mas empurrou a meta com a barriga. Nas águas da Baía, há geladeiras, sofás, resíduos químicos de fábricas, óleo dos petroleiros. E, volta e meia, cadáveres.

Só pode ser gozação chamar de “ecobarco” aquele troço que faz papel de Comlurb na Baía de Guanabara, retirando toneladas de “lixo flutuante”. “Ecoboat” e ecobarreira não são nem paliativos. A 11 dias dos Jogos, foi retirada uma geladeira da água. Lars Grael, medalhista olímpico nas Olimpíadas de Seul e de Atlanta, disse que será “uma competição de vela com obstáculos”. Seu diagnóstico, em dia sem chuva: “Bastante sujeira, muito óleo na superfície e detritos. Plásticos, latas, engradados. Imagina, em plena regata, essa quantidade de lixo prendendo no casco da embarcação”.

Não foi por falta de planos bilionários ou de doações internacionais. Até ajuda do Japão o Rio já teve. As instalações de tratamento de esgoto são abandonadas ou sofrem vandalismo. As bombas param de funcionar e fica tudo por isso mesmo. Foi é por falta de vergonha.  Muita gente culpa “o brasileiro”, esse povo sem cultura ambiental. É verdade. Mesmo brasileiro com doutorado não sabe cuidar do lixo ou sai emporcalhando as praias. Mas o buraco é muito mais embaixo. Mais de 100 milhões de brasileiros não têm saneamento básico. Metade da população do país não tem coleta de esgoto! Depois da Olimpíada, talvez mude a cultura ambiental. É só a gente não ficar de boca fechada.

Fonte: Ruth de Aquino - Época

 

segunda-feira, 25 de julho de 2016

"Não queria destruir a presidente Dilma"



Após a prisão, João Santana admite caixa dois de campanha. “Só não sabia que era dinheiro sujo” 

O publicitário João Santana queria proteger Dilma Rousseff. Compreensível. Afinal, sua cliente já tinha pago US$ 4,5 milhões por fora a ele, o mago das campanhas enganosas do PT. Seu roteiro na TV havia pintado o Brasil de rosa, azul e o escambau. “Eu que ajudei, de certa forma, a eleição dela, não seria a pessoa que iria destruir a presidente”, disse enfim João Santana em depoimento ao juiz Sergio Moro.

Por que sua delação a destruiria? Porque apenas começava o processo de impeachment quando o publicitário e sua mulher, Mônica Moura, foram detidos. E porque esses milhões de dólares não eram apenas caixa dois. Tinham sido pagos por um lobista, em conta não declarada na Suíça, e sua origem era criminosa. Os milhões de dólares vinham de propinas em contratos da Petrobras.

Segundo a Lava Jato, esse pagamento à propaganda política de Dilma foi desviado de um contrato fechado por um estaleiro para construir uma plataforma. Nem vou listar aqui todos os coadjuvantes porque ninguém mais consegue acompanhar o novelo de nomes e números, dignos de uma saga de Gabriel García Márquez. O que importa é: o mago caiu, a mulher do mago também, e ambos mentiram para proteger Dilma e a própria pele. Agora, caíram na real e tentam passar a imagem de bonzinhos e leais.  Antes de mentir para proteger Dilma, João Santana usou seu talento de publicitário para pintar a presidente como alguém que ela nunca foi, pintar a realidade brasileira de cores que escondessem a cor de burro quando foge e, assim, mentir ao eleitorado. Publicidade sem compromisso com a realidade deveria ser crime. Mas é, não é? Na televisão, o país editado por efeitos especiais é escandaloso. Num Brasil que lê pouco, por falta de instrução e de hábito, e onde o voto é compulsório, a tal propaganda política “gratuita” deveria ser sujeita a um crivo rigoroso para ir ao ar.

Não se trata de uma caça macarthista aos publicitários. Os clientes mandam, eles fazem. É só isso? Não. No caso de políticos, eles recriam os personagens, os cenários. Eles inventam. Eles convencem. Eles mostram como manipular o voto. Não consigo achar nada disso ético. E, ainda por cima, ganham uma fortuna, em dólares, que escondem fora do país. João Santana se arrepende.

Embora não tenha admitido conivência com “uma trapaça”, como perguntou Moro, o publicitário agora se penitencia. Receber pagamento no caixa dois ou “por fora” é sim, segundo João Santana após refletir na prisão, um “constrangimento profundo”, “um risco”, “um ato ilegal”. Um crime, não é mesmo? Chamando as coisas pelo nome. Só que era difícil para o PT de Dilma anunciar publicamente quanto estava pagando a seu “construtor de imagem” para vencer a eleição.

No início, João Santana e a mulher, aquela mesma que sorriu mascando chiclete ao ser presa, em atitude debochada, combinaram dizer aos investigadores que esses milhões de dólares eram de campanhas eleitorais feitas no exterior. [quando foi presa Mônica Moura declarou que não iriam conseguir que ela baixasse a cabeça; coitada - não havia sido informada sobre as normas do cárcere e escolheu para desafiar uma das regras básicas em uma prisão: o preso sempre que se dirige ou é interpelado por alguma autoridade (que pode ser um simples agente penitenciário) tem a obrigação de baixar a cabeça e cruzar as mãos para trás. Em uma semana Mõnica aprendeu as duas regras e passou a baixar a cabeça para qualquer autoridade e cruzar as mãos.] Queriam evitar o que chamaram de “um grave problema” para Dilma, a honesta como nunca antes na história. Aquela por quem os militantes cegos botam a mão no fogo, a que não cometeu nenhum crime, a mãe dos deserdados, dos sem-­teto, dos famintos – alguém ainda alardeia isso por convicção, sem ganhar milhões de patrocínio em troca?

João Santana acha que foi apanhado como bode expiatório. Denuncia a hipocrisia que crucifica a ele e a mulher, num país em que, segundo o publicitário, 98% das campanhas políticas no Brasil usam caixa dois. Por que só o casal está preso por isso? “Eu tinha consciência de uma prática ilegal. Dinheiro sujo, jamais. Caixa dois não é necessariamente caso de corrupção”, disse Santana ao juiz Moro. Na hora de eleição, sem vigilância apropriada, “ou faz a campanha dessa forma ou não se faz”.  

Caixa dois é prática disseminada não só entre políticos, mas em “todas as camadas sociais e dezenas de profissões que recebem por fora”, disse João Santana. Aí sim. É a pura verdade. O publicitário bota o dedo numa ferida gigantesca. “A fila poderia ser fotografada de satélite”, afirmou o ex-mago do PT. “Iria de Brasília a Manaus.” Em campanhas políticas eleitorais, porém, é difícil o caixa dois ser imaculado. João Santana não é iniciante nem ingênuo. Deveria saber desse detalhe ou nem se importar com a origem.

Oficialmente, o PT pagou R$ 170 milhões em campanhas entre 2006 e 2014. Se pagou milhões de dólares por fora, é porque não podia declarar. Se não podia declarar, é porque era sujo. O desvio do desvio do desvio. Mas Dilma não cometeu nenhum crime. Não sabia de nada. Tampouco sabia Lula, aliás líder, segundo as pesquisas do Datafolha, nas intenções de voto no primeiro turno da eleição presidencial de 2018. Quem será o mago do PT nessa disputa? Foram todos presos. Viraram delatores e traidores.

Fonte: Ruth de Aquino - Época