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domingo, 24 de setembro de 2023

Por que não recorrerei ao STF contra minha cassação - Deltan Dallagnol

VOZES - Gazeta do Povo

Justiça, política e fé

Nesta semana, depois de muita oração e reflexão, anunciei que não irei recorrer ao Supremo Tribunal Federal contra a decisão ilegal do Tribunal Superior Eleitoral que cassou o meu mandato de deputado federal, conquistado com os votos de 344.917 paranaenses
A razão para isso é muito simples: não há justiça no Supremo. 
Eu já cheguei a acreditar que houvesse justiça em meu país e que o STF seria capaz de entregar essa justiça. Faz tempo que não acredito mais.

Confiar na justiça e lutar por ela sempre fez parte de mim. Tenho orgulho de poder ter servido, ao longo de 18 anos de minha carreira, como procurador da República, uma função que sempre identifiquei como de amor ao próximo, porque é isso que o Ministério Público faz: cuida das pessoas garantindo o cumprimento da lei e da ordem, punindo a criminalidade, combatendo a corrupção, protegendo o meio ambiente e os direitos difusos e coletivos.

Infelizmente, é impossível reconhecer a justiça nas decisões que são diariamente tomadas pela maioria do STF. 
A maioria no tribunal, a quem compete a guarda da Constituição, tem destruído a democracia que deveria proteger, com decisões cada vez mais arbitrárias. 
No STF, o que me espera são três ministros que já votaram contra mim no TSE pela cassação do meu mandato. 
Além disso, temos os pivôs da destruição da Lava Jato, que não disfarçam sua inimizade por mim: Gilmar Mendes e Dias Toffoli, ministros que representam a ala dominante na corte, totalmente avessa à Lava Jato.

Os ministros que julgariam o meu caso seriam os mesmos que votaram para anular condenações e investigações contra Lula, Arthur Lira, Beto Richa, Sergio Cabral, Gleisi Hoffman, Eduardo Cunha e vários outros. 
São os mesmos que, mesmo com todas as provas encontradas pela operação Lava Jato, só conseguiram condenar um único político, o ex-deputado Nelson Meurer, que nem chegou a cumprir pena, falecendo pouco depois. 
E são os mesmos ministros que condenaram, à revelia dos princípios constitucionais mais básicos do direito penal democrático, pessoas envolvidas no 8 de janeiro, que não têm sequer foro privilegiado perante a corte, para enumerar apenas um dos dez problemas com o julgamento.

Esses mesmos ministros têm, segundo a imprensa, interesse em emplacar candidatos seus à próxima vaga no STF, após a aposentadoria da ministra Rosa Weber. Dizem os jornalistas, ainda, que Gilmar Mendes está especialmente empenhado em influenciar a sucessão de Augusto Aras na PGR, e que Dias Toffoli tem tomado decisões absurdas contra a Lava Jato movido por um desejo de fazer as pazes com Lula e o PT, após ele mesmo ter destruído pontes com seus velhos amigos.

Num cenário desses, em que Lula - justamente quem vai fazer as indicações aos poderosíssimos cargos que são de interesse dos ministros - não esconde que seu maior sonho é a vingança total e completa contra a Lava Jato, é fácil de perceber que sobra pouco espaço para a Justiça, essa coitada entidade pouco lembrada pelos supremos. Ela fica ali, nas sombras do Plenário do STF, cegada, ensurdecida, emudecida, amarrada e impotente, esmagada pelo tamanho das pretensões políticas e desejos inconfessáveis por poder absoluto que permeiam o local.

Desde que anunciei minha decisão, recebi muitos comentários carinhosos de apoio e de força, pelos quais sou grato, e muitos que também expressaram sua revolta e sua indignação com o atual Estado de Abuso do Direito que vivemos no Brasil. 
É alarmante que a maioria das pessoas compartilhe exatamente o meu sentimento - de que não há justiça no STF - mas é também triste, extremamente triste. 
Tão triste quanto um desembargador precisar expressar, na tribuna do Supremo, que os ministros são as pessoas mais odiadas do país
Como nossa Suprema Corte se deixou desmoralizar desta forma?

Algumas pessoas chegaram a comentar: “Deltan, recorra ao STF, faça você mesmo a sustentação oral e exponha a injustiça do tribunal”
Como acreditar que até mesmo isso, o direito básico de um advogado ou de uma pessoa a apresentar pessoalmente a sua defesa aos seus juízes, será respeitado no meu caso? 
Como acreditar nisso quando o STF, ao ser confrontado com as críticas necessárias às suas ilegalidades e arbitrariedades por advogados durante o julgamento dos réus do 8 de janeiro, muda seu regimento interno para passar os julgamentos futuros ao Plenário virtual, negando a mais de mil réus e seus advogados o direito deles de serem julgados e apresentarem suas defesas no Plenário físico?

Não há como acreditar porque não há mais respeito à lei e à Constituição. Não há mais Império da Lei e Estado Democrática de Direito. Por conta disso, 35% dos brasileiros acreditam que não é permitido afirmar que o STF prejudica a democracia. Uma a cada quatro pessoas entende que não há liberdade de opinião no Brasil, que deveria ser garantida pelo Supremo. Além disso, 45% já sentiram medo de perseguição por criticar autoridades. As pessoas já perceberam que, hoje, há apenas o exercício puro e simples do poder e a manipulação da lei e das regras conforme as conveniências políticas do momento, em que salvam-se os amigos e aos inimigos sobra apenas a destruição. 

Hoje, como a maioria dos ministros me identifica como inimigo da corte, terei apenas isso à minha espera lá - abuso, arbitrariedade, ilegalidade e, ao fim, destruição. Isso no tribunal que deveria ser o primeiro a defender impessoalidade, imparcialidade e império da lei. Um dos maiores problemas é que os ministros que seguem a lei são os que têm menos poder, justamente porque não estão dispostos a violar as regras para beneficiar amigos e prejudicar adversários. Enquanto isso, vemos o poder dos demais crescer assustadoramente.

Outras pessoas não conseguem entender como eu possa ter decidido não recorrer para recuperar o mandato - para essas pessoas, não há nada mais importante do que cargos, verbas, prestígio e status social. 
Mas não é isso que me move, nunca foi. Não sou um cargo e nem um mandato. 
Se fosse, aliás, nem teria renunciado ao meu cargo de procurador, que sempre me realizou profissionalmente e trazia mais conforto pessoal por qualquer ótica que se faça a comparação. 
O que me move - e move a muitos que estão comigo nessa jornada - é um senso de propósito maior, de que devemos construir um Brasil iluminado pela Justiça em que floresçam democracia, liberdade e prosperidade. Nas sombras da injustiça em que vivemos, isso jamais acontecerá.

E é por isso que vou continuar a lutar. As 344.917 mil vozes que foram caladas pelo TSE não serão caladas para sempre. A sua voz, leitor, também não será calada para sempre.


domingo, 13 de agosto de 2023

As brincadeiras no STF revelam a crise da Justiça - Deltan Dallagnol

Gazeta do Povo - VOZES

Justiça, política e fé

Na última quarta-feira, após a presidente do STF anunciar o resultado da votação para a vice-presidência do tribunal, em que o ministro Alexandre de Moraes recebeu um voto, enquanto o ministro Edson Fachin recebeu dez, num clima descontraído, seguiram-se falas de dois ministros em tom de brincadeira:

- Ministro Alexandre de Moraes: “é que a votação não foi no TSE”.

- Ministro Gilmar Mendes: “vai colocar esse pessoal no inquérito”.

O humor tem sido, ao longo da história, uma ferramenta para ilustrar, criticar e até satirizar as realidades mais cruéis e absurdas de uma sociedade. Pode também ser usado como um espelho revelador de uma realidade que muitos tentam ignorar.

A alusão de Moraes ao seu poder absoluto no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e a insinuação de Gilmar Mendes de que Moraes poderia usar sua influência para perseguir aqueles que não o apoiaram trouxeram à luz uma faceta sombria de nossa corte suprema, a de interferências e manipulações.

Com sua brincadeira pública, os ministros, talvez inadvertidamente, chamaram a atenção para as preocupações que muitos brasileiros têm há algum tempo: a politização do STF e a influência de agendas pessoais nas decisões judiciais.

O humor tem sido, ao longo da história, uma ferramenta para ilustrar, criticar e até satirizar as realidades mais cruéis e absurdas de uma sociedade

O tamanho do poder de Moraes no TSE está evidente há tempos. Em maio, Moraes conseguiu nomear ao TSE dois advogados ligados a ele. Mas não bastou isso. No dia 24 daquele mês, num ato audacioso de atropelo do protocolo, o próprio Moraes anunciou que tais advogados foram escolhidos pelo presidente, sem aguardar o pronunciamento oficial da presidência ou de sua Secretaria de Comunicação.

 Em junho, a imprensa noticiou que Moraes procurou pessoalmente outros ministros da corte eleitoral em julgamentos importantes, como aquele da inelegibilidade de Bolsonaro, buscando construir compromissos e consensos. 
No caso de Bolsonaro, buscou evitar o adiamento do julgamento por pedidos de vista, que efetivamente não ocorreram. 
A unanimidade na minha cassação foi tida por um jornalista reconhecido como articulada também pelo ministro.

A essas demonstrações se somam as numerosas decisões de Moraes que têm sido consideradas, por muitos juristas como arbitrárias, mas têm sido endossadas pelos demais ministros. E aqui entra a segunda piada, de Gilmar, que reflete a inclinação de Moraes para censurar vozes discordantes, em violação à Constituição e às leis.

Um caso que revela tais abusos voltou à tona nesta última semana, envolvendo o influenciador Monark. Moraes emitiu uma terceira ordem de bloqueio das redes sociais do influenciador. Contudo, tal bloqueio é absurdo. 
Primeiro, a decisão que congelou suas redes, impôs multa de 300 mil reais e determinou que seja investigado por desobediência não indica em momento algum que regra constitucional ou legal as manifestações do influencer violaram. Vários juristas apontaram não existir uma violação sequer.

Segundo, se houvesse algum abuso, seria possível discutir a retirada pontual de conteúdo das redes, mas jamais seu bloqueio total. Hoje, as redes sociais são em grande medida a voz das pessoas, um canal básico de expressão. Bloquear as redes é o equivalente medieval de cortar a língua da pessoa.

Para além de não ter previsão na Constituição ou nas leis, o bloqueio das redes é vedado por elas. De fato, caracteriza censura prévia proibida expressamente pela Constituição.  
Essa censura prévia impede Monark de se expressar sem se saber previamente que conteúdo expressaria. 
Isso prejudica a manifestação de sua personalidade, violando um direito humano básico, e prejudica o debate público.

E aqui entra a segunda piada, de Gilmar, que reflete a inclinação de Moraes para censurar vozes discordantes, em violação à Constituição e às leis

Em terceiro lugar, como as redes sociais são o instrumento de trabalho de Monark, o bloqueio das suas redes o impede de auferir renda, o que conflita com a impenhorabilidade dos instrumentos de trabalho e com a própria dignidade da pessoa.

Some-se que a imposição de multa sem ampla defesa e contraditório viola o devido processo legal. É um confisco
Além disso, a instauração de inquérito para apurar desobediência conflita com a jurisprudência das próprias cortes superiores segundo a qual não há desobediência quando há aplicação de multa.

Isso tudo se refere a apenas uma decisão, mas há numerosas outras que rasgam a Constituição e as leis. A decisão de Monark é mais um testemunho da intensidade com que o ministro Moraes atua quando se sente desafiado ou contrariado. Essas decisões, que lembram um período sombrio da nossa história em que a liberdade de expressão estava sob constante ameaça, foram percebidas por muitos como tentativas de controlar a narrativa e suprimir vozes dissidentes.

Em um sistema judiciário ideal, a justiça não tem cor, sabor ou inclinação política. Ela é cega e imparcial. 
A brincadeira entre Moraes e Mendes revela uma complacência com algo tóxico que está se infiltrando na instituição, corroendo seus fundamentos que deveriam estar na defesa da democracia, do estado de direito e dos direitos fundamentais.

Se aceitarmos que a "brincadeira" tem, de fato, um fundo de verdade, então estamos diante de uma crise que vai além do Judiciário. Estamos testemunhando autocracia e tirania judiciais que constituem uma ameaça à própria essência da democracia brasileira.

O quadro de escalada do arbítrio judicial torna as "piadas" menos inocentes. 
O risco não está na piada em si, mas no que ela reflete ou destila. 
Se o poder de um ministro domina a corte e se o ministro pode usar de seu poder para perseguir quem o desafia ou desagrada, onde se pode buscar justiça?
 
Isso explica a indignação de tantas pessoas nas redes sociais diante das ironias dos ministros
As piadas foram compreendidas como um tapa na cara da sociedade de uma Justiça em crise, que em nome de defender a democracia tem sistematicamente violado direitos fundamentais e, assim, corroído a própria democracia.
 
Deltan Dallagnol, colunista - Gazeta do Povo - VOZES
 
 
 


sábado, 1 de julho de 2023

A guerra contra a Jovem Pan - J. R. Guzzo

Revista Oeste

A denúncia que o MPF acaba de fazer para punir a rádio é um manifesto político e uma demanda de repressão, por parte do Estado, contra um órgão de imprensa que exerceu em suas transmissões o direito constitucional à liberdade de expressão


Ataque à Jovem Pan | Foto: Montagem Revista Oeste/Shutterstock/Divulgação

Desde a intervenção da ditadura de Getúlio Vargas contra O Estado de S. Paulo, em abril de 1940, com a entrega da sua direção a um funcionário do governo e a transformação do jornal num boletim de propaganda do ditador, não se tentou no Brasil nenhuma violência contra um órgão de imprensa como a denúncia que o Ministério Público Federal acaba de fazer para punir a Rádio Jovem Pan
Não se trata de uma peça de acusação legal, feita dentro do que está escrito nos códigos de processo em vigor no país. 
É um manifesto político e uma demanda de repressão, por parte do Estado, contra um órgão de imprensa que exerceu em suas transmissões o direito constitucional à liberdade de expressão.  
Não tem nada a ver com a lei. Tem tudo a ver, e só tem a ver, com um ato de força bruta contra quem desagrada a religião oficial imposta pelo consórcio entre os partidos de esquerda e o sistema judiciário que hoje governa o Brasil. 
É coisa de KGB, ou da justiça que se pratica em Cuba.

Liberdade de expressão é assunto recorrente na Revista Oeste | Foto: Montagem Revista Oeste/Shutterstock

A denúncia, apresentada por dois acusadores de uma “Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão”, de São Paulo, pede à Justiça Federal o cancelamento das três outorgas de difusão da Jovem Pan — quer dizer, em linguagem mais clara, a cassação das concessões que ela tem do governo para transmitir seus programas de rádio, como todas as emissoras brasileiras são obrigadas a ter. Por que um castigo desses? 
Por causa, pelo que dizem as 215 páginas da acusação, da cobertura jornalística das eleições de 2022 feita pela Jovem Pan. Segundo os procuradores, essa cobertura foi uma infração gravíssima — a rádio, dizem em seu português tumultuado, se “alinhou” com algo que eles descrevem como “campanha de desinformação que se instalou no país ao longo de 2022 até o início deste ano”, e veiculou “conteúdos que atentaram contra o regime democrático”. 
 
A cassação é só o começo. O MP também quer que a Jovem Pan pague R$ 13,4 milhões como indenização por “danos morais coletivos”. Não se cita o nome de nenhuma das possíveis vítimas dos danos que teriam sido causados pela emissora; devem ser os 220 milhões de brasileiros, embora ninguém saiba da existência desse prejuízo em relação a si próprio nem tenha reclamado de alguma coisa. 
Enfim, para ficar só no grosso, os procuradores exigem o que nem o regime militar de 1964 foi capaz de pensar um dia — a Jovem Pan deve ser obrigada a veicular “ao menos” 15 vezes por dia, entre as 6 e as 21 horas, durante quatro meses seguidos, textos escritos pelo governo com informações “oficiais” sobre aquilo que o MP, ou o próprio governo Lula, consideram ser a “confiabilidade do processo eleitoral”
E se a rádio, ou qualquer brasileiro, achar que o sistema não é confiável? É proibido achar.
 
Em qualquer democracia séria do mundo a denúncia seria devolvida aos procuradores pelos juízes, por não atender à exigência mais elementar de um sistema judicial coerente — o cidadão só pode ser acusado de alguma coisa se a lei disser, claramente, que coisa é essa.  
Nenhuma lei brasileira diz que é proibido, ou nem sequer errado, praticar atos de “desinformação”. 
É algo que não tem existência legal no Brasil; a palavra “desinformação”, aliás, simplesmente não aparece nas 10 milhões de leis supostamente em vigor neste país. 
E “atentar contra o regime democrático” — que diabo seria isso? “Democracia” é uma coisa para os dois procuradores de São Paulo. 
É totalmente outra para os mais de 20 comentaristas citados na acusação — e cada um deles tem o pleno direito constitucional de achar que é outra. O que a lei proíbe é “tentar abolir, com o emprego de violência ou grave ameaça, o Estado de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais”. 
Ninguém fez absolutamente nada disso — nem a Jovem Pan nem os comentaristas. 
Que ato de “violência” ou “grave ameaça” eles praticaram? Nenhum. 
Só estavam falando no rádio — só isso.

É ilegal, por acaso, falar mal do STF ou do Senado ou, digamos, dos tribunais de contas ou de qualquer das outras “instituições” que o pagador de impostos brasileiro é obrigado a sustentar?

A denúncia do MP é desse jeito, da primeira à última linha. Acusa a rádio por coisas que os procuradores acham que é crime, mas a lei não diz que é — ou por coisas que eles acham que aconteceram, mas não aconteceram. Os jornalistas que acompanharam as eleições para a Jovem Pan são acusados pelo MP, por exemplo, de fazerem uma “interpretação altamente questionável da Constituição”. É mesmo? 
Quer dizer que é legalmente proibido, agora, fazer interpretações “questionáveis” da Constituição? 
O sujeito seria legalmente obrigado, então, a só fazer interpretações corretas? Não tem nexo nenhum. 
 
Em outra passagem, o MP se irrita porque dois dos comentaristas citados, Augusto Nunes e Ana Paula Henkel, não têm formação “em direito” Ana Paula, inclusive, é acusada de ter se formado em Arquitetura. E onde está escrito que alguém precisa ser diplomado em Direito para poder dar a sua opinião sobre esta ou aquela lei? 
A Jovem Pan também teria cometido o delito de dirigir “falas graves” ao STF e ao TSE, “inclusive contra os seus ministros”, e de criticar o senador Rodrigo Pacheco por não levar adiante as solicitações de impeachment dos membros da Suprema Corte coisa obviamente prevista na Constituição. Como assim?  
É ilegal, por acaso, falar mal do STF ou do Senado ou, digamos, dos tribunais de contas — ou de qualquer das outras “instituições” que o pagador de impostos brasileiro é obrigado a sustentar?
Será que não se pode falar mal nem desse Pacheco?
 
A denúncia acusa a Jovem Pan de violar o artigo 221 da Constituição. E o que diz o artigo 221? Diz que as emissoras de rádio e televisão devem dar “preferência” a “finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas”; também devem promover “a cultura nacional e regional” etc. Não pode ser isso o crime da Jovem Pan. Só pode ser, então, alguma falha no “respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família”, como exige a última frase do artigo 221. A denúncia, pelo jeito, se refere a esse item — os procuradores acham que a rádio ofendeu, em sua cobertura das eleições, “os direitos fundamentais” dos cidadãos. Quais, exatamente?  
Não se diz nada sobre isso. Também se acusa a emissora de não atender aos “interesses da coletividade” e de não respeitar o artigo 53 do Código Brasileiro de Comunicações — cuja redação foi dada por um decreto-lei do regime militar. É dali que vêm as excomunhões para as ofensas à “moral pública” — ou a repressão aos culpados de “caluniar, injuriar ou difamar os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário ou os respectivos membros”. Ou, então, para a veiculação de “notícias falsas”. Esse regime, a propósito, é chamado de “ditadura militar” pela denúncia — e os jornalistas são formalmente acusados, ali, de elogiar “a ditadura militar”.
 
Os promotores dizem que a segurança e integridade do sistema eleitoral foram confirmadas pela comissão das Forças Armadas que estudou a questão no ano passado. Não foi isso o que aconteceu no mundo dos fatos. 
As Forças Armadas não confirmaram nada só disseram que, com os elementos que puderam examinar, não dava para afirmar se as urnas do TSE estavam bichadas ou se, ao contrário, eram garantidas contra possíveis fraudes. Ou seja: não disseram que sim nem disseram que não. A questão das urnas, na verdade, é o centro das acusações feitas pelos procuradores. 
Basicamente, eles dizem que a Jovem Pan e seus comentaristas “desacreditaram, sem provas”, o processo eleitoral de 2022 e contribuíram para que “um enorme número de pessoas duvidasse da idoneidade” das eleições. Sim, milhões de brasileiros duvidaram, e continuam duvidando, das urnas eletrônicas que levaram o TSE a proclamar o presidente Lula como vencedor da eleição. 
 
Eles não entendem até hoje por que essas urnas são consideradas pelo consórcio STF-Lula como o sacrário do Santíssimo Sacramento, uma coisa em que ninguém pode mexer nem criticar, sob pena de ser indiciado em inquérito criminal — e que não pode, em nenhuma hipótese, ser tecnicamente melhorada. Por que isso?  
As urnas são um objeto mecânico — por definição, estão sujeitas a melhorias e a ajustes, hoje, amanhã e sempre. Quem criou desconfiança em relação às urnas eletrônicas não foram os programas da Jovem Pan. Foi a recusa absoluta do TSE em admitir qualquer acerto em seu sistema, por mínimo que fosse. 
Ou, por outro ângulo de visão: ninguém criou mais desconfiança em relação às urnas do que o Congresso Nacional, que aprovou uma lei, nada menos que uma lei, reconhecendo que o sistema não é seguro e, por essa razão, estabeleceu a obrigatoriedade de comprovação por escrito dos votos. O STF suprimiu a lei, por achar que ela era “inconstitucional”; a Câmara de Deputados estava pronta para aprovar uma nova lei no ano passado, estabelecendo a mesma coisa, mas um ministro do STF foi lá e convenceu as lideranças a desistirem do projeto. (Essas lideranças lideram um plenário do qual um terço tem problemas com o Código Penal e depende do STF para ficar do lado de fora da cadeia.) 
 
Os procuradores, em sua denúncia, se mostram indignados com as emissões da Jovem Pan. Têm todo o direito a isso, como cidadãos, mas como membros do Ministério Público é indispensável que tenham mais do que indignação;  
têm de ter provas materiais das acusações que fazem e razões legais para pedir o que pedem. A cobertura das eleições pela emissora foi ruim? 
Pode ter sido; é uma questão de ponto de vista. 
Mas esse é um problema entre a Jovem Pan e a sua audiência — quando não gosta do que ouve, vê ou lê, o público simplesmente vai embora e deixa os jornalistas falando sozinhos. O Estado não tem nada a ver com isso.
 
Não é surpresa, naturalmente, que o Ministério Público se comporte assim. Boa parte dos seus 13 mil membros, do MP da União e dos Estados, são militantes políticos que consideram que o seu dever não é aplicar a lei, mas fazer do Brasil um país melhor — segundo as suas ideias pessoais do que é melhor para o país, é claro. 
O que mais chama a atenção, no caso, é a posição geral da imprensa brasileira. Ao silenciar quase que completamente sobre a denúncia, a mídia se mostra a favor do MP e contra a Jovem Pan e os seus comentaristas — é isso, na prática.  
As redações, na maioria, funcionam como células políticas das facções de esquerda; os proprietários dos veículos, também em sua maioria, deixam que seja assim, por falta de interesse, de energia ou de talento para conduzir as suas empresas. 
O resultado é que a imprensa no Brasil está virando uma ex-atividade; e o jornalismo, uma ex-profissão. A ideia de que deve haver órgãos de comunicação diferentes, com posturas editoriais diferentes, está em vias de extinção, ou já foi extinta — como a iluminação pública a bico de gás ou os condutores de charrete que ficavam em frente às estações de trem nas cidades do interior. Os jornalistas, hoje, se tornaram incapazes de entender, e de aceitar, a liberdade de imprensa.Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil


Leia também “O golpe que nunca foi dado”

 

J. R. Guzzo, colunista - Revista Oeste

 

 

 

sábado, 24 de junho de 2023

TSE - Bolsonaro inelegível: pode? Deltan Dallagnol

Vozes - Gazeta do Povo

Justiça, política e fé

Começou  o julgamento da Ação de Investigação Judicial Eleitoral que pode deixar Bolsonaro inelegível.  
A ação proposta pelo PDT de Ciro Gomes busca cassar os direitos políticos de Bolsonaro por oito anos por causa de uma reunião convocada pelo então presidente com embaixadores de diversos países em 18 de julho de 2022, na qual Bolsonaro expressou desconfianças sobre as urnas eletrônicas e o processo eleitoral brasileiro. 
A reunião foi divulgada pela TV Brasil e também pelas redes sociais oficiais do governo e pessoais de Bolsonaro.
 
A avaliação geral é de que Bolsonaro ficará inelegível. O que preocupa é que essa avaliação se deve não a uma análise jurídica do caso, mas sim ao nome escrito na capa dos autos e à animosidade da Justiça em relação a ele. Numa democracia, um processo não deve ser palco para discutir ou julgar pessoas, mas sim os fatos, debaixo da lei. O que passa disso enfraquece o império da lei o Estado de Direito, substituindo-o por um império de pessoas e de suas vontades e caprichos políticos.
 
A questão deve, ou deveria, ser: qual a solução jurídica adequada para esse caso, diante dos fatos comprovados, do Direito e dos precedentes dos tribunais? Alega-se, basicamente, que Bolsonaro teria cometido abuso de poder político e dos meios de comunicação e conduta vedada previstos na legislação eleitoral. Examinemos cada uma dessas alegações e suas consequências previstas em lei.

    A avaliação geral é de que Bolsonaro ficará inelegível. O que preocupa é que essa avaliação se deve não a uma análise jurídica do caso, mas sim ao nome escrito na capa dos autos e à animosidade da Justiça em relação a ele

A conduta vedada atribuída a Bolsonaro está prevista no artigo 73 da Lei nº 9.504/97, que proíbe que agentes públicos usem bens móveis ou imóveis da Administração Pública, pois isso tende a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos
As punições previstas em lei são a suspensão da conduta, multa e, nos casos mais graves, a cassação do mandato. 
Havendo cassação, a lei de inelegibilidades prevê como consequência a inelegibilidade por oito anos. Como Bolsonaro não foi eleito, não poderia ser cassado e, assim, uma condenação por conduta vedada não acarretaria sua inelegibilidade.

A acusação de abuso de poder político e dos meios de comunicação tem por base o art. 22, XIV, da Lei Complementar 64/90, que proíbe o “uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político”. A lei prevê ainda que, para se caracterizar o ato abusivo, deve ser considerada “a gravidade das circunstâncias que o caracterizam”. Havendo condenação, a lei prevê a pena de inelegibilidade do “candidato diretamente beneficiado”.

Duas questões devem ser examinadas: os fatos alegados na ação, da forma como foram delimitados, devem ensejar uma condenação por abuso de poder político e dos meios de comunicação à pena de inelegibilidade? Em caso negativo, podem ser analisados em conjunto outros atos – como a minuta golpista ou os ataques do 8 de janeiro – para caracterizarem, como um todo, pelo conjunto da obra, abuso de poder político e dos meios de comunicação?

Em relação à primeira questão, por mais reprováveis que se possam considerar as falas de Bolsonaro sobre o sistema eleitoral, não devem ser sancionadas com inelegibilidade por quatro razões. Primeiro, a lei exige que o ato abusivo aconteça em benefício de candidato, ou seja, em contexto eleitoral. A reunião com os embaixadores ocorreu fora do período eleitoral. Nem Bolsonaro, nem Braga Netto, estavam sacramentados como candidatos a presidente e vice pelo PL. 
A convenção partidária do partido só ocorreria no dia 24 de julho daquele ano. 
Além disso, os questionamentos de Bolsonaro às urnas vêm de longa data, tendo sido feitos no passado também.
 
Segundo, as críticas ao sistema eleitoral não conduzem a uma vantagem eleitoral do então pré-candidato Bolsonaro sobre outros pré-candidatos. Seria muito diferente se Bolsonaro, durante as eleições, tivesse convocado uma reunião no Palácio do Alvorada com diversos embaixadores para fazer ataques ao candidato adversário mais competitivo, Lula, utilizando-se dos canais oficiais do governo para transmitir a reunião ao público.
 
Terceiro, a liberdade de expressão só deve ser restringida nas hipóteses previstas em lei. 
As Declarações de Direitos Humanos e Constituições democráticas protegem até mesmo a liberdade para falar mentiras e dar opiniões equivocadas. 
Nos casos de infração prevista em lei, as sanções aplicadas devem igualmente ser estabelecidas expressamente na lei. 
É preciso hoje recordar que a liberdade de expressão é um supradireito e, por isso, tem superioridade até sobre outros direitos fundamentais, porque além de ser uma liberdade individual é um pilar da democracia.

Assim sendo, eventuais críticas infundadas ao processo eleitoral podem ser moralmente condenáveis e enfraquecer a democracia, mas dificilmente se enquadram no conceito de abuso de poder político previsto na lei brasileira, que exige que o abuso gere benefício a candidato no contexto de uma disputa eleitoral.

A tese da democracia militante, invocada para embasar excessos judiciais em tempos recentes, jamais foi desenvolvida com o objetivo de legitimar ações estatais sem base constitucional ou legal, mas sim para que as Constituições previssem mecanismos de defesa da democracia. E o nosso sistema tem tais mecanismos: não só os estados de defesa e sítio, mas uma série de previsões da lei criminal proíbem e punem com prisão ataques à democracia e ao Estado de Direito.

Em quarto lugar, a lei exige que as circunstâncias sejam suficientemente graves para que exista ato abusivo, trazendo uma orientação no sentido de que a punição deve guardar uma proporcionalidade em relação ao mal causado. Se o ato abusivo não tem o condão de desequilibrar as eleições, evidentemente a inelegibilidade não se aplica. No caso em julgamento, há fatores relevantes que devem ser sopesados.

Um desses fatores é o fato de que as críticas de Bolsonaro ao sistema eleitoral sofreram dura contraposição na imprensa, nas redes sociais e no debate público.  
Em todas as vezes que Bolsonaro tocou no assunto, os maiores jornais do país rechaçaram as desconfianças em relação às urnas, e inúmeros órgãos, especialistas, juristas e advogados também se manifestaram em sentido contrário ao que dizia o ex-presidente. 
O próprio TSE, durante todo o ano de 2022, fez uma campanha maciça na imprensa e nas redes sociais em defesa das urnas eletrônicas.

    Bolsonaro será julgado pelo “conjunto da obra”, como se diz popularmente

Quando se analisa a gravidade das consequências do ato, outro fator relevante a ser considerado é que, no ambiente de forte polarização política já existente na época, as declarações de Bolsonaro provavelmente seriam filtradas e consideradas com reserva por aqueles que já não fossem seus apoiadores. 
Isso coloca em dúvida mais uma vez a ideia de que o fato poderia ter gerado um desequilíbrio no pleito. 
O próprio comparecimento massivo de eleitores às urnas também é evidência de que as declarações não demoveram os eleitores de votar nos seus candidatos.

Em relação à segunda questão posta, sobre a possibilidade de inclusão e julgamento de outros fatos no processo, a jurisprudência do TSE, firmada durante o julgamento da chapa Dilma-Temer em 2017, é clara ao proibir a inclusão de novas provas no processo após o protocolo da petição inicial, porque o tipo de processo em questão (a AIJE) não admite que fatos alheios à ação sejam usados para julgar os réus.

Além disso, o ministro Benedito Gonçalves, relator do processo contra Bolsonaro no TSE, quando saneou o processo, delimitou os fatos a serem julgados. 
 Foi apenas mais tarde, em 16 de janeiro de 2023, que o partido autor da ação, o PDT, apresentou outros fatos, como a minuta do golpe e os atos de 8 de janeiro. 
Entretanto, o mesmo ministro aceitou a inclusão da minuta do golpe na ação, o que foi referendado pelos demais ministros do TSE de forma unânime. 
O entendimento do TSE foi, portanto, na contramão do que a própria corte já havia decidido em 2017.
 
Desse modo, Bolsonaro será julgado pelo “conjunto da obra”, como se diz popularmente. 
Isso abre margem para a interpretação de que o processo está sendo conduzido de acordo com o nome que consta na capa dos autos e gera um risco ao devido processo legal se não houver uma renovação das oportunidades de defesa e produção de provas sobre tudo aquilo que for novo e for efetivamente objeto do julgamento.
 
O jurista Horacio Neiva, em excelente fio no Twitter, apontou como o TSE tem o costume de tratar eleições presidenciais de modo diferente, mudando de entendimento ao sabor dos ventos da política.  
Segundo o jurista, no julgamento da chapa Dilma-Temer em 2017, o TSE não aceitou a inclusão de novas provas no processo mesmo após a enxurrada de evidências trazidas pela Lava Jato de que a campanha de Dilma foi irrigada com dinheiro de corrupçãoporque na época Temer era presidente e o custo de cassar um presidente eleito ou em exercício é sempre imenso.
 
Hoje, com Bolsonaro fora da presidência, o TSE tem menos pudores para julgá-lo inelegível. Horacio lembrou ainda que é por isso que se costuma dizer que o TSE “é duro contra os pequenos e manso com os grandes”, e fez, também, o seguinte questionamento: se Bolsonaro tivesse sido eleito, estaria o TSE disposto a cassá-lo?  
A experiência e o entendimento de como Brasília funciona indicam que não, até mesmo porque o ex-presidente teria indicado dois ministros neste ano para compor a corte, em vez dos dois ministros indicados por Lula, considerados aliados do ministro Alexandre de Moraes.

Na sessão de ontem, o ministro Benedito Gonçalves leu seu relatório, as defesas apresentaram sustentações orais e a Procuradoria-Geral Eleitoral pediu a procedência da ação, para que Bolsonaro seja considerado inelegível. O voto do relator será lido apenas na próxima terça (27) e a expectativa de analistas e da imprensa em geral é de que será um voto longo e severo pela inelegibilidade de Bolsonaro.

Muito provavelmente se o personagem deste processo não fosse Jair Bolsonaro, o acusado poderia ser condenado por conduta vedada, mas dificilmente seria condenado por abuso de poder político e dos meios de comunicação à pena de inelegibilidade. 
Como estamos falando de Bolsonaro, a capa dos autos e a vontade dos ministros que hoje compõem o TSE devem mais uma vez prevalecer, como aconteceu no meu caso.  
Não se trata de você gostar ou não dos personagens e de concordar ou não com eles. 
Trata-se de respeitar a democracia e a lei. 
Vivemos cada vez mais um governo de pessoas e não de leis. 
A conferir na semana que vem.

Deltan Dallagnol, colunista - Gazeta do Povo - VOZES


sábado, 10 de junho de 2023

Três questões para Deus nesse momento de perseguição - Deltan Dallagnol

Gazeta do Povo - VOZES

Justiça, política e fé

Três questões para Deus nesse momento de perseguição - Foto: Bigstock

Eu estava sentado na poltrona do avião junto à porta de emergência.
A cabine do avião estava escura. O avião tinha decolado havia pouco e muita gente já havia fechado os olhos para descansar nas duas horas que separavam Brasília de Curitiba. Inclinei meu corpo para olhar através da janela. O céu estava lindo e estrelado. A grandeza do universo trazia paz num momento conturbado.

No dia anterior, a última terça-feira, minha cassação do cargo de deputado foi executada pela Mesa Diretora da Câmara dos Deputados.  
Muita gente havia clamado que a Mesa defendesse o povo, a democracia e suas atribuições diante de uma decisão do TSE que “legislou”, criando uma hipótese de inelegibilidade inexistente para me “caçar”
Contudo, como acontece tantas vezes, a voz da população foi barrada nas portas dos palácios de Brasília.

Naquela própria quarta-feira, poucas horas antes, outra bomba foi lançada sobre mim. Por seis votos a cinco, o Superior Tribunal de Justiça suspendeu as decisões da primeira instância da Justiça Federal favoráveis a mim, que suspendiam o procedimento do Tribunal de Contas da União que me cobra mais de R$ 3 milhões de reais.

    Contudo, como acontece tantas vezes, a voz da população foi barrada nas portas dos palácios de Brasília

O procedimento do Tribunal de Contas é esdrúxulo. A Justiça Federal disse que há “manifestas e evidentes ilegalidades”, além de “indícios de quebra de impessoalidade”, ou seja, de perseguição política.  
Foi conduzido contra os pareceres da área técnica do TCU, contra o parecer do Ministério Público do TCU e contra o entendimento do Ministério Público Federal
Três dos quatro ministros do TCU que me condenaram foram atingidos pela Lava Jato e seus desdobramentos. O relator, além disso, é aspirante a uma vaga no STF de Lula e estava no jantar de lançamento de sua pré-candidatura à presidência.
 
Todos, menos a área política do TCU, haviam entendido que os gastos da força-tarefa da Lava Jato foram legais e adequados. Foram feitos com passagens e diárias para trazer procuradores de todo país para Curitiba, a fim de recuperar 15 bilhões de reais.  
Além disso, todos disseram que, se houvesse alguma irregularidade, eu não teria nenhuma responsabilidade, porque eu não recebi nem paguei os valores, ou seja, não era nem beneficiário nem ordenador dessas despesas. Um juiz técnico e concursado apontou na mesma direção.
 
Contudo, o STJ suspendeu as decisões da primeira instância, inclusive a sentença que anulava o procedimento do TCU
Esse tipo de medida no STJ só é emitida em situações muito excepcionais, quando as decisões judiciais questionadas geram um risco grave e sistêmico, o que está longe de ser o caso. 
Dentre os 6 votos que me prejudicaram, estão dois ministros citados em delações da Lava Jato e um terceiro cujo filho foi acusado. Agora, o procedimento do TCU poderá avançar, inclusive sobre o patrimônio da minha família.
 
Há muito tempo há uma reação contra a Lava Jato, executada de várias formas e no barco da reação tem muita gente poderosa. 
Há gente que sinceramente acredita, ainda que equivocadamente, que a Lava Jato cometeu excessos, e esses são os que menos me preocupam. Os mais vingativos e poderosos são os que atacam a Lava Jato por seus acertos. E agora tem um novo time: os que querem agradar Lula, que quer vingança, para ser nomeado ou influir em nomeações para altos cargos da República. 
São inimigos em quantidade e poder excessivos.


    Três dos quatro ministros do TCU que me condenaram foram atingidos pela Lava Jato e seus desdobramentos

Olhando para a imensidão do universo e as estrelas, no silêncio e escuro do avião, eu imaginei uma experiência de uma conversa com Deus, com três perguntas.

Deus, a injustiça é muito grande. O Senhor me abandonou?

- Aonde quer que você vá, as pessoas têm abordado você com uma mensagem de confiança, de força e de resiliência. Olhe para a quantidade de pessoas que estão sofrendo a sua dor e a sua injustiça, que reflete a injustiça que reina no seu país. Olhe para aqueles que lhe contaram que choraram com o que lhe aconteceu, olhe para aqueles que lhe dizem que oraram e estão orando por você, olhe para todos que lhe param e pedem “não desista”. Eu estou cuidando de você por meio de todas essas pessoas.

Meu coração se fortaleceu. Ao mesmo tempo, eu ainda tinha preocupações muito concretas para colocar diante de Deus e avancei para a segunda pergunta.

Deus, agora eles vão avançar sobre o patrimônio da minha família. 
O Senhor conhece o meu coração e sabe que estou disposto pessoalmente a pagar o preço de lutar por justiça, mas a injustiça é muito grande e agora vai atingir quem eu mais amo. 
Dói buscar justiça e ver a injustiça se abater justamente sobre a vida da minha família, da minha esposa e dos meus filhos.

- Quando foi que eu permiti que você e sua família fossem tocados? Quando você foi condenado a pagar mais de cem mil reais por conta do Power Point, eu não fiz choverem mais de doze mil pix em menos de 36 horas na sua conta? Não foi mais de meio milhão de reais sem você abrir a boca para pedir? Quando você viu qualquer coisa parecida, homem de pequena fé? Não tema. Seja forte e corajoso.

O meu coração foi reconfortado, mas eu ainda imaginei colocar uma última questão para Deus:

Sim, Deus, mas estou sendo perseguido e fui impedido de seguir no caminho de transformação que havia sonhado. O que eu faço agora?

- Há muito tempo, dei a Moisés uma direção para sair do Egito com os israelitas. Então, quando eles viram no seu encalço os exércitos egípcios que queriam matá-los e renovar sua escravidão, e então se depararam com o Mar Vermelho à frente, ficaram desorientados. Moisés clamou a mim e Eu respondi, dizendo: “por que você está clamando a mim? Diga aos israelitas que sigam avante”. Siga avante no seu firme propósito.

Não sou Moisés e estou longe de ser um dos meus heróis da fé, mas eles são exemplos, modelos e referências para mim e milhões de cristãos. Aquele momento de reflexão nos céus, olhando para a imensidão da criação, foi um momento precioso, em atitude de oração, que vou guardar comigo. Há toda uma população que quer seguir na direção de um país em que os governantes se curvem aos interesses do povo e não aos seus próprios interesses. Todos querem um país mais justo e próspero. É preciso reunir essas pessoas, organizar os esforços e avançar, com trabalho, estratégia, perseverança e fé.
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Conteúdo editado por: Jônatas Dias Lima


Deltan Dallagnol, colunista e ex-deputado - Gazeta do Povo - VOZES

 


quarta-feira, 24 de maio de 2023

Justiça Eleitoral - Em cassação de Deltan Dallagnol, TSE criou nova hipótese de inelegibilidade

Gabriele Bonat


Juristas afirmam que cassação de Deltan Dallagnol pelo TSE gera insegurança jurídica.| Foto: EFE/André Borges

O processo de cassação do deputado federal mais votado nas Eleições 2022 no Paraná, Deltan Dallagnol (Podemos), pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) apresenta uma série de problemas, na avaliação de juristas ouvidos pela Gazeta do Povo.  Os especialistas destacaram que a cassação fere vários princípios, entre eles o da legalidade dos mandatos eletivos e o da soberania popular e quebra uma tradição de preservação dos mandatos dos representantes eleitos democraticamente pelo povo.
 
Outra avaliação comum entre os dos juristas é a de que, na prática, o TSE criou uma nova hipótese de inelegibilidade para justificar a impugnação do registro de candidatura de Dallagnol.  
Tal medida, apontam os especialistas, somente pode ser criada por lei complementar. 
Ao ser definida de forma unânime e sem debates pela Suprema Corte Eleitoral, essa novidade pode gerar um cenário de insegurança jurídica e ter como efeito direto a exploração de novas brechas na lei para criar mais e mais interpretações inovadoras da legislação eleitoral.

Decisão do TSE foi pautada em uma suposição
Há uma semana, o TSE cassou, por unanimidade, o registro de candidatura de Deltan Dallagnol, eleito deputado federal com cerca de 345 mil votos em 2022. De forma rápida e discreta, sem discussões, a decisão do TSE, por 7 a 0, fez o ex-coordenador da Operação Lava Jato em Curitiba perder o mandato.

O tribunal entendeu que o ex-procurador era alvo de reclamações disciplinares no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) quando pediu exoneração do cargo no Ministério Público Federal. Para o ministro Benedito Gonçalves, relator do caso no TSE, Dallagnol "sem dúvidas" poderia vir a ser alvo de um Processo Administrativo Disciplinar (PAD).

Segundo a decisão dos ministros, ao pedir exoneração Dallagnol “agiu para fraudar a lei, uma vez que praticou, de forma capciosa e deliberada, uma série de atos para obstar processos administrativos disciplinares contra si e, portanto, elidir a inelegibilidade”.

A decisão dos ministros, avaliam os juristas procurados pela reportagem, foi pautada por uma suposição. 
Na prática, contra o ex-procurador não havia nenhum Processo Administrativo Disciplinar (PAD) ativo no momento da exoneração do cargo. 
O professor de Direito Constitucional Fabio Tavares afirma que a cassação do deputado é ilegal, pois foi proferida na margem da lei, ofendendo os termos da Constituição que garantem o princípio da segurança política.“A lei diz claramente que, se existir um PAD pendente e o funcionário pedir exoneração, ele passa a ser inelegível. Mas Dallagnol não tinha PAD aberto, ele tinha sindicância e reclamações. A Lei da Ficha Limpa diz 'somente se houver instauração de PAD'. A decisão unânime do TSE vai na contramão da lei e da jurisprudência”, diz Tavares.

“Interpretação do TSE é uma fraude sobre fraude”, diz especialista  

A Lei da Ficha Limpa prevê que, em caso de renúncia do cargo, o servidor público que está respondendo um processo administrativo está inelegível por oito anos. Isso ajuda a evitar fraudes na lei, na opinião do especialista em Direito Eleitoral, Adriano Soares.  Segundo ele, havia casos que o servidor público que estava passando por um PAD, pedia exoneração antes do processo ser concluído para não sofrer com as consequências. "Isso presume que o servidor quer fraudar a lei. Mesmo sem sofrer essa sanção, a pessoa ficará inelegível para evitar fraudes”, explica Soares.

Para o jurista, no caso do Dallagnol o TSE presumiu uma nova fraude. 
“Neste caso, o TSE, por hermenêutico, criou uma fraude à lei que já previa uma presunção de fraude. Temos aplicado aqui uma dupla fraude. É uma cadeia de liberalidades”, destaca Soares.

O especialista em Direito Eleitoral ressalta que há algumas possíveis consequências com a decisão do tribunal. A primeira é que o TSE criou uma nova hipótese de inelegibilidade, violando o Art. 14, parágrafo 9°, da Constituição Federal, que prevê que outros casos de inelegibilidade só poderão ser criados por Lei Complementar.

Outro ponto citado pelo advogado é que a decisão gera precedente para outras hipóteses. “Assim, todas as hipóteses de inelegibilidade podem ser criadas pelo TSE e isso gera uma evidente insegurança jurídica. Fere o princípio da legalidade dos mandatos eletivos, fere o princípio da soberania popular e quebra uma tradição de preservação dos mandatos eletivos”, detalha. “Não se cassa um mandato sem que haja uma violação da lei”, complementou Soares.

Ausência de debates na decisão dos ministros gera estranheza  
Por unanimidade, 7 a 0, os ministros decidiram pela cassação do mandato do ex-coordenador da Operação Lava Jato. A falta de debates e discussões a respeito de uma matéria tão delicada no campo jurídico foi um dos pontos levantados pelo doutor em Direito pela Universidade de São Paulo (USP) e especialista em Direito Constitucional, Antônio Jorge Pereira. Ele afirma que os ministros criaram um “factoide e que a falta de discussão sobre o tema evidencia a perseguição política. “Alexandre de Moraes e Cármen Lúcia não divergiram em nada. Parece que há uma combinação prévia. Ou seja, já havia a decisão de condenar o Dallagnol, não importando os fatos”, opina.

Na visão de Adriano Soares, a decisão do TSE também careceu debate. “Nós não ouvimos os outros ministros colocando suas posições. Isso gera no meio jurídico uma surpresa”, diz. Para ele, no caso de Dallagnol faltou uma visão do direito garantista e uma visão do direito com interpretações diversas. “Retrata um momento delicado de polarização no Brasil e impacta o judiciário. Isso não é bom”, conclui o especialista.

Gabriele Bonat - Gazeta do Povo 

 

quinta-feira, 18 de maio de 2023

Lira, ampla defesa, cassação, ordem jurídica, Lira: Deltan Dallagnol vai ter direito à ampla defesa na Câmara e Marco Aurélio, sobre cassação de Dallagnol pelo TSE: ‘À margem da ordem jurídica'.

Lira: Deltan Dallagnol vai ter direito à ampla defesa na Câmara

O parlamentar tem cinco dias úteis para se defender

O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), disse, nesta quarta-feira, 17, que a perda do mandato do deputado federal Deltan Dallagnol (Podemos-PR) tem de ser analisada pela Corregedoria da Câmara.  “A Mesa seguirá o que determina esse ato: a Câmara tem de ser citada, a Mesa informará ao corregedor, o corregedor vai dar um prazo ao deputado, o deputado faz sua defesa e sucessivamente”, disse Lira. “O mandato deve ser cassado somente por esta Casa.”

Deltan Dallagnol

 Arthur Lira | Foto: Luis Macedo/Câmara dos Deputados | Foto: Foto: Luis Macedo/Câmara dos Deputados

Na ocasião, Lira respondia a uma questão de ordem do deputado federal Maurício Marcon (Podemos-RS). Na terça-feira 16, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) cassou o mandato de Deltan Dallagnol. A Corte entendeu que ele tentou “burlar” a Lei da Ficha Limpa ao deixar o Ministério Público sob, segundo o tribunal, risco de ser condenado em processo administrativo.

A Constituição garante que os deputados cassados pelo TSE têm direito à ampla defesa na Câmara. 
Desse modo, a perda do mandato tem de ser declarada pela Mesa da Casa, de ofício ou mediante provocação, assegurada pela ampla defesa. O parlamentar tem cinco dias úteis para se defender.
 

[ Ministro Benedito Gonçalves, do TSE, recebe do companheiro Lula um carinhoso tapinha no rosto. - Foto: Reprodução/ Twitter [são momentos carinhosos e que mostram que autoridades e criminosos também são capazes de momentos de carinho.]

Marco Aurélio, sobre cassação de Dallagnol pelo TSE: ‘À margem da ordem jurídica'.

 Ex-ministro do STF ficou 'perplexo' quando soube que ex-procurador não respondia a PAD

Marco Aurélio errou Moraes

 O ex-ministro do STF Marco Aurélio Mello | Foto: Nelson Jr./SCO/STF

O ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio Mello afirmou que a decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de cassar o mandato de Deltan Dallagnol (Podemos-PR) foi tomada “à margem da ordem jurídica”. Ele disse que ficou perplexo quando ficou sabendo que o ex-procurador da República não respondia a um Processo Administrativo Disciplinar (PAD), como exige a Lei da Inelegibilidade (Lei Complementar 64/1990).

“Eu fiquei perplexo porque soube vendo o noticiário que sequer PAD havia”, disse à Folha de S.Paulo. “Foi uma interpretação à margem da ordem jurídica”, acrescentou Marco Aurélio. Para o ex-ministro, “enterraram a Lava Jato e agora estão querendo enterrar os que protagonizaram” a operação.

Dallagnol chegou a responder a dois PADs enquanto era procurador. Depois disso, sem nenhum processo instaurado, conforme atestou o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), ele exonerou-se, em 2021.

Mas o relator no TSE, ministro Benedito Gonçalves, criou a tese de que Dallagnol pediu demissão para não ser eventualmente, no futuro, punido por PADs que não existiam e que ninguém sabe se existiriam. Isso porque havia 15 representações (mas nenhum PAD) em trâmite contra o ex-procurador). Os outros seis ministros acompanharam o relator.

Ao decidir pela cassação, o TSE ignorou o próprio precedente de não fazer interpretações extensivas além do que está previsto no texto da lei — para decretar a inelegibilidade de candidatos. Dezenas de políticos criticaram a decisão da Corte eleitoral. A ONG Transparência Internacional, de combate à corrupção, também destacou a “atipicidade” do procedimento e da fundamentação e alertou para um “perigo sistêmico”.


Brasil volta à era do vale tudo - Cassação de Dallagnol é absurda- O Globo

Merval Pereira 
 
[IMPORTANTE:  o título deste Post é AUTÊNTICO, consta em O Globo - está devidamente linkado, portanto não se trata de 'fake news'. Optamos por este destaque tendo em conta ser prova de que órgãos da velha imprensa, que fizeram o L começam a se arrepender.
Além do jornal O  Globo, temos o Estadão, a Folha, VEJA e outros órgãos que começam a ser forçado - pelos FATOS - a criticar a corja que servilmente serviram e ainda servem, mas começam a se rebelar.
Leiam  também: 

O sistema é f*#@  Também do Merval]

Deltan Dallagnol (Podemos-PR)


Deltan Dallagnol (Podemos-PR) Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados
 
A cassação do deputado Dalton Dallagnol não surpreendeu. 
Está claro que ele e Sergio Moro são os alvos preferenciais do esquema político que venceu. 
Depois do combate à corrupção, estamos vendo todos sendo absolvidos, ou tendo seus processos anulados e arquivados. [e, na sequência, vendo o Brasil condenado a ser governado por um ex-presidiário (que não foi inocentado, foi apenas descondenado) que não tem sequer um rascunho (ou minuta) de plano de governo, só tem um objetivo = acabar com o BRASIL.]
Ninguém foi julgado, e quem foi teve a pena anulada. 
 
Há uma clara perseguição aos dois, que representam a operação Lava-Jato, que está sendo ou já foi desmontada. A sentença do ministro Gonçalves diz que Dallagnol pediu demissão do MP para evitar uma punição
O caso é que não havia nada contra ele quando saiu, mas o juiz argumentou que existiam 15 processos que poderiam causar alguma condenação. 
Mas condenar alguém sobre algo que poderá acontecer é uma coisa de doido. O fato concreto é que não tinha nenhuma punição a Dallagnol quando ele saiu do MP.

É um absurdo o que aconteceu, não tem como imaginar outra coisa. Em um julgamento que levou um minuto, fica muito claro que a decisão estava tomada antes. Faz parte de um processo. O MP do Paraná e o ex- juiz Moro são símbolos de um período em que a corrupção foi combatida.

Pode-se dizer que houve excessos, mas os fatos não foram alterados; existiram, o dinheiro foi roubado, muito foi devolvido. Hoje, todos dizem que foram obrigados a delatar. Até Emilio Odebrecht escreveu um livro onde afirma que não houve roubo na Odebrecht.

Renan Calheiros e Eduardo Cunha estão comemorando nas redes a condenação do Dallagnol. Isso é exemplar, dá para entender por que estão comemorando e por que houve a condenação.  
É a tal frase famosa do Romero Jucá: acabar com isso e fazer um grande acordo com o STF e tudo. Foi feito.

O mesmo aconteceu na Itália. O sistema se reorganiza e consegue dar a volta. Agora todos os partidos e políticos estão sendo anistiados. Essa sequência de fatos não é à toa, nem coincidência. É o resultado de uma reviravolta da política brasileira, uma volta aos seus primórdios, onde vale tudo.

 Merval Pereira, colunista - O Globo

 

quinta-feira, 21 de abril de 2022

Lira recorre ao STF para Câmara decidir sobre cassação em casos como o de Daniel Silveira - O Estado de S. Paulo

Caso pode afetar futuro político de deputado bolsonarista, condenado pelo Supremo à perda de mandato 'automática'

O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (Progressistas-AL), recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF) nesta quarta-feira, 20, para que o Poder Legislativo tenha a palavra final em casos de cassação de parlamentares em julgamentos da Corte.

A medida foi tomada no mesmo momento em que o tribunal condenava o deputado bolsonarista Daniel Silveira (PTB-RJ) por ataques à democracia e determinava a perda de seu mandato.

Lira não citou o caso de Silveira, mas protocolou o recurso em uma ação de 2018 que trata do tema enquanto o julgamento do deputado bolsonarista se desenrolava, às 18h15. Procurado pela reportagem, Lira não se manifestou.

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Arthur Lira (Progressistas-AL) recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF) para Congresso decidir sobre cassação de parlamentares condenados pela Corte Foto: Adriano Machado/Reuters

A perda de mandato de parlamentar por ordem do STF é controversa e virou um embate entre congressistas e ministros da Corte nos últimos anos. Aliado do governo Jair Bolsonaro, Lira afirmou no recurso que, “diante das condenações penais transitadas em julgado, compete às Casas do Congresso Nacional decidir pela perda do mandato eletivo”.

O Supremo, no entanto, tem defendido que cabe ao Congresso apenas cumprir a decisão do Judiciário. Para os parlamentares, há interferência nas prerrogativas constitucionais da Câmara e do Senado quando a Corte determina a perda de mandato.

A Constituição prevê, no artigo 55, que a cassação de deputados e senadores deve ser decidida em uma votação no Legislativo, sendo exigida maioria absoluta. Em casos precedentes, a Mesa Diretora da Câmara, sob protestos de congressistas, apenas declarou a perda de mandato. Nesses episódios, o ato da Mesa foi lido em plenário, sem a necessidade de votação. Foi o que ocorreu, por exemplo, com o ex-deputado Paulo Maluf (Progressistas-SP), em 2018. 

No entanto, no caso do ex-deputado Paulo Feijó (PL-RJ), a Câmara questionou a decisão. O parlamentar foi cassado em maio de 2017 pela 1ª Turma do Supremo. Feijó recorreu, mas a decisão foi mantida em novembro. Em fevereiro de 2018,  o então presidente da Câmara, Rodrigo Maia (hoje PSDB-RJ), decidiu levar a questão ao Supremo, para que haja uma decisão pacificando o procedimento em casos em que a Corte determine a perda de mandato por condenação criminal.

Duas semanas antes do julgamento de Silveira, no dia 5 de abril, o ministro relator da ação de Maia, Luís Roberto Barroso, extinguiu o processo por uma questão técnica, sem analisar o mérito. A ação se referia justamente ao caso de Paulo Feijó, cujo mandato encerrou-se em 2019. No entendimento de Barroso, a ação havia, portanto, perdido o sentido.

Nesta quarta-feira, 20, quando a decisão sobre Silveira era analisada, Lira pediu reconsideração da decisão de Barroso e que o STF volte a analisar o mérito da questão de fundo. “A ação não possui como objeto simplesmente reverter a perda do mandato do ex-deputado federal Paulo Fernando Feijó, mas sim impedir que prerrogativas constitucionais da Câmara dos Deputados sejam subtraídas”, disse recurso de Lira.

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Ministros concluíram que declarações de Daniel Silveira não estão protegidas pela imunidade parlamentar. Foto: Nelson Jr./STF

Para ele, o Supremo estaria violando a separação entre os Poderes, ao determinar que ao Congresso cabe apenas uma “mera declaração” da Mesa Diretora, em ato de formalidade, sem necessidade de votação em plenário. É o que congressistas apelidaram de perda “automática” do mandato, quando o condenado não tem mais chances de recorrer.

O entendimento de Lira é similar ao de seu antecessor. Quando apresentou a ação, em 2018, Maia disse por meio de nota que a questão tratava de interferência entre Poderes. Não compete ao Poder Judiciário, mas ao Poder Legislativo, decretar a perda de mandato de parlamentares em razão de condenação criminal. Trata-se de prerrogativa constitucional irrenunciável, que não pertence a esta Presidência ou a esta Legislatura, mas ao Poder Legislativo, enquanto instituição permanente da democracia”, disse ele.

Felipe Frazão, colunista - O Estado de S. Paulo