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sexta-feira, 10 de junho de 2022

Decisão do STF - Cassação do mandato de Francischini é uma injustiça - Gazeta do Povo

J.R. Guzzo

Francischini foi o deputado estadual mais votado do Paraná em 2018

Ele foi eleito pelo voto de 430 mil cidadãos paranaenses e destituído por três magnatas que jamais tiveram um único voto na vida. 

Vai se tornando muito difícil, para qualquer cidadão que tenha a capacidade de pensar dentro dos princípios da lógica mais simples, acreditar que o Brasil viva numa democracia – ou, pelo menos, o que se entende por democracia nas sociedades onde ela é realmente praticada. Não é preciso entrar num curso de ciência política para se ver isso.

Uma das exigências mais básicas das democracias de verdade é ter um sistema de Justiça que funcione, que seja compreensível pelo cidadão comum e cujas decisões se possa prever – elas precisam, essencialmente, seguir o que está escrito nas leis e prover soluções justas, onde se veta o que está errado e se aceita o que está certo. O Brasil de hoje não tem isso.

O que temos, na realidade do dia a dia, é uma Justiça que produz injustiça; está fazendo exatamente o contrário do que se espera que fizesse, e com isso perde o seu nexo lógico. 
Quem precisa de injustiça? Ninguém – sobretudo uma democracia, que não pode funcionar sem um sistema judicial coerente. 
Decisões injustas, assim, são uma agressão direta ao regime democrático, sobretudo quando se tornam uma ação permanente do Estado.


Acontece o tempo todo, e acabou de acontecer com a cassação do deputado estadual Fernando Francischini, do Paraná, por decisão de 3 a 2 numa “turma” do STF. Ele foi eleito pelo voto de 430 mil cidadãos paranaenses e destituído por três magnatas que jamais tiveram um único voto na vida. A vontade dos eleitores, que é outro fundamento essencial da democracia, não valeu nada no seu caso.

A cassação do mandato do deputado é um ato de injustiça em estado bruto e mais um exemplo flagrante da aberração funcional em que se transformou o sistema judiciário no Brasil 
Ele foi punido por um crime que simplesmente não existe no Código Penal Brasileiro – falou que duas urnas da eleição de 2018 estavam sendo roubadas. E daí?

Pode ser verdade, pode ser mentira ou alguma coisa entre as duas; só não pode ser crime, porque não existe lei dizendo que é. Se sua declaração causou danos, ele poderia ter sido processado penalmente por calúnia, injúria ou difamação, e responder a ações cíveis de reparação. Foi acusado, processado e condenado pelo delito inexistente de propagar “desinformação”.

Não há como resolver essa insânia. Francischini foi cassado por ser um deputado “bolsonarista”, como diz a mídia (não um deputado paranaense; um deputado “bolsonarista”), e para intimidar outros críticos do sistema eletrônico de votação em vigor, com a criação de jurisprudência preventiva. O recado é o seguinte: “Cuidado. Quem falar mal do sistema eleitoral vai ser cassado. Olha o Francischini”. O resto é pura hipocrisia.

O caso todo é tão absurdo que em seu primeiro julgamento, no TRE do Paraná, o deputado foi absolvido por 7 a 0. Mas isso não fez diferença nenhuma. O caso acabou no Supremo, e o Supremo funciona hoje como o mais poderoso partido de oposição no Brasil.  É óbvio que a decisão foi reformada no TSE e, no fim, no STF, por um voto de diferença.
 
É injustiça pura e simples. Porque raios o deputado, ou qualquer cidadão brasileiro, não pode falar mal das urnas eletrônicas, ou do que lhes der na telha?  
Em que lei está escrito que o sujeito é obrigado a confiar no sistema eleitoral existente? 
De novo: se o deputado fez uma acusação falsa, há farto remédio para isso no Código Penal e demais legislação.

Mas ele foi punido, com a perda do mandato, por uma infração que não está tipificada na lei – e a tipificação, ou seja, a descrição detalhada, clara e por escrito de cada obrigação legal das pessoas, é uma exigência elementar de qualquer sistema de justiça, e de qualquer Estado Democrático de Direito. Se não está na lei, não pode haver punição. Ponto final.

O STF tem dois ministros nomeados pelo atual presidente e nove inimigos declarados do governo.  
Não é preciso dizer que os dois votos a favor do deputado Francischini foram os dos ministros indicados por Bolsonaro; 
também não é preciso dizer que suas decisões serão automaticamente anuladas pelos outros nove, sempre que houver alguma conotação política no processo. É essa, hoje em dia, a previsibilidade da Justiça brasileira – pode-se contar, com certeza, que as decisões vão ser contra o governo.
 
J. R. Guzzo, colunista - Gazeta do Povo - VOZES

segunda-feira, 6 de junho de 2022

O climão no STF após o pedido de Carmén Lúcia para analisar decisão que livrou deputado bolsonarista - Por Bela Megale

O Globo

STF

O pedido da ministra Carmén Lúcia para que o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) analise a decisão de Kassio Nunes Marques, que livrou o deputado bolsonarista Fernando Francischini da cassação, causou mal-estar em uma ala da corte
O motivo é que magistrados avaliam que, antes solicitar ao presidente do STF, Luiz Fux, que o tema fosse debatido no plenário, Carmén deveria ter pedido para que Nunes Marques se manifestasse sobre o recurso que contestava sua decisão.  
 

Integrantes do STF ouvidos pela coluna afirmaram que há forte tendência da corte de derrubar a decisão de Nunes Marques que devolveu o mandato de deputado estadual do Paraná a Francischini. Eles argumentam, porém, que seria importante deixar o colega se posicionar antes de a medida ser revertida. — Se o STF não ouve o contraditório dentro da própria corte, o que fará o guarda da esquina com esse exemplo? — afirmou um ministro
 

 
 
Ele fez uma referência à frase atribuída ao vice-presidente do marechal Costa e Silva, Pedro Aleixo, numa reunião que teria decretado o AI-5, em dezembro de 1968. O AI-5 inaugura o período mais violento da ditadura militar. “O problema deste ato”, teria dito Aleixo, “não é o senhor, nem os que com o senhor governam o país, mas o guarda da esquina.”
 
[foi para ser contra o presidente  Bolsonaro ou algum  dos seus apoiadores, vale qualquer coisa. A história recente mostra decisões 'fora da curva' de ministros do STF  e não são contestadas por integrantes da Corte. Porém, Francischini é apoiador de Bolsonaro, portanto, o que não conseguem no voto, tentam outras maneiras...]

Após o pedido de Carmén, Fux marcou para a próxima terça-feira uma sessão extraordinária do plenário virtual para analisar o recurso que questiona a suspensão da cassação de Francischini.

Bela Megale, colunista - O Globo