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segunda-feira, 6 de junho de 2022

O climão no STF após o pedido de Carmén Lúcia para analisar decisão que livrou deputado bolsonarista - Por Bela Megale

O Globo

STF

O pedido da ministra Carmén Lúcia para que o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) analise a decisão de Kassio Nunes Marques, que livrou o deputado bolsonarista Fernando Francischini da cassação, causou mal-estar em uma ala da corte
O motivo é que magistrados avaliam que, antes solicitar ao presidente do STF, Luiz Fux, que o tema fosse debatido no plenário, Carmén deveria ter pedido para que Nunes Marques se manifestasse sobre o recurso que contestava sua decisão.  
 

Integrantes do STF ouvidos pela coluna afirmaram que há forte tendência da corte de derrubar a decisão de Nunes Marques que devolveu o mandato de deputado estadual do Paraná a Francischini. Eles argumentam, porém, que seria importante deixar o colega se posicionar antes de a medida ser revertida. — Se o STF não ouve o contraditório dentro da própria corte, o que fará o guarda da esquina com esse exemplo? — afirmou um ministro
 

 
 
Ele fez uma referência à frase atribuída ao vice-presidente do marechal Costa e Silva, Pedro Aleixo, numa reunião que teria decretado o AI-5, em dezembro de 1968. O AI-5 inaugura o período mais violento da ditadura militar. “O problema deste ato”, teria dito Aleixo, “não é o senhor, nem os que com o senhor governam o país, mas o guarda da esquina.”
 
[foi para ser contra o presidente  Bolsonaro ou algum  dos seus apoiadores, vale qualquer coisa. A história recente mostra decisões 'fora da curva' de ministros do STF  e não são contestadas por integrantes da Corte. Porém, Francischini é apoiador de Bolsonaro, portanto, o que não conseguem no voto, tentam outras maneiras...]

Após o pedido de Carmén, Fux marcou para a próxima terça-feira uma sessão extraordinária do plenário virtual para analisar o recurso que questiona a suspensão da cassação de Francischini.

Bela Megale, colunista - O Globo


domingo, 29 de setembro de 2019

Sentenças sem defesa - Janio de Freitas

Folha de S. Paulo
Reconhecimento das garantias constitucionais foi ameaçado pelo Supremo
Mais uma vez, o Supremo Tribunal Federal mostra uma combinação de temor a reações da opinião pública, inclinações políticas e argumentos artificiosos no trato de questão essencial para o regime democrático. É o que existe sob o louvado reconhecimento, já feito, de que às defesas cabe o último pronunciamento antes da sentença, para responder a denúncias novas ou a pendências remanescentes -- direito desrespeitado em julgamentos na Lava Jato. [alguém, por favor, explique a este escriba, não versado nas filigranas jurídicas, como fica se cada réu tiver o direito de falar por último?
a indagação se impões já que a ainda em gestação 'suprema decisão' tudo indica não explicará - se optar por tempos diferentes para os réus delatores e o delatados - se a temporalidade para cada tipo de réu se encerra, ou quando o delatado, ao se defender dos argumentos expendidos pelo delator, acusar a este de algum delito e o acusado invocar o direito de se manifestar devido sua condição de delator e delatado?]

Na verdade, porém, o valor desse reconhecimento depende de uma definição que está ameaçada pelo próprio Supremo. Ainda faltando os votos dos ministros Marco Aurélio Mello e Dias Toffoli, que apenas antecipou sua opinião, a meio da semana ficava reafirmada, por 6 votos 3, a tese que levou à anulação da pena imposta por Sergio Moro a Aldemir Bendine, ex-presidente da Petrobras. Resultado que agora se estendia ao ex-gerente da empresa Márcio Ferreira. Mas a forçosa decisão incomodou vários ministros, dada a possibilidade de anular numerosas condenações da Lava Jato. Não tardou a aparecer o que foi chamado de "modulação" no reconhecimento do direito dos réus. Melhor diriam, no entanto, mutilação.

Luís Roberto Barroso, terceiro a votar, propôs que, se confirmada para o réu a última palavra, assim seja apenas daqui por diante. Logo, caso o Supremo declarasse incorretos os métodos condenatórios, a seu ver o incorreto deveria permanecer intocado. Nem ao menos era caso de regra nova e não retroativa. Azar o de quem não teve a defesa final e está na cadeia. É interessante a virada de Barroso, que se mostrava de fino rigor legalista até que se viu sob críticas, por comprometer-se com a tese da prisão antes de concluídos os recursos de defesa. Sua reconhecida vaidade se teria magoado, e passou a responder com uma virada para a linha Fux.

Por falar nele, nunca surpreendente, Luiz Fux adotou a proposta de Barroso. E, como toque pessoal, considerou mera "benesse processual" a ordenação dos pronunciamentos finais que leva, só ela, aos "assegurados contraditório e ampla defesa" citados no artigo 5º da Constituição.Se, em casos da Lava Jato, entre a acusação por um delator e a sentença não houve tempo para a defesa, ficaram impossibilitados o contraditório e a ampla defesa. Para isso, o método de Moro consistia em dar o mesmo prazo para as "razões finais" da acusação e da defesa. Benesse, só para a ânsia condenatória de Moro.

Cármen Lúcia fez um voto peculiar: sim, a defesa tem direito ao prazo para responder à última acusação, mas a sua falta só deve invalidar a condenação se o réu provar que foi prejudicado. Assim o voto da ministra ignora que a incorreção a ser anulada não está no réu, está no processo. O réu teve um direito negado, e não tem que provar nada para vê-lo respeitado. O truque para não repetir o julgamento de condenados da Lava Jato não está à altura da Carmén Lúcia original, serve apenas à dos últimos tempos. [o ônus da prova recai sobre quem acusa, quem invoca uma suposta ocorrência.]

Relator do caso, Edson Fachin foi espantoso. A seu ver, não tem sentido o prazo maior para a defesa porque a legislação não diferencia delatores e delatados. Ao que o decano Celso de Mello respondeu: se há tal lacuna, "deve ser suprida pelo princípio da ampla defesa". Com a Constituição, pois. Tese também de Rosa Weber e Ricardo Lewandowski. Alexandre de Moraes, a propósito, foi simples e certeiro: "Não custa ao Estado respeitar o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa. Nenhum culpado, nenhum corrupto, nenhum criminoso deixará de ser condenado, se houver provas, se o Estado respeitar esses princípios constitucionais".

Ainda assim, e com a adesão de Dias Toffoli, que anunciou outra "proposta de modulação", os propensos a mutilar o direito constitucional à "ampla defesa" têm possibilidade de fazer maioria. Situação ameaçadora, porque, como disse Gilmar Mendes, "a questão não é Lava Jato, é todo um sistema de Justiça penal".

Ou é o perigo de Justiça bolsonara.
Jânio de Freitas, jornalista - Folha de S. Paulo