Sergio Moro - Brasileiro do Ano
Ele condenou Lula e derrotou os barões da corrupção
Implacável
defensor da Lava Jato, o juiz Sergio Moro foi o responsável por mandar
para a cadeia em 2017 o ex-governador Sergio Cabral, o ex-presidente da
Câmara Eduardo Cunha e os ex-ministros do PT José Dirceu e Antonio
Palocci. A sentença de maior repercussão, no entanto, foi a que condenou
o ex-presidente Lula a nove anos e meio de prisão
Aos 45 anos, o juiz Sergio Fernando Moro
conseguiu uma inalcançável façanha em 2017: mandou um lote de políticos
dos mais poderosos para a cadeia, como o ex-governador Sergio Cabral, o
ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha, os ex-ministros José Dirceu e
Antonio Palocci. A mais estrepitosa sentença, no entanto, pela
repercussão e simbolismo, foi a que condenou a nove anos e meio de
prisão o ex-presidente Lula. Se confirmada pela segunda instância, e não
houver liminares marotas capazes de sustentar uma ilegalidade até o
pleito, o petista, mesmo que em última hipótese não seja preso, estará
impedido de concorrer às eleições de 2018. Daí o peso e a relevância
histórica do veredicto de Sergio Moro. Graças ao infatigável trabalho no
combate à corrupção, norte que perseguiu com desassombro ao longo dos
últimos 12 meses, o juiz será homenageado pela ISTOÉ na noite de
terça-feira 5 como o Brasileiro do Ano.
Depois de três anos e meio à frente da Operação Lava Jato,
Moro leva uma faina exaustiva. Trabalha mais de dez horas por dia. Não
raro, sequer almoça. Como magistrado, já condenou 114 pessoas, sobretudo
políticos importantes, ex-diretores da Petrobras e os mais conhecidos
empreiteiros brasileiros, sentenciados a penas que somam mais de 2.100
anos de cadeia. O mais emblemático empresário a ser preso pelo juiz da
13ª Vara Federal de Curitiba foi o empreiteiro Marcelo Odebrecht, dono
de um império que faturava R$ 130 bilhões por ano. Devido à atuação
implacável da Lava Jato, e, claro, de Sergio Moro, Marcelo e outros
envolvidos no esquema já devolveram R$ 11 bilhões aos cofres públicos.
Estima-se que a Petrobras foi desfalcada em R$ 40 bilhões pela quadrilha
organizada a partir do PT, PP e PMDB. Apesar dos resultados altamente positivos, Moro acha que o
Brasil pode não conseguir acabar com a corrupção endêmica. “A passagem
do Brasil de um ambiente de corrupção disseminada para um ambiente de
integridade corre riscos. Faltam reformas gerais mais incisivas que
diminuam incentivos e oportunidades para a prática de corrupção. A
omissão da maior parte de nossas lideranças políticas a esse respeito é
notável e frustrante”, disse Moro em entrevista à ISTOÉ. Ele não
acredita, porém, que o Brasil vá retroceder em matéria de punição aos
corruptos, a despeito de os fantasmas do atraso insistirem em assombrar o
País. “Pelas aspirações da sociedade brasileira, acredito que, apesar
da sombra do retrocesso, não há como voltar ao status quo da impunidade
dos barões da corrupção”.
“A corrupção será tema central nas eleições de 2018”
Sergio Moro, juiz federal
O laborioso cotidiano de Moro o motivou a insinuar, em
palestras pelo Brasil, que a Lava Jato estaria chegando ao fim e que
eventualmente ele poderia descansar. Em função da repercussão, o juiz
logo corrigiu seu desabafo. Disse que irá até o fim. Explicou, contudo,
que o trabalho da operação em Curitiba realmente aparenta estar na reta
final. “Há uma lista de julgamentos relevantes, como a condenação
criminal de vários corruptores e corrompidos, entre eles quatro
ex-diretores da Petrobras e diversos ex-parlamentares. Então grande
parte do trabalho já foi feita em Curitiba”.
Paralelamente à Lava Jato, o juiz tem se posicionado contra o
fim do foro privilegiado. Entende que essa medida acabará com
privilégios que protegem os mais ricos e poderosos. Há duas semanas, o
STF praticamente restringiu a prerrogativa de foro. A maioria dos
ministros decidiu que só terão direito ao foro privilegiado políticos
acusados por crimes cometidos no exercício do mandato e que também
tenham relação com o cargo ocupado. A sessão foi interrompida por um
pedido de vistas do ministro Dias Toffoli, mas só uma improvável
reviravolta, embalada por revisões em série de votos, impedirá a corte
de seguir por esse caminho. “A decisão do STF, ainda em formação, vem em
boa hora, mas o ideal seria acabar de vez com o foro privilegiado, para
todos, inclusive para juízes. Não quero para mim esse privilégio”,
frisa. [oportuno ter em conta que Toffoli pode 'segurar' uma decisão final sobre o foro privilegiado, pelo tempo que entender conveniente; apesar das normas estabelecerem um prazo para um processo ser devolvido pelo ministro autor do 'pedido de vistas', as mesmas são ignoradas.]
Outra discussão sobre a qual o juiz do Paraná tem se
debruçado é a prisão dos condenados em segunda instância. Ele faz coro
de que a Justiça brasileira é morosa e há um generoso sistema de
recursos que, manejado por criminosos poderosos e habilidosos, pode
impedir que qualquer ação penal chegue a um final. Processo sem fim,
sublinha Moro, “é o equivalente à impunidade”. Sensível a essa
realidade, o STF mudou sua jurisprudência em 2016 e passou a admitir
que, após uma condenação por uma Corte de Apelação, se possa desde logo
executar a pena. “Foi um grande golpe contra a impunidade dos poderosos.
Isso não impede que, havendo um recurso com plausibilidade, não se
possa, como exceção, suspender a execução da pena”, disse. Moro lembra
bem que, em outros países, como EUA e França, o preso condenado em
primeira instância já pode ir para a cadeia. No Brasil, desde 2016, o
destino de qualquer condenado em segunda instância é aninhar-se atrás
das grades, mas já há articulações em curso para dar um cavalo de pau na
herança bendita do ex-ministro do STF Teori Zavascki.
O contraste entre as céleres condenações de Sergio Moro e as
decisões do STF a passos de cágado, corte que ainda não condenou nenhum
réu da Lava Jato com foro privilegiado, é gritante e salta aos olhos do
mundo jurídico. Neste ano, o feito do magistrado foi destacado por
vários órgãos de imprensa nacionais e além-mar. Mesmo assim o juiz dá um
desconto e fala em falta de vocação das cortes superiores para
processar. “Como Teori, o ministro Edson Fachin tem realizado um
destacado trabalho. Tem tomado decisões rápidas e muito bem
fundamentadas. Agora, os Tribunais Superiores, por melhores que sejam as
intenções, não estão vocacionados para processar, instruir e julgar
ações penais desde o início”.
A respeito das naturais especulações acerca de uma eventual
candidatura a presidente da República, Moro repete como um mantra não
ter interesse de ingressar na política partidária”. Na verdade, o juiz
pretende dar prosseguimento à carreira jurídica. Ele não esconde
acalentar uma vaga como desembargador em instância superior. Ou, quem
sabe, um dia chegar ao STF.
Embora já tenha repetido inúmeras vezes que não pretende ser candidato a
presidente, Sergio Moro acha que o legado da Lava Jato pode contribuir
para mudar os rumos das eleições no ano que vem. “A corrupção será tema
central nas eleições de 2018 e será uma oportunidade para que os
eleitores cobrem dos candidatos posições concretas para a eliminação da
corrupção sistêmica, propiciando talvez a superação, a partir de 2019,
da omissão atual de nossas lideranças políticas”. O magistrado entende
que, graças à Lava Jato, os candidatos a presidente no ano que vem não
irão escapar de responder a questões cruciais como a posição sobre o
foro privilegiado, a execução da prisão em segunda instância, como os
aspirantes ao Planalto pretendem atuar para que o STF consolide sua
atual jurisprudência e o que será feito para evitar o loteamento
político de cargos públicos, gênese dos crimes na Petrobrás “Submeter os
candidatos a essas questões concretas parece ser mais relevante do que
discussões sobre as suas preferências ideológicas ou sobre sua condição
de outsider ou não”, justificou Moro. Pelo que já contribuiu para o País
tecer com os fios da Justiça e da contumaz retidão de caráter páginas
fundamentais de sua história, Sergio Fernando Moro é uma unanimidade
nacional. A única unanimidade que de burra não tem nada.
Indubitavelmente, o juiz é o brasileiro de maior destaque em 2017. Revista Isto É